quarta-feira, 19 de junho de 2013

Meu caminho até “Humanos, graças a Deus”

Humanos-Caminho

Gostaria de aqui endereçar alguns fatores indicativos de um caminho que me conduziu até a redação final desse livro, publicado pela Novos Diálogos Editora, sob o título de Humanos, graças a Deus! Em busca de uma espiritualidade encarnada. Aqui vão eles:

1. O livro não nasceu como livro, primeiramente, escrito de "cabo à rabo". Foi escrito no caminho; ou seja, são escritos de uma caminhada de mais ou menos 4 anos – caminhada de vida, teológica, de sala de aula, de pesquisas, de observações, de vivência da fé pessoal e comunitária e, é claro, de corridas. Muitos deles nasceram de conversas, outros de reflexões em sala de aula, outros de respostas a indagações de leitores – a quem eu carinhosamente chamo de “co-transgressores” – feitas em outros textos que escrevi no blog Escrever é Trangredir. Mas, o mais fascinante para mim, é que eles nasceram de um lugar de liberdade, pois a escrita é isso: um lugar de liberdade! E como liberdade, citando Roland Barthes, “a escrita não é mais que um momento”. Esses escritos são produtos de instantes vividos, e de escolhas que fiz ao partilhar meu olhar sobre esses instantes.

2. Embora não tenha sido programado de antemão, há nele um cantus firmos, um fio condutor, que despretensiosamente, embora não casualmente, foi se desenhando, e que é endereçado pelo título – uma espécie de afirmação-celebração e denúncia-protesto ao mesmo tempo: a de que somos humanos, e graças a Deus por isso!

3. Qual seria a razão dessa preocupação e de onde ela brota? Eu diria que ela não nasce de hoje, uma vez que, primeiro, esse é um clamor bíblico – pela humanização da pessoa – que vemos repercutir nas narrativas bíblicas e, de modo especial, em Jesus; segundo, porque continua reverberando em autores que me influenciaram, só para citar alguns: Kierkegaard, Ellul, Buechner, Peterson, Manning, Cavalcanti, Rosset, Monteiro, Unamuno, Nietzsche, Urteaga e tantos outros. Mas um autor que merece uma especial menção aqui é Henri Nouwen, sem dúvida a principal influência desse livro. Nouwen endereçou essa questão – a de nossa humanização – menos ao modo de uma discussão em seus livros, e mais ao modo de uma autobiografia ou de uma transgressão de si. De modo que quem lê Nouwen lê sua vida, e percebe o verbo encarnado o tempo todo e de inúmeras formas, não somente belas e alegres, mas também feias e tristes. Nouwen foi um dos primeiros (e poucos) a me fazer perceber que na espiritualidade cristã não somos transfomados para caminhar, somos transformados enquanto caminhamos e enfrentamos, à duras penas muitas vezes, os desafios, as alegrias, as tristezas, a leveza e a dureza do caminhar. É assim que a gente cresce, amadurece e aprende a ser humano e a andar perto de Deus e das pessoas ao mesmo tempo.

4. Penso que essa preocupação também nasce de inquietações do tempo presente, minhas é claro, mas não minhas apenas, de muita gente. Tenho impressão de que uma porção de nossa humanidade como existência, como identidades, como razão de ser, tem sido decepada por um certo espírito do tempo ou por um projeto de ser humano, que a religião cristã certamente ajudou a construir, que tem a ver com eficiência, santidade, perfeição, indefectibilidade, e que a gente não deu conta de viver. E, não dando conta de viver, escoamos nossas frustrações de várias formas, pela via do niilismo, do espiritualismo, do relativismo ou simplesmente do grito incontido que parece dizer: "Eu tenho o direito (natural) de ser imperfeito, de estar errado" – embora não necessariamente me resigne ao lugar do erro, invariavelmente passo por ali.

5. Então, esse livro vai ao encontro dessas inquietações, procurando ou buscando uma espiritualidade encarnada, procurando se parecer com Jesus de Nazaré, o Deus que se fez ser humano e tão lindamente humano, que só podia ser Deus. Como disse Thomas Merton, “é um destino glorioso ser membro da raça humana, ainda que seja uma raça dedicada a diversos absurdos e que cometa terríveis erros: mesmo assim, Deus em sua glória tornou-se membro da raça humana! Um lugar comum como esse de repente pode ser como possuir um bilhete premiado de uma loteria cósmica”.

Permitam-me citar aqui dois trechos do livro, e com eles termino essa breve descrição de caminho. O primeiro diz respeito precisamente a essa busca que me move neste livro:

Mas o que busco, afinal? Uma experiência, um modo de ser, pensar e agir que preconizem a convergência entre o cristão e o humano, entre o santo e o profano, entre ser discípulo e ser gente, de acordo com o tipo de gente que Jesus foi — verbo encarnado, chamado de “glutão e beberrão”, amigo de pecadores, que chorou, sorriu, festejou e sofreu. E, mais que isso, defendo que viver a fé cristã, buscando fidelidade ao Cristo, não nos isenta de ter de encarar a nós mesmos tal como somos no mais profundo do ser, nossas virtudes e bondade, bem como idiossincrasias, pecados e demônios. Lembrando do que disse Padre Brown, personagem de G. K. Chesterton: “Sou um homem... e, por isso mesmo, tenho todos os demônios do mundo em meu coração”. E, também, das palavras autobiográficas de Leonardo Boff: “Participo, penosamente, da condition humaine onde vige a porção sim-bólica junto com a porção dia-bólica. Sou teólogo mas também pecador. Peregrino e também me desgarro. Por isso sou devedor de desculpas e suplicante de perdão” (p. 19).

Por fim, as palavras de Paulo Freire, que foi um admirável ser humano e brilhante educador, que me inspiram a gostar desse paradoxo que é ser humano:

Gosto de ser homem, de ser gente, porque não está dado como certo, inequívoco, irrevogável, que sou ou serei decente, que testemunharei sempre gestos puros, que sou e que serei justo, que respeitarei os outros, que não mentirei escondendo o seu valor porque a inveja de sua presença no mundo me incomoda e me enraivece. Gosto de ser homem, de ser gente, porque sei que a minha passagem pelo mundo não é predeterminada, preestabelecida. Que o meu “destino” não é um dado, (sic) mas algo que precisa ser feito e de cuja responsabilidade não posso me eximir. Gosto de ser gente porque a História em que me faço com os outros e de cuja feitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de determinismo (p. 61).

É isso, minha gente. O restante, se curiosos/as estão, vocês terão de ler no livro...

Jonathan

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Afinal, que país é esse mesmo?

Assistir (mesmo que de passagem) esse início de cobertura da Copa das Confederações 2013 na Rede Globo pode dar a estranha experiência e sensação de que existem vários países "em campo": 
1. Dos que vestem a camisa milionária da seleção e pisam nos campos bilionários da bola (mas estão "cagando e andando" pro Brasil); 
2. Dos que batem palma pra grande cobertura multi-tecno-digital da todo-poderosa, que, por sua vez, só noticia aquilo que, e do modo como, convém (afinal, o maior interesse é manter acesa a paixão dos brasileiros na seleção, os olhos bem fechados para todo o resto, para que o bolso dela, Globo, e de seus investidores, se mantenham bem cheios de $); 
3. O país minúsculo dos que protestam – usando importante questão do problema do transporte em São Paulo e no Brasil (mas que é só, como se diz, “a ponta do Iceberg”) – contra o descaso do governo, as múltiplas e generalizadas injustiças sociais e o abismo entre o país dos "descamisados" e o dos alienados, que "vestem a camisa" com muito orgulho de ser brasileiro, a despeito do que acontece no Brasil; 
4. O país dos indiferentes, que não estão nem aí para uma coisa e nem outra, mas que assistem tudo de camarote como se nada disso “lhes representasse” ou dissesse respeito; 
5. O pequeno país dos mandatários do poder político-econômico, que literalmente fazem a "máquina girar" (para o bem e para o mal), e que precisam continuar fazer a caravana prosseguir enquanto "os cães ladram", mas "não mordem" (mesmo que passando como rolo compressor sobre os direitos e reivindicações dos cidadãos e cidadãs, e usando a violência e repressão quando preciso); 
6. O grande país dos bestializados (usando aqui, não pejorativamente, a metáfora de José Murilo de Carvalho), que assistem ou não a tudo isso meio tontos, sem saber bem o que dizer, o que fazer, para onde ir, que posição tomar, afinal, antes de tudo, precisam mesmo é sobreviver; 
7. E assim por diante... [inclua aqui o que faltou, pois muito sempre falta para possivelmente descrever ou analisar situações tão complexas]. Como diria Carlinhos Veiga, há muitos "Brasis" dentro do Brasil. E é realmente uma pena que ignoremos tanto essa múltipla e complexa realidade, que continuemos parados, estacionados, de braços cruzados, "só orando", só lamentando, só escrevendo na timeline do Facebook. Bem disse Gabriel O Pensador: "Até quando a gente vai levando porrada, porrada", e vamos ficar sem fazer nada? Bem, certamente tem gente fazendo alguma coisa, fazendo o que pode, fazendo o possível para simplesmente não viver conformado com o que aí está posto ou in-posto. Seja o que for, um processo de descoberta, em meio a esse pandemônio, é necessário: do que significa ser "cidadãos e cidadãs brasileiros"! Mais que apenas geradores ou apoiadores de protesto, apenas torcedores, apenas céticos, apenas consumidores, apenas isso ou aquilo... precisamos utilizar momentos como esse como oportunidades para discutir um projeto ainda em construção: o que implica e de que jeito podemos ser, mais assertivamente, cidadãos e cidadãs! 
Admito certa indecidibilidade a respeito da cidadania no mundo "líquido-moderno" (Bauman), mas estou tentando compreender e, enquanto isso, fazer o que posso. Só não dá pra sentar na poltrona, sintonizar na Globo, curtir a fabulosa transmissão, mesmo que sem grande empolgação pela seleção, e fingir que nada está acontecendo. Comida é coisa boa; diversão e circo também; só não dá pra "bater palma pra palhaço" enquanto a grande tenda está literalmente em chamas, e vendo a platéia pegando fogo. Viver, já diria Robinson Cavalcanti, é tomar partido... E que Deus nos ajude e nos conscientize bem ao tomarmos o nosso, pois Ele, certamente, já tomou o Dele e deixou claro o que Ele quer de nós. Vale a pena que lembremos outra vez do profeta Amós (5:24):
Alguém aí sabe o que eu quero? Eu quero justiça – um mar de justiça. Eu quero integridade – rios de integridade. É isso que eu quero. Isso é tudo que eu quero...

Jonathan

quarta-feira, 5 de junho de 2013

O que os amigos dizem de “Humanos, graças a Deus” (Parte 3)

Convite Humanos

Ao começar a ler este livro do meu amigo Jonathan Menezes tive a impressão de que ele também estava me convidando para uma caminhada, onde sou levado a, de forma atenta, ouvi-lo em profundo silêncio e a considerar, sem pressa, suas ponderações. As palavras aqui contidas não são filhas do agito, todo o contrário, foram geradas na escuta cuidadosa, no silêncio reverente, no desejo de fazer e de encontrar sentido.

Com uma variedade temática organizada em torno de quatro eixos somos relembrados de nossa humanidade, convidados a viver uma espiritualidade que não nos tira da história, mas que nos permita viver de forma integral a vida, com um profundo senso de gratidão a Deus. Como disse, ele nos convida a caminhar com ele, ouvi-lo, ponderar, questionar. Pode ser que em determinados momentos você se surpreenda com uma forma diferente de analisar determinada situação, ou que seus conceitos sejam confrontados. Neste momento é bom continuar ouvindo de forma reflexiva, afinal até aquilo que difere pode ser útil para fortalecer nossas próprias convicções, mas o desafio é continuar ouvindo de forma atenta.

É com alegria que encorajo a cada leitor(a) a fazer esta breve caminhada com Jonathan Menezes, um jovem teólogo, querido amigo, com quem tenho tido o prazer de correr algumas provas de corrida de rua mas que, quando escreve, muda completamente o ritmo, ele prefere caminhar ao nosso lado, compartilhando o que tem aprendido, desejoso de que suas reflexões animem a todos que com ele desejam fazer o caminho de volta àquilo que nos faz e nos mantém plenamente humanos, conforme a intenção daquele que nos criou.

Obrigado amigo Jonathan por partilhar seus momentos e por nos convidar a esta caminhada, silenciosa, acolhedora, reflexiva e amorosa.

Ziel Machado
(Trecho do Prefácio ao livro Humanos, Graças a Deus!)

terça-feira, 4 de junho de 2013

O que os amigos dizem de “Humanos, Graças a Deus” (Parte 2)

Humanos CapaEm tempos de consumismo, alta velocidade, banda larga e outras formas de aceleração da experiência temporal da vida humana, não é nada fácil escrever um texto teológico sobre a espiritualidade cristã. Em primeiro lugar, por que qualquer coisa que escrevemos fica logo obsoleta pela passagem ultraveloz do tempo. Em segundo, por que qualquer coisa que escrevemos sobre espiritualidade é consumido antropofagicamente e reduzido a um “gostei” ou “não gostei” de leitoras e leitores. Enfim, por que há uma certeza prévia no tocante à incapacidade da teologia se pronunciar sobre um tema tão prático e a-teológico como a espiritualidade. Por isso mesmo, é muito bom que este livro tenha sido escrito e possa ser lido por mais do que apenas a família e o círculo de amizades de seu autor.

Este não é um livro para ser descartado assim que chegarmos às suas últimas palavras. Não é auto-ajuda secular disfarçada de espiritualidade cristã. Não é teologia tentando reduzir a espiritualidade ao âmbito da intelectualidade. Ah! Não é também a última palavra sobre o tema. O texto de Jonathan é uma reflexão pessoal e teológica sobre os riscos de ser cristão em nossos dias. É teologia e testemunho simultaneamente. Dá testemunho da possibilidade de caminhar espiritualmente em um mundo totalmente dominado pelo deus-dinheiro. Reflete criticamente sobre os riscos de confundir espiritualidade com auto-grandeza, ou com emocionalismo, ou com doutrinismo. É livro para ser lido e relido. Para ser pensado e discutido. Para ser ruminado. No mínimo, por que nos ajuda a perguntar como ser espiritual sem deixarmos de ser humanos. E esta pergunta é fundamental e indispensável. Se o Espírito de Deus fez do homem-Deus Jesus alguém para quem “nada do que é humano lhe era estranho”, precisamos dEle para que nós, meramente humanos, aprendamos a não estranharmos nad a do que nos é próprio enquanto humanidade que caminha na força do Espírito.

Júlio Zabatiero
(Coordenador de Pós-Graduação e Pesquisa da Faculdade Unida de Vitória)

Pensador e professor, Jonathan gosta de correr nas horas vagas, corridas de longas distâncias, dessas que é preciso acelerar o passo e dosar o fôlego. Neste livro sobre espiritualidade, ele escreve como corre, ritmo dosado que permite na paisagem conhecida colher o desconhecido. Corre na companhia de muita gente, registrada em livros ou na vida, e nos convida também a correr, no seu ritmo, em busca de nossa humanidade escondida em algum lugar. Porque para ele, espiritualidade é isso, aprender a respirar humanamente no compasso da respiração divina. Sendo assim, sua escrita se move no paradoxo, santo e profano, simbólico e diabólico, humano e divino. Desse modo, se apresenta como escritor transgressor, imagem de Deus, o transgressor maior, o paradoxo ao infinito. Deus que se torna corpo, humano, simplesmente humano.

Marcos Monteiro
(Pastor, teólogo e filósofo. Assessor de pesquisa do Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão)

O que os amigos dizem de “Humanos, graças a Deus!” (Parte 1)

Humanos CapaPublicar, para mim, é sempre uma alegria. Um pequeno artigo veiculado por aí já me deixa feliz. Significa que as ideias estão repercutindo, bem ou mal (melhor se for bem, é claro). Um livro então, é uma alegria em dobro. Meu primeiro livro, Humanos, graças a Deus (Novos Diálogos, 2013), acaba de sair do forno. Mais adiante, gostaria de escrever aqui o que me motivou a escrevê-lo e como cheguei até ele. Agora, quero fazer uma nota de gratidão, em três partes, a alguns amigos que me ajudaram neste livro, escrevendo seus endossos de recomendação. Alguns deles foram publicados apenas parcialmente no livro, por isso coloco aqui na íntegra o que eles escreveram. A eles – Antonio, Flávio, Júlio, Marcos e Ziel – o meu muito obrigado!

Um dos grandes dilemas que eu vejo na igreja cristã e em especial na brasileira, é a sua aspiração de ser divina quando ela deveria ser humana. A igreja “esquece” que ela é composta de gente – gente que chora, pensa, sofre, ri, ganha, perde, luta, abandona – enfim, gente com dilemas e angústias. A igreja nega esse fato com uma pregação que não toma em conta essa realidade, pois afinal o povo de Deus é um povo que caminha de vitórias em vitórias. Essa é a grande beleza dos textos do amigo Jonathan. Você certamente irá se identificar com suas palavras e pensamentos, pois refletem essa nossa jornada humana em direção ao Reino de Deus. Leia, reflita e considere os desafios propostos nesses ensaios.

Antonio Carlos Barro
(Fundador e professor da Faculdade Teológica Sul Americana)

Em dias de confusão conceitual e principalmente vivencial a respeito do tema do livro que temos em mãos, os escritos de Jonathan Menezes se apresentam como contribuição indispensável na busca por uma espiritualidade sadia, coerente com a realidade de nosso ser e fundamentada nas escrituras. Com profundidade, honestidade e impressionante capacidade de reflexão, o autor traz à discussão, através de seus ensaios, questões que há tempos nos debatemos, exatamente por não nos darmos o direito de sermos humanos ou por negar esse dom divino, substituindo-o por ideais inalcançáveis, alienantes e distantes do chão da vida.

Flavio Henrique de Oliveira
(Professor da Faculdade Teológica Sul Americana)