terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Ano novo, Vida nova? (II)

1.
Vida nova? Bem, a vida segue, e ela não se renova apenas com votos e nem com a passagem de ano – que pode ser vista como simples mudança no calendário – porém, se renova à medida que a mente e o espírito se renovam. E como se renovam? Se, e somente se, compreendemos que “viver em novidade de vida” conforme o Evangelho é uma proposta muito mais abrangente e não cabe na agenda triunfalista dos fins de ano e nem pode ser comercializada. Paulo, o apóstolo, diz: “Assim também andemos nós em novidade de vida”.
2.
O primeiro passo para isso já foi dado por Cristo na cruz, sepultando consigo nosso estado de condenação e culpa pela escravidão do pecado; o segundo quem dá somos nós, na energia e força do Espírito, quando sepultamos aquele velho ser imerso em pecado e ressuscitamos para uma nova vida em Cristo.
3.
Vida que se revigora na renovação diária de nosso compromisso com Ele, na dependência de seu Espírito. Nossos planos, votos, felicitações triunfais de nada servem se estiverem fora desse propósito. Nada de “novo”, se essa novidade não partir de dentro pra fora, na metanóia diária que deve se impor como confrontação aos paradigmas desse século: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2). Em outras palavras, não se trata de uma vontade que se revela magicamente, mas pela vivência e ação: renova-ação, inconforma-ação e obediência aos valores revelados no Evangelho. E nisso não tem nada de “Abracadabra”.
4.
Novo ano, vida nova? Nem sempre. Nada pode ser feito novo se não for entregue em “mãos maiores”, aquelas que possuem a primeira e a última palavra: “Haja luz” e “Eis que faço novas todas as coisas”. Portanto, para esse ano que já nasceu, prefiro fazer um voto-oração mais bíblico e realista: que a graça nos conduza para uma vida nova em Deus, conforme Deus e para Deus!

Grande beijo e feliz 2009!
Jonathan
(Foto: Rio Sena, Paris)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Ano novo, Vida nova? (I)

É muito comum nas passagens de ano ver as pessoas fazendo votos, promessas e desejos para o ano que vem. E nesse não foi diferente. Feliz 2009? Nada de novo debaixo do céu. Sempre ouvimos os mesmos votos de felicidade, saúde, paz, alegria, prosperidade, sorte no amor, na vida, nos negócios... O “blá, blá, blá” de antigamente é o mesmo de hoje, com algumas nuances. Felicidade, antigamente, era uma palavra mais ligada a coisas singelas da vida, como casar, ter um filho, receber flores. Hoje tem se tornado objeto de comércio e marketing, por parte dos veículos de comunicação, empresas e até igrejas. “Mas que mal há nisso?”, talvez algum(a) leitor(a) pergunte intrigado(a).

Está certo, mal pode até não fazer – que mal pode haver em se desejar coisas boas, um recomeço, uma vida nova, um ano novo? Porém, em que medida realiza o bem? Esse “bem” não é apenas o fazer-se-sentir-bem dos psicologismos auto-estimulantes e das “piedades pervertidas” (Ricardo Quadros Gouvêa) de nosso tempo, mas um “bem” conforme os padrões Divinos, que nem sempre (ou quase nunca) coadunam com as expectativas irrealísticas reverberadas por cada um de nós, ano após ano. A esse respeito, a palavra de Deus ao profeta Jeremias me chama atenção: “Eu é que sei os pensamentos que tenho a vosso respeito; pensamentos de bem e não de mal, para vos dar o fim que desejais” (Jr 29.11).

O “fim” aludido no texto é bem específico, e não genérico – pois diz respeito ao anseio mais premente do povo naquele instante: a libertação do cativeiro na Babilônia. Logo, não é um texto a ser aplicado deliberadamente (e há algum que pode ser?). A lógica da banalização, se pudesse prever, pode ser resumida no seguinte: ora, se os pensamentos de Deus são de bem, para dar o fim que eu desejo, então Deus (que é o “Deus dos impossíveis”), está disposto a mover céus e terra para me beneficiar – como fazer parar uma chuva, apenas para que eu possa ir de um lugar a outro sem me molhar, por exemplo. Essa lógica é furada. Primeiro, porque transgride o sentido bíblico. Segundo, porque promove uma transferência de vontades: de mim para Deus e de Deus para mim, como se entre ambas houvesse uma perfeita harmonia e como se o que pensássemos ser “muito bom”, em qualquer situação, de fato realizasse o bem de Deus em nós.

Desse modo, invertemos os paradigmas, subvertemos as “vontades” e simplesmente absorvemos as prioridades que estão na agenda da humanidade ano após ano, como se elas representassem a todos num todo, como se convergissem com as dinâmicas da realidade e ainda conseguissem manipular a Deus, que simplesmente assina embaixo e abençoa a todos, fazendo o papel do “bom velhinho”. Honestamente, chamem-me de cético, chato, pessimista ou do que quiserem, mas isso tudo não passa de ritual vazio e quimérico papagaiado por todo mundo todos os fins de ano sem a devida reflexão e percepção da realidade ao redor. Falta-nos sensibilidade e criticidade e muito mais.

Jonathan

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Neste natal, você precisa engravidar!

Maria... achou-se grávida pelo Espírito Santo” (Mateus 1.18).
Sob certo ponto de vista, o natal é uma festa religiosa como qualquer outra, onde se comemora o advento, a vinda do “menino Deus”. Mas por que celebrar a vinda de Deus se, durante todo o ano, tocamos nossas vidas como se ele não existisse? O que, de fato, as pessoas estão celebrando? Celebração por celebração existem tantas outras – aniversário, dia das mães, dos pais, das crianças, das mulheres, etc. Assim, o que faz – ou deveria fazer – do natal uma celebração tão especial?
Para mim, o natal traz uma notícia especial: a de que, queiramos ou não, acreditemos ou não, não estamos sozinhos nesse mundo. Foi-nos enviado o Emanuel, que significa “Deus conosco”. O barco da história não está à deriva. Deus está nele com a gente. A salvação está hoje-já-aqui-presente. Deus, como diz uma canção, “não vive longe lá no céu sem se importar comigo”. Ele se encarnou para viver em e com a humanidade.
Nesse sentido, chama-me a atenção a metáfora utilizada por William P. Young, autor do livro “A Cabana”, de que, em Jesus, vemos um Deus que, ao contemplar a desgraça da humanidade e o caos no mundo, arregaçou as mangas e se meteu “no meio da bagunça”. Foi Jesus mesmo quem disse: “O reino está entre vocês”. Não de maneira estrondosa, como os grandes e pomposos reinados humanos, mas silenciosa e revolucionária. As visibilidades e sinais do reino são pessoas que levam a sério o chamado de Jesus e encharcam suas vidas e a de outras pessoas com amor, paz, justiça, solidariedade, equidade, liberdade, compaixão, enfim, a lista é grande.
Então, por que ainda persiste esse sentimento todo fim de ano de que a mensagem do natal “cai no vazio”? Vazio que tem sua maior expressão quem sabe no consumismo, um dos deuses deste século. Porque, em muitas pessoas, mesmo as mais religiosas, Jesus ainda não nasceu. Pode ter nascido na história, mas ainda não no ser das pessoas. E o que é preciso acontecer antes do nascimento? Todos sabem que é a gravidez. Maria foi engravidada pelo Espírito de Deus. Tem gente que ainda conta a história da cegonha para seus filhos, e acho que, para muita gente de religião, “Jesus” veio pela cegonha, ou seja, não nasceu de fato, foi encomendado, é um “Cristo genérico”, parafraseando Eugene Peterson, ou um Jesus “Genésio”.
Para que Jesus nasça em nós e para que o natal tenha sentido, precisamos nos deixar ser engravidados pelo Espírito. Somente ele pode nos engravidar de Jesus, do Deus conosco operando em nós aqui e agora. O sacerdote (padre, pastor, xamã, guru, pai de santo, etc.) não é capaz, nem a religião, nem as boas obras, nenhuma criatura, nenhum rito, culto, sacrifício, nada. Por isso, deixe o Espírito te engravidar da vida plena: de liberdade, de sonhos, de projetos de vida que sejam um convite para que o “Deus conosco” esteja em todos eles, no próximo ano e para o resto de sua vida.
Pense nisso, e abra de uma vez por todas sua vida para que o Espírito de Deus te engravide de Jesus! Grande beijo e um feliz natal!
Jonathan

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

E se todos os dias fossem como o natal...

A recomendação do rei Herodes Antipas aos três reis magos era para que eles fossem até o local onde estava o menino, o reconhecessem e depois voltassem com as indicativas do caminho para que, posteriormente, ele também pudesse ir e “adorá-lo” (Mt. 2:8). Mas a estrela parece ter “aberto os olhos” daqueles magos em todos os sentidos: quanto aos intentos malévolos de Herodes (o que na verdade foi-lhes revelado em sonho), para uma realidade maravilhosa que estava por vir, jamais antes experimentada pela humanidade, para o próprio Deus encarnado em uma criança recém-nascida. Naquele momento parece ter havido uma mudança de sentido, uma conversão de motivações e emoções. A curiosidade transformou-se em certeza, e o vazio foi preenchido por uma “profunda alegria”.

Natal é tempo de mutações. Não apenas as cidades ficam mais bonitas e coloridas, com suas agitações típicas e decorações peculiares, mas o comportamento das pessoas também parece mudar. Ainda que por pouco tempo, a fraternidade substitui o individualismo, a solidariedade toma o posto da indiferença, a superficialidade e fugacidade que marcam a vida nos grandes centros dão lugar à generosidade, à compreensão e ao amor. “Reconciliação” seria a palavra exata para expressar tudo o que estou dizendo. Não seria este o “espírito do natal” de que tanto se fala? Ora, não me refiro aqui ao “espírito” consumista que contagia as pessoas nesta época, nem tampouco aos presentes, árvore de natal ou Papai Noel. É inegável que tudo isso influencia e muito. Mas ao que verdadeiramente faz do natal um tempo diferente: Jesus.

Ah, e se todos os dias fossem como o natal? Se Jesus deixasse de ser apenas um símbolo guardado na memória, de quem nos lembramos por conveniência, como quem tira um coelho da cartola, apenas em datas comemorativas do calendário “cristão”, passando a ser o referencial de vida das pessoas que o apontam como o “verdadeiro sentido do natal”, todos os dias do ano? Então poderíamos finalmente viver o natal como é para ser vivido, como um interminável tempo de Graça, como uma estrela sempre presente no céu a brilhar, nos lembrando de que o Emanuel permanece conosco, enchendo-nos de paz e alegria, transformando-nos para que transformemos este mundo, e produzamos frutos “dignos de arrependimento”, trazendo de volta à vida aqueles a quem Ele quer bem.

Jonathan

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O Milagre do Natal

A aparição daquela estrela os encheu de profunda alegria” (Mateus 2.10).

Fico tentando imaginar a sensação daqueles três reis magos, que vieram do Oriente, ao contemplarem a estrela que apontava para Belém, onde algo muito importante tinha acontecido, algo que mudou a história de todos nós. Tente pensar comigo como seria a manchete no jornal da época (se isto existisse): “Extra, Extra. Nasceu o Rei e Salvador dos judeus – na manjedoura localizada numa pobre estrebaria”.

Este é o tipo de notícia que, naquele tempo, seria motivo para umas boas gargalhadas. E sabe por quê? Porque todo rei que se preza, nasce em “berço de ouro”, no palácio real, em meio a muito conforto e mordomia. É assim que todo mundo pensa. Esse era o tipo de salvador que todo mundo esperava. Então, como pôde um menino, que seria chamado “rei”, nascer num lugar sujo, pobre, provavelmente fedido e cheio de animais ao redor? Como pôde ser filho de uma simples camponesa e de um carpinteiro?

Eis a resposta que nem todos entendem: o rei Jesus é um rei diferente. É um rei que veio para fundar um reinado em que não importam os bens e valores materiais que se possa conquistar. Um reinado que não tem um palácio, nem está em um lugar ou um tempo determinados. Mas, sim, é um reino que se constrói com outros tipos de valores, como paz, alegria, justiça, igualdade, liberdade, compaixão e, sobre todos esses, o amor. O amor a Deus e às pessoas desse mundo. São valores do reino de Deus, que é o reino que Jesus veio inaugurar.

Esse reino é feito de pessoas falhas e pecadoras como eu e como você! Tudo isso, por todos nós, meninos e meninas, homens e mulheres, seres a quem Deus ama muito. E é por causa desse grande e eterno amor, que Deus nos chama para viver no seu Reino. Essa é alegria e o grande milagre do natal: de podermos fazer festa, porque Jesus veio para convidar a gente pra fazer parte do seu reino! Que grande notícia, é a boa notícia. Então, façamos festa e espalhemos aos outros essa notícia: “nasceu o nosso Salvador e Rei!”

Jonathan

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

As conexões entre sexualidade e espiritualidade

A intenção de Rob Bell ao explorar nesse livro Sex God as conexões entre sexualidade e espiritualidade me parece salutar e relevante.

Primeiro, porque as histórias da Bíblia convergem para a “conexão”, de um Deus que a todo o momento deseja relacionar-se com seu povo e sua criação, mas cuja intenção nem sempre é genuinamente correspondida. Isso, devido aos muitos obstáculos criados pelo ser humano, que o conduziram ora a um relacionamento superficial com Deus, de troca, barganha, legalismo e expectativas, ora a uma rejeição prática, à medida que se assentiu ao convite tentador da serpente para ser “como Deus”, declarando, assim, sua (nossa) independência.

Segundo, porque as pessoas de nosso tempo estão cada vez mais “antenadas” a tudo que acontece ao seu redor, e cada vez menos capazes de contrair experiências duradouras e profundas, vivendo, portanto, uma história sem raízes, relacionamentos descartáveis, vidas que não se conectam a outras vidas.

A posição de Bell, todavia, é suficientemente clara: você pode, de diferentes maneiras (e o sexo é uma delas), “estar” com um número variado de pessoas e não permanecer conectado a nenhuma; de igual modo, pode-se ter uma gama apreciável de performances rituais e “espirituais” para Deus ou até gabaritar na prova de conhecimentos bíblicos, sabendo a Bíblia “de cabo à rabo”, e não saber absolutamente nada sobre Deus, visto que Deus é amor, e está muito mais interessado na intensidade de nosso amor que na quantidade de nosso conhecimento, sendo o verdadeiro saber – dádiva Divina – qualidade inerente daquele que ama, conforme Deus ama (ágape).

E o amor pressupõe conexão e profundidade. E o sexo com amor é o prazer que conecta, liberta e completa os amantes para serem um do outro e um para o outro. Não foi assim que Deus designou no princípio? Da costela do homem, Deus havia criado a mulher. Eles não apenas tinham a mesma natureza (húmus – pó – humano), mas haviam sido criados para viver em permanente conexão entre si, e com seu Criador. “Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne” (Gn 2.24).

O sexo é uma dessas bonitas e benditas expressões da criação. Duas pessoas diferentes e especiais se unem; seus corpos se tocam, se interpenetram; de duas carnes, uma só se faz. E a conexão não está apenas nos corpos que se juntam, mas nas almas que se encontram. Assim, pode-se dizer como a mulher no Cântico dos Cânticos: “Eu sou do meu amado, e o meu amado é meu”. E assim se completa o desejo do Senhor: a pela realização do ser humano, como mais fina expressão de seu amor e presença nele e com ele. Logo, esse amor não pode ser algo abstrato ou virtual, como um beijo que se manda pelo Messenger ou um “scrap” pela página do Orkut. Mas é a presença de Deus reverberando em nós, através de relacionamentos vivos e reais entre pessoas de carne e osso; é o Deus-concoso-aqui-já-sempre.

O pecado, portanto, não habita no sexo, nem em nada que lhe diga respeito. Ele habita, sim, no ser. Enquanto o ser estiver corrompido, todas as suas relações também estarão. O amor, por sua vez, é o “vínculo da perfeição”, como diria João. Onde houver amor, haverá o sólido convite e possibilidade para que vivamos a plenitude de Deus com alegria, gozo e liberdade. “Ame e faze o que quiseres” (Santo Agostinho). Sem amor nada somos e tudo o que fazemos torna-se nonsense, parte de uma precária provisoriedade.

Jonathan

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Sexualidade: repensando nossa definição - por Rob Bell

Se tomarmos seriamente a compreensão de nosso estado natural, devemos repensar o que sexualidade é. Para muitos, sexualidade é simplesmente o que acontece entre duas pessoas envolvidas num prazer sexual. Mas isso é apenas uma pequena porcentagem do que sexualidade é. Nossa sexualidade tem a ver com o todo dos caminhos pelos quais nos esforçamos para nos reconectar com o nosso mundo, uns com os outros, e com Deus.

Um amigo meu tem dedicado sua vida para estar ao lado daqueles que têm sido esquecidos e oprimidos. Ele está no começo dos trinta anos, é solteiro, e ele fala abertamente sobre seu celibato. O que torna sua vida tão poderosa é que ele é uma pessoa muito sexual, porém ele tem focalizado sua sexualidade, suas “energias para conexão”, num grupo específico de pessoas.

Algumas das pessoas mais sexuais que conheço são celibatárias.

Elas dormem sozinhas.

Eles têm escolhido se doar para várias pessoas, para servir e a dar e assim conectam suas vidas a causas muito dignas. Esses amigos me ajudaram a entender por que a Red Light District[1] em Amsterdam é tão sexualmente reprimida. Se você algumas vez já andou por essa parte da cidade, onde a prostituição é legal, você sabe que pode ser um pouco controverso ter aquelas mulheres na vitrine gesticulando para você, te convidando para entrar e fazer “sexo” com elas.
O que é mais espantoso é perceber o quão não-sexual toda aquela parte da cidade é. Tem um monte de gente “fazendo sexo” dia e noite, mas não passa disso. Não há conexão. Essa é, na verdade, sua única forma de funcionamento. Eles concordam em pagar certa taxa para a performance de certos atos, ela faz performance pra eles, ele a paga e ambos partilham um desempenho. A única maneira de eles se encontrarem outra vez está na improvável possibilidade de ele retornar e eles repetirem a performance. Não há conexão, não obstante.

Então na Red Light District há uma série de interações físicas sem conexão. Há um monte de pessoas tendo um sexo físico – para alguns isso é trabalho – e aquele ainda não é um lugar realmente sexual.

Tem até um termo que alguns utilizam empinando a face – “sexo casual”. O raciocínio que se tem, freqüentemente é: “É apenas sexo”.

Exatamente. Quando o que rola é apenas sexo, então é tudo o que é. Deixa a pessoa profundamente desconectada.

Você pode ter sexo com muitos, e ainda estar sozinha. E quanto mais sexo você tiver, mais sozinha estará. Ao mesmo tempo é possível dormir sozinho e celibatário, e ser muito sexual. Conectado com muitos. Igualmente é possível estar casado com alguém compartilhando da mesma cama e até tendo sexo regularmente e permanecer profundamente desconectado.

Há um ditado que afirma: “Você é apenas tão doente quanto seus segredos”. Isso é verdade também para os relacionamentos. Se há segredos não partilhados, tópicos que não podem ser discutidos, coisas do passado proibidas de serem trazidas à tona, podem matar um casamento.
Então eles estarão dormindo juntos, mas eles estarão realmente dormindo sozinhos.

Rob Bell
(Trechos traduzidos do livro Sex God. Grand Rapids: Zondervan, 2007).

Notas
[1] Distrito da Luz Vermelha, lugar da prostituição legalizada em Amsterdam.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Natal: a confraternização dos fracos

Felizes são os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus” (Mt 5.3).

É difícil falar de fraqueza para um universo que supervaloriza a performance e a realização pessoal acima de todas as coisas, e que consagra uma velha casta, a qual sempre reaparece com novas facetas: os auto-suficientes. Sem questionar para onde e até onde vamos com este estilo de vida, aceitamos as regras e compulsões ditadas pela sociedade, que tende a eliminar de seu vocabulário palavras como vulnerabilidade, choro, dor, lamento e pobreza, e a destacar a supremacia dos mais fortes. Assim, nos tornamos seres que não abrem mão do controle de nossas vidas medíocres e alimentamos a simulação de uma fachada indelével.

Interessei-me de bom grado pela idéia de Henri Nouwen de “confraternização dos fracos”, pois ela preconiza uma possibilidade honesta e tremendamente humana, a saber, a participação fraterna nas dificuldades uns dos outros, complementando e ajudando uns aos outros, visto que todos possuímos fraquezas de diferentes espécies. Isso é com-paixão. Penso que esta idéia se aplica perfeitamente à celebração do natal, por duas razões. A primeira já foi delineada e aponta para a voz do mal na sociedade e na igreja, que nos condiciona a jamais demonstrarmos nossas fragilidades. A segunda diz respeito ao que o natal festeja: o nascimento na história do Deus que se fez gente, Jesus, e que encarnou a fragilidade, a dor, e a “desprezível” miséria da condição humana, desde a inglória manjedoura até a insuportável cruz, expondo sua total vulnerabilidade para que, através de sua morte, encontrássemos vida. Inconcebível loucura, Maravilhosa Graça!

Portanto, natal é a confraternização de homens e mulheres que não têm vergonha de celebrar a vida, admitindo todas as suas incoerências e limitações, reconhecendo sua pobreza, bebendo de seu próprio cálice, recebendo de Cristo o cálice da salvação e a revelação da face humana de um Deus que não se esconde atrás de um nome, de um título ou de um ofício, mas que se apresenta na completa vulnerabilidade de seu amor, para a redenção da criação, a qual perdeu a noção do que é o amor. Que neste natal, eu e você possamos despertar do sono e do cativeiro, num movimento de retorno a este Deus e a nossos irmãos e irmãs Nele.

Jonathan

domingo, 16 de novembro de 2008

Continuação do post anterior

É... mas não me parece que existe esse tipo de iniciativa de modo significativo, muito menos uma visão e comportamento alarmantes a respeito. Pelo contrário, ouvi de uma senhora a seguinte frase, que exemplifica bem certo comodismo que toma conta dessas congregações: “Nossas igrejas têm se mantido por gente mais velha sim. E não é de hoje. E quando essas morrerem, haverá outros velhos para dar continuidade, e assim a igreja vai sobrevivendo”. Outra expectativa que ouvi é a de que um dia esses jovens, que hoje estão distantes da igreja, irão voltar para ela, sem que haja um esforço em evangelizá-los. E (para completar o sonho perfeito) talvez sejam enterrados ali, como todo mundo nesse pequeno vilarejo de Freasland: no cemitério que fica no mesmo terreno que a igreja. Irônico, não?

Bem, não sou nenhum profeta do Apocalipse, nem estou aqui para julgar os holandeses. Muito menos, por outro lado, para dizer que igrejas cheias de jovens, cheias de gente, igrejas “avivadas”, desse ponto de vista mais genérico de avivamento (pra ser gentil), com louvorzão, palavras confortantes, uma série de programações diversificadas e atraentes, são igrejas mais vivas. Pelo contrário, uma das faces da “morte” do Evangelho em alguns contextos, como o brasileiro, está exatamente em algumas dessas igrejas evangélicas, que prestam mais desserviço que serviço ao reino.

A relação igreja-cemitério não é puramente estética ou numérica. Não tem a ver apenas com o provável esmorecimento de igrejas e a tendência tão grotesca quanto estranha de alguns em manter uma postura de platéia de seu próprio funeral. Mas também tem a ver com a ausência do sentido de igreja no sentido bíblico – povo de Deus, organismo vivo, agente do Reino, instrumento da Missão de Deus no mundo. Sem esse senso, perderemos não somente o fervor evangelístico, ou o desejo de que o Evangelho seja relevante a nossa geração, mas fundamentalmente a percepção de somos igreja para os outros, e não para nós mesmos.
O movimento umbilical (em torno de nossos próprios umbigos), que pode se expressar tanto num comodismo morno, quanto num fervor superficial, é anti-Evangelho e anti-Deus, por assim dizer. Eu, porém, luto todos os dias, até contra mim mesmo, para ter o anti-umbilical... Bem, às vezes eu consigo, e só pela graça.

Jonathan
(Foto: Outra perspectiva da igreja e do cemitério)

Semanal de Amsterdam (IX): Sobre cemitérios e igrejas

Duas semanas que não escrevo um semanal, e temo que esse seja o último, pois minha jornada em Amsterdam está no fim, em sua última semana. Andei viajando um bocado pela Europa e depois fiquei muito ocupado em compromissos com igrejas daqui. Eles financiaram (junto com a Universidade) minha vinda, estudos e estadia, e obviamente esperam algo em troca, que na verdade consistiu em intercâmbio de experiências em que ambos ouvimos uns aos outros acerca de nossos contextos, enfocando principalmente a igreja. No caso do Brasil, senti os holandeses com que tive contato muito interessados em saber sobre esse clima religioso exótico que temos em nosso país, e toda a multiplicidade de credos, sincretismos e troca cultural que ele comporta, mesmo na chamada “igreja evangélica” – nesse caso, o problema foi explicar a eles o que é ou quem é “evangélico” no Brasil. Acho que eles ficaram confusos, mas tudo bem, as relações eclesiásticas aqui na Holanda não são tão menos complicadas.

Quando entramos no assunto Igreja na Holanda, foi inevitável não comentar algo que ficou explícito, em ambas as congregações protestantes que visitei (em Apeldoorn e Freasland): a maciça ausência de gente jovem, sobretudo nas congregações da Igreja Protestante. Quem olhar algumas dessas igrejas cheias de modo panorâmico e focar apenas as cabeças, pode ter a sensação de estar numa plantação de algodão – com todo o respeito aos idosos, é só uma maneira bem-humorada de expressar a predominância dos irmãos e irmãs de cabelo branco nessas comunidades. Na roda de pessoas com as quais jantei na igreja, no sábado retrasado, por exemplo, afora eu, todos os outros tinham idade acima de 50 anos, num grupo de dez pessoas. E nos perguntávamos: para onde estão indo os jovens dessas igrejas? A resposta é óbvia, se considerarmos dois fatores mencionados em outros semanais, sobretudo no Semanal IV, que são o processo de secularização, que atinge, mormente, essa nova geração (15-30 anos), e a ineficácia das igrejas de perfil reformado, mais tradicional, em alcançá-los, em incluí-los.

E o mais interessante disso tudo é que as pessoas de igreja e líderes com quem conversei não me pareceram tão preocupados com tal realidade a ponto de iniciar por si mesmos, a partir de sua congregação, um processo inverso, que talvez comece pela flexibilização das estruturas, pelo desmantelamento dessa besteira eclesiástica (em parte necessária, em parte totalmente inútil) chamada hierarquia, e por uma renovação do estilo de ser igreja – sua teologia, sua linguagem, suas formas, programações. Mas tudo isso requer muito esforço, boa vontade e um senso grande de que isso é algo necessário à própria sobrevivência e posteridade dessas igrejas, sob pena de num prazo não muito longo restarem apenas prédios vazios, que então servirão talvez de museu ou patrimônio histórico.
Continua...
Jonathan
(Foto: A congregação e o cemitério em Freasland)

sábado, 8 de novembro de 2008

Que amor é esse?

Você já teve alguma vez aquela sensação de que o amor de Deus é "bom demais pra ser verdade"? Tipo, será que perdemos alguma coisa ou é isso mesmo? Deus realmente me ama incondicionalmente? Quero dizer, independente do que eu faça ou de como eu seja, ele continuará me amando? Você nunca fez uma pergunta ( não exatamente com essas palavras) do tipo: puxa, Deus, mas fala aí, qual é a minha parte nesse negócio do seu amor por mim? Fala, vai, eu sei que tenho que fazer alguma coisa, aliás, eu preciso fazer alguma coisa pra que eu não fique com essa sensação incômoda de que o seu amor é uma coisa utópica, irreal, boa demais pra ser verdade. Sabe como é, quando o presente é muito grande e de graça, a gente desconfia (mudando um pouco o ditado)...

Confessamente ou não, é assim que agimos muitas vezes. Dizemos crer na graça, mas será que cremos nela ao ponto de nos render completamente? Cantamos o amor de Deus e nos dizemos alcançados por esse amor, mas, na prática, como lidamos com um amor que não pede nada em troca para ser o que é? Bem, a essa hora, alguém certamente levantaria o dedo e diria: "Olha, não é bem assim, Deus requer muita coisa da gente sim". Creio também nisso, em parte. A parábola dos talentos, em Mateus 25, fala sobre o destino daqueles que preferem esconder o talento e não produzir, não ser frutífero. Mas a pergunta é: em que ser frutífero ou não pode mudar o amor de Deus por nós? Há algo que possamos fazer para intensificar ou para diminuir esse amor? Em tese, a resposta mais comum seria "não", mas, de fato, eu tenho visto que a resposta é "sim".

Por que? Simples, porque não lidamos bem com o fato de que com a graça de Deus e seu amor incondicional, saímos do controle. Daí, não adianta: sacrifícios, louvores, línguas, bençãos, orações, jejuns, caridade, etc. Nada disso nos conduz a Deus, porque, pela graça eu sei que já fui conduzido. Nada disso aumenta o amor dele por mim, porque o amor dele é eterno e imutável. Todas essas coisas "adiantarão", a partir do momento em que forem fruto de gratidão e da operosidade do amor e da graça de Deus em nós; isso é ser frutífero. Do contrário, é só religiosidade, nada mais. Deus não te quer e não me quer mais "religioso", ele quer o seu e o meu coração, o que significa nos querer por inteiro, assim, do jeito que somos, imperfeitos como somos, mas à caminho da perfeição que Ele desenhou para nós, e não essa "perfeição" pérfida que os mestres da religião têm exigido (e não de agora) das pessoas.

Assista a esse vídeo do Rob Bell, em que ele diz, acerca do amor de Deus: "Nada do que você possa fazer vai me fazer amar você menos do que amo". Será aceitável isso? Você crê nisso? E mais, você tem experimentado isso em sua vida e relacionamento com Deus? Ou, estaremos sempre nessa roda viciosa da lei, de ter que "fazer algo" ou deixar de fazer um monte de coisas, coxeando nas esquinas da vida por migalhas do amor de Deus? Pense nisso, e depois me fale o que você pensou se quiser...

Ótimo fim de semana!

Jonathan

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O dia de uma Flor

Hoje é o dia de uma flor… A mais linda que conheço.
Flor que desabrochou ha oito anos atras em minha vida
e desde entao tem feito dos meus dias, dias mais alegres.
Para mim ela é uma flor rara, a qual nao se encontra sempre, em qualquer lugar.
Ela tem uma beleza so dela, uma ternura inconfundivel
e um perfume suave, que todos os dias desejo cheirar;
é o meu aroma de todas as manhãs e de todas as noites...

Sinto saudades do seu cheiro e do seu gosto, minha flor...
Sinto saudades de te olhar todos os dias e lembrar que você é minha.
Sensação indescritivel, que nem a distancia momentânea me fez esquecer...
Sinto saudades do carinho que você me da, simplesmente sendo você, essa flor tão linda por dentro e por fora, e do amor livre e descomplicado com que você tem me amado...

Perdoa-me, minha flor, pelos dias em que não cuidei bem de você,
em que te fiz triste, em que não te reguei com o amor que você merece... às vezes é tão dificil ser algo mais do que apenas esse ser cheio de defeitos que sou...
Mas o tempo e a distância têm me curado de muitas coisas, e so aumentado meu amor por você.
Te amo nas pequenas coisas... quando rimos, quando choramos, quando nos amamos,
e até mesmo quando você esta brava (fica ainda mais linda).
Amo-te ate mesmo em seus momentos de silêncio,
e jamais deixei de te amar, mesmo quando meu desejo foi ficar so,
ficar longe por um tempo...
Te amo porque você e minha cumplice e porque ambos respeitamos nossa individualidade...
Te admiro muito por ter me deixado partir por um tempo,
por me ter dado liberdade, e por ser tão forte, mesmo na fraqueza...

Cibele, você é minha flor, minha mulher, minha amante, minha pequena,
dadiva de Deus que aprendo a valorizar a cada dia mais...
Feliz Aniversario... Que Deus te conceda muitos anos mais de vida,
e me faça o homem mais feliz do mundo permitindo que eu viva a seu lado neles.
Te amo do tamanho do infinito...

Sinceramente seu,

Jonathan
Paris, 5 de Novembro de 2008
(Ps. Desculpe os erros ortograficos, esse teclado francês e estranho).


domingo, 26 de outubro de 2008

Semanal de Amsterdam (VIII): Deus é bom em todo o tempo!

Esse semanal será o mais curto de todos. Só escrevo para dizer que essa simples confissão de fé me arrebatou mais uma vez essa última semana. E tudo simplesmente porque parei para pensar como Deus tem sido bom comigo nesse último ano. Quantas portas ele tem aberto sem que eu mesmo peça e nem imagine, ou mesmo quantos presentes Ele me deu sem que eu mesmo pedisse. A frase de Simone Weil me “caiu como luva”: Não recebemos os grandes presentes da vida correndo atrás deles, mas esperando por eles.

Estar nessa cidade, vivenciando tudo o que tenho vivenciado, e relatado aos poucos aqui, certamente é um desses grandes e inesperados presentes. Uma das marcas que certamente ficarão em minha vida é poder me relacionar com pessoas de praticamente todo o mundo representadas num grupo de apenas 13, que é a turma do Bridging Gaps. É prazeroso ver que tem gente boa de Deus em todo lugar, além de experienciar a diversidade de um modo tão rico, seja por meio dos mal-entendidos (que acontecem direto, é muito comum a pessoa falar A e você ouvir ou entender B, e vice-versa) como também do comum entendimento de que somos iguais em Cristo: não há judeu, nem grego, nem homem, nem mulher, negro ou branco, escravo ou livre, e assim por diante (Gl 3.28).

Ao mesmo tempo, fiquei pensando em como minha constatação de que Deus é tão bom muitas vezes está condicionada pelas circunstâncias de vida. Tipo: Deus me presenteou com um carro, e isso significa que Ele é muito bom. Mas, e para aquele a quem Ele não presenteou, será que a afirmativa é a mesma? Quando tenho um emprego maravilhoso, onde faço e que gosto e ainda recebo muito bem, digo: “puxa como Deus é bom!”. Mas, e se eu estiver desempregado e passando por dificuldades, terá Deus ocultado sua bondade? Nossa percepção da bondade de Deus é dualista e focalizada em nós mesmos. Ano passado, quando vivenciei experiências de sofrimento e angustia, será que meu coração tinha a mesma disposição para dizer: Deus é bom em todo o tempo?

Estou repetindo o óbvio, porque o óbvio é, paradoxalmente, o mais difícil de ser vivido. É óbvio que Deus me ama, e é óbvio que Ele é bom em todo tempo, mas será igualmente fácil repetir de modo prático essas sentenças no troca-troca de situações de vida, em especial, da vida cristã? Poderemos dizer como Paulo: Pois eu estou bem certo, de que nem morte, nem vida, nem anjos, nem principados, nem coisas do presente, nem do porvir, nem poderes, nem altura, nem profundidade, nem qualquer outra criatura, serão capazes de nos separar do amor de Deus em Cristo Jesus nosso Senhor? (Rm 8.38-39). Que o Senhor nos ajude para que nossas confissões acerca de seu amor e bondade sejam cada vez mais desafetadas pelo tempo, as circunstâncias e as marcas deixadas por algumas delas.
Ps. Não sei quando será o próximo semanal. Estou indo pra Londres, Roma, Paris. Depois volto a Amsterdam. Se conseguir escrever algo de lá, postarei aqui. Senão, até a volta amigos!

Jonathan
Foto: Trem em movimento

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Adestramento evangélico

Você tem certeza de sua salvação? Bem, se você é evangélico e não tem, então é melhor começar a ter, pois na igreja evangélica brasileira, em geral, quem não tem esse tipo de “certeza” está fadado a ter sérios problemas. O primeiro problema é ser aceito como membro de uma igreja. Em muitas delas, para estar apto a se tornar membro, a pessoa tem de se sujeitar a uma bateria de “exames” de admissão, sendo que em algumas, isso começa com o que agora chamam de “Encontro com Deus”, que consiste em alguns dias de refúgio para ter um encontro mais do que especial com o Divino – e, é claro, para isso é preciso se apartar da convivência com os outros! – o que em muitos casos implica em conversão, outros em re-conversão (ou re-batismo). Isso mesmo, independente dos anteriores encontros que supostamente a pessoa tenha tido com Deus, para se tornar membro da Igreja X ela precisa passar pelo crivo da “verdadeira conversão” a Jesus, na visão daquela comunidade. Mas é claro que ninguém colocaria isso assim dessa forma. Há outras formas mais politicamente corretas de se colocar, tipo (o mais comum): “É um processo que a pessoa passa para se integrar à visão da nossa igreja”.

Depois do encontro, a pessoa passa por uma classe pré-batismal – casais que vivem juntos, mas não casados legalmente nem chegam a esse estágio, pois são considerados inaptos logo de cara – quando ela será introduzida à “doutrina” a qual passará a professar e, obviamente, será submetida à outra bateria de provas até que chegue ao batismo. Em meio a toda essa “burocracia espiritual” (alguns diriam “lavagem cerebral”), o novo crente – ou “novo” pelo menos para a Igreja X – certamente se deparará com a tão crucial pergunta: “Você tem certeza de sua salvação?”. E, evidentemente, a resposta de todo mundo é sempre “sim”. Mas minha duvida capital aqui é: e se a resposta fosse “não”, ou “não estou muito certo ainda”? Tal pessoa, assim, não estaria apta a se juntar a Igreja X? E se não, por que não? Quero dizer, que diferença faz na economia da salvação (pela graça) se sempre tenho certeza ou não? E, afinal de contas, o que significa “ter certeza”?

Bem, alguém a essa altura pode estar se perguntando: será que esse cara não sabe que a fé é “a certeza das coisas que não se vê”? Sim, eu responderia. Mas que certeza é essa, cara-pálida? Seria assim uma certeza que não admite incertezas ou dúvidas, do tipo: “tudo bem, creio na salvação, mas ajuda-me na minha falta de fé”? Tipo, às vezes penso que certas perguntas não passam de retórica barata, pois elas têm um único endereço, caixa postal, fora da qual nada é admissível e tudo está errado. Mas, ora essa, se às vezes lamento, se tenho dúvidas, se nem sempre estou tão certo, ou quem sabe convicto, mas abalado, e de alguma forma tento expressar isso, é porque (1) sou humano e (2) porque sou honesto para admitir tudo isso.

Isso significa que não tenho fé? Não. Significa que a minha fé está se fortalecendo por meio das crises. Implica que não sou um “verdadeiro salvo”? Não – afinal, qual de nós seria capaz de separar salvos de não salvos? Esse negócio de verdadeiro salvo, puro evangélico ou 100% cristão é idiotice! Esqueça isso, e se afaste desse tipo de demência espiritualista, para o bem da sua alma. Implica, eu creio, que, embora já tenha sido salvo, continuo sendo salvo de meus muitos desvios e descaminhos, e reconduzido, tal qual o pródigo, à casa do Pai pela graça de Cristo, que nunca me é sonegada, mesmo quando minha resposta for: “não tenho muita certeza”, mas sinceramente quero ter. Pois, se alguém já está plenamente certo e seguro de tudo, para que precisa de graça? O caminho para a honestidade com Deus – contra toda forma e “adestramento” – é reconhecer que não somos, estamos sendo, que não nos tornamos, mas estamos nos tornando, dia após dia, em meio a avanços e reveses, na fornalha da transformação de Deus, que não está interessado na resposta pronta de lábios adestrados, e sim em tudo o que somos com tudo que isso implica.

Jonathan
(No trem, de Groningen à caminho de Amsterdam)

domingo, 19 de outubro de 2008

Semanal de Amsterdam (VII): Sementes de esperança

Os leitores desse blog certamente sabem de minha grande apreciação pela vida e obra de Henri Nouwen. Senão, basta reler alguns posts antigos para perceber o quão fundamental em minha caminhada foi e tem sido os escritos e o exemplo desse padre holandês. Pois bem, por estar morando em sua pátria de origem, não poderia deixar de procurar vestígios aqui sobre ele. Encontrei seu irmão, Laurent Nouwen, que foi muito simpático e me convidou para uma palestra que aconteceu em Utrecht, cidade próxima a Amsterdam, no dia de ontem, como continuidade a um série de palestras que a Henri Nouwen Society aqui na Holanda tem promovido. O tema, obviamente, foi espiritualidade, e a convidada da vez, para minha surpresa, foi uma brasileira, a teóloga Ivone Gebara, que trabalha com os pobres dos pobres em Recife há muitos anos. Apesar de suas dificuldades com o inglês, Ivone foi muito feliz em sua palestra, e bastante insistente em dizer repetidas vezes que espiritualidade não é somente isso ou aquilo; é isso, aquilo e muito mais (ela usou muito a expressão “more than that”).

Duas palavras a respeito: a) Às vezes pensamos que certas concepções são privilégio de um grupo e, se observarmos bem, logo perceberemos que isso não é verdade. Há muitas pessoas que pensam e agem de formas muito parecidas, mas utilizando linguagens diferentes. Assim é com a questão da “espiritualidade integral”, conceito diluído em exemplos ricos de vida expressos na fala de Ivone; b) nesse sentido, a espiritualidade não se resume a um cantinho separado da vida o qual dedicamos a Deus, mas é a própria vida vivida integralmente na perspectiva de Deus. Logo, espiritual não é somente algo relacionado à disciplinas espirituais (como oração, jejum, etc.), pode ser também uma conversa sincera, uma corrida no parque, um dia duro de trabalho, e assim por diante. Deus não nos ama e nem nos enxerga em compartimentos, tampouco nos criou para isso. É sinal de esperança ver que pessoas como Ivone partilham desse mesmo sentimento e têm espalhado a vida de Deus por aí, espontâneamente.

Hoje visitamos alguns trabalhos de diaconia na cidade de Amsterdam, a maioria deles relacionados com acolhimento, hospitalidade e reintegração de pessoas marginalizadas (desabrigados, imigrantes ilegais, drogaditos). Trabalhos como o do Exército da Salvação (Salvation Army). Visitamos uma das casas para os “Homeless”, que é como chamam em inglês as pessoas desabrigadas. Me impressionou ver na fala de uma jovem que trabalha no local tanta maturidade e sensibilidade ao dizer que “essas pessoas são pessoas como nós”, logo o ato de compaixão é mais que um “dever cristão”, é o ato de me enxergar no outro e perceber que nada do que é humano me pode ser estranho. Mesmo numa sociedade opulenta (endinheirada, materialmente abastada) como a sociedade holandesa, existem os sem-tetos, os sem-visto, os marginalizados, que o governo faz um grande esforço pra manter longe dos olhos turísticos, mas que estão por aí. Me tocou também ouvir de um pastor da igreja Victory Outreach Amsterdam, dedicada a alcoólicos e drogaditos em processo de reabilitação, que “aqui tratamos as pessoas como pessoas”. Sentença simples, mas muito significativa numa sociedade que tende a identificar o “outro” por sua condição ou posição na socidade – o negro, o latino, a mulher muçulmana, o asiático, o imigrante, etc, em detrimento do “puro” holandês.

Por fim, me impressiounou a honesta confissão de Erika, da equipe da “The world one house” - um lugar de encontro e ajuda de pessoas sem documento válido para permanência legal na Holanda. Ela disse que as pessoas na sociedade holandesa são materialmente equipadas para não precisar de mais nada além de si mesmas. Logo, figuram entre os homeless, os “Godless” (os sem-Deus), que cresceram num lar religioso certamente, mas que não vêm nenhuma conexão entre a vida que levam e a necessidade de servir ou de viver pra Deus, ou de seguir a religião de seus pais. A rejeição dos jovens de Amsterdam em relação a Deus é pior que a de Londrina, minha hometown, por ser considerada a cidade mais secular da Europa, mas diria que não estamos muito longe de tal realidade. Fico me perguntando o que podem ser sementes de esperança em contextos como esse? O que fazer para que as novas gerações possam se aproximar do evangelho? Como reconstruir as pontes de contato, perdidas no processo maciço de secularização e na lacuna existente entre gerações? Perguntas que a Igreja na Holanda precisa tentar responder de forma prática e rápida. E creio que as mesmas questões, em diferentes proporções, também sejam válidas para a Igreja em Londrina e nas grandes cidades do Brasil.
Jonathan

Foto: Com Laurent Nouwen e Ivone Gebara em Utrecht

sábado, 18 de outubro de 2008

Honesto com Deus

Rob Bell é um pastor norte-americano, líder da Mars Hill Church. Um controverso e ao mesmo tempo muito bem aceito comunicador da Palavra nos dias de hoje entre os norte-americanos, por sua versatilidade metafórica e criatividade com a qual fala sobre Deus e sobre o ser humano. Também porque a maioria de suas mensagens têm uma veia existencialista, e que procura atingir não apenas o intelecto, mas também o coração das pessoas. Foi uma grata descoberta pra mim nos últimos tempos, em meio a tanta baboseira que leio e escuto quando o assunto é fé, especialmente entre os evangélicos.

Nessa mensagem ele toca num dos temas para mim muito caros que é o da honestidade. Fala sobre ser honesto com Deus e sobre a oração como a própria vida. Honestidade, nesse sentido, é a irmã-gêmea da lucidez e de uma vida com Deus e com as pessoas mais saudável e livre. Gostei demais de uma das partes do vídeo, quando ele fala que Deus pode lidar com nossas confissões mais honestas, por isso não precisamos temer falar qualquer coisa pra Ele com medo de que "Ele possa não aguentar".

Já escrevi demais, como sempre. Assistam, vale a pena.

Até mais!

Jonathan

domingo, 12 de outubro de 2008

Semanal de Amsterdam (VI): Os leitores ordinários

1.
Começo dizendo que esse título ("leitores ordinários") não é uma ofensa aos leitores desse blog. É a melhor tradução que encontrei para a expressão em inglês “ordinary readers”, que designa os leitores comuns, simples, da Bíblia. Depois de seis semanas, meu repertório sobre Amsterdam está acabando. Talvez precise sair e ver mais coisas, o que certamente acontecerá. De qualquer forma, a cada semana é um prazer sentar aqui e “conversar” um pouquinho com vocês sobre o que tem se passado comigo aqui. E esse foi um dos conceitos, como diz meu irmão de caminhada Marco Antônio, que “bateu e ficou”. Já retorno a ele e quero explicar por que. Antes, quero falar um pouco do sentimento e da “posição” de teólogo.
2.
Uma das conseqüências primárias de se tornar parte do mundo da teologia é começar a fazer distinções, que na maioria das vezes têm a ver com capacidades ou habilidades (ou a ausência de ambas) para realizar essa ou aquela tarefa. Refiro-me ao campo eclesiástico, e a diferenciação entre sacerdotes e leigos e as muitas capilaridades que envolvem esses dois grupos. Entre eles (e muitas vezes “acima”) está o teólogo ou a teologia. O teólogo, dentro dessa categorização, é aquele douto no ramo da teologia, que nem sempre é um sacerdote, mas dificilmente gostaria de ser lotado entre os simples leigos. Isso me faz lembrar a clássica pirâmide social medieval: no topo estão os oratores (clero), em seguida vêm os belatores (nobreza), e por fim aparecem os laboratores (os servos). Somos, assim, herdeiros dessa estrutura piramidal que valoriza e exalta a hierarquia. Quem não respeita a hierarquia num país como o Brasil, por exemplo, pode estar fadado a ouvir a famosa expressão: “Você sabe com quem está falando?”, que quer deixar bem claro os “lugares” ocupados por cada um.
3.
É claro que o mundo tem avançado em direção à subversão desse modelo, inclusive o mundo eclesiástico. Mas avanço ou retrocesso são palavras relativas ao contexto. Nos anos 70 a teologia da libertação, inspirada pela reforma no Vaticano II, veio com uma proposta “diferente” através de sua teologia e das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que procurava abolir esse abismo entre sacerdotes, teólogos e leigos. Logo, numa CEB todos são leigos e todos são sacerdotes (no sentido bíblico), ao mesmo tempo em que todos são teólogos. Certamente essa foi uma expressão prática e um avanço rumo a uma maior igualdade. Mas a pergunta que não quer calar é: como nós, teólogos, lidamos de fato com as “exegeses” espontâneas dos “ordinary readers”? Em outras palavras, como um exegeta, que pretende revelar através de técnicas acadêmicas os sentidos de um texto, pode lidar com interpretações de leitores para os quais a Bíblia não é um objeto de estudo profundo, mas apenas o “kerigma”, a revelação e proclamação da Palavra Divina?
4.
Uma das posturas acadêmicas contemporâneas (a literária) tem postulado que os sentidos não são dados, mas são construídos. Logo, pode haver tantos sentidos quanto são os leitores. Aqueles teólogos que se vêm como “árbitros do significado” rebaterão contra essa postura e contra a multiplicidade dos significados que brota das muitas leituras da Bíblia, a maioria delas procedida por leitores comuns, que constroem suas interpretações espontaneamente. Mas quem foi que outorgou a nós teólogos o direito de arbitrar sobre verdadeiros ou falsos significados? Quem nos colocou no posto de paladinos da verdade absoluta? Essa experiência de “leitura intercultural” aqui em Amsterdam tem reforçado minha visão de que não há interpretação inválida, há apenas interpretações diferentes e que precisam ser respeitadas em sua singularidade, quer concordemos com elas ou não. E isso reforça ainda a percepção de que todos precisamos ser teólogos, à medida que aceitamos seriamente esse duplo desafio de viver e pensar a nossa experiência de fé à luz da revelação de Deus, que se expressa não apenas no verbo, mas em sua contínua encarnação. Isso deve nos desafiar ainda a repensar a maneira como muitas vezes discernimos nosso lugar no Reino de Deus e aceitamos nosso chamado.
5.
O texto de 1Coríntios 1.26-31 nos convida a olhar e repensar isso. Ei-lo na tradução “The Message” (Eugene Peterson): “Take a good look, friends, at who you were when you got called into this life. I don't see many of "the brightest and the best" among you, not many influential, not many from high-society families. Isn't it obvious that God deliberately chose men and women that the culture overlooks and exploits and abuses, chose these "nobodies" to expose the hollow pretensions of the "somebodies"? That makes it quite clear that none of you can get by with blowing your own horn before God. Everything that we have—right thinking and right living, a clean slate and a fresh start—comes from God by way of Jesus Christ. That's why we have the saying, "If you're going to blow a horn, blow a trumpet for God”.
No amor e temor de Cristo.

Jonathan

Foto: "Púlpito" (Igreja San Nicolás, Amsterdam)

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

João 4: Interpretações espontâneas (II)

Essa foi a forma como meu grupo contou a história de João 4: através de um poema que escrevi. Não tenho muita vocação para poemas, muito menos em inglês, e nem sei se isso pode ser visto como um poema - os poetas que me perdoem. Entretanto, até que a turma gostou... Compartilho com vocês abaixo!
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1.
A traveler came on tired and thirsty from his long journey. In his hands there was a mission to complete, and he decided to go through that foreign land. Although all the barriers existents between his people and the others whom he was going among. There was a big and revolutionary message to spread, which was much more strong
2.
So the thirsty man went to the fountain, desiring to find some water. A woman also appears, and what more can be expected of this encounter? He, the strange, starts a conversation showing his vulnerability. And what an awkward request, she realizes: what made him thinks that this would be my responsibility?
3.
Oh, there was much more than thirsty behind that first demand. He asked for the natural first, to offer the supernatural then. The matter was not just supply a necessity, not even it’s quarter. That request was more to say that in the very deep heart of the life matters, exists a everlasting and living water
4.
She was a bit confused, and he asked to her: call your husband! And then came on a striking revelation: there were five husbands before, and she was living with another man in an other situation. Something started to seem quite special in that strange person in front of her. He was more than a simple man; who knows if he was not a prophet then?
5.
A prophet, here? I have to make this worthwhile now, she reflected. What does can be more unexpected? A religious theme was picked up, and then a question was born. Which is the right way to worship: in our traditional mountain or in the temple of the Lord?
Another revelation arose: in worship there is no right place or wrong! No matter, who you are, or the people that you are belong. God is Spirit, Truth, Life! In Him we can be one and be together, and that’s all that really matters.
6.
Living water, worshiping in Spirit and Truth. All that conversation remained the Messiah, the God’s Chooser One who was supposed to come. If this was really truth, if is really him The One, she thought, now I know that we are not more alone. What might to say? What more to be expected? The city crowd now knows, through the myriads of her expressed feelings and doubts, what the Jesus’ Gospel wanted to show.
7.
The God’s Words never comes back empty and are never lost! There are no boundaries, no even one, which the Gospel cannot cross!

Jonathan

João 4: Interpretações espontâneas (I)



Vídeo produzido por um dos grupos de estudantes em nossa apresentação final da classe "Intercultural Bible Reading and hermeneutics", ministrada pelo prof Hans de Wit, na Vrije Universiteit Amsterdam. Gostei demais!!!

Jonathan

domingo, 5 de outubro de 2008

Semanal de Amsterdam (V): relances e espaços de liberdade

Now the Lord is the Spirit, and where the Spirit of the Lord is, there is freedom” (2 Corinthians 3.17).

Não é estranho a ninguém que relativamente acompanhe aquilo que escrevo ver mais uma reflexão sobre a liberdade e suas múltiplas facetas. Todavia, quero que vocês estejam certos (as) de que nessa semana não fui eu quem foi atrás desse tema, mas ele é que outra vez “caiu no meu colo”. E tudo aconteceu na última sexta-feira (03), na aula “Text and Context” ministrada pelo Prof. Hans de Wit. Foi um dia especial, pois recebemos um grupo de professores e estudantes de teologia de Cuba, na intenção de que eles compartilhassem um pouco de seu contexto e o que significa fazer teologia lá, ao mesmo tempo em que pudéssemos responsivamente aos relatos levantar um debate, com perguntas e também comentários referentes ao contexto dos alunos do “Bridging Gaps”.
De cara posso dizer que foi a melhor classe “ever”, desde que cheguei aqui em Amsterdam. Em primeiro lugar, pelo clima de fraternidade e empatia que se estabeleceu entre nós e “nuestros hermanos” de Cuba, desde os primeiros minutos, quando um dos professores começou seu tocante relato sobre a situação política e social de Cuba, desde a transição de poderes entre os irmãos Fidel e Raul Castro, até as formas de pensar teologia decorrente ou em diálogo com seu contexto. Havia grande expectativa por parte da população quanto às possíveis mudanças que essa transição poderia acarretar. Porém, muitas das mudanças até aqui não passaram de simulacro. Raul assumiu o poder, mas Fidel ainda exerce grande influência nas tomadas de decisão políticas e tem encontrado formas sutis de exercer seu “poder simbólico”, como expondo suas opiniões em jornais e periódicos semanalmente ou até diariamente. Fidel é mais que um líder em Cuba; ele já se tornou um ícone popular, figura incrustada no imaginário da cultura daquele país, e ali figurará ainda por muito tempo...
Em segundo lugar, pelo aparecimento do tema da liberdade nas muitas falas e diálogos. Liberdade é sempre um conceito relativo e muito complicado no contexto de Cuba, por exemplo. A teologia da libertação assumiu esse tema nos anos 60 para declarar seu engajamento com as lutas sociais na América Latina, em especial com a causa dos pobres, associando isso à liberdade do Evangelho. Porém, em Cuba esse discurso seria encarado como algo “fora do lugar”. Teoricamente, desde a revolução cubana dos anos 50, não há mais pobreza – no sentido de grandes desigualdades sociais – e a libertação já foi instaurada. Mas é claro, não ser pobre em Cuba significa ter as condições mínimas de sobrevivência – alimentação, trabalho e um salário, que no Brasil seria visto como “salário de fome”. Assim, o que é afinal a liberdade para essa gente cubana? Um irmão disse: “Em Jesus Cristo me sinto livre. Por outro lado, em Cuba os líderes dizem: ‘você pode pensar e fazer o que quiser, desde que seus pensamentos e atos não atrapalhem nem contradigam a ordem estabelecida”. E citou a famosa frase dita por Fidel: “Dentro da revolução tudo; fora da revolução nada”.
Entretanto, o conceito de liberdade não é somente relativo em Cuba, mas em qualquer contexto. Já comentei um pouco em outros semanais sobre a tão celebrada liberdade da qual gozam os holandeses. E esse foi um tema também levantado no debate de sexta: como pode um povo que se julga tão livre, como o povo holandês, ser tão cheio de regras, como a de instalar câmeras de “segurança” por todos os lados (ruas, trens, bondes, ônibus, supermercados, etc.)? O “Grande Irmão” de George Orwell (1984) está por todos os lados aqui em Amsterdam, com seus enormes olhos, instaurando uma “liberdade vigiada”, por assim dizer. Zygmunt Bauman diria que não é possível se ter as duas, liberdade e segurança, ao mesmo tempo, sem que uma não acarretasse algum prejuízo a outra. Não existe nenhuma liberdade humana sem problemas, sem roturas, sem limitações. E é por isso que esse encontro foi tão marcante para mim. Primeiro, porque mais uma vez denunciou as fissuras da liberdade humana e a relatividade desse conceito; segundo, pois também oportunizou um espaço livre, onde tantas nacionalidades diferentes se reuniram a uma e na presença do Espírito para debater seus contextos e experiências à luz da fé, e também compartilhar de “sonhos de liberdade”, tão possíveis no Senhor.
Uma cubana disse: “Gostaria que as mudanças viessem de nós mesmos, e não de fora”. Outro disse: “Eu sonho que a igreja venha levantar sua voz intrepidamente contra essas características do sistema que são anti-Deus”. E por fim, outro irmão rogou: “Que a igreja possa criar espaços de liberdade como esse, onde se possa criticar e propor soluções abertamente sem medo de repressão”. Sonhos... Sonhos que fazem sentido tanto às mulheres de Mianmar, a quem são vetados muitos direitos humanos básicos em seu país, como ao povo de Cuba e a tantos outros. Como diria Jürgen Moltmann, a liberdade é paixão criadora pelo possível. E que continuemos criando e recriando possibilidades, na paixão pelo Evangelho e pelo poder do Espírito.
Um beijo e até a próxima.
Jonathan
Foto: (Bridging Gaps e os visitantes de Cuba, na Free University)

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

É bem melhor... saudades!


É bem melhor serem dois do que um
Já dizia o Santo livro
Do que viverem perdidos em seus corações
É bem melhor serem dois numa dor
E serem dois num sorriso
É bem melhor serem dois numa linda canção
Na verdade ninguém vive só por viver
Mas vive pra outra pessoa
E se faz um ser completo no instante em que vive no outro
É assim...

A Tempestade é filha do sol
O sol amigo das plantas
As plantas são o abrigo das aves
E as aves são nossa alegria
A juventude é mais bela se está
Emoldurada no velho
E o velho tem mais sentido
Se tem a essencia do novo

Ninguém pode num tempo ser todas as coisas
Nem mesmo ter todas as faces
Até o não se completa no sim
Tomando-se mais sentido
É assim...
João Alexandre

domingo, 28 de setembro de 2008

Pense muito, que é melhor se sofrer junto...

Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos... ali o Senhor ordena a sua benção e a vida para sempre” (Sl 133.1,3).

Quando se está longe de casa, dos seus, assim como eu estou a um mês, é que se pode dar maior valor ao "estar junto", à comunhão que temos uns com os outros, enquanto família, amigos, irmãos, parceiros e parceiras de caminhada. A comunhão está na essência da vida e na essência da criação. Desde o princípio Deus fez essa escolha: “Não é bom que o homem esteja só” (Gn 2.18). Dois é sempre melhor que um: na alegria ou na dor, na celebração ou no luto. Já dizia Vinicius de Morais: “Pense muito, que é melhor se sofrer junto que viver feliz sozinho”. Bela poesia, que expressa o valor de uma vida em comum, custe o que custar. "There's no concern when we're wounded together", afirma o cantor Jason Mraz em sua bonita canção "A beautiful mess".

Há algum tempo, preguei um sermão falando sobre ser comprometido com a comunhão. Baseado no banquete (Ceia) para o qual Deus nos convidou em Cristo, como lembrança de seu sacrifício vivo entre e por cada um de nós, eu afirmei: A história que Deus escreve conosco, de modo insistente, perseverante, é uma história de comunhão. Ele deseja se relacionar conosco! Ele partilhou sua própria vida conosco! E como forma de lembrança, Ele nos convida hoje a tomar do vinho, a comer do pão, como plena e misteriosa expressão da vida que Ele nos ofereceu em Jesus. Não são simples migalhas ou simples goles. É o símbolo de TUDO o que Deus nos deu! Podemos viver da graça, expressa no pão e no vinho, e em nosso compromisso renovado de comunhão no Espírito e de amor mútuo.

Ontem recebi um email simples e tocante de um novo, mas já querido irmão de caminhada em Londrina, o Marco Antonio. Nele, além das palavras de conforto, estava a letra de uma bela canção de sua autoria, que ele afirma ter sido baseada em uma das frases por mim ditas naquela pregação, a qual, segundo ele, "bateu e ficou". Fiquei muito feliz em receber essa mensagem, e mais feliz ainda em ler e degustar essa bonita letra, que busca expressar nossa comunhão mística em Deus. Quando li, fiquei pensando: precisamos urgentemente de mais poetas na igreja evangélica brasileira, como o Marco, que consigam unir o sabor de bonitas palavras com o sabor de uma boa, profunda e bíblica teologia. Por isso, tenho a honra de poder compartilhar com vocês essa singela e profunda poesia:
A NOSSA COMUNHÃO
(Marco Antonio Rosa)

NÃO É SOMENTE MEU,
E ASSIM PERTENCE A TI
O AMOR QUE ELE ME DEU
E AGORA VIVE EM MIM.

EU QUERO REPARTIR
O QUE EU RECEBI:
DE GRAÇA ELE DEU,
DE GRAÇA EU SOU TEU.

VEM DO TEU ESPÍRITO A NOSSA COMUNHÃO,
SOMOS UM SÓ PÃO, UM SÓ CORPO,
UM SÓ CORPO NA ALEGRIA E NA DOR,
NA MESMA ESPERANÇA, NO MESMO AMOR.

EU TE DOU MEU PÃO
PARA TE VER FELIZ,
E TE DOU DE BEBER
DA FONTE DESSE AMOR

QUE NOS FAZ CANTAR
A UMA DOCE VOZ
O AMOR DO NOSSO DEUS
QUE AGORA VIVE EM NÓS.

Jonathan

sábado, 27 de setembro de 2008

Semanal de Amsterdam (IV): uma cidade secular e privatista

Não me parece mais nenhuma novidade falar em secularização e secularismo no mundo de hoje. Trata-se de um processo que se iniciou nos anos 60, e que hoje pode ser visto como irreversível. Só para colocar os “pingos nos is”, secularização é um movimento de libertação do mundo das tutelas da religião (metafísica) e das cosmovisões fechadas. Harvey Cox, que escreveu o polêmico “A cidade secular” (1965), afirma que o processo de secularização, ao invés de ser destrutivo à espiritualidade cristã, está em profundo acordo com ela. “É conseqüência legítima do impacto da fé bíblica sobre a história”. Isto, pois, segundo ele, o objetivo de Deus é o de “humanizar a história”. Por outro lado, por secularismo, se pode entender como uma tendência de transformar certos aspectos da vida em absolutos, assumindo o lugar de Deus (ex. o consumo, o indivíduo). Desse modo, conseqüência natural é afirmar que consumismo e privatismo são duas das marcas de um mundo cada vez mais secularista. (Mais sobre o assunto em: http://escreveretransgredir.blogspot.com/2008/03/sexo-alpha-dog-e-cidade-secular.html).
Esse processo tem desafiado as igrejas em Amsterdam. Falar em secularismo nessa cidade é quase um pleonasmo. Antes de minha viagem para cá, Cibele, minha esposa, ouviu de uma pessoa que havia estado aqui a seguinte impressão: “É uma cidade sem Deus”. Assim, vim disposto a observar isso. Logo, considero que: Em primeiro lugar, do ponto de vista teológico, não há cidade sem Deus. Há, sim, e esse parece ser o caso de Amsterdam, cidades em que o nome de Deus não é tão falado ou nem um pouco falado – como nos acostumamos a ver no Brasil, em cada esquina. Falar de Deus aqui certamente é uma coisa estranha. E Cox já havia sugerido, em 1965, colocar a palavra “Deus” de lado, em favor de outra designação que nos confronta na cidade secular, como “o Ser”, eu diria. Não sei se essa é a saída, mas é fato que os discursos e métodos de antes já não convencem e nem caem mais bem aos ouvidos dos secularizados. A mensagem não muda, é claro, o que deve mudar são as formas de proclamação e vivência dessa mensagem.
Em segundo lugar, isso não significa que os holandeses em Amsterdam não sejam um “povo religioso”. Pelo contrário, eles são muito religiosos. O grande lance é que a religião, mais do que nunca, tem se tornado um assunto privado. Tanto, que é difícil e truncada a relação da igreja com a sociedade. Minha impressão é que a igreja nesse país não se mete muito nos assuntos de interesse público, da sociedade civil. Há interesse e esforços missionários? Com certeza, mas esses esbarram ou têm de enfrentar essa resistência da cultura de que religião é assunto privado e não se mistura com público. Em 2004, após quase 40 anos de diálogo, houve uma unificação entre três igrejas: Igreja Reformada da Holanda, a Evangelical Luterana, e a Reformada Holandesa. Dessa fusão, surgiu a Igreja Protestante da Holanda (Protestantse Kerk). É uma igreja grande, tem 2 milhões de membros, só perdendo para a Igreja Católica. Mas, fato alarmante é que a cada ano essa igreja tem perdido 60 mil membros, e muitos deles saem para engrossar a fila cada vez maior dos chamados “sem-religião”. Esse é um ponto em comum com o Brasil, por exemplo, onde a religião que mais cresce é a dos “sem-religião”, chegando hoje a ter 10% da população.
O reino do privatismo e do secularismo substitui, portanto, o reino do coletivo (num sentido estrito) e da religião (em assuntos que tocam a vida pública). Onde está Deus nisso tudo? Como o Evangelho ainda pode ser relevante em um contexto como esse? Como deve se portar o cristão que deseja fazer diferença, como sal e luz do mundo, nessa cultura? Perguntas que gostaria de deixar no ar para reflexão, para meus amigos e amigas do caminho... Nesse sentido, concordo com Lya Luft: "pensar é trangredir"! E que a igreja não esconda mais seus talentos quando o assunto for pensar o mundo, e a si mesma em sua prática e vida no mundo.
Que o Deus da graça nos ilumine na procura por respostas...
Jonathan
(Foto: The Damsquare)

terça-feira, 23 de setembro de 2008

O Jovem caminha em dois extremos

Há mais ou menos 1 ano atrás, concedi uma entrevista ao Jornal "Comtexto" da UNOPAR, falando sobre a questão da sexualidade na igreja. Foi uma experiência interessante e que gerou um debate caloroso. Gostaria de publicar aqui uma de minhas respostas na ocasião às muitas críticas, positivas e negativas, que recebi pelo que opiniei ali.

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Quando fui convidado para dar essa entrevista, logo pensei: "Se não disser aquilo que os evangélicos estão acostumados a ouvir e que os manteriam bem acomodados em suas posições e estados mentais anteriores, certamente serei execrado". Mas, por outro lado, indaguei: "E se não for honesto o suficiente diante de Deus e das pessoas, e corajoso para dizer aquilo que penso e acredito estar de acordo com a Palavra, sem medo de ser julgado, esterei agindo contra minha consciência". Bem, assumi os riscos, e estou "pagando" por tê-los assumido, como ficou bem claro por boa parte das opiniões até aqui colocadas. Quero dizer que respeito todas e acolho as críticas de bom grado, e tento compreender mesmo aquelas que fazem juízos de valor premeditados, como os de que eu "morri na unção", de que "pratiquei sexo antes do casamento" e falei tudo isso só pra "justificar meu pecado", de que é "desculpa pra pecar teologicamente", de que sou "falso profeta", herege e "dei lugar ao Diabo", de que "esse sangue" será cobrado de mim (qual sangue?), de que preciso me santificar, de que expressei minha falta de conhecimento e "falta de vontade", etc. Pois bem, respeitando a todos, quero apenas colocar algumas coisas:
1º.Minha ênfase nas respostas não estiveram no sexo antes ou depois do casamento. Isso foi uma escolha de quem publicou a matéria, em enfatizar isso na minha fala. Meus pontos principais sempre foram o sexo com amor e com responsabilidade. Repito o que disse no final, para quem não prestou a atenção: "A grosso modo, ele apenas está dizendo que o casamento é o melhor lugar para se viver essas experiências, provando nada mais, nada menos que conhecia bem nossa natureza humana, nossas necessidades e limitações".
2º.Continuo reafirmando: o que muitos líderes dizem ser bíblico e de Deus não é nem bíblico e nem divino, mas absolutas perversões da Palavra. Muitas das opiniões expostas aqui continuam presas a uma "teologia moral de causa e efeito" (como diz Caio Fabio), cujos pressupostos são fundados num escravismo legal e não na Graça muito menos numa leitura sensata das Escrituras. Não creio que falar de graça e da liberdade em Cristo, cf. Paulo, seja necessariamente um caminho para justificar a libertinagem, e não afirmei e nem defendi a libertinagem aqui. Se alguém, porventura, entendeu assim, lamento; ou se quer ser libertino por causa do que disse, lamento mais ainda, porque não me entendeu. Como expliquei, e repito: "Devemos ser livres e maduros o suficiente para escolher o melhor caminho". Mas já estou chegando a conclusão que liberdade e maturidade é coisa pra poucos, pouquíssimos. A maioria ainda prefere a escravidão do Egito que os 40 anos no deserto. Fazer o quê?
3º.Quanto aos juízos de valor, de que sou isso ou aquilo, questionando minha integridade em Deus, sugiro que os "irmaõs e irmãs" releiam Mateus 7 e Mateus 23. Ah, de preferência, releiam todos os Evangelhos e tentem observar melhor a conduta e os ensinamentos de Jesus, que certamente serão uma melhor defesa do que qualquer coisa que poderia argumentar aqui a meu favor. Sinceramente, acho que é perda de tempo. Só Deus tem a chave e o acesso aos corações e segredos dos homens. O que passar disso é enfado da carne, engodo espiritual de quem sofre de uma das piores neuroses de nosso tempo: a "neurose de santidade". Só clamo pela misericórdia de Deus sobre mim, pecador!
4º. Por fim, reconheço que as afirmações que faço nessa matéria são um pouco arrojadas para um espaço tão curto, e careceriam de um tempo e uma instância maiores a fim de que fossem melhor debatidas ou, quiçá, compreendidas, até para diminuir os julgamentos. Mas, como disse, as afirmei de boa e sã consciência em Deus, mesmo prevendo as implicações. As interpretações e desdobramentos disso estão fora de meu controle. Como diz Tiago, cada um se ocupe em refrear sua própria língua. Outra vez digo: respeito as opiniões aqui expostas e até os ataques. Isso faz parte da vida de quem escolhe opinar e lançar idéias livremente, e correr o risco de ser bem, mal ou até de não ser compreendido e até execrado. Aceito esse fardo. É também o meu fardo.
Jonathan

domingo, 21 de setembro de 2008

Semanal de Amsterdam (III): os holandeses, a moral cristã e o Reino da Liberdade

Antes de vir pra Amsterdam, ouvi muitas coisas sobre a liberalidade dos holandeses. Coisas do tipo: “Ah, você sabia que lá o uso de drogas é legalizado?”; “Cuidado, porque lá o sexo é liberado numa das praças públicas”. A sensação era de que eu estava indo para a própria Sodoma pós-moderna... Uma terra onde nada é de ninguém e tudo é de todo mundo. Bem, preconceitos à parte, as coisas não funcionam bem assim. Os holandeses são muito organizados e têm muitas regras; aliás, têm regras pra tudo, até para o governo da liberalidade em assuntos como sexo e drogas. Mas, parece que isso aqui não é uma “grande coisa”, a não ser para os turistas que vêm pra cá e se impressionam com as facilidades e curiosidades da vida nessa cidade. Vida que, aliás, é bem diferenciada, considerando o grande centro de Amsterdam, e Amstelveen, onde estou morando, uma espécie de cidade satélite que fica grudada em Amsterdam. Aqui é um lugar de parques bonitos, visuais naturais interessantes, um lugar para morar. Já o centro, bem, é o coração da cidade e onde a maioria das coisas acontece...

Imagine que você vive num dos poucos lugares do mundo onde se tem plantação de bananas. Para você, que vive ali, é uma coisa comum. Você pode se dar ao luxo até de estar enjoado de banana. Mas, para os de fora, que não têm bananas livremente em sua terra, a não ser as “importadas” ou “clandestinas”, é uma enorme novidade e atração. Eu diria que, para os holandeses, é mais ou menos assim: essas questões não são tão extraordinárias. Elas simplesmente são assim como são. Você não vê nenhum alarde acerca disso. Ninguém vai te agarrar na rua e chamar pro parque pra fazer sexo, ou te oferecer drogas deliberadamente. Aliás, se há uma palavra que os holandeses gostam é discrição; eles são muito discretos. Eu diria que quem vem pra cá tem um cardápio de opções das mais múltiplas possíveis para experimentar. Mas, cada um experimenta a cidade como quer. Por isso falo dos preconceitos; não há somente o imperativo do sexo e o imperativo das drogas aqui! Só há pra quem escolhe experimentar esse lado da cidade. Mas esse é somente um lado da moeda.

Um colega africano, que aqui conheci, perguntou a minha opinião sobre o que eu achava melhor, referindo-se a essas duas questões (prostituição e drogas): um país, como o Brasil, no qual existem leis contrárias a essas questões, mas que não reduzem na prática (vide os grandes esquemas de prostituição e tráfico de drogas que prosperam cada vez mais), ou um país onde ambos são autorizados por lei? Bem, já me deparei com essas questões anteriormente, mas, minha opinião sincera foi e é pela segunda opção, embora não sei se num país como o Brasil qualquer das duas inibiria o crime. Mas, é uma coisa óbvia! Tudo o que é proibido tem um gosto diferente e aguça mais o desejo pela transgressão e subversão das regras e normas. Como diz uma canção chamada "Dirty Little Secret": “I want, I need the fruit of your pine, it tastes so bitter sweet cause I know it's not mine”.

As coisas são assim: quanto mais se proíbe, menos se coíbe! E quando paro pra pensar na moral cristã, tal como os brasileiros a concebem, vejo tão pouco nexo e lógica. Há algum nexo falar sobre uma mensagem sobre um reino de liberdade e graça, quando o que conseguimos, na prática, é só uma liberdade de cabresto e migalhas de graça, que está muito mais pra “des-graça”? As pessoas vêm em Jesus um rei libertador, mas, quando são convidadas a viver nesse reino de liberdade, onde cada um, à luz da Palavra e na dependência do Espírito, é árbitro de sua própria vida e consciência, elas recuam; é um peso muito grande ter de decidir por si próprias. Assim, preferem retornar ao Egito e viver sob as controladoras e seguras ordens de Faraó. Pérfida contradição!

Eu ainda fico com a palavra do apóstolo Paulo: “Foi para a liberdade que Cristo vos libertou! Permanecei, pois, firmes, e não vos submetais de novo ao jugo da escravidão!” (Gálatas 5.1).

Até a próxima!

Jonathan
(Foto: The Museumplain )

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Divinização pastoral X demonização do crente

(...) Um dos objetivos do pastor deveria ser o de gerar filhos na fé bem nutridos, maduros, que pudessem caminhar com as próprias pernas, sem necessitar de cabresto ou leitinho “espiritual” na boca; de tal modo que, num futuro não muito longínquo, pudessem debater com seu pastor de igual pra igual, sem hierarquia, não só sobre bíblia e teologia como sobre a vida de modo geral. É o mestre sendo alcançado e até superado pelo discípulo. Quimérico? No mundo de hoje, sim, infelizmente.

São armadilhas do sistema eclesiástico, como observa Eugene Peterson: “Enquanto que a comunidade míngua, a ansiedade por liderar cresce, mas é comum essa liderança destruir a comunidade, reduzindo as pessoas às funções que desempenham. Quanto mais “eficientes” nossos líderes se tornam, menos vida em comunidade nós temos”. (O pastor desnecessário, p. 189).

Logo, esse crente moderno sofre de inanição espiritual, tornando-se cada vez mais oco, cujo fim do abismo ainda está longe de ser encontrado. Por ser um tolo e ignorante do projeto de Deus para a sua vida, ele permite que um outro exerça o controle sobre sua vida ao ponto de cegar o seu entendimento. Perde a autocrítica e, como num passe de mágica, deixa de existir. Não pode rebelar-se contra os ensinos do pastor-deus. Tem medo de ser castigado e de perder as bênçãos. Finalmente, não aceitando a dignidade ofertada por Cristo, apanha com as mãos cheias aquilo que o Cristo rejeitou da serpente quando foi tentado no deserto, quem sabe focado na “restituição” prometida, riqueza e prosperidade material – aberrações dessa época (...).

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Trechos do artigo que escrevi com Antonio Carlos Barro: "A divinização pastoral versus a demonização do crente". Para ler o texto todo clique aqui.

Jonathan