terça-feira, 7 de abril de 2009

As tradições, o Evangelho (Final)

As dinâmicas do evangelho nos levam a perguntar: de que vale um exterior limpo, se lá dentro, lá no fundo, há muita sujeira escondida? Jesus diria: “Limpa, limpa primeiro, fariseu, esse teu interior, porque a limpeza de fora é conseqüência. Tira a trave do teu olho antes de acusar o cisco no olho do teu irmão”. E quantas traves não passam despercebidas, quantos camelos não são engolidos com muito sal e pimenta – o orgulho, a hipocrisia, a falsidade, a opressão, a injustiça, a mentira, o egoísmo... Esses não são pecados? Mas na aparência... Ah, quanta beleza! Falsa beleza, sórdida e feia “beleza”, “beleza americana”.

E qual deve ser a resposta de cristãos autênticos a esse modo de vivência que nos cega e emudece em relação à manifestação de Deus? Quanto a mim, gente, eu prefiro me juntar ao Brennan Manning e dizer: Eu sou um maltrapilho do Pai! A resposta mais honesta e humanizadora para mim é: “Eu quero ser pobre de espírito”. Chega! Basta de viver a ilusão de que existe algo nessa vida que me preenche e completa mais que a graça. Cansei de lastimar por meus fracassos mais óbvios, de me autoflagelar por causa de minhas limitadas habilidades e sofrer com o golpe diário da reprovação. Deus já me aprovou para sempre quando, em Cristo, disse: “Está consumado!”.

Não consigo e nem preciso me adequar aos caminhos infrutíferos para o reino dessa visão legalista de pureza que por aí se tem pregado. Não! Não é preciso ser menos humano para ser puro na presença de Deus, nem é necessário negar aquilo que de natural e bom ele criou para ser santo. Quero, sim, aprender o que é o amor incondicional do Pai, a adentrar no mundo das pessoas, mesmo quando não me identifico muito bem com esse mundo, às vezes tão diferente do meu. O universo dos “pequeninos” de Deus: as criancinhas, os pobres e oprimidos, as prostitutas e os cobradores de impostos. Nada do que é humano me pode ser estranho. Quero, por fim, corroborar com as seguintes palavras de Manning:
“Quanto mais crescemos no Espírito de Jesus Cristo, mais pobres nos tornamos – e mais percebemos que tudo nesta vida é um presente. A tonalidade fundamental da nossa vida passa a ser ação de graças humilde e jubilosa. A consciência da nossa pobreza e de nossa inépcia leva-nos a regozijar-nos na dádiva de termos sido chamados das trevas para a maravilhosa luz e transportados ao Reino do amado Filho de Deus. O homem ou a mulher pobres escrevem ao Senhor nove cartas que dizem: ‘Bom é’. Numa conversa, o discípulo que é verdadeiramente pobre no espírito sempre deixa a outra pessoa com a sensação de que a vida do discípulo foi enriquecida por ter conversado com ela. Não se trata de falsa modéstia nem de humildade fingida. A vida dele ou dela foi de fato agraciada e enriquecida. Ele não é apenas escapamento, sem abertura para a entrada de fora. Ele não se impõe aos outros. A pobreza espiritual dela a capacita a adentrar o mundo do outro mesmo quando não é capaz de identificar-se com esse mundo – por exemplo o mundo das drogas, o universo gay. Os pobres de espírito são as menos condenatórias das pessoas; convivem bem com pecadores. O homem ou a mulher pobres do evangelho reconciliaram-se com sua existência falha. Estão conscientes de sua falta de inteireza, sua incompletude, o simples fato de não apresentam de forma alguma os requisitos necessários. Embora não apresentem desculpa para o seu pecado, estão humildemente conscientes de que o pecado é precisamente o que os levou a se atirarem à mercê do Pai. Eles não fingem ser mais do que são: pecadores salvos pela graça”.

(Brennan Manning. O Evangelho Maltrapilho. São Paulo: Mundo Cristão, 2005, p. 81-82).
Jonathan

2 comentários:

Daniel Guanaes disse...

Pois é, Jonathan. O problema é que limpar lá dentro dá mais trabalho e se identificar como "maltrapilho do Pai" é colocar muita coisa a perder, né. É o caminho; mas ele é estreito demais pra um povo evangélico que só sabe andar em massa e olhar pra cima; desaprendendo a cada dia o valor da individualidade e da interioridade.
Abç
Daniel

Jonathan Menezes disse...

Sem dúvida, Daniel. Acho que a primeira coisa que deveria ser dita ao novo convertido é: prepare-se, porque você vai sofrer! E não: ah, agora é só vitória, só benção, só alegria meu irmão. Não há vitória sem derrotas, ressurreição sem cruz, benção sem escassez, alegria sem tristeza. O grande problema que vejo é que temos nos rendido facilmente aos apelos dessa massa. E tal rendição, muitas vezes, implica na morte da fidelidade. Fomos chamados à fidelidade, o que pode incluir a insatisfação e não apenas a satisfação das pessoas. Precisamos reiterar nossa paixão pela igreja nos dias de hoje? Estou cada vez mais convencido que sim. Mas precisamos dizer em voz alta que essa igreja não pode querer continuar formando "vencedores", ela precisa formar gente, seres humanos, inteiramente dependentes da graça.
Valeu,
Jon