quarta-feira, 17 de março de 2010

No jardim da filosofia (I): A planta do esclarecimento

Quero pensar, alegoricamente, na Filosofia como um grande jardim. Um jardim complexo, é verdade, pouca gente se arrisca a passar por ele; muitos o negam, não conseguindo encontrar sentido e função para a existência desse jardim. E estes ainda acusam aqueles que ingressam nesse jardim como sendo loucos, excêntricos, ou quem sabe gente que fala numa linguagem que a maioria das pessoas não entenderia, e até por isso, não darão a mínima...
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Pensemos que esse jardim (filosofia) tem um solo (aqui entendido como a história da filosofia), um solo fértil de onde brotam todas as flores e plantas (os filósofos e suas correntes), todas elas derivadas (ou derivadoras, diriam alguns) de uma grande árvore, a “árvore do conhecimento”. Afinal de contas, o conhecimento e suas infinitas conexões com a vida e com o “real”, em termos de possibilidade ou de impossibilidade, são áreas de interesse filosófico. Imaginem que neste solo surgem diferentes espécies de plantas ou de pequenas árvores, que produzirão frutos na medida de sua posição no solo, e sua perspectiva ou posição em relação à árvore.
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Num certo lugar desse jardim, em uma dada posição no solo, surge a planta do esclarecimento. Essa planta queria representar uma espécie de “virada na flora do jardim”. Ela nasce pautada na argumentação de que as plantas até então existentes no jardim viveram debaixo de tutelas de plantas parasitas da árvore do conhecimento, ligadas a uma força estranha chamada de Física do andar superior (a metafísica, para os filósofos). E que as grandes culpadas disso eram elas mesmas, pelo mau-uso da “seiva” (representação da razão) que a todas é peculiar. O que importa para essa planta não é tanto o quê se deve saber, mas como podemos saber. E para estabelecer os modelos do “como”, ela, primeiro, apresenta os “limites desse saber”.
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A produção de frutos (conhecimentos por derivação), portanto, está vinculada a esses limites. O reconhecimento deles permite que se chegue ao verdadeiro esclarecimento. O verdadeiro conhecimento que brota da árvore-mor é conhecimento concreto, de coisas concretas (fenômenos), e não conhecimentos que pertencem ao mundo imaginário das flores do céu. Pautados nesse mundo imaginário das flores do céu, é que o jardim se viu contaminado por um falso conhecimento, gerador de subordinações (tutelas) improdutivas, que serviram, até então, como impedimento ao esclarecimento.
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Porém, como eu disse, há outras “flores” no campo, plantas dissonantes, raízes que não se desprenderam do solo, mas que clamam por vida e sustentação (pensamento) próprios. E uma dessas flores foi uma rosa vermelha espinhosa chamada martelo. Ela nasce de uma inquietação já presente no campo por meio de pequenos jardins e cores que foram arrancados dali por se julgar que não contribuiriam para o alvorecer da era do esclarecimento. Mas esse esclarecimento ultrapassou os limites por ele mesmo criado. E essa rosa martelo ataca as fraquezas, escancara os limites da era do esclarecimento no jardim.
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Uma de suas acusações é de que a era do esclarecimento criou uma oposição entre a organização (ciência) e a beleza (arte). Para que houvesse mais organização era preciso ter menos beleza, pois se cria que os reflexos da beleza prejudicam a boa organização no jardim. Somente uma boa organização, destituída de beleza, seria capaz de conduzir as pessoas à verdade, produto tão requerido pela árvore do conhecimento.
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(Continua...)
Jonathan

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