segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

As pessoas não mudam (I)

1. A tese em questão

Há algum tempo, meu amigo Marcos Orison, vulgo Marquinhos, vem compartilhando com um grupo (seleto) de pessoas uma tese que ele defende – talvez não exatamente nova ou original, mas certamente polêmica (especialmente em círculos religiosos) – de que as pessoas não mudam.

Em princípio, a idéia me pareceu estranha e difícil de ser sustentada, sobretudo em consonância com certo discurso teológico (alguns diriam pregação) que afirma que não há estrago que Deus não possa consertar, ou problema que Ele não seja capaz de dar jeito. E “pau que nasce torto, morre torto”? Sim e não, responderiam os defensores desse discurso. Sim, caso a pessoa se abandone a esta situação, e “não” caso se renda aos consertos da marcenaria celestial. Parece que se a fé não vier temperada com um otimismo – ou “a certeza” – em relação ao ser humano, à vida e o que a circunda, deixa de ser “fé” e passa a ser descrença, ceticismo, pessimismo ou coisa que o valha.

Nesse contexto, a fé necessita da mudança (resultados, coisas acontecendo) para ser fé. Por mais correta que pareça, esta perspectiva tende a diminuir, com o tempo, as perspectivas de amadurecimento do crente, que passa a viver uma fé estagnada (no binômio causa-efeito ou problema-solução), obtusa e “sem graça” (literal e metaforicamente falando). Esse tipo de fé, uma fé que tem os olhos e pés longe do chão, tende a perder sua conexão com e relevância para a vida de pessoas de carne e osso (pleonasmo proposital).

Voltando à tese de Orison. Sua explicação – em palavras que não conseguirei reproduzir a contento (ele precisava ter escrito isso) – é de que cada um de nós carrega cargas ou marcas, sejam elas genéticas, comportamentais e/ou culturalmente geradas, que nos acompanham sempre como um rio perene. Quando alguém se converte ao Evangelho, afirma-se que sua vida e sua pessoa mudam – na linguagem paulina, “tudo se faz novo”. Algumas coisas nesse processo, fundamentais suponho, mudarão seu curso. Passamos a apurar o nosso senso de metamorfose. O Espírito revela à nossa consciência que não somos – ou não podemos continuar sendo – o mesmo tipo de gente que costumávamos ser antes desse encontro com Cristo. Os testemunhos surgem, assim, como evidência pessoalmente narrada da mudança: antes eu era “assim”, hoje sou “assado”, sou diferente, me tornei uma pessoa melhor.

Entretanto – e aqui flerto explicitamente com a tese em questão – se observarmos com atenção, e se formos honestos o bastante, veremos que alguns espinhos de outrora continuaram cravados no mesmíssimo lugar, relutando para não sair da carne. A disposição quanto a como os tratamos pode (e deve) mudar. Mas eles, seja lá representação do que forem, continuam lá, resistentes, mesmo que escondidos ou sublimados. A transformação que a fé em Cristo e sua graça produzem não nos faz ex-pecadores, mas pecadores redimidos da inelutável (humanamente falando) escravidão do pecado.

Percebo que, de um jeito ou de outro, continuamos sendo tortos. Ainda cometemos os mesmos erros tão reprovados, ainda nutrimos a mesma espécie de mal tão detestado, e esporadicamente ainda somos tentados – nos rendendo à tentação às vezes – pelos mesmos vícios que por tanto tempo nos assombraram e que a gente achava que, com o tempo e seus tratamentos, desapareceriam. Fracasso? Desalento? Falta de fé ou de perseverança? Não necessariamente. Injetar doses de realismo na fé não significa torná-la menos fé, mas fazer dela uma fé mais honesta e humana. Então, volto a aquiescer com a tese em questão: as pessoas (realmente) não mudam... Mas, até que ponto?

(Continua...)
Jonathan

3 comentários:

Michele irmã do Michelson disse...

Ansiosa para o próximo texto...

patricia disse...

ansiosa pra conhecer o cara que é a fonte da teoria!

Jonathan Menezes disse...

Ansioso por comentários que falem do texto, hahaha. Brincadeira, valeu por passarem por aqui.