Assumir a sua, a minha, a nossa prodigalidade é parte de nossa condição humana, para ser mais humanos. Eis a visão da alegoria bíblica do “filho pródigo” em Lucas: não existe ninguém que, em alguma dimensão ou extensão de sua vida precária, não seja/ esteja perdido...
Então, quando dizemos, por exemplo, que a missão da igreja no mundo é conduzir “gente perdida” a Deus, o que isso efetivamente quer dizer?
Para muitos, na prática isso significa que já fomos achados, estamos na casa do Pai, que tudo está sob perfeito controle, portanto não somos perdidos, os “outros” é que são.
Se nutrirmos algo semelhante em nosso coração, não podemos estar mais fora do prumo divino, pois denegamos nossa condição humana precária e carente da graça em nome de algo “maior”; usurpamos uma suposta divindade e, uma vez mais, aceitamos a oferta da serpente.
Essa história, contudo, mostra que é possível permanecer perdido, mesmo sem nunca se deixar perder, sem nunca ter partido, como é o caso do filho mais velho.
Esse é um dos paradoxos da parábola: quando dizemos que já fomos achados, que nada mais resta para ser redimido, aí é que perdidos estamos e de modo permanente, invisível. Quando, porém, reconhecemos que perdidos estamos, mesmo que por pouco, significa que há esperança de ser encontrado ou reencontrado...
Isso, no entanto, não é a desgraça da missão de Deus, mas a sua qualidade; a assunção de nossas fraquezas e da condição humana é o que nos torna úteis nesse mundo. Parafraseando Segundo Galilea, o que não pode ser assumido também não pode ser redimido. Cristo assumiu nossa condição para, só então, redimi-la.
Sendo honesto, então, preciso admitir isso: sou um eterno reincidente! Não há um dia sequer de minha vida em que, por muito ou por pouco, eu não caia. Essa é uma verdade inconveniente sobre mim: eu vivo caindo! Nem todos sabem; poucos gostam de admitir, mas Deus o sabe...
A inconveniência dessa verdade está não somente no fato de que ela me expõe como pessoa, mas também de que ela mostra que o cair não precisa ser inimigo do estar de pé, de levantar, de poder se reerguer. Na verdade, como diz o ditado, “para cair, basta estar de pé”. Ou, melhor ainda, como disse Paulo, “quem pensa estar de pé, cuide para que não caia”. Cuide, e não negue; cuide, e não reprima; cuide, o que significa, lide com a possibilidade sempre iminente da queda...
Por isso, é importantíssima no filho mais jovem a atitude de reconhecimento, em que se admite: “Estou perdido”! Sem isso, não há encontro possível. Quem nunca se sentiu perdido na vida não pode reconhecer a alegria e a satisfação de ser encontrado...
De muitas e variadas formas eu fui encontrado, assim como de muitas e variadas formas eu continuo perdido; tentando não cair, e ainda assim caindo vez por outra; levantando-me pela graça e tentando prosseguir na força que Deus, a família, os amigos, a comunidade suprem.
Assim sou eu, assim é você, e assim também é Deus. Como assim, Deus? Sim, Deus! Ao reler a parábola, percebo que não somente os dois filhos são as figuras vulneráveis e perdidas da história. O pai também é. Não da maneira dos filhos, é claro; o pai é “perdido de amor”.
É essa imagem de Deus que a parábola me revela: de um Deus de amor, que também se encontra “perdido” em busca de seus filhos perdidos e não descansa até que, finalmente, os encontre. Um Deus que nos ama com um amor incondicional, incansável, imponderável, insano e nada justo aos nossos olhos. Um amor que, como defende Brennan Manning, “abraça a todos sem exceção. De novo, o amor de Deus é tolo”. Desejo aprender mais dessa tolice divina para, quem sabe, me encontrar mais humano.
Jonathan
Um comentário:
Ao ler seu comentário sobre a figura do Pai, lembrei-me da afirmação de Moltmann sobre o sofrimento de Deus. Diferente de nós, que sofremos por carência de ser, Ele sofre justamente pelo transbordar do que é: Amor.
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