quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Não é proibido pensar (Final)

(Rótulo 3) “O mundo pós-moderno é o das sensações em detrimento das percepções, do espiritualismo, e é a era da desrazão”.

Revanche do sagrado – é assim que muitos caracterizam uma faceta do momento “pós-moderno” – contradizendo profecias do séc. XX que declaravam o “fim da religião”. Essa percepção é reforçada se considerarmos o crescente interesse em espiritualidade (religião banhada em sentimento), aliado a um desinteresse por estruturas mais racionalistas e hierárquicas. Mas não é tudo o que se pode dizer sobre esse momento, e chamá-lo de era da desrazão pode não passar de caricatura, em se desconsiderar outras possibilidades...

Há outra perspectiva sobre isso que diz que a mudança não está em rejeitar a ciência ou abandonar a razão, mas visualizá-las sob outro ponto de vista. Nesse sentido, como já disse outrora, o pós-moderno faz uso da razão, constrói juízos e até admite algumas certezas, porém, reconhecendo os limites de sua razão, a provisoriedade de seus juízos e as dúvidas presentes mesmo em suas certezas.

Outra questão está na supressão das emoções no passado, que no presente redunda numa avalanche de emoções, de carência, e de necessidade de relacionamento. Conversar com quem quer prova racional, lógica e exata de tudo é muito chato, e vejo que há um reconhecimento crescente disso – que pode se expressar em desilusão e resignação, ou em busca por algo novo.

A diferença entre a apologética de hoje e a de ontem é que não temos mais de colocar um valor excessivo nas evidências lógicas como prova racional de nossa fé, mas damos também valor às ações, histórias vividas e contadas, aos relacionamentos. O relacionamento passa a ser o lugar onde podemos com a vida compartilhar a nossa fé, não ignorando argumentos racionais, mas passando a dar mais valor a perguntas honestas e a respostas honestas.

E a fé, segundo Brian McLaren, “é o contexto no qual é possível explorar os mistérios que fundamentam essas perguntas”, e, acrescento, sem ter de recorrer a respostas fáceis e evasivas... Durante anos a fé tem sido atacada de várias formas. Às vezes justamente, em outras injustamente. Exercemos nossa fé em meio a bons e maus exemplos. E as pessoas se apegam muito aos maus exemplos (talvez porque eles sejam mais visíveis) e estão cansadas desse tipo de religião – de dogmas, escravidão, guerra, opressão e morte. Mas ela não tem a última palavra...

McLaren apresenta a visão de uma religião na qual podemos nos alistar na luta contra o mal:
"A religião que enxerga o orgulho dos fariseus ‘aqui dentro’ e a devoção das prostitutas ‘lá fora’, a religião que ouve satanás sussurrando aos ouvidos do discípulo mais importante e que enxerga o amor exemplificado no viajante samaritano – essa religião irá inspirar a sua lealdade. A religião que reconhece sua inutilidade quando é só discurso sem ação... essa religião as tirará da cama no domingo de manhã. A religião que enxerga a verdadeira fé onde quer que ela se encontre – incluindo um ‘forasteiro’ de um contexto ‘errado’, tal como o centurião romano ou a mulher sírio-fenícia (Lucas 7.1-10 e Marcos 7.24-30) – e não somente vê, mas também a confirma, aceita, recomenda, celebra – essa religião as conquistará para a vida inteira. Mas espere! Não estamos falando sobre o reino de Deus, proclamado e demonstrado por Jesus Cristo?” (Brian McLaren. A igreja do outro lado, p. 125).
Que continue havendo sempre um grupo honesto e fiel de cristãos que não sacrificam seu amor e fidelidade ao reino no altar do fanatismo e das balburdias balaônicas de nosso tempo.

Jonathan

Um comentário:

Thiago disse...

Como Samuel Escobar diz, na pós-modernidade Jesus não precisa provar ser revolucionário, lógico, religioso,capitalista, socialista, etc. Ele é quem realmente é, não precisamos encaixar Ele dentro de nossa ideologia.

“To be human means to be called to interpersonal communion”, because the image and the likeness of the Trinitarian God are the basis of the whole of “human ‘ethos', which reaches its apex in the commandment of love” (paras. 33 - Compendium of the Social Doctrine of the Catholic Church).

Muito boa essa série.
Logo vamos postar no nosso blog uma série semelhante, mas bem menos comportada.

abracos