sábado, 19 de fevereiro de 2011

Rindo de ou com Deus?

Na primeira vez em que ouvi essa música (ver no post abaixo) e prestei o mínimo de atenção a sua letra, logo me encantei não só pela hábil maneira com que nela a autora brinca com as palavras, ou pelo tom sereno da voz de Regina Spektor, mas pela assertividade com que trabalha a idéia de “rir de Deus”.

Nas estrofes da música, o “rir de Deus” se refere a variadas situações crônicas da vida, como se dissesse: bem, se é que tem alguém rindo de Deus, certamente não é em um hospital ou em meio a uma guerra, etc. Ninguém (ou quase ninguém) é capaz de rir de Deus nessas horas, não é mesmo? Pelo contrário, é precisamente nesses momentos que mais lembramos que Deus existe – mesmo que tenhamos passado a maior parte da vida negando ou ignorando sua existência. Como diria C. S. Lewis, para muitos, Deus é como um pára-quedas, do qual só lembramos quando estamos em queda livre.

Ao mesmo tempo, na segunda parte do refrão a autora ironiza mais ainda dizendo que Deus pode ser engraçado, hilário até. É claro que se trata aqui de uma idéia de Deus, bastante popular, aliás, de um Deus-joguete dos desejos humanos, que se submete a um relacionamento de barganhas e que está pronto para dar presentes de acordo com o mérito de quem ora certo ou faz as coisas (religiosamente) direitinho. Esse é o tipo de idéia em relação a qual a gente não sabe bem se ri ou se chora. Só não dá pra ficar indiferente.

Paulo disse que não era pra ninguém se enganar porque de Deus não se zomba (Gl 6.7), ou seja, não se faz de Deus um tolo. O apóstolo não está sendo imperativo aqui; não está dizendo “não zombem de Deus”, e sim, “por mais que se tente, não é possível zombar de Deus”, Ele não é zombável. Em outras palavras, Deus não deixa de ser Deus porque deixamos de acreditar nele ou de honrá-lo, e nem é mais Deus porque o honramos, louvamos, glorificamos; Ele não se torna mais Santo cada vez que cantamos “Tu és Santo”. Quando dizemos e fazemos cada uma dessas coisas, no fundo, não é por causa de Deus, e sim por causa de nós mesmos, da necessidade que temos Dele, da gratidão a Ele pelo amor que Dele recebemos, e assim por diante. Não amo o amor pelo amor em si, mas, primeiro, porque fui e porque sou amado.

Não estamos sendo prepotentes demais quando pensamos que Deus precisa de nossos mimos para ser mais Deus, mais Santo, mais Glorioso? Ele já É tudo isso. E o que É não deixará de ser porque alguém disse de menos, e nem será mais do que É porque outro fez de mais. À prepotência humana (minha e sua) de achar que o mundo (e Deus) é seu umbigo é que se destina a bem-humorada ironia da música: no fundo ninguém está rindo de Deus, todos estamos rindo com Ele.

Jonathan

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Laughing with/ Rindo com - Regina Spektor



No one laughs at God in a hospital
(Ninguém ri de Deus em um hospital)
No one laughs at God in a war
(Ninguém ri de Deus em uma guerra)
No one´s laughing at God when they´re starving or freezing or so very poor
(Ninguém está rindo de Deus quando está morrendo de fome, congelando ou muito pobre)
No one laughs at God when the doctor calls after some routine tests
(Ninguém ri de Deus quando o médico liga depois de alguns exames rotineiros)
No one´s laughing at God when it´s gotten real late
(Ninguém está rindo de Deus, quando já é muito tarde)
And their kid´s not back from the party yet
(E é o seu filho que não voltou da festa ainda)

No one laughs at God when their airplane starts to uncontrollably shake
(Ninguém ri de Deus quando seu avião começa a tremer incontrolavelmente)
No one´s laughing at God when they see the one they love
(Ninguém ri de Deus quando vêem que a pessoa que eles amam)
Hand in hand with someone else and they hope they´re mistaken
(Está de mãos dadas com outra pessoa e eles esperam estar enganados)
No one laughs at God when the cops knock on their door
(Ninguém ri de Deus quando a polícia bate à sua porta)
And they say we got some bad news sir
(E eles dizem: temos más notícias, senhor)
No one´s laughing at God when there´s a famine fire or flood
(Ninguém está rindo de Deus quando há fome, incêndio ou inundação)

But God can be funny
(Mas Deus pode ser engraçado)
At a cocktail party when listening to a good God-themed joke
(Em um coquetel quando você ouve uma ótima piada sobre Deus)
Or when the crazies say He hates us
(Ou quando os loucos dizem que Ele nos odeia)
And they get so red in the head you think they´re ´bout to choke
(E eles estão com o rosto tão vermelho que você acha que eles vão engasgar)

God can be funny
(Deus pode ser engraçado)
When told he´ll give you money if you just pray the right way
(Quando dizem que Ele pode te dar muito dinheiro se você orar do jeito certo)
And when presented like a genie who does magic like Houdini
(E quando apresentado como um gênio que faz mágica como o Houdini)
Or grants wishes like Jiminy Cricket and Santa Claus
(Ou concede desejos como o Grilo Falante e o Papai Noel)
God can be so hilarious (Deus pode ser tão hilário)
Ha ha, Ha ha

No one laughs at God in a hospital
(Ninguém ri de Deus em um hospital)
No one laughs at God in a war
(Ninguém ri de Deus em uma guerra)
No one´s laughing at God when they´ve lost all they´ve got
(Ninguém está rindo de Deus quando perde tudo o que tem)
And they don´t know what for
(E não sabem qual é a razão disso)
No one laughs at God on the day they realize that the last sight they´ll ever see
(Ninguém ri de Deus no dia em que eles notam que estão vendo a última coisa que vão ver)
Is a pair of hateful eyes (É um odioso par de olhos)
No one´s laughing at God when they´re saying their goodbyes
(Ninguém está rindo de Deus quando dizem “adeus”)

No one laughs at God in a hospital
(Ninguém ri de Deus em um hospital)
No one laughs at God in a war
(Ninguém ri de Deus em uma guerra)
No one´s laughing at God when they´re starving or freezing or so very poor
(Ninguém está rindo de Deus quando está morrendo de fome, congelando ou muito pobre)
No one´s laughing at God
(Não há ninguém rindo de Deus)
We´re all laughing with God
(Todos estamos rindo com Deus)

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Ainda que... nada serei!


What do you got if you ain't got love?

Há mais de dois mil anos atrás, um tal de Paulo escreveu uma poesia sobre o amor e desde então essa poesia tem inspirado milhares de outras poesias sobre isso. A música “What do you got”, de Bon Jovi, que me inspirou a escrever esse post, segue esse curso. A razão para tal sucesso parece óbvia: a poesia de Paulo não fala de qualquer amor (como o que diz: “amo correr” ou “amo meu carro”), nem tampouco de nossos amores-necessidade (C. S. Lewis) tipicamente humanos; ele fala sobre ágape, o amor divino, e pontua características próprias e vivas desse amor.

Apesar de ser poético, o texto de Paulo é direto, vai à veia do que o amor é na prática; consegue construir uma bela visão, sem deixar de ser realista, admitindo que, embora o amor seja tudo, fora de Deus não é possível vivê-lo em seu mais sublime sentido, e, mesmo que busquemos esse “vínculo da perfeição”, como diz João, ainda assim, continuaremos vendo “um reflexo obscuro, como em espelho”. Ou seja, perseguir o amor verdadeiro é uma vocação interminável, humanamente falando. Podemos encontrar relances do ágape, mas só seremos plenos nele quando Deus for tudo em todos. Até lá...

Bem, até lá, só sei de uma coisa: eu preciso tentar viver esse negócio como sendo o sentido maior de minha existência, como se o ar que eu preciso para respirar me faltasse caso eu... não tivesse amor! Embora ele não me falte, é como se faltasse. Por exemplo: eu não perco meu emprego porque eu não amo, mas é como se perdesse; meu casamento não necessariamente termina se não tiver amor, mas, assim sendo, na prática ele já terminou há muito tempo; minha conta bancária não terá maiores nem menores dividendos porque eu amo, mas existencialmente, sem amor, me sentirei como o mais pobre entre os homens; eu posso falar de amor sem ter amor; posso saber muito sobre Deus, sem tê-lo ao menos experimentado em amor algum dia. E o que eu tenho? O que me resta? Sem amor, nada, só o vazio!

Sei lá, parece que Paulo estava muito certo quando escreveu 1Coríntios 13, você não acha? Quer dizer, essa parada de amar é séria. Amar ou não amar parece não ser uma questão, assim como viver ou não fora d’água não é uma questão para o peixe. Quando nos conscientizamos mesmo disso – e talvez levemos muito tempo ou pouco tempo, tenhamos de apanhar muito ou pouco da vida, pra aprender isso – então, falar de amor se torna algo “fora de moda”; afinal, não é preciso falar muito quando se vive, concorda?

Como observou Zygmunt Bauman: “O amor não se reconhece nas palavras”. Ou ainda, como assertivamente disse Jonathan Rutherford: “O amor oscila na beira do desconhecido além do qual fica quase impossível falar. Ele nos leva para além das palavras. Quando pressionados a falar sobre o amor, procuramos atrapalhadamente pelas palavras, mas as palavras curvam-se, dobram-se, desaparecem”.

É meio que um incômodo esse negócio, e não poderia ser diferente: falar de amor é muito estranho! Até porque, eu não sei se conseguirei colocar isso em prática tanto quanto agora me sinto constrangido e motivado a falar a respeito. Mas acho que aí está a graça da coisa, não? Não saber nos tira do controle, uma vez que o amor não tem nada a ver com controle, tem a ver com vulnerabilidade e incerteza. Amar, diria Bauman, significa estar e permanecer num estado de permanente incerteza. Então, é bom falar de vez em quando. Só que melhor, bem melhor, é viver...

Jonathan