sexta-feira, 28 de maio de 2010

Sobre o livro "Missão Integral", de Gondim (final)

No que tange à apreciação crítica da obra, encerrarei com outras considerações, tentando ser mais pontual.

1) Quanto aos marcos conceituais da pesquisa, a saber: (a) O fator identidade – Gondim tenta demonstrar que esse foi o principal impedimento para o crescimento da reputação da MI entre os evangélicos, referindo-se às suas raízes fundamentalistas. Não vejo dessa forma. A mim parece que a variabilidade de “práticas discursivas” entre os representantes é uma razão mais provável. Se a MI fosse tão “fundamentalista” quanto entende o autor (embora tal ligação não seja de todo infundada), talvez alcançasse maior simpatia entre os evangélicos no Brasil, fundamentalistas em sua maioria .

(b) O fator Lausanne – no que tange às “nomenclaturas”, o autor mais complica que esclarece, especialmente em sua abordagem mais histórica, dispersa e generalizante. Mas ao que se refere às diferentes apropriações da MI, por parte do norte e do sul da América, me pareceu pertinente o que ele expôs. Ainda resta saber se haveria, aos olhos do autor, vida para a MI fora da polaridade entre norte e sul.

(c) O fator produção teológica – é indubitável que os teólogos da libertação foram mais eficazes nesse quesito, levando o nome da teologia latino-americana para fora deste continente; que a questão da identidade entre eles foi mais bem (porém não totalmente) trabalhada, para mim, também é ponto pacífico. Todavia, entendo que a crítica do autor ficou muito voltada para o plano conceitual da MI, com foco nas questões, já pontuadas, do conservadorismo e da polarização, e não levou em conta a práxis, ou o que se fez em termos de MI no continente para além das conferências, consultas e debates teológicos. Diante desse silêncio, o que o autor quis dizer em sua palestra no CBE 2, quando afirmou que precisamos celebrar porque “fizemos Missão Integral” nesse país?

2) Quanto à agenda e os desafios por ele propostos à MI. A agenda se concentra apenas no campo teológico. O autor até fala algo sobre “práxis transformadora”, sem, no entanto, direcionar a campo algum. Ele menciona quatro pontos a ser discutidos para um “avanço” maior: a antropologia da queda, a questão da teodicéia, as contradições internas à MI, e a doutrina da soberania divina. A última, segundo ele, “repete a doutrina calvinista da providência quando afirma um teísmo quase fatalista” (p. 147). As maiores preocupações do autor são teológicas. Mas ele quase que “legisla em causa própria” ao atrelar a sua agenda (a da TR) a uma possível agenda da MI, à medida que questiona a crença evangelical na soberania de um Deus que determina os mínimos detalhes da história.

Por exemplo, na conclusão ele afirma que na maioria dos textos sobre missão está impressa a idéia de que “Deus é soberano e que tudo está sob seu controle”. O desafio que ele propõe, de modo inverso, é que cabe “à Missão Integral responder até que ponto a miséria da América Latina seria plano dele” (p. 147). Diante disso, tenho duas questões: Será mesmo que os pensadores e adeptos da MI são tão deterministas ao ponto de não ter uma resposta mais honesta e realista para essa questão? E qual teologia, por mais eficaz que seja, seria capaz de perscrutar os planos ou intentos divinos suficientemente para poder responder a contento essa pergunta?

Por fim, não obstante às críticas ora tecidas a respeito da presente obra, entendo que não é menos oportuno recomendar sua leitura aos pesquisadores ou interessados na temática da Missão Integral e seus derivantes ou derivados, visto que se trata de uma produção recente na área; também porque é uma entre as raras produções já publicadas especificamente sobre esse assunto; mas, mais do que isso, porque, ela mesma, com suas virtudes e defeitos, como toda produção literária, científica ou não, deixa lacunas e, com elas, abre avenidas de possibilidades para continuarmos pensando a MI, seja a partir da revisão de antigos paradigmas, seja a partir da invenção de novos. Assim, faz-se teologia através do diálogo, em concordância ou confronto com as perspectivas existentes. Teologia é fruto do caminhar, é resposta ocasional.

Jonathan

Um comentário:

Koisa disse...

Brother Jon,
Li sua resenha sobre o livro ora mencionado.
Sua análise é profunda e demonstra uma leitura atenta do texto. Também li a mesma obra e realmente ela é "lacunosa". Penso em fazer similar resenha, apenas que me falta motivação.
Avante para o posto que lhe pertence.
abs
AC