quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Por uma igreja frágil e irrelevante

Fragilidade

Nosso mundo é um mundo cada vez mais competitivo, composto de pessoas competitivas. Nem todos são vencedores, nem todos os vencedores alcançam o pódio e o poder por mérito próprio, mas quase todos, regidos pela lei do mercado, competem entre si para ver quem conquista o direito de “chegar lá”. Maquiavel ficaria feliz em se dar conta de que sua teoria, originalmente aplicada à política de sua época (no clássico O Príncipe), funciona bem em outros ambientes, como o mercado de trabalho ou a religião, por exemplo; universos nos quais nem sempre importam tanto os meios, se estes estiverem a serviço de almejáveis fins. Sucesso, pujança e relevância são palavras indispensáveis a qualquer um que deseje ter uma sobrevida neste tipo de sociedade.

Você, leitor/a, deve estar se perguntando, “e a igreja nisso?”, já que meu título remete a ela. Bem, a igreja vive na tensão entre ser uma expressão desta e (relevante) para esta época, e sua razão de ser, que é encarnar diante do mundo a boa nova do reino revelada em Jesus. Ou seja, o que move a igreja não são os ditames do que impera na sociedade em que ela coexiste, mas o exemplo de seu Senhor.

E o exemplo de Jesus, suas prioridades, sua missão se desenham desde seus primeiros passos no ministério. Segundo a narrativa de Lucas no texto indicado acima, Jesus não inicia seu ministério em ação, mas em silêncio, oração e na total dependência do Espírito no deserto. Lucas diz que ele voltou do Jordão (lugar de seu batismo) “cheio do Espírito” e que ele “foi guiado pelo mesmo Espírito no deserto” (Lc 4.1). Depois de quarenta dias, ele passou a ser tentado pelo diabo no instante mesmo de sua maior vulnerabilidade e em seus aspectos geradores: (a) suas necessidades básicas (transforma pedras em pão), (b) sua identidade (se és o filho de Deus, atira-te daqui e convoque os anjos pra te livrarem), (c) sua vinculação divino-humana com o poder (a ti darei todos estes reinos se prostrado me adorares). Em nenhuma delas, porém, Jesus foi imprudente, não se submetendo ao uso leviano da Palavra pelo diabo. Pelo contrário, ele rejeita o caminho do poder e abraça, a partir dali, uma vocação despossuída de pretensões grandiosas neste mundo e desejosa apenas de fazer a vontade do Pai.

O caráter dessa vocação se confirma no momento seguinte da narrativa. Num sábado, Jesus adentra a sinagoga (respeitando o costume e a tradição) e lhe é dado o livro do profeta Isaías, no qual se lê: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para pregar boas novas aos pobres. Ele me enviou para proclamar liberdade aos presos e  recuperação da vista aos cegos, para libertar os oprimidos, e proclamar o ano da graça do Senhor” (Lc 4.18-19, NVI). E, logo em seguida, disse aos presentes que aquela palavra acabara de se cumprir nele mesmo. Desde então, fica claro que ele encarna a figura indigesta do profeta.

Quase todo líder cristão em nossos dias, naturalmente, imagina poder iniciar seu ministério bem, realizando boas e grandes coisas para se estabelecer, sendo notado e respeitado a fim de conquistar seu espaço. O mestre, porém, tem um início subversivo até nisso, pois esse primeiro ato ministerial, segundo esse relato, foi um fracasso total: todos na sinagoga ficaram enraivecidos com seu discurso, o expulsaram da cidade e tentaram jogá-lo do precipício, o que só não aconteceu porque ainda não era o momento. Mas era o indício de um caminho, caminho de cruz.

O que a igreja contemporânea tem a aprender com isso? Dentre tantas lições que daqui poderíamos extrair, eu diria que igreja e seus líderes precisam aprender com Jesus a não temer a rejeição, o escárnio e o insucesso (aos olhos do mercado) no instante em que ela decide viver com integridade sua vocação para ser um frágil instrumento da missão do reino neste mundo. Henri Nouwen vai além, e afirma algo arrojado em relação aos líderes cristãos (que aqui reaplico a igreja): “O líder cristão do futuro será aquele que ousa afirmar sua irrelevância no mundo contemporâneo como uma vocação divina. Ela permite que ele esteja em profunda solidariedade com a angústia atrás de todo aquele esplendor do sucesso. E leve a luz de Jesus para brilhar ali”.

“Frágil e irrelevante”, digo, não porque encarna o espírito de vítima ou de derrotada, tampouco porque não faça e não vá fazer diferença, mas porque é irreverente aos caminhos de sucesso mundanos, e porque encarna o espírito de sua fragilidade humana na dependência do Espírito, como Jesus no deserto, e admite não precisar nem desejar viver sob a égide e em busca de outro poder que não esse; e mais, assume que todo exercício legítimo de poder na igreja passa pela fragilização de quem o exerce, no momento em que se coloca tanto na dependência do mesmo Espírito no serviço, como na mútua e fraterna dependência da própria comunidade. Em suma: olhar para Jesus torna mais claro o tipo de opção que a igreja de Cristo precisa fazer ao lidar com poder e instituições neste mundo, qual seja, não a de rejeitá-los como quem os demoniza, mas de abandonar o modo como se valoriza poder e instituição por aí, tantas vezes colocando-os acima das pessoas às quais deveríamos amar e servir.

A igreja que se diz de Jesus não pode inverter a lógica: ela ama mais as pessoas que as instituições e não o contrário. Aliás, instituições são instrumentos úteis, não objetos de amor e/ou veneração!

Ademais, a vocação primária da igreja faz com que ela não esteja neste mundo para estabelecer coisas – como que monumentos só dela, porém supostamente erigidos “para a glória de Deus” (resta saber qual) –, mas para peregrinar na liberdade, e seguindo os rastros, do Espírito e obedecendo unicamente a um Senhor. Por fim, o papel da comunidade do povo de Deus em um tempo tão plural como o nosso não reside em normatizar o falar de Deus, nem tampouco na pretensão de falar por Deus, como se a ela tivessem sido conferidas tanto uma revelação especial quanto um modo especial (ou exclusivo) de apresentar a revelação. Em tempos de fragilização, como o pensamento fraco de Gianni Vattimo nos faz atentar, a igreja não passa de um débil e, como tal, não exclusivo instrumento da Missio Dei, que, para ser efetiva como instrumento, precisa se aceitar como insuficiente, frágil, como um vaso de barro nas mãos do Oleiro, a fim de que nela, através dela e para além dela, isto é, no mundo, avulte o poder do Espírito Santo, a única testemunha absoluta da verdade, a nós não acessível senão por meio de fragmentos de linguagem e fragmentos de experiência.

Jonathan

terça-feira, 17 de setembro de 2013

O mundo não é dos espertos?

O Grinch

O mundo não é dos espertos, mas é das pessoas honestas e verdadeiras. A esperteza, um dia é descoberta e vira vergonha. A honestidade se transforma em exemplo para as futuras gerações. Uma corrompe a vida e a outra enobrece a alma. [Raquel Fragoso]

Frases de efeito espalhadas na internet podem ser como gotas em um oceano: logo, sem mais nem menos, tudo vira uma só substância líquida comum a todos os usuários. Tentei encontrar a autoria da frase acima, e eis que surgiu o nome de Raquel Fragoso. Assumirei que ela seja mesmo a autora, até que se prove o contrário (ou não). O fato é que, vendo a mensagem espalhada como vírus nas redes sociais – outro fenômeno desta era digital: nem sempre refletimos sobre o que “curtimos” e/ou compartilhamos, e ainda assim endossamos – confesso que, de primeiro instante, parece ser uma frase atraente, com uma mensagem positiva para gente de bem. Basicamente dizendo: não importa o quão bem-sucedidos sejam os “espertos” por aí existentes, que em tudo querem ou afirmam levar vantagem; no fim das contas, o mundo será “das pessoas honestas e verdadeiras”, que deixarão exemplo para as próximas gerações, enquanto a corja da esperteza, quando descoberta, resultará em “vergonha”, que em si já pode ser a própria punição.

Não que esta seja, de fato, a intenção desta frase, mas, numa realidade cruel, não me impressiona que as pessoas se agarrem a mensagens do tipo “no fim o bem vencerá”, mesmo nos dias de hoje. É a mensagem presente em quase todos os enredos de Hollywood ou nas novelas da Rede Globo, com raríssimas exceções; os personagens que representam “o mal” podem até prevalecer sobre as pessoas “do bem” (que geralmente são as protagonistas), mas, para alegria do “respeitável público pagão” (como diz O Teatro Mágico) de plantão, a estória, com mais ou menos meandros de complexidade, sempre termina com a vitória “do bem sobre o mal”. Compreensível, afinal para que o espetáculo possa continuar é preciso não somente retratar o provável, mas o palatável, ou seja, “o que o povo gosta”, com uma boa dose de autoengano. E, como disse Michel Maffesoli, “a necessidade de se autoenganar é o motor constante do conformismo do pensamento”.

Talvez um primeiro (ou segundo) impulso do/a leitor/a, a essa altura, seja em dizer: “defina esperteza”! Pois bem, dentre os muitos sentidos possíveis que o Dicionário Michaelis dá à palavra (como “acordado”, “ativo”, “desperto”, ou “inteligente”), o que mais se aproxima do sentido usado pela autora da frase talvez seja este: “que tem agudez e atividade” ou “sagaz”. Então esperteza, nesse ínterim, seria uma espécie de arte da vileza, por meio da sagacidade, da artimanha aguda e arguta de quem maquina não pelo bem, mas para “se dar bem”, custe o que custar. Bem, o que me parece é, que se o mundo não está inteiramente entregue a tal espécie de esperteza, sem dúvida ele é, em quase todas as dimensões da vida, refém constante dela.

Não quero ser advogado do pessimismo ou do niilismo aqui. Abraço a honestidade e a sabedoria como caminhos (positivos?) de vida. É indubitável que, num sentido cristão e humano, elas são melhores que a tolice e a malandragem. Mas penso que o autor de Eclesiastes foi mais assertivo e realista que a autora desta frase, em seu capítulo 9, quando afirma que “a sorte é a mesma para todos”, bons e maus, justos e injustos, espertinhos ou honestos, e que “tudo depende do tempo e do acaso”. Mais ainda, quando aponta para o paradoxo dos trabalhos sem recompensa (como a bondade, por exemplo), ou mesmo das inversões perversas da vida, isto é, os estultos dominando os sábios. É claro que podemos ser reconhecidos e até recompensados pelo bem; mas não há garantias disso. E, por mais ilusório e fugaz que seja, sim, o mundo não só é, como está nas mãos dos espertos muitas vezes, e a política e religião são bons exemplos, nus e crus exemplos eu diria, de como e com que gigantescas proporções isto se dá. Até porque, a frase se refere a este e não a outro mundo, onírico ou escatológico.

Eclesiastes ainda dá outro exemplo no mesmo capítulo (v. 13-18): numa pequena cidade com poucos habitantes, veio um rei muito rico, sitiou-a e a dominou; então, veio um homem pobre, mas sábio e, por sua sabedoria, livrou a cidade. No fim, porém, o opressor foi lembrado, e o libertador esquecido pelo povo da cidade. Os anais da história daquele povo registraram o nome do opressor, mas não o do sábio. Por causa de exemplos como esse é que, como se diz no começo do capítulo acima citado de Eclesiastes, diante do fato de que não apenas “a todos sucede o mesmo”, mas que nem sempre o benefício da bondade e a punição da maldade são garantidos, muitos desanimam e se entregam desvairadamente à vil “esperteza”. Talvez porque acabem chegando à trágica conclusão de que ser honesto não vale à pena, não traz recompensa, não traz grandes ganhos; pelo contrário, muitas vezes pode trazer perseguição, prisão ou morte, como disse certa vez o padre Gustavo Gutiérrez. Assim, a questão pode ser: se todo mundo está igualado na existência; se o bem nem sempre triunfa sobre o mal; se o político opressor recebe um busto na praça enquanto o sábio libertador é esquecido, por que razão devo me preocupar em ser honesto?

Ser honesto é um trabalho funesto quando se busca recompensa e/ou reconhecimento, ou mesmo quando se espera aplausos por isso. Honestidade é um modo de ser que nos possui e nos impulsiona a agir de tal modo (honesto) quando ninguém está vendo. Antes de tudo, o ser honesto acontece diante de Deus e de si mesmo, onde não há sentido para autoenganação ou ilusão. Ademais, Eclesiastes e a vida ensinam: no fim, nem sempre o melhor vence a batalha, ou mocinho supera o bandido, ou o justo prevalece sobre o injusto, não só porque a vida é complexa, mas porque a todos iguala debaixo do sol. E se a honestidade persiste sendo um melhor caminho é porque, como diz a frase, “enobrece a alma”, e não porque nos faz ganhar o mundo. Afinal, como disse Jesus, de que vale ganhar o mundo inteiro e perder a própria alma?

Jonathan

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Letter to a sexually active young couple

casal-sexo

By Jonathan Menezes

Our world (specifically the “Christian world”) is still permeated by the pretentious assumption that dating Christian couples that attend church services (or not) are not necessarily sexually active. Yes, chastity is still the ideal thought when it comes to Christian dating nowadays. There are no problems with that legitimate option, so to speak; the problem is to claim it not as an option, that is influenced by the awareness and maturity level of each person or each couple, but as a universal rule, a categorical imperative (using here Kant’s term), as if purity and holiness of a dating relationship could only be evaluated (although I think it cannot be assessed) by the absence of the erotic dimension. It is preferred, therefore, to ignore that most of the dating couples today do not live according to this imperative, consciously and healthily, or secretly and culpably.

The requirements of the church regarding sexuality have been, for a long time, hypocritical, presumptuous and loyalist, all in the name of a “Biblicist idolatry” under the guise of fidelity to the Bible. It is ignored, as said Robinson Cavalcanti, the fact that “the Bible is not an encyclopedia of prescriptions for every detail of human life”. What it offers us, in many cases, such as premarital sex, for example, are either guidelines to very specific cases, historically and culturally situated, or more general relational principles grounded in loving God, loving our lives and our neighbors.

The worst thing is that this imperative, as you may have noticed, is exclusive, that is, anyone, being Christian, in any way could have a kind of dating where sex is present, with sanity and sanctity. And there has not been enough opening for anyone who wants to discuss it nor for those who think differently. What is the reason for this? The reason is always: because sex outside of marriage is a sin and it is "pretty much clear" in the Bible. As happened to me, perhaps you have already intricately stopped before and reflected about such certainty, and thought: I have either read the bible very little or have I read it very badly, because where in the Bible is it spoken so clearly on this issue and so categorically that many Christians – especially the evangelical ones – have propagated that as absolute truth, for so long, for all people, regardless of what is the case? Now which possible “textual buzzword” critical thinkers will be mooting at this point? Fornication? That our body is the temple of the Spirit? The story of marriage (“becoming one flesh”) according to the Genesis? Holiness and purity? Texts about lust, lubricity, impure desires, prostitution? Well, the list can be large and I will not try here to give exhaustive references; I think you understood my point, so I will go straight to it.

I am not saying that these precepts do not exist or are not valid, however there is a lack of insight and intellectual honesty when we apply them, several times (if not most of the time) outside a proper context. Common sense and creativity seem to be elements that have been increasingly left out of our Bible reading. At the end of the day, the impression that remains is that what evangelicals have always said to be their “strength”, that is, their zeal in relation to the Scripture, can also be their weakness. Especially when they do not realize that the most childish idolatry is the one in which we hold others to one thing and lose our sense of independence and the power to criticize our relationship with our independence. And that is the way that many of those who boast themselves of being biblical evangelicals treat the Bible: as an object of veneration, which ends up canceling reverence to God's Word, impoverishing and enclosing it into their human precepts (all too human?).

I will mention the most common case, just as an illustration, of one of the practices not recommended in the Bible; fornication. When one thinks of “sex outside marriage”, for example, this is the first principle that appears in many forms of argument against the “practice” – as if its applicability was universal in this case. The biblical meaning of the word “fornication”, according to Robinson Cavalcanti, is “fortuitous relationship, uncompromised without emotional involvement”. It is the typical sex for sex, casual, without connection, without much regard for the person with whom you have sex. It does not mean that all sexual relationships outside the context of marriage are fornication, nor that all those who practice it fit into the category of “fornicators”. But they are all included in the same group because it is much easier to consider the Bible a manual of good conduct, with specific rules for everything we regard as misconduct, than to consider it the Word of God, which in itself is an invitation to obedience with discernment and good conscience before each experienced situation.

One of the most honest interpretations I have read about sexual relationship in the context of dating, engagement and commitment, coming from a Christian, was written by Robinson Cavalcanti, if I am not mistaken, in 1985. According to him:

It is assumed that the intimacy grows as: a) feelings b) mutual knowledge c) commitment d) the approach of the marriage, formal or informal, grow. Being the good sexual relationship a condition for marital success, some indicator should be inferred even in the preparatory period. If the virginity of both is a Christian ethical target, sexual socialization of costs (everybody assuming the burden) is lesser evil than the dichotomy of some virginity vs. prostitution of others, with one “paying the bill” of the other. (...) What cannot be required of people who are really committed and who love each other, under awkward sexual tension, is for them to simply "push it back", when they are grown-ups, graduated, with a good job, a nice apartment, a car etc. Meanwhile...

My goal with this particular letter, however, is neither to empty the meaning and power of sin in a human being – something impossible – nor to trivialize the sexual act, which is a divine gift, but to think together the implications of an active sex life between dating couples, assuming that this is already your reality or maybe it is in the verge of being your reality. I do believe that there is a possibility, on a dating or engagement during which the couple has sexual intercourses, that sex will not be merely fornication, but it will be love, commitment and emotional involvement, full of meaning and a maturation process towards a lasting married life, that is, marriage. With this letter I have the risk of getting many stones thrown at me, but this is the price of honesty and the price of no longer be willing to play this “pretending” game which exists in our midst, that is: “I pretend I do not know you have sex and you pretend to follow the law of premarital abstinence”. We must stop with this hypocrisy, even with screams that will be heard by few and execrated by many (I am feeling as I was the Salem Witch right now).

Well, let’s focus less on the outside world, and more in our inner world. When you decided to take this important step in your relationship – as long as that has come from a conscious decision and not just from passion (no judgments here) – you might have reflected about the greatness, beauty, and also the responsibility of this act, I imagine. Otherwise, I think it is worth reflecting about it. I mean, even though we are made of flesh, bones and that our body has a specific shape, we do have impulses, desires, and sexual attraction. We are not talking about fleshes in friction, rubbing each other simply for pleasure, but we are referring to two people who have feelings, who suffer, who cry, who get excited, who become fragile when they get disappointed, when they love, when they get hurt. Yes, relationships where the buzz goes beyond sex encompass all those factors. Have you ever thought that during a sexual intercourse it is not simply our bodies that are touching each other, but our whole being? And, as much as we think that through performance, through the plasticity of the act and the ability to give and receive pleasure, we are in control of the situation, it is a great mistake. Because, as I said, whether we accept it or not, there are always more factors involved, nobody has the complete control of themselves, nobody is able to completely control their feelings, nor the other’s feelings. That is why, even in cases where both have an agreement to only use themselves and enjoy each other, there is no guarantee that in the end, no one will get hurt. After all, you could have treated your partner as a mere “object” some time in life, but when you get treated like that it is different, and even the “deal” might not end up as a “great deal”.

But I also imagine that you have decided to have sex because you love each other, because sex is an essential complement to your love, and because you wanted your relationship to be completely perfect – Am I being assertive or far too idealistic? Anyway, when we want something like this, it might be because we want (even if unconsciously) a relationship that lasts a lifetime, although this is relatively long, it takes a lot of work, and it is beyond the reach of our eyes and mind. The future, as it is usually said, belongs to God. The point is, we are able to decide what to do with our present, and this can be a either a gift or a torment, it depends on us most of the time. I believe that God gives us the power to choose with whom and in what way we will direct our relationships, and then He will bless our choices as long as our choices dignify and honor God, our partner, and our lives. Happiness, if it does exist, is a gift that is only enjoyed when shared with intensity.

Do not think, thus, that I am writing to you simply to say that it is all right to do it. I write to say that the will to do it right is in your hands, do it well, do it with love, make your relationship last for a lifetime, because it is also a divine gift. Sex can be very pleasurable when it is just sex, however it is much better when there is commitment, when the feeling is cultivated to last forever, to make sense, and to generate and inspire life. I hope you understand the depth of this, that sex can be an instrument of love and life, but also of power, competitiveness and mere vanity. That is what happens with any type of great power.

In order to guide us, Jesus made an interesting point in one of his parables: "From everyone who has been given much, much will be demanded; and from the one who has been entrusted with much, much more will be asked" (Luke 12.48b, NIV). In another translation (The Message) it says: “Great gifts mean great responsibilities; greater gifts, greater responsibilities!”. What does this imply? It implies that God calls us by love, through love He sustains us, and the greatest power of all that He offers us is love, without which the other "powers", including sex, can cause destruction and instead of generating life. This happens for, in essence, love is a subversive power, once it takes over the control of our lives it leaves us vulnerable and sets the other person free – it does not use, does not abuse, nor exploits.

The beauty of God's creation is that the Creator gives us the chance to choose what to do, what we will do with the things He gave us during life, the chance to choose generating good or bad things from what we have been given, even though, in us, “good” gets to mix with “worse” very easily. Nonetheless He said he hopes we opt for life. I wonder, at the current level of knowledge, involvement and mutual responsibility between you as a couple, what does it mean to opt for life? What do you want and expect from your relationship? How much have fought to have a mutual life? Because it is the strength of the alliance between you two that makes sex become divinely blessed and humanly meaningful. Not only a source of pleasure, but a source of abundant life...

[Translation: Vinicius Cavalheri]

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Sexo: ama e faz o que quiseres!


Para você, leitor/a, que “chegou agora”, um aviso: este texto é um pós-escrito de minha “Carta a um jovem casal sexualmente ativo”, uma tentativa de responder a alguns dos questionamentos e críticas que recebi. A gente gasta certo tempo pensando e escrevendo antes... Se o assunto é "sexo", certamente gasta bem mais tempo respondendo às reverberações e regurgitações depois – até aí tudo bem, diálogo é bom, e a gente, no fundo, escreve pra ser lido; o problema é a natureza e a belicosidade de algumas das respostas. Se pensar e hesitar demais, chegará à conclusão de que melhor é não escrever. É preciso de um pouco de coragem e de um pouco de insanidade (além de um bom colete à prova de balas) para escrever sobre isso em um ambiente cercado de pessoas armadas até os dentes, parece que ávidas à espera de quem será o próximo "indecente" a se aventurar a tratar do tema. Incrível a tácita e reprimida fascinação pelo assunto entre religiosos, não? E pergunto como é que podemos manter por tanto tempo a sexualidade como centro e pedra sagrada de "nossa moral"? E por quanto tempo ainda iremos fingir que o atual estado de coisas não pode, de modo algum, interferir nem alterar o modo como há séculos temos pensado e agido (ou não pensado nem falado, mas muito "agido")? Sabiamente disse certa vez o caro amigo e mestre Julio Zabatiero: "Pecado não é fazer sexo, pecado é falar sobre sexo".

Minha relação com o tema não é contratual nem polêmica (embora o tema seja); é uma relação de curiosidade e inquietação, por entender que foram muitos anos de uma ditadura teológica explícita sem sair do lugar comum das mesmas afirmações, nem sempre com a devida base e seriedade. Acho no mínimo curioso que se celebre tanto e se aceite passivamente posições previamente assumidas simplesmente porque, por muito tempo, cristãos, ao longo de séculos, sustentaram-nas como sendo verdadeiras. Devemos levar isso em consideração, é claro. Mas não nos esqueçamos de que: em primeiro lugar, elas são interpretações da Mensagem, e não o espelho da própria Mensagem e; em segundo lugar, que nem todos os cristãos, em todas as épocas e lugares, pensaram de uma única forma sobre o sexo. O que questiono no artigo provém, majoritariamente, de uma visão cristã ocidental e, sobretudo, do evangelicalismo norte-americano. Admiro quem se dispõe a nadar contra a maré, toma o tema a peito e resolve dar a cara à tapa por admitir outras interpretações – daí meu interesse e apreço por Robinson Cavalcanti, embora pense que muito do que ele disse precisa ser revisto e não apenas revisitado. Descer a lenha em que pensa, ou, como disse Kierkegaard (em 1844, referindo-se à sexualidade), "fazer de censor, é demasiado fácil; extrair daqui sermões, passando por cima da dificuldade, não é menos doentio; mas falar sobre o problema de maneira verdadeiramente humana, eis o que constitui toda uma arte". Assim, minha intenção, ao escrever o texto em questão, foi expressar (artístico-humanamente) o que penso e provocar o pensar, desde um lugar de liberdade. Agora, sei bem que a liberdade tem riscos e que ela incomoda mais que as celas de segurança com as quais estamos bem habituados. Todavia, quem tem boa vontade e desejo de aprender e não somente reafirmar o que supostamente já sabe (porque "é a verdade", segundo ele/a) e polemizar, jogar pedras ou interpretar como bem entende – minhas intenções, meu texto e seja lá o que for – mesmo que não concorde, compreenderá que ideias são lançadas para serem discutidas, revisadas, criticadas, porque provisórias.

Talvez um jeito de evitar o “perigo” que tantos temem em falar do tema a partir desse lugar é criando uma espécie de censura para abordagens como essa, o que acham? No começo do artigo, colocar o seguinte aviso: "Proibido para pessoas não maduras na fé!". Só fico me perguntando: como esperamos que essas pessoas amadureçam? Prosseguindo com a “boa e velha” homeopatia bíblica? Conheço inúmeras igrejas que adotam esse sistema e nem por isso houve alguma progressão ou abandono do estado de infantilidade. Natural, afinal, também tenho aprendido que a liberdade, embora se destine (como vocação) a todos os humanos, não será acolhida e nem perseguida por todos. Mas, se queremos que as pessoas deixem de ser infantes, paremos de tratá-las como tais. Meu texto é muito claro sobre o contexto de amor e responsabilidade que demandam uma relação e os efeitos negativos que a relação sexual pode gerar em alguém (aspecto ignorado por muitos, que preferem se centrar apenas no que é periférico e atacável no texto). O grande problema de alguns de meus leitores, mais ou menos enraivecidos com o que proponho, é que não coloco um "ponto final", não determino a regra, mas instigo a que cada um cuide e zele por si mesmo, afinal é a Deus e somente a Ele que prestaremos contas de tudo.

Diante dos questionamentos que recebi de um pastor no facebook, a partir do clássico Cristianismo puro e simples, de C. S. Lewis, voltei ao livro para recordar algumas coisas. Lembro como em minha adolescência, depois de ter sido bombardeado por Jaime Kemp, esse livro, e seu capítulo sobre a moralidade sexual, me foram importantes. Sobretudo em duas coisas que ele diz: (1) Que Deus conhece nossa situação e não nos julgará como se não tivéssemos dificuldades – o contexto opressor em que vivia foi incapaz de me dizer isso; (2) Que a sexualidade (dimensão animal) não é, para ele, o centro da moralidade cristã, e sim o orgulho (dimensão diabólica) – que ele define como o mais completo estado da alma anti-Deus. Não poderia estar mais de acordo, até hoje. Lewis foi o primeiro a me fazer pensar, logo cedo, que havia algo de doentio talvez em nossa persistência em tornar a sexualidade o centro da moralidade, coando mosquitos e engolindo camelos. Mas, enfim, ela é importante, e ainda resta a opinião clara e central naquele capítulo de que a castidade pré-matrimonial é uma regra clara e inegociável. Pois bem, minha pergunta é simples: se essa é "a regra cristã", quem foi que transformou aquilo que claramente é uma interpretação possível em a única interpretação possível? Porque se é a única possível e incontestável, não posso chegar a outra conclusão senão a de que estamos confundindo absolutos da Mensagem com absolutos da cultura, seja ela religiosa ou não.  

O casamento, por exemplo, faz parte da intenção criativa do Criador desde o princípio, como relatado em Gênesis e não questiono isso. O que questiono são os formatos, as circunstâncias historicamente situadas, o padrão cultural que absolutizamos. Creio que precisamos repensar o casamento (as formas) e as circunstâncias prévias a ele (caso a caso, consciência por consciência), em que o sexo não tem que ser, necessariamente, uma coisa impudica e condenatória. Precisamos ir além de Lewis, que claramente não se debruçou de modo intenso sobre o tema (e quem o fez até hoje?). Ele foi um homem de seu tempo e escreveu em resposta aos desafios daquele momento. Estaremos nós com honestidade, discernimento e coragem dispostos ao mesmo? Sempre haverá muitos "ses" e "poréns" a um assunto tão complexo. E encaro minhas opiniões como sendo tão provisórias e em construção quanto eu mesmo. O que não dá, pelo menos pra mim, é para fechar questão. Estamos apenas começando, ou prosseguindo, como queiram.

Meu ponto principal é, e sempre foi, o seguinte: sexo, para ser canal de vida, precisa ser feito dentro de um contexto de amor e responsabilidade, em que ambos carregam bônus e ônus das decisões que tomam. Aqui, a meu ver, cabe bem a frase de Santo Agostinho: “Ama e faz o que quiseres”. O amor liberta, mas também cuida, zela com responsabilidade pela vida do/a amado/a em todas as coisas. E o contexto em que isso se dá de modo mais intenso, mesmo que antecipadamente, é sem dúvida um casamento (talvez um pré-casamento, nestes casos): um relacionamento estável, sério, comprometido e que se quer de longa duração. Sempre me questionam que esse relacionamento pode acabar; então, este casal terá casado "de fato", mas não "de jure". Para mim, o que conta, biblicamente falando, é o casamento de fato. O casamento de jure é mais um testemunho público (esse termo justifica melhor que o de uma "satisfação pública") do amor e aliança do casal, tendo a "benção" da igreja e da sociedade (a de Deus sempre vem antes, desde a criação e, mais especificamente, quando o compromisso do casal é seguido ou precedido do compromisso com Deus). Agora, conheço tantos e tantos exemplos de casamentos malogrados no primeiro ano, no primeiro semestre, no primeiro mês, simplesmente porque casar de jure, nestes casos, muitas vezes, não passou de "um abençoado erro".

O que para mim não faz o menor sentido é dizer que isso é melhor ou diferente dos casos de casais comprometidos, que resolveram "aprofundar" a relação, casando-se "de fato" e, mesmo que intencionalmente querendo algo que dure, terminaram. Não é licença para que isso aconteça sempre, mas faz parte da vida, pode acontecer e acontece. E não vejo como sendo bíblico, tampouco como cristão, o peso de condenação infernal que no cristianismo se tem colocado sobre pessoas neste tipo de situação (não estou especulando, conheço inúmeros casos em que isso se aplica); aliás, isso é desumano e hipócrita para falar o mínimo.

Aqui cabe um esclarecimento: o uso que faço do termo “hipócrita” é sinônimo para farisaico; hipócrita é a im-posição – que parte do pressuposto de que eu tenho o que é preciso para “ser espiritual e crente”, enquanto o outro não, quando, no fundo, ninguém tem. Muito melhor é o sustentar plural de certas posições, sejam elas conservadoras ou não. Que fique claro: meu problema não é com ser conservador, o conservadorismo precisa ser respeitado; a hipocrisia (inclusive a que me ronda diariamente), denunciada. Penso que qualquer posição pode ser sustentada (e é nosso dever garantir o espaço democrático em que possam ser ditas e defendidas); o problema é quando ela tenta se sustentar pela via (por natureza, excludente) do moralismo, do sanitarismo, da purificação da raça. Aí pra mim reside todo o problema. Enfim, mas o que acabo de citar acima é um contexto de relacionamento apenas, dentro de um assunto para lá de complexo.

O que quero mesmo é continuar escrevendo, com honestidade e responsabilidade a respeito, e sei do grande desafio que me espera. Concordo com, e acolho tranquilamente, o que alguns amigos e críticos já me alertaram, há algum tempo: isso passa por um aprofundamento bíblico inclusive, explorando textos e contextos diversos, o que também pretendo fazer. O que não posso endossar é essa visão de “bíblico” que alguns dos que me interpelam severamente (às vezes me chamando de liberal, humanista e até pondo em cheque a razão de minha fé) apresentam: uma colheita de versículos bíblicos retirados de seu contexto e que, mesmo genericamente, devem embasar o todo de nossa moralidade, mesmo que não tratem especificamente de sexo ou da sexualidade humana. Quem espera isso de mim, está perdendo seu tempo. Duas coisas curiosas: 1) muitos dos textos bíblicos utilizados para refutar minha carta, de fato, nem sequer falavam de sexo; 2) a mesma lógica utilizada para captar frases bíblicas e aplicá-las na discussão foi utilizada com meu texto, extraindo frases fora de contexto para gerar pretextos. A isso me refiro quando digo que falta honestidade intelectual em nossa abordagem a este e a outros assuntos.

Ademais, confesso que me sinto um pouco ridículo tem horas, parecendo ter que discursar sobre um tema no século XXI para pessoas com uma cabeça que beira o medieval. Preciso vencer a tentação de desconsiderá-las, ao mesmo tempo em que tento não me amarrar por causa delas – afinal, não dá para querer ser autêntico e agradar a todo mundo ao mesmo tempo, especialmente os do “mundo evangélico”. É difícil, como difícil é lidar com a própria igreja nestes termos. Mas vamos em frente com a graça de Deus, nem que dando marretadas no ar e acertando a própria cabeça. Afinal, antes perder a própria cabeça que arrancar a do outro por causa das ideias que ali dentro borbulham. Agradeço pelas intervenções, agradáveis ou desagradáveis, que recebi em função desse texto. Me ajudaram e me ajudarão a continuar pensando...

Jonathan