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Ao abordar o mito narcísico, Rosset afirma que a fragilidade ontológica de Narciso, que o levou à aniquilação de si, não foi a apreciação, o amor ou a grande aceitação pelo seu “eu real”, mas sua fixação em uma espécie de “duplo psicológico”, ilusório. Ou seja, essa interpretação nos conduz a pensar que aquilo que Narciso contempla embevecido, na verdade, seria a sua não-realidade, uma representação (desejável) de si mesmo, da qual ele necessita para continuar existindo, para além do desespero de não ser.
A mortalidade – preceito de que a existência tem um fim previsto, embora o momento do fim seja imprevisível – já afirmara Paul Tillich em A coragem de ser (1972), é uma das grandes fontes geradoras de aflição e ansiedade no ser humano, à medida que ela representa uma ameaça constante ao ser. Contudo, como assevera o próprio Tillich (1972, p. 42), “se a ansiedade fosse só ansiedade do destino e da morte, a morte voluntária seria o caminho para sair do desespero”, de tal maneira que a coragem requerida não seria a de “ser”, mas a de “não ser”.
Nesse sentido, as perspectivas de Tillich e Rosset se aproximam, à medida que este último defende que a angústia do sujeito, mais do que a própria morte, provém de sua não-realidade, sua não-existência. Em outras palavras, a pessoa narcísica sofre por perceber que o ideal de si não corresponde à realidade, que é cruel. Sendo esta cruel, ele precisa de outra “dose cavalar” de seu duplo, sua representação, que oferece, segundo Rosset, não a si mesmo, “mas seu outro, seu inverso, sua projeção segundo tal eixo ou tal plano” (Rosset, 2008, p. 91).
A “ilusão voluntária” consiste no efeito psicológico tranqüilizador produzido pela representação no espelho; no encontro com meu outro, penso estar em contato comigo mesmo.
Jonathan
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