terça-feira, 4 de setembro de 2012

Uma fé “fora da caixa”

fora da caixa

Escrevi estas linhas, motivado pela pergunta feita por amigos-irmãos de uma comunidade nascente em São Paulo, chamada “COLETIVObeta”. Na ocasião de minha fala e participação em uma das reuniões do grupo, iniciei considerando que a fé cristã não existe à parte do contexto histórico e cultural em que é concebida. Antes, é permeada, influenciada e modificada por ele. Logo, não existe fé “pura”, no sentido de incontaminada em relação ao ambiente, as pessoas, os coletivos, suas práticas, suas ideias, seus costumes, etc. De modo que esse negócio de “fé fora da caixa” pode não passar de uma perspectiva ingênua – já que todos nos encaixamos em algum esquema, quer admitamos ou não (como bem observou na ocasião meu amigo Hilton Isleb) – mas também (e penso que assim deve ser) uma tentativa de constantemente repensar e de novo situar a fé, de acordo com as transformações pelas quais o mundo passa e nós, mundanos, também passamos.

Assentindo positivamente com a proposta de meus amigos, traço aqui, em breves, algumas ideias sobre o que seria essa tal “fé fora da caixa”.

1. É aquela que se reconhece como dádiva e, portanto, que diz: Eu “estou na fé”. Não trata a fé como posse, porque se é posse a gente guarda na caixa, no armário ou embaixo da cama e a luz (de Cristo) não pode brilhar ali... A fé, definitivamente, não existe para ser “guardada”, mas para ser expressa, para brilhar e salgar.

2. É a fé que abandona a linguagem que diz “minha fé”, por entender que fé cristã se gesta comunitariamente. A conversão pode ser a razão pela qual passamos a viver na e pela fé, mas a comunidade é o que sustenta, desafia e impulsiona a fé a outras possíveis conversões. Ademais, fé que não se converte ao outro não pode ser chamada “cristã”. No máximo se traduz por uma crença, como uma opinião: você crê daquela forma, você crê em Deus, mas sua vida não se move do jeito de Deus. Ao modo como Tiago já dizia: Você acredita em Deus? Beleza! Mas deixa eu te avisar: até os demônios crêem e temem. No final das contas, se nada opera ou transforma, a fé é como um cadáver, uma fé necrófila – amiga da morte, não da vida.

3. É aquela que não pode simplesmente se perder, num vaivém de “tinha e agora perdeu” – pois se não é propriamente minha, vai se perder como? A fé que se perde é aquela que nem bem se achou, e é preciso então perguntar se o que se perdeu não pode ser essencial ao ser verdadeiramente achado na fé. Ser achado na fé é ser achado livre, aceito pela graça e amado como filho de Deus e firmado na esperança da consumação no reino.

4. É ainda uma fé que não teme os riscos, que não tenta se blindar contra o mundo nem contra a humanidade, a começar pela própria. É, portanto, uma fé frágil, tanto por habitar em “vasos” quebráveis, como porque está fora e não se furta de se expressar ao mundo, porque não se envergonha daquele que é a razão própria de sua existência: Jesus! A fé que não tem vergonha de Jesus não cria adornos para ele. Ela assume sua identidade radical como necessariamente mansa e humilde de coração, de um fardo que é leve e suave, mas também de uma atitude rebelde e causadora de problemas, pois veio trazer espada e não “paz” ao mundo – pelo menos não essa paz artificial e sem justiça que ele almeja muitas vezes.

5. Por fim, porque não “se ganha” e, assim, não teme “se perder”, a fé fora da caixa é uma fé chamada a pensar, discernir e, diariamente, reinventar a si mesma diante de Deus e de seu contexto. Isso significa que a fé fora da caixa é uma fé que, apesar do firme alicerce espiritual que tem em Jesus, não se despe da dúvida, da incerteza e da indeterminação próprias do viver humano, especialmente no tempo atualmente vivido. Antes, a fortaleza da fé é que ela é uma certeza em meio a incertezas (cf. Hb 11.1). Enfim, a natureza da própria fé a conduz para fora da caixa, pois não se pode aprisionar o Espírito, que é quem a vivifica. Esse é o grande problema que o Espírito gera para a pessoa de fé: é que ele é livre e atua em liberdade. Uma fé escrava, comodamente encaixotada, não se deixa orientar pelo vento do Espírito, pois é o Espírito quem promove a liberdade para se viver a vida de Cristo de modo autêntico no mundo. Quem tem ouvidos, ouça...

Jonathan

(Imagem: ideiaseacao.com)

Um comentário:

FLAVIANNE disse...


Oi!

Tudo bom?!

Gostei muito do texto!

São poucas palavras, mas encontrei em meio a elas respostas de perguntas silenciosas!

Abç.