tag:blogger.com,1999:blog-31402036437592718802024-02-19T12:22:09.052-03:00Escrever é transgredir!Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.comBlogger403125tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-5739147441628622322018-10-16T15:26:00.004-03:002018-10-16T15:27:48.261-03:00Sobre 'Humanos, graças a Deus' (Segunda edição)<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><iframe allowfullscreen="" class="YOUTUBE-iframe-video" data-thumbnail-src="https://i.ytimg.com/vi/sBHgxygeeGw/0.jpg" frameborder="0" height="266" src="https://www.youtube.com/embed/sBHgxygeeGw?feature=player_embedded" width="320"></iframe></span></div>
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Venho escrevendo este livro há alguns anos, entre idas e vindas, rasuras e reparos. Sua primeira edição foi publicada em 2012, com ensaios que havia escritos nos quatro anos anteriores. De lá para cá, algumas coisas mudaram no cenário de minha existência, e em meu modo de pensar. Assim, com o esgotamento daquela edição, decidi incorporar novos ensaios escritos recentemente e que representam não apenas minhas reflexões atuais, como também se adequam ao “espírito” deste livro. Embora ele não tenha sido escrito de modo integrado, há, contudo, um <i>cantus firmus</i> nessa caminhada de vida e reflexão em busca de uma espiritualidade encarnada, que, mesmo despretensiosamente, acabou por dar coesão e coerência à maioria dos ensaios aqui reunidos. A este “canto” resolvi dar um título, que é parte afirmação-celebração, parte denúncia-protesto: Somos humanos, graças a Deus!</div>
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Qual seria a razão dessa preocupação e de onde ela brota? Eu diria que ela não nasce de hoje, uma vez que, primeiro, esse é um clamor bíblico – pela humanização da pessoa – que vemos repercutir nas narrativas bíblicas e, de modo especial, em Jesus; segundo, porque continua reverberando em autores que me influenciaram, só para citar alguns: Kierkegaard, Ellul, Buechner, Tillich, Peterson, Lewis, Manning, Cavalcanti, Comblin, Rosset, Alves, Monteiro, Unamuno, Nietzsche, Rorty, Vattimo, Urteaga e tantos outros. Alguns deles bastante imponderados e intempestivos em sua maneira de ser e pensar, como o próprio autor em alguns dos ensaios deste livro.</div>
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Penso que essa preocupação também nasce de inquietações do tempo presente, minhas, é claro, mas não minhas apenas, de muita gente. Tenho impressão de que uma porção de nossa humanidade como existência, como identidades, como razão de ser, tem sido decepada por um certo espírito do tempo ou por um projeto de ser humano, que a religião cristã certamente ajudou a construir, que tem a ver com eficiência, santidade, perfeição, indefectibilidade, e que a gente não deu conta de viver. E, não dando conta de viver, escoamos nossas frustrações de várias formas, pela via do niilismo, do espiritualismo, do relativismo ou simplesmente do grito incontido que parece dizer: “Eu tenho o direito (natural) de ser imperfeito, de estar errado”; ou seja, embora não necessariamente me resigne ao lugar do erro, invariavelmente passo por ali.<br />
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Mas o que busco, afinal? Uma experiência, um modo de ser, pensar e agir que preconizem a convergência entre o cristão e o humano, entre o santo e o profano, entre ser discípulo e ser gente, de acordo com o tipo de gente que Jesus foi — verbo encarnado, chamado de “glutão e beberrão”, que chorou, sorriu, festejou e sofreu. Jesus foi corretamente chamado de “amigo de pecadores”. Mas, pergunto: se não fosse amigo de pecadores, de quem mais seria? É óbvio, trata-se de um pleonasmo, uma redundância. Enquanto o pleonasmo dos fariseus continua operante, bem como sua caça aos “inimigos de Deus” e da “sã doutrina”, Jesus continua sua busca revolucionária por amigos, e cometendo disparates, como o de dizer para a gente amar nossos inimigos. Aliás, ele ganhou muitos inimigos por causa desses disparates. É que o amor não pode ficar indiferente. Talvez a indiferença possa nos livrar da retaliação e do ódio, mas não o amor. O amor incomoda, tira do lugar de conforto, desestabiliza. Quem ama, diria C. S. Lewis, fica vulnerável.<br />
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E vulnerabilidade não é somente suscetibilidade involuntária, mas a voluntária coragem de se despir diante do outro. Como Jesus fez, em agonia, perante seus amigos no Getsêmani. Por causa de Jesus, entendo que meus amigos são aqueles/as que viram um pouquinho da minha alma, viram emergir meus demônios, e ainda assim escolheram permanecer ao meu lado. Não temo ser vulnerável diante deles, nem eles diante de mim. A amizade é, assim, uma divina permuta de humanidade.</div>
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Igualmente, pontuarei que a vida na fé não nos blinda contra as intempéries naturais dessa existência debaixo do sol – seus paradoxos, seu inventário de possibilidades (boas e ruins) – nem é um convite para que nos retiremos da história, ou para que deixemos de nos envolver visceralmente nela. Não! Ser humano, conforme os rastros de humana-divindade e o exemplo deixados por Jesus, significa assumir a identidade, a história e o devir humanos num tempo, espaço e cultura específicos para, assim, e somente assim, poder ser parceiros do Espírito nas revoluções e transformações que Ele vem realizando nesta mesma história desde seu alvorecer, e após a ressurreição. Por essa razão, defendo que viver a fé cristã, buscando fidelidade ao Cristo, não nos isenta de ter de encarar a nós mesmos tal como somos no mais profundo do ser, nossas virtudes e bondade, bem como idiossincrasias, pecados e demônios.<br />
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Lembrando do que disse Padre Brown, personagem de G. K. Chesterton: “Sou um homem... e, por isso mesmo, tenho todos os demônios do mundo em meu coração”. E, também, das palavras autobiográficas de Leonardo Boff: “Participo, penosamente, da <i>condition humaine </i>onde vige a porção sim-bólica junto com a porção dia-bólica. Sou teólogo, mas também pecador. Peregrino e também me desgarro. Por isso sou devedor de desculpas e suplicante de perdão”.</div>
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Não convivo com “espirituais”, convivo com pessoas. A espiritualidade que me promete as alturas não me serve, pois sou gente, e não pássaro, gente, e não anjo. Quero espiritualidade-chão, ser pessoa-chão, porque o evangelho não é especulação metafísica; o evangelho é Deus abraçando o chão, se fazendo gente e mudando o curso da história.</div>
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[Trechos da Introdução do livro. Assista acima um vídeo de promoção. Você pode adquirir o livro clicando <a href="http://editorarecriar.com/produto/humanos-gracas-a-deus">aqui</a>. Ficarei muito feliz em tê-lo/a como leitor/a]</div>
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<b>Jonathan</b> </div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-36086432509621943512017-04-10T23:03:00.000-03:002017-04-11T08:50:51.409-03:00A coragem de saber "apenas" em parte<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhliyvCWLEabm1XqqzLbmAr8SjcjQSXEOXh4rYC2aSq8qsAJKTgOOtsSJNU2nd9yMgyWEhOYoxKI3uIlVQ6fP_N_uCc0Mgqtw1PWchELHUWoMJK7W2F4XOxpK1-z0ZNLsj6LNPpEPUa1UEJ/s1600/To+be+or+not+to+be.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="265" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhliyvCWLEabm1XqqzLbmAr8SjcjQSXEOXh4rYC2aSq8qsAJKTgOOtsSJNU2nd9yMgyWEhOYoxKI3uIlVQ6fP_N_uCc0Mgqtw1PWchELHUWoMJK7W2F4XOxpK1-z0ZNLsj6LNPpEPUa1UEJ/s400/To+be+or+not+to+be.jpg" width="400" /></a></div>
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“<b>Agora</b> conheço <i>em parte</i>, mas <b>depois</b> conhecerei <i>plenamente,</i> assim como também sou plenamente conhecido” (1Co 13.12b).</div>
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Em 1952, Paul Tillich publicou <i>A coragem de ser</i>, que ainda hoje é considerada por muitos (e por mim mesmo) sua obra-prima. Como outras de suas obras, esse livro foi oriundo de conferências que o autor deu na Universidade de Yale dois anos antes. Seu objetivo na obra foi o de analisar a fé a partir da coragem – no sentido ontológico, como uma qualidade do “ser” de alguém. Embutida na reflexão sobre o ser, está a questão do “não-ser”: aquilo que eu sou e aquilo que eu não-sou são duas realidades que formam a minha existência. </div>
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Nisso consiste a principal fonte de sua ansiedade: a experiência de ser tendo a “consciência existencial do não ser”. Em outras palavras, trata-se da consciência de que meu ser tem limites, começando por limites internos (físicos, psíquicos, emocionais, etc.), passando pelos limites externos (os de “seu mundo”, de sua situação social, de sua cultura), até chegar aos limites existenciais (a finitude como o seu limite-mor). </div>
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A ansiedade básica do ser humano nasce então da constatação sobre aquilo que ele não é: não-tão-lindo, não-tão-santo, não-tão-inteligente, não-tão-perfeito. Quando essa constatação se confirma como certeza, a ansiedade pode se transformar em desespero (“sem esperança”, a falta de sentido se torna então vitoriosa). É compreensível, então, que “toda a vida humana possa ser interpretada como uma tentativa contínua de evitar o desespero”. E, na maior parte do tempo, o ser humano consegue. A questão é: como? </div>
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A resposta de Tillich é: evitando o ser! Ou seja: evitando encarar a si mesmo como “si-mesmo”, projetando um<i> alter</i>-ego. O antídoto para o desespero passa a ser, assim, a auto-ilusão, em que, nos termos de Arthur Danto, “não ocupamos nosso interior, mas vivemos ingenuamente no mundo”. Em termos práticos, ornamentamos nossa aparência com maquiagem, photoshop ou botox; acumulamos títulos, posses e posições para forjar nosso “ser social” (o que somos para os outros); criamos mecanismos psicológicos e neurolinguísticos para afirmar uma persona que só existe em nosso mundo de desejos e projeções. Tudo para que os outros gostem mais da gente e nos aceitem, e nós também.</div>
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E, vejam, isso nada tem a ver com o desejo de e o impulso para ser melhor em todos os sentidos. Pois, para isso, é necessário sim uma dose de autoafirmação, de luta consigo mesmo, de inquietude e busca de superação. Isso é saudável e faz parte de nossa “evolução” (essa palavra é ruim, mas não achei outra) como pessoas. Esse impulso e desejo se tornam destrutivos, como salienta Tillich, caso se queira evitar a todo custo o risco de insegurança, imperfeição ou parcialidade e incerteza que rondam nossa condição, além da própria realidade de quem somos e de quem não-somos. </div>
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Dessa forma, Tillich afirma que a “boa vida”, a vida sã e humanizada, é a vida corajosa, isto é, a vida que pode ser afirmada em sua integridade, a despeito de suas ambiguidades, imperfeições e da própria morte que a cerca. Nietzsche, como sabemos, chamou isso de <i>amor fati </i>(amor ao destino ou a vida a despeito de quaisquer condicionalidades). Elevou isso, porém, à “vontade de potência”, paradoxalmente projetando um homem superior (um “super-homem”) e, como tal, incapaz de reconhecer suas fraquezas e de aceitar as dos outros. </div>
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O que Tillich chamou de “a coragem de ser”, porém, nos conduz a esse lugar de aceitação e autoafirmação do ser “a despeito de” não-ser. Reúne ao mesmo tempo uma <i>atitude passiva</i>, de aceitação do ser imperfeito ou do “ser como uma parte”, e uma <i>atitude ativa</i> de afirmação do ser como “si próprio”, e não como outro qualquer. O equilíbrio entre as atitudes passiva e ativa são fundamentais para a integridade e sanidade desse ser. Uma sem a outra conduzem a extremos: aceitação sem afirmação gera resignação (ou pior, auto-comiseração); afirmação sem aceitação promove a auto-ilusão. E os extremos, como já disse certo sábio, são inimigos da vida.</div>
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A coragem de ser de Tillich tem inúmeras outras implicações para a fé, como, por exemplo, a coragem de “aceitar-se como sendo aceito, a despeito de ser inaceitável”; o que teologicamente pode ser descrito como graça. A eficácia da graça de Deus na vida humana depende da aceitação de nossa ineficácia e de nossa insuficiência. Minha preocupação aqui reside, porém, em que implicações essa coragem de ser traz para a reflexão sobre os caminhos e descaminhos do saber. E, nesse sentido, as palavras de Paulo na epígrafe são indicativas de um caminho: o caminho da coragem do ser que se reconhece como uma parte, e que, ademais, sabe que o seu conhecimento é apenas parcial.</div>
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Isso soa como uma afirmação óbvia, e isso se trata de uma afirmação óbvia, mas que muitos de nós têm obviamente a ignorado. Na prática funciona assim: sabemos que nosso saber é em parte, mas agimos com o outro como se apenas o dele ou dela fossem. Na teologia, por exemplo, sabemos, por total inferência e afirmação de fé, que “Deus é grande”, que “Deus é eterno”, mas agirmos muitas vezes como se “o que pensamos” sobre Ele também fosse (incluindo tais afirmações). A assunção da parcialidade e do estado inacabado desse conhecimento, porém, deve sempre nos lembrar de que ele nunca é grande coisa. O silogismo “<i>falo</i> sobre Deus, logo <i>sou</i> grande coisa, e esse saber também é” é um dos mais fatais para a teologia e para a espiritualidade cristãs. Faz do lugar teológico um lugar de usurpação e, como tal, um lugar idolátrico, pecaminoso. </div>
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Como já vimos anteriormente nessa série, a comunidade de Corinto também vivia essa tentação por ser formada também por uma elite intelectual, muito ciosa de seu conhecimento. A poesia de 1Coríntios 13 vem para quebrar qualquer auto-ilusão a respeito desse lugar. Primeiro, porque afirma que<i> o amor prevalece sobre o saber</i>. Alguém pode saber falar a língua dos homens e dos anjos e entender todos os segredos do universo, mas sem amor tudo isso é reduzido a zero (v. 1-2). Segundo, porque enfatiza que <i>o saber é sempre em parte</i> (v. 8) – mesmo quando temperado com amor, como já enfatizei anteriormente nessa série. Terceiro, porque nos <i>recorda sobre a finitude do saber</i>: um dia, como tudo, ele também será aniquilado (v. 9). </div>
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Ou seja, nada desse conhecimento que hoje acumulamos e ostentamos com orgulho irá permanecer. Nada! Profecias? Desaparecerão. Línguas? Cessarão. Ciência? Passará. Teologias? Igualmente. </div>
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Essa mensagem pode aumentar o desespero de quem vive tomado pela angústia de não-ser, tentando a todo custo superar essa condição, sem primeiro passar pelo lugar humanizador da aceitação. Mas ela é, sobretudo, uma mensagem de esperança e libertação. É um grande conforto poder deitar a cabeça no travesseiro ao final de um longo dia sem esse peso tenebroso da autoafirmação (do que eu posso ser-saber) destituída de aceitação (dos limites desse ser-saber). </div>
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O saber é uma benção enorme, mas o não-saber, nesse contexto, é uma benção ainda maior, verdadeiramente libertadora! Porque não apenas damos espaço para o outro, que também é e também sabe parcialmente, como finalmente deixamos que Deus desempenhe o papel de Deus, nos relegando o maravilhoso lugar de “apenas humanos”. Então, a coragem de ser quem se é e como “uma parte”, de Tillich, une-se com a liberdade e “a alegria de não ser Deus”, de Tomás Halík no livro <i>A noite do confessor</i>. É um alívio, diz ele, não ter de substituir Deus como amador, ou (diria eu) como um teólogo aspirante a Deus. Assim, (finalizo com suas palavras):</div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
'Quando temos a coragem de largar as rédeas que, de qualquer modo, não controlam nada, mas que, não obstante, nos arrastam continuamente – através de nossas ansiedades e arrogância, através de nossa grandiosidade, loucura e vaidade, ridículas, embora perigosas –, quando desistimos de nosso posto fictício de comandante do universo, sentimos um alívio enorme. A humildade e a verdade curam e libertam'. </blockquote>
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<b>Jonathan</b></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-67352475846721917492017-03-28T09:30:00.000-03:002017-03-29T13:31:16.939-03:00Transformando inteligências e não inflando 'egos'<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjsF5ia6AMkW0RG3uHJhrXJOuv2gsvmS4TVppkaN0AyzCU4rVOceJpWEKpjKgCyU00Lr9rMjkyssXDIu9f1tZH81lAqa3tUH6kv9PppUXHgfLz7bxAbiVhUE7lIMWyuJqvCaIlwazvSAjcf/s1600/Humility-865x487.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="225" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjsF5ia6AMkW0RG3uHJhrXJOuv2gsvmS4TVppkaN0AyzCU4rVOceJpWEKpjKgCyU00Lr9rMjkyssXDIu9f1tZH81lAqa3tUH6kv9PppUXHgfLz7bxAbiVhUE7lIMWyuJqvCaIlwazvSAjcf/s400/Humility-865x487.png" width="400" /></a></div>
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“Não imitem o <i>comportamento e os costumes</i> deste mundo, mas deixem que Deus os transforme por meio de uma <i>mudança </i>em seu <i>modo de pensar</i>” (Rm 12:2a, NVT).</div>
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Talvez não haja sentimento humano pior que o de estar dividido: entre mundos, desejos, valores, amores, escolhas e estilos de vida opostos ou conflitantes. A sensação é a de violação interior: somos violados internamente todas as vezes em que não conseguimos ser quem somos e, simultaneamente, agradar a todas essas forças que o tempo todo parecem guerrear dentro de nós, ora nos empurrando para um lado, ora puxando para outro. É uma espécie de escravidão, porque são essas forças e não nós mesmos (muito menos Deus) que temos o controle sobre nossas vidas. </div>
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O exemplo neotestamentário clássico é o de Paulo, em Romanos 7, quando apóstolo narrou seu drama interior entre desejar fazer um tipo de coisa – por entender, pela lei de Deus, que era bom e correto – e ver-se seguindo a via completamente oposta, pela força da “lei do pecado” que habita em seus membros. “Quero fazer o bem, mas não o faço. Não quero fazer o que é errado, mas, ainda assim, o faço” (Rm 7:9, NVT). E, como ele deixa bem claro naquele texto, a força para vencer (ainda que não de uma vez por todas) esse conflito não reside nele mesmo, mas na graça de Jesus Cristo.</div>
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Ou seja, ao mesmo tempo em que aprendemos que estar dividido faz parte da experiência humana – pois é fruto da angústia de querer e não poder, ou de não querer, e ainda sim fazer –, também sabemos que isso é tremendamente destrutivo, pois nos faz escravos do pecado e de nosso ego (o que dá no mesmo). O ser dividido é um ser adoecido, carente de seu brilho humano original. </div>
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No próprio texto de Romanos 7 Paulo relembra o nome desse mal: “cobiça”. A cobiça é o que me faz desejar algo que está além de minhas possibilidades; e, quando ela toma conta dos meus membros, é também o que interdita o bem que eu quero fazer, mas não consigo. Ela normalmente começa com um pensamento (falo como mestre da cobiça!), um simples e aparentemente inócuo pensamento. Na medida que vai tomando forma, esse pensamento vai chamando outros pensamentos e corporificando um desejo, que logo toma conta do coração (o centro da volição, segundo o AT), e quando ocupa o coração se enraíza e faz morada ali, se espalhando para os membros do corpo e demandando atitudes concretas de satisfação. Nesse âmbito, a lei de Deus já não tem poder algum a não ser o de aguçar a concupiscência (o desejo pecaminoso). </div>
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<i>A cobiça é, portanto, a mãe e a mestra da alma dividida!</i></div>
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Em Romanos 12, Paulo deixa claro que a transformação passa pela entrega de nosso ser inteiro a Deus como “sacrifício vivo e santo, do tipo que Deus considera agradável” (Rm 12:1). Que tipo de sacrifício é esse? Não se trata de uma oferta tipicamente religiosa, porque o sacrifício vicário, último e suficiente (de Jesus na cruz) pôs fim à necessidade de ofertas dessa natureza. O que “está consumado” não pode ser revogado, tampouco barateado no altar das “oferendas espirituais”. Trata-se precisamente do nosso coração. Ou seja, até para que a cobiça não mais tome conta do coração e faça dele um escravo, é necessário oferecê-lo inteiramente a Deus. Somente assim o coração – e tudo o mais no ser humano – poderá ser livre ou rumar para a liberdade.</div>
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O passo conseguinte dessa liberdade está em não mais ter de mimetizar os modos de ser e pensar de nossa cultura, especialmente aqueles que nos conduzem ao velho problema da cobiça e, portanto, são conflitantes com a vida de e em Deus. E aqui entra em questão o que mais quero chamar atenção nesse caso: a transformação pela qual alegamos ter passado, no momento de nossa conversão (ou da entrega de nosso coração a Deus), implica em um modo novo e diferente de pensar: do pensar que <i>se conforma </i>ao pensar <i>inconformado</i>. </div>
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O primeiro é o que segue as tendências, modismos e flutuações de seu tempo e cultura; é o pensamento que se adapta de acordo com os ditames de seu entorno, que “se mundaniza” ao se curvar ao <i>modus operandi</i> e às urgências de seu tempo. Em contrapartida, o segundo é o que quero chamar aqui de "pensamento mutante". É <i>mutante</i> porque está mudando constantemente não apenas por não aceitar os moldes impostos por seu entorno (e aqui me refiro tanto a conteúdos quanto a formas), quanto e principalmente porque procura seguir o sopro do Espírito de Deus – o mais selvagem sopro do universo! E na medida em que o Espírito de Deus, como sabemos, nunca para de soprar – a despeito de nossa incapacidade de escutar o que Ele sopra – o pensamento de quem procura segui-lo nunca para de mudar, de amadurecer, de se trans-formar. </div>
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Por isso esse pensamento é, no geral, <i>in-con-formado</i>; suas formas são assumidamente provisórias; sua teologia é feita a partir do caminhar e da jornada e, por isso, resiste a moldes ou formatações permanentes. É construída a partir de constantes esboços de saber e agir à luz da Palavra, e como resposta crítica às necessidades de seu contexto. E assim, pela graça, vai “experimentando” aqui e acolá relances da “boa, agradável e perfeita vontade de Deus para vocês” (Rm 12:2b). E aqui está um claro contraste entre apenas conhecer e experimentar: há muitos que <i>conhecem</i> cognitivamente a vontade de Deus (como o Paulo de Rm 7 dizia conhecer bem “a lei de Deus”), mas somente aqueles que permitem ser transformados por Deus e sua graça é que a <i>experimentam</i> de fato. Mas o que isso significa concretamente?</div>
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Bem, há vários sinais dessa transformação que Paulo nos vai apontando ao longo do capítulo 12, sendo o mais marcante deles, a meu ver, a capacidade de se humilhar. Começando por ser “honestos em nossa autoavaliação” (12:3), andando de acordo com o que Deus nos deu e não se julgando maior nem melhor do que ninguém. Por outro lado, o comportamento cobiçoso é irmão do comportamento orgulhoso: na medida em que almejamos ser mais do que nos cabe, isso vem acompanhado de querer ser mais que os outros – e logo achar que sabe mais, que é mais inteligente, e que a luz de seu pensamento reluz tanto que torna o do outro uma mera sombra. </div>
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Não se trata aqui de negar quem somos e o que sabemos, tampouco de esconder isso, mas de saber que no Reino de Deus não há espaço para “egos inflados”. O dom de Deus foi feito, sim, para ser externado e partilhado, e realizado com excelência: que o profeta profetize na medida do dom de Deus; que o mestre ensine bem; que o servo que sirva com dedicação; já o que lidera, que o faça de modo responsável (cf. 12:6-8). No ato de partilhar, porém, precisamos aprender não usurpar o lugar uns dos outros, porque, como lembra Paulo: “Somos membros diferentes <i>do mesmo corpo</i>, e todos pertencemos <i>uns aos outros</i>”. E, como diz a poesia de Beto Guedes na canção “O Sal da Terra”: </div>
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<i>Vamos precisar de todo mundo, um mais um é sempre mais que dois | </i><i>Pra melhor juntar as nossas forças é só repartir melhor o pão | Recriar o paraíso agora para merecer quem vem depois</i>.</blockquote>
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A inteligência transformada é fruto de um coração transformado; fruto da cabeça que incha no mesmo compasso em que incha o coração. Que sabe que no reino de Deus maior é o que serve, que honra o caminhar de quem veio antes e pavimenta o caminho para quem vem depois, porque reconhece que <i>todo mundo precisa de todo mundo</i>. </div>
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<b>Jonathan</b></div>
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Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-53521812977706678592017-03-13T17:25:00.000-03:002017-03-13T18:09:13.048-03:00O péssimo hábito da literalidade e do pré-juízo<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPaOyfWR2hm6m7qi8pGvrAF8Q_Y1oA3ZHnMRv4m-k2_0bRLqLtbBhyphenhyphenAPFVqZ9m8TtVyEmKTrdi_0mOXX0x_JMOc60elz4ksFlmFr7jRuI7QItG3ZWenoVhD0Q6O79IhnWLakESUb-4veJW/s1600/Kleber+Lucas.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="225" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPaOyfWR2hm6m7qi8pGvrAF8Q_Y1oA3ZHnMRv4m-k2_0bRLqLtbBhyphenhyphenAPFVqZ9m8TtVyEmKTrdi_0mOXX0x_JMOc60elz4ksFlmFr7jRuI7QItG3ZWenoVhD0Q6O79IhnWLakESUb-4veJW/s400/Kleber+Lucas.jpg" width="400" /></a></div>
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Um dos grandes <i>descaminhos do saber</i> se encontra no que chamo aqui de “péssimo hábito da literalidade e do pré-juízo”. Pois, como já insisti em posts anteriores, tomar as coisas como dadas, tal como emergem na superfície, pode comprometer o juízo e a interpretação que oferecemos sobre as situações, os objetos de estudo, e as pessoas. O desafio aqui é desconfiar do dito e de meus pressupostos inicias sobre ele; é indagar sobre os possíveis “não-ditos” ou “mal-ditos” subjacentes nos ditos. Em suma, nem tudo é sempre tão óbvio quanto pode parecer. Ilustro com uma história.</div>
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Recentemente meu amigo Kleber Lucas cantou “Epitáfio”, dos Titãs, junto com sua banda em um dos cultos da “Soul Igreja Batista” no Rio de Janeiro, onde ele atua como pastor. Em seguida, publicou um vídeo em sua conta no Instagram, e (como já era de se esperar) foi execrado por uma massa de “irmãos” (digo com certa relutância) na fé, não só por cantar uma música “secular” num culto cristão, mas por ser esta uma canção cujo refrão diz: “O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”. Duas questões me preocupam nesse caso, sobre as quais quero comentar aqui. </div>
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A primeira questão nasce do <b>mui antigo</b> <b>dualismo sagrado <i>versus</i> secular</b>. </div>
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O pressuposto, nesse caso, é: existe música “do mundo” e existe “música de Deus”. Na igreja a gente só pode ouvir e cantar música de Deus (isto é, gospel), nunca do mundo. Escuto essa baboseira sectária desde que me conheço como cristão, mas para mim ela nunca fez sentido. Porque tem música que se diz ser “pra Deus”, mas que simplesmente não consigo cantar (ou sequer suporto ouvir), porque fere meus ouvidos de tão ruim no conjunto letra, teologia e a melodia. Pode até comover, mas não muda um centímetro da vida; fala de Deus, mas só pra massagear o ego. </div>
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Além disso, não me fazem pensar, não mexem com minhas entranhas, não me instam a olhar para o próximo, ao micro e macro ambientes que me cercam, a relacionar a Palavra com as questões do cotidiano, a adorar a Deus e celebrar a vida em <i>comum-unidade</i>, até porque centram-se quase inteiramente no indivíduo e seus problemas particulares. Como diz João Alexandre, são variações do mesmo tema, “meras repetições” – e me pergunto até quando insistiremos em repetir e variar, em segregar e não pensar, em vociferar e não dialogar? Certas coisas parecem ser insuperáveis.</div>
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Em contrapartida, tem tanta música feita por gente “do mundo” que consegue fazer o que falta a muitas canções cristãs: cantar as belezas divinas, sem necessariamente falar o nome de Deus, e retratar os dramas da vida humana e os gemidos da criação. Para citar só um exemplo dentre tantos: “Sol de primavera”, de Beto Guedes, é uma canção “do mundo” que pode ser entoada como hino a Deus, pois fala de dor, fraternidade e esperança, sobre semear a boa nova, sobre andar a segunda milha com quem chora, sobre aprender a viver e ser melhor. [É óbvio que tem muita música cristã que também faz isso com competência, mas esse texto não é sobre elas].</div>
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Ora, eu sou de Deus e eu faço parte do mundo; o mundo é de Deus (embora boa parte dele seja tomado pelo maligno), e todas as coisas boas nele existentes são fruto de Sua Graça; atributos invisíveis, como disse Paulo; imagem e semelhança do Criador. Se eu respiro, ando, vivo, canto, choro, sofro e me alegro dando ações de graças “em tudo”, não tenho razão alguma para perder tempo com dualismos religiosos infantis. Logo, não existe música de Deus <i>versus</i> música do mundo; existe música boa <i>versus</i> música ruim, e para todos os gostos. Portanto, discernir é preciso; segregar não é preciso. Agora, se não gosta ou não aprova; se para você esse tipo de fazer não convém a sua forma de fé, ao menos não julgue nem discrimine quem vivencia sua fé com liberdade e gratidão. Somente Deus conhece e examina o coração, lugar por excelência do louvor.</div>
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A segunda (e central) questão diz respeito <b>ao péssimo hábito da <i>literalidade</i> e do<i> pré-juízo</i>. </b></div>
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A música “Epitáfio”, dos Titãs (2001), parece-me ser apropriada para uma reflexão sobre essa vida que vivemos. “Epitáfio” nada mais é que aquela inscrição da lapide do túmulo no cemitério. Geralmente ali se escreve aquilo que a pessoa foi, uma qualidade dela. Exemplo: “Aline, esposa fiel, mãe dedicada, mulher irrepreensível”. A música, porém, inverte isso e apresenta uma lista de coisas que a pessoa queria ter feito, mas não fez. Em suma, é como se ela dissesse: “Eu queria e devia ter vivido melhor, curtido intensamente os momentos singulares da vida, mas não consegui”. </div>
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É uma linda canção, que fala de ideais de vida possíveis, mas de um lugar de impossibilidade: o instante da morte. Embora tratemos a morte com extrema recusa, estranhamento e medo muitas vezes, ela tem uma função pedagógica: lembrar-nos sobre como temos vivido e que valor damos à vida e às pessoas a quem mais amamos. A poesia dos Titãs, porém, chama atenção a dois problemas pelo menos (um prático e outro teórico) - que, por sua vez, não anulam a meu ver sua beleza poética e sua utilidade para a reflexão, nem a torna “proibida” de se cantar na igreja (desculpe, mas me sinto ridículo nesse comentário). Primeiro, mostra que, nos últimos instantes de vida, quando não há mais nada a ser feito, alguém lamenta o que poderia ter sido feito, mas não foi ou não fez. Segundo, afirma que “o acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”. </div>
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Aqui chegamos ao coração da questão: o <i>acaso</i> – que diz respeito a coisas que acontecem sem aparente (e previsível) causa ou razão – ao que me parece, não escolhe a quem vai atingir, nem tampouco tem “protegidos”. Se tudo depender do acaso, então minha vida está nas mãos daquilo que há de mais incerto e implacável. O que pouca gente sabe, porém, é que o acaso é considerado biblicamente como parte integrante da existência, e não um mal a ser extinto (nem poderia). Senão, examinemos brevemente o famoso versículo do livro de Eclesiastes em que a palavra aparece:</div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
Percebi ainda outra coisa debaixo do sol: Os velozes <i>nem sempre</i> vencem a corrida; os fortes <i>nem sempre</i> triunfam na guerra; os sábios <i>nem sempre </i>têm comida; os prudentes <i>nem sempre</i> são ricos; os instruídos <i>nem sempre</i> têm prestígio; pois <i>o tempo e o acaso </i>afetam a todos. (Ec 9:11, NVI)</blockquote>
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O autor aqui desvela uma verdade inconveniente: nem sempre o que era para acontecer, segundo uma ordem esperada de coisas, acontece. O honesto nem sempre “vence na vida”; atos de bondade nem sempre são recompensados do mesmo modo; ou ainda, como se diz em outra tradução, “as pessoas mais capazes<i> nem sempre</i> alcançam altas posições. Tudo depende da sorte e da ocasião” (NTLH), ou do tempo e do acaso. A palavra em inglês para acaso é <i>chance</i>, e diz respeito a ausência de controle e presciência sobre tudo o que de bom ou de ruim acontece debaixo do sol. “Cedo ou tarde”, afirma-se na tradução A Mensagem, “a má sorte atinge a todos”. Isso mesmo: <b>todos</b>! Mesmo os que creem na proteção divina, não estão blindados contra ele. O acaso, portanto, pode não ter protegidos, como sugere o autor da canção, mas ninguém passa por esta vida sem ser afetado/a por ele.</div>
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O péssimo habito da literalidade não nos permite questionar, não nos capacita a lidar com os paradoxos, a ponderar o imponderável, porque não admite “contradições” de toda sorte – embora as Escrituras mesmas coloquem essas contradições bem diante dos nossos olhos, só não vê quem não quer. Então, julgamos quem canta a música dos Titãs como “traição à fé” (resta saber qual), sem saber o que cada um carrega no coração quando canta, e como se apropria da canção. Os detratores do pastor e sua comunidade não estiveram na "Soul" naquele dia, e não poderiam ter a dimensão do significado que aquela canção teve para aquelas pessoas ali reunidas. Não obstante, como é usual no meio evangélico, deixaram-se levar pelas aparências, optaram pelo caminho da segregação, do ódio e do julgamento típicos de uma certa religião. Afinal, sempre é mais fácil julgar do que compreender, condenar do que discernir, empregar fórmulas mágicas do que enfrentar a complexidade da vida de peito aberto e com a franqueza de às vezes poder dizer “eu não sei”. </div>
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Eu, porém, ainda fico com o bom senso advindo da Palavra de Deus, que me instrui aqui e acolá a evitar a frivolidade dos caminhos fáceis e a leviandade das respostas prontas, cujo convite é o do discernimento, da coragem e do enfrentamento da vida e suas intempéries, com confiança e esperança no Deus de amor, sabedores de que Ele caminha com a gente, desde as montanhas mais altas aos vales mais escuros; das avenidas iluminadas aos becos da existência, sem que saibamos exatamente o “como” nem o “porquê”. Que o péssimo hábito religioso da literalidade e do pré-juízo, bem como o seu famigerado gosto por repetições, não mais nos impeçam de encontrar Deus no lugar improvável, no aparentemente escuso e no inesperado. Pois teologia e fé que não se deixam surpreender por Deus são coisas tremendamente enfadonhas e pouco frutíferas; de novo, meras repetições. </div>
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<b>Jonathan</b></div>
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Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-70918938347777613522017-03-07T10:56:00.002-03:002017-03-07T11:02:58.154-03:00Livrai-nos dos consoladores molestos!<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh-6C4dPwkYjdUWRDRalkL2IEVdmw9dIs_km5lptLeDgW3sIfn2h0zurxLovgI3-gAoKBwc_s3oYmBJaorthPvm4ejvp-EztfRx6Lmz8UxMqOEKkX39Nbm17dCBVsy6I0E9vH5g3NVqyX-z/s1600/J%25C3%25B3+e+seus+amigos.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="267" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh-6C4dPwkYjdUWRDRalkL2IEVdmw9dIs_km5lptLeDgW3sIfn2h0zurxLovgI3-gAoKBwc_s3oYmBJaorthPvm4ejvp-EztfRx6Lmz8UxMqOEKkX39Nbm17dCBVsy6I0E9vH5g3NVqyX-z/s400/J%25C3%25B3+e+seus+amigos.jpg" width="400" /></a></div>
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<i>Vocês falam como especialistas. Até parece que, quando morrerem não sobrará ninguém para ensinar outros a viver.</i> (Jó 12:1, A Mensagem)</div>
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Em meu tópico anterior falei sobre “o fazer que há no saber”. Neste falarei sobre os limites que a complexidade da vida impõe ao saber, e o transpassar desses limites por quem acha que o saber (teológico) tem resposta para tudo, pode sistematizar tudo, e até mesmo possui presciência sobre a vida, sobretudo a dos outros. Meu estudo de caso aqui será sobre Jó e seus “amigos”, aos quais chamarei aqui de “doutores destino” – em clara alusão ao personagem “Doutor Destino” das histórias em quadrinho da Marvel, cuja característica principal é o orgulho exacerbado. Não fica difícil, portanto, identificar o alvo principal de minhas preocupações aqui: o chamado “orgulho intelectual”. </div>
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O livro de Jó é como uma grande peça teatral, com personagens marcantes assumindo falas em diferentes atos. Não se trata de um livro doutrinário ou sistemático, mas de uma poderosa e inquietante parábola sobre a vida e o sofrimento humanos. O enredo conhecemos bem: Jó, um homem íntegro e fiel a Deus, tinha uma vida próspera e era um dos homens mais importantes de todo o Oriente. Indo prestar contas ao Eterno, Satanás coloca a integridade e fidelidade de Jó em cheque, dizendo que ele se portava assim porque tudo ia bem com ele. “Retire tudo o que ele tem, e veremos onde vai parar essa fidelidade!”. O Eterno, então, permitiu que tudo lhe fosse retirado, porém, sem nenhuma consequência fatal. </div>
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E assim se fez, tudo na vida de Jó entrou em colapso como num efeito cascata: primeiro foram os bens materiais, depois a família e, por fim, a saúde de Jó. E nada de Jó pecar. Vieram seus amigos (Elifaz, Bildade e Zofar), que permaneceram a seu lado em silêncio, velando-lhe o profundo sofrimento durante setes dias e sete noites. Ao final daquele tempo, Jó, não suportando mais a dor e miséria absurdas em que caíra, quebrou o silêncio e começou a amaldiçoar o dia de seu nascimento, questionar a razão de ser de sua existência e a despejar toda a sua revolta em Deus, colocando em pauta a questão do “sofrimento do justo”, tema recorrente nos livros de sabedoria do AT.</div>
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Sua indagação central foi: por que Deus permitiu que eu, um homem reto e bom, viesse a sofrer tamanho revés, tamanha miséria e a experimentar tão grande amargura na vida, a ponto de desejar a própria morte? Onde foi que eu errei para que a morte invadisse minha vida dessa maneira? Como o infortúnio lhe atingiu de modo certeiro e avassalador, Jó não tinha em quem descontar, de modo que o alvo mais natural nesse caso era o Eterno, a quem ele servia e era fiel. “Por que, Deus!? Por que eu? Por que dessa forma tão cruel?”. Quando o infortúnio e as más notícias batem à porta, as respostas tendem a sair logo correndo pela janela. A sensação de solidão e abandono é recorrente. E quem mais poderia suportar-nos nessa hora senão o Eterno?</div>
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Os “amigos”, porém, não entenderam assim, e logo também saíram das sombras e do silêncio, bancando os paladinos de Deus, mas de fato desempenhando o papel de “advogados do Diabo”. Sabe aquele grupo que liga as antenas logo que vê alguém falando de Deus e não perde a oportunidade de pular no pescoço de quem quer que possa estar dizendo algo que venha “machucar Deus” (ou o Deus de sua ortodoxia ou de sua teologia)? Os amigos de Jó foram capazes de ficar em silêncio compreensivo só enquanto o amigo igualmente permanecera em silêncio, como se sua dor fosse menos “doída” e (para eles) menos escandalosa porque silente. Mas quando ele passou a gritar e a lamentar, eles saíram da condição de amigos para a de juízes e “doutores destino”, sabedores do que Deus pensa e porque as coisas acontecem como acontecem, implementando uma lógica própria: a de causa e efeito. A teologia dos amigos de Jó, como bem notou Caio Fábio em seu livro <i>O enigma da graça</i>, é a “teologia moral de causa e efeito”. </div>
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Para eles, a vida de pessoas inocentes e íntegras de fato não pode acabar em desgraça, porque elas não semeiam isso; quem semeia bondade só colherá bondade. Para eles, somente “aqueles que cultivam o mal e semeiam a desgraça colhem exatamente isso”, como disse Elifaz (Jó 4:8). Segue-se que o problema de Jó e a situação em que se encontrava tinha uma causa ou razão certa: é porque ele estava em pecado, e é porque não era justo nem íntegro como reivindicava ser. De fato, a sabedoria bíblica atesta que “não há uma única pessoa perfeita no mundo; nenhuma que seja pura e sem pecado” (Ec 7:20). A retidão de Jó indicava um caminho de obediência, mas não uma vida sem pecado. Inteiramente diferente é, porém, dizer que ele caiu nessa situação porque era pecador; se assim fosse, como explicar a situação de tantas pessoas que vivem em pecado, mas não sofrem o mesmo tipo de consequência? O problema do sofrimento do justo é, portanto, consentâneo ao problema da prosperidade do ímpio. </div>
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De mais a mais, com um raciocínio tão simplista baseado na lei do “toma lá, dá cá” (alguém só recebe aquilo que realmente merece), os conselhos não poderiam ser menos molestos do que os que foram por eles apresentados, como os de Zofar a Jó: é o seguinte, você pecou, fez besteira e isso é um fato, do contrário não poderia estar na situação em que está. Então, abra o coração para Deus e peça ajuda; se você abandonar o mal, limpar das mãos o pecado, “você poderá encarar o mundo sem sentir vergonha e andar seguro sem medo nem culpa. Você esquecerá das suas angústias: elas não passarão de cagas lembranças”. E mais: “o sol vai raiar e brilhar para você, e toda sombra será dispersa ao romper da manhã” (Jó 11:13-16). Simples assim. Praticamente uma formula mágica! Ora, a resposta de Jó não poderia ser outra e provavelmente ocorreria a qualquer ser humano sensível, e se revela no sentimento de traição e desamparo: “Alguém desesperado pelos amigos deveria ser amparado, mesmo que desistisse de confiar no Todo-poderoso (...). Vocês apontam o que há de errado em minha vida, mas respondem à minha angústia com conversa fiada (Jó 6:14, 26).</div>
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As respostas honestas de Jó me lembra das considerações de C. S. Lewis em seu livro <i>A anatomia de uma dor</i>, escrito por ele em seu período de luto pela morte de sua esposa. Ali Lewis revela que em sua busca por Deus em meio a luto, tudo o que conseguiu encontrar foi “uma porta fechada na sua cara, ao som do ferrolho sendo passado duas vezes do lado de dentro. Depois disso, silêncio”. Também assevera que a dor não diminui nem o tormento vai embora com consolos e conselhos molestos, por mais bem-intencionados que sejam, nem com “evasivas”, discursos com ornamentação rebuscada ou explanações teológicas de toda sorte. Em sua experiência, o luto não foi menor porque alguém disse que sua esposa estava melhor porque estava com Deus. E conclui acertadamente que, “quando você está lidando com Deus, é possível cometer toda sorte de equívocos”. Jó podia (e tinha, de certo modo, permissão para) estar equivocado porque ele falava de um lugar equívoco, o lugar da dor excruciante. Como cobrar bom senso e doutrina reta de alguém nessa situação? Mas o equívoco dos “amigos” foi maior, pois falavam de Deus priorizando a retidão da letra e não a singeleza do coração. Se o coração for duro, insensível e indolente, a letra, mesmo quando reta, será letra morta.</div>
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Não é à toa que Jesus não veio chamar gente (que se acha) justa e reta, mas pecadores ao arrependimento. Usando a metáfora de Brennan Manning, ele não veio para a elite espiritual e teológica, o pessoal da “auréola apertada”, mas para os maltrapilhos, isto é, a turma da “auréola torta”. Só quem passa pela grande miséria – ou que ao menos reconhece sua miséria – pode também passar pelo grande arrependimento. Portanto, minha oração final é simples: que Deus me ensine a fazer teologia a partir do lugar da incompletude, da falta e, por isso, do arrependimento. Que Ele me livre dos consoladores molestos, sim! Mas que me livre, sobretudo, de me tornar um; que afaste de mim o orgulho intelectual. Pois não há risco humano mais óbvio que o de nos tornamos apenas mais uma variação ou versão sofisticada daquilo que mais abominamos. </div>
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<b>Jonathan</b></div>
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Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-61174921884240819972017-02-21T09:21:00.002-03:002017-02-21T09:21:43.601-03:00O 'fazer' que há no 'pensar'<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiNKGOh-EUnbDDxdbs2zJtMbNqEWTu_InTaMqwhX_Omw5DjqFXw_ZtOQ4wijONy7O1IFUP-Qi7VO_Z96ZEHeKQVsSU4JVPjXTASMdt_upc8hP0xT4MEH2SLqFcbrdSuuckc07SEYNvprHVz/s1600/Thinking.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="202" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiNKGOh-EUnbDDxdbs2zJtMbNqEWTu_InTaMqwhX_Omw5DjqFXw_ZtOQ4wijONy7O1IFUP-Qi7VO_Z96ZEHeKQVsSU4JVPjXTASMdt_upc8hP0xT4MEH2SLqFcbrdSuuckc07SEYNvprHVz/s400/Thinking.jpg" width="400" /></a></div>
<i><br /></i>
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<i>Não apaguem o Espírito. Não desprezem as profecias. Examinem todas as coisas. Fiquem com o que é bom. Afastem-se de toda forma de mal. </i><span style="text-align: justify;">(1Ts 5:19-22)</span></div>
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Em tópicos abordados anteriormente aqui no blog, escolhi falar sobre a simplicidade da vida, de nossas escolhas, do modo como lidamos com o conhecimento que temos, da ideia de temperá-lo com amor, das pressões externas por produtividade, do anseio interno por ser mais. Entretanto, é preciso que se diga em alto e bom som: simplicidade não é simplismo, muito menos burrice. Explico: a moderação, como diz Eclesiastes, em tudo é boa. Isso significa, em nosso caso, que conhecimento sem simplicidade (e tudo o que ela agrega) vira cinismo, e o cinismo é autodestrutivo: só enxerga mazela em tudo e todos; não leva a nada. Mas simplicidade sem conhecimento vira pura ingenuidade, e logo somos enganados, levados de um lado para o outro como boiada. Portanto, nem o desprezo injuriado a tudo e a todos, nem a aceitação passiva e não questionada, parecem ser caminhos de sabedoria. Melhor é examinar tudo com cuidado. </div>
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É sobre isso que Paulo está falando no texto citado na epígrafe acima. Trata-se de um chamado ao discernimento. Um chamado comunitário para examinar as profecias (não confunda com predições futuras, pois se trata da pregação evangélica), interrogar e denunciar o mal onde quer que ele exista, não perder o ânimo diante das pressões externas, manter-se identificado com o Espírito a fim de reter apenas o que é bom, e não se deixar coagir por outros “espíritos” (Roma, ditames da sociedade, perseguição religiosa, etc.) e ser levado a pensar como eles. Quem pratica o discernimento tende a pensar com e não como o outro. Voltarei a esse ponto adiante.</div>
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É uma tentação num mundo convulsionado pela informação rápida e disponível num piscar de tela do smartphone, contentar-se com o mero dado, aceitar como veio sem querer saber mais, ater-se às manchetes do dia, ouvir e acolher apenas o que lhe agrada sem se importar muito com significado e com reflexão. Aliás, se você não sabe, o Facebook já tem feito isso com maestria por você: seleciona, sobretudo, as notícias e postagens que te interessam, que concordam com seu pensamento, que se conformam com seus desejos e “ideais”. Com isso, ele nos diz todos os dias: você não precisa aceitar o diferente, você não tem de lidar com o incômodo, não precisa se escandalizar com o pensamento contrário, com o abjeto e indesejável colega de “direita” ou de “esquerda”, pois vamos fazer de tudo para criar um pequeno universo virtual de coisas e pessoas parecidas com você, prontinho para você só curtir ou compartilhar. E olha só: se alguém ficar espezinhando você, basta acionar o dispositivo de “block” e a paz reinará de novo. </div>
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Contudo, nem toda paz é boa para se conservar, como bem nos alertou <i>O Rappa</i>. O conforto tem um preço e ele se chama “alienação”, que é a ação de transformar-se em alguém alienado, alheio, separado, distinto, distante; um quase alienígena em seu próprio contexto. A alienação pode até trazer comodidade, aliviar perturbações, evitar problemas; seu produto final, porém, é o emburrecimento e o embrutecimento. E assim, emburrecidos e embrutecidos, quando colocados em coletivos ou em redes sociais, tendemos a tratar os outros (em especial, os mais diferentes de nós), quase naturalmente e sem peso na consciência, com burrice, rudeza e brutalidade; em alguns casos, como um peso morto e, em outros, como um mal a ser extinto. Outro efeito da alienação em nosso tempo é que ela tem institucionalizado o ódio. E feito com que, em nome do combate ao “politicamente correto”, joguemos no lixo valores importantes como a compaixão, a generosidade, a bondade, a tolerância, o bem comum. </div>
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Para nós, teólogos/as, eu arrisco dizer que esse é o lugar e o momento certo. Essa é a hora de fazer teologia, porque a melhor maneira de aprender teologia, para além dos livros e leituras (embora amando-os e apreciando-os), é quando estamos de ouvidos abertos e atentos ao mundo, e ao que o Espírito está fazendo no mundo, mesmo quando ele está partido e convulsionado como o nosso. A isso John Stott chamou de “ouvir duas vezes” (ao Espírito e ao mundo). Se não aprendermos a fazer teologia com os ouvidos, jamais aprenderemos a fazê-la bem com as palavras, e a convertê-la com eficácia em vida. Por isso gostaria de tomar as recomendações de Paulo à comunidade de Tessalônica há mais de dois mil anos, para pensar no “fazer” que há no “pensar” teologicamente. </div>
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<br /></div>
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Primeira recomendação: <i><b>examinar tudo</b></i>. A palavra grega no original é <i>dokimázō</i>, isto é, examine, julgue, prove, investigue. Não tome as coisas como óbvias, nem tire conclusões precipitadas, mas prove e discirna. Se colocarmos uma comida na boca de um bebê pela primeira vez ele fará uma expressão estranha, e aquela expressão significa que ele está provando. Não dá para saber se é bom ou ruim se não testar, se não examinar. O coração do sábio, diz Salomão (em Pv 18:15) está ávido por conhecer e, por isso, está sempre aprendendo. Então, a recomendação é clara: não acredite em tudo o que vê, nem rejeite só porque o outro disse que não presta, mas prove; não apenas o modo alheio (de agir ou pensar), mas pondo o seu próprio à prova. Pedro Demo disse que “quem não sabe pensar, acredita no que pensa. Quem sabe pensar questiona o que pensa”. O pensador será um transgressor por natureza quando aprender a transgredir mais o que ele propriamente ou impropriamente pensa que ao pensamento alheio. </div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Segunda recomendação: <i><b>não desprezar</b></i>. <i>Exoutheneo</i> é o termo grego aqui utilizado, que insta a não tratar com desdém, com desprezo, nem ridicularizar ou rejeitar desqualificando. No texto ele se refere à profecia ou à pregação (5:20). Considere que cada recomendação está ligada à anterior: não desprezar é o ato conseguinte de examinar. Quantas vezes não desprezamos sem provar? Quantas vezes não provamos e, logo em seguida, desprezamos? Mas Paulo diz: prove e não despreze. É possível julgar, fazer a crítica devida, apropriar-se do que for possível, sem desprezo nem desconsideração ao outro. O Espírito pode estar realizando seu trabalho naquela pessoa, mesmo que eu não concorde com nada do que ela diz, ou com sua forma. Muita gente desempenha seu papel de modo sincero e bem-intencionado. E Deus continua utilizando quem ele quer e como quer. Então, não pense que você é a nata de Deus. Porque Deus escolhe os que não são, e fala pelos meios menos convencionais.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Terceira recomendação: <i><b>preservar o bom</b></i>. O “bom” aqui é <i>kalos</i>, ou o que é próprio, bonito, valioso. O que vale a pena ser preservado? Segundo que critério? Paulo não responde a essas perguntas. Considerando, porém, a quarta recomendação (que veremos a seguir), o bom aqui é resultado de uma decisão, baseada no discernimento, no bom senso, no ouvido atento ao Espírito, na sensibilidade à luz da Palavra. Paulo está sendo, portanto, prudente: antes ele disse “não despreze”, e agora está dizendo, grosso modo, para que não aceitemos tudo sem critérios, desleixadamente. A aceitação acrítica é também uma forma sutil de desprezo, como quando alguém te diz algo importante e você responde com um desdenhoso “tá bom” – que, no fundo, quer dizer “não estou nem aí para isso”! O teólogo que escuta mais do que fala será capaz de ser rigoroso e terno, sensível e criterioso, tudo ao mesmo tempo numa atitude própria de quem não separa o coração do ato de pensar.</div>
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<br /></div>
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Quarta recomendação: <i><b>não apague o Espírito</b></i>. Apagar aqui é <i>sbennumi</i>, que também significa “extinguir” ou “suprimir”. Como alguém pode extinguir o Espírito de Deus? Não podemos extingui-lo da vida. Mas podemos extingui-lo de nós mesmos, calando-lhe a voz, ignorando a direção (ou caminhando na contramão) do vento. Já disse que toda boa teologia começa antes com o ouvir que com o falar, e na prática de ouvir a oração é indispensável. Karl Barth disse que a oração é “o primeiro e fundamental ato do trabalho teológico”. Não se trata apenas de dobrar os joelhos (embora Barth também diga que quem não dobra os joelhos, não pode se levantar), mas de deixar com que Deus dobre nosso espírito, envergue nossa vida, realize seu trabalho em nós, subtraindo-nos de nós mesmos, e fazendo sua luz brilhar ali no espaço em que só resta Ele, falando, agindo, nos interpelando. </div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Espera-se que essa abertura ao Espírito se converta numa abertura ao outro, ao diferente e ao novo. De acordo com João Batista Libânio, normalmente nossa rejeição ao novo tem a ver com uma insegurança e um medo inconscientes. Onde atua o Espírito, porém, ali há liberdade (2Co 3:17) e, como expressa Libânio, “a abertura para o novo só é possível na liberdade”. Ele também defende a ideia de que essa abertura ou fechamento ao diferente também se configura como abertura ou fechamento diante de Deus, “que se manifesta ao ser humano como diferente, como o outro, como totalmente outro”. Em resumo: toda “boa” teologia começa com uma escuta atenta, em atitude de oração; mas também tem a ver com uma abertura, prontidão e suscetibilidade crítica para receber o diferente.</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Jean-François Lyotard em <i>The inhuman</i>, diz que “estar preparado para receber aquilo que a mente não está preparada para pensar é o que merece ser chamado de pensamento”. E também afirma que todo pensamento (do impensável) envolve dor. Explicando: estamos acostumados com o “já-pensado” e é mais habitual e confortável lidar com esse conjunto de saberes e práticas que estão conformados ao “já-pensado”. No entanto, não há nenhum desafio em pensar o que já foi pensado – na verdade, é até um contrassenso ao discernimento, sobre o qual venho falando. O desafio é receber e lidar com o não-pensado. E o não-pensado dói, porque muitas vezes entra em choque com o que já havíamos pensado antes – ou alguém em nosso lugar. Por isso, retornando a um argumento anterior, pensar o já-pensado é pensar como – conforme sempre pensamos, aprendemos e aceitamos; já pensar o não-pensado é pensar com, isto é, pensar junto, ao mesmo tempo, não apenas aceitando, mas também ajudando a construir esse novo jeito de pensar. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
A última recomendação não é menos importante: <i><b>abster-se do mal</b></i>. De “toda forma” de mal (<i>ponēros</i>, i.e., o ato mal, a malevolência, a maldade pura e simples). Jogar fora tudo o que tenha essa feição malevolente. É discernir o mal e afastar-se dele. Pois o pensamento que se reveste do mal é o pensamento que fere todas as recomendações anteriores. E a melhor forma de abstenção do mal, como Jesus no ensinou, é usar e oferecer o bem como moeda de troca. E não apenas pregar o bem, mas personifica-lo. Nisso consiste a vocação da teologia: que ela seja um pensar no qual também se imponha um fazer. E que esse fazer gere frutos dignos de arrependimento.</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
<br />Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0FTSA, Londrina, Verão de 2017-23.3355354 -51.1871491-52.127758400000005 -92.4957431 5.4566875999999986 -9.8785551tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-23616408058407583342017-02-13T15:16:00.000-02:002017-02-13T15:59:52.512-02:00Quando saber não é o bastante<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhURDoBzP4Tso0lyqtI3utNEXYyJzPbcfJbEbXanMW4pTZuO9uq0CeNkIwTAQVnSBJHnzmkBNjNgBu-wSIAu8Clu8YlfEZKmVqgxxPLoORoWf4U7py74U5SUt8t5AUDj9V5bi37uHoXbs62/s1600/knowledge.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="251" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhURDoBzP4Tso0lyqtI3utNEXYyJzPbcfJbEbXanMW4pTZuO9uq0CeNkIwTAQVnSBJHnzmkBNjNgBu-wSIAu8Clu8YlfEZKmVqgxxPLoORoWf4U7py74U5SUt8t5AUDj9V5bi37uHoXbs62/s400/knowledge.jpg" width="400" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
O saber ou conhecimento ensoberbece (dá lugar à arrogância), mas o amor edifica.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Conhecemos bem esse texto paulino (1Co 8:1). Quantas vezes não o utilizamos para o despropósito de dizer que o conhecimento não vale de nada; que a razão atrapalha a fé; ou, pensando particularmente no caso de quem se dedica ao conhecimento teológico, que o sujeito se torna descrente se estuda demais. Mas será que é isso que Paulo está dizendo?</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Se olharmos atentamente a toda a passagem (8:1-13), veremos que o conhecimento é um elemento importante aqui, mas não é o centro da questão (embora meu foco aqui seja falar sobre ele). O centro tem a ver com uma disputa entre facções dentro da comunidade cristã sobre a licitude ou não licitude de comer um certo tipo de comida (aquela que era sacrificada aos ídolos). A existência de facções não é uma grande surpresa se considerarmos que isso aconteceu na cidade de Corinto.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Corinto era uma cidade multicultural. Nela conviviam judeus, cidadãos romanos, gregos, imigrantes (sírios e egípcios); era uma verdadeira Babel sociocultural. Era também uma cidade plurirreligiosa. A adoração monoteísta caminhava lado a lado com a politeísta (deuses greco-romanos, deuses estrangeiros, sem falar no próprio Imperador). A igreja, por sua vez, não estava alheia a essa diversidade. Era étnica (judeus e “pagãos”) e socialmente diversa – do tesoureiro da cidade ao escravo; de camponeses à gente da elite.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Corinto não era Atenas, mas a classe alta nutria pretensões filosóficas e se orgulhava de seu conhecimento e sabedoria. A questão do texto está diretamente associada a isso. Por um lado, judeus e cristãos agradecem a Deus pela comida; por outro, os pagãos honram aos deuses nos atos de celebração envolvendo refeição.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
A comunidade cristã em Corinto estava dividida entre, pelo menos, duas facções: (a) Os “fortes”, eram aqueles que diziam, acertadamente, que ídolos e deuses não eram nada, pois no fundo só há um Deus. Eram “fortes” porque privilegiados por esse “conhecimento” e pela “liberdade” que gozavam na participação social; (b) os “fracos”, em geral, eram provavelmente pagãos recém-convertidos; em sua vida anterior, estavam acostumados com o sacrifício aos ídolos, por isso, ao ver irmãos e irmãs participando dessas refeições, sua consciência era maculada, escandalizada.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Tudo isso chegou a Paulo, algum tempo após sua partida, em forma de “bomba atômica”. Sua preocupação pastoral e recomendações nos traz, ainda hoje, luz sobre o que fazer, como cristãos maduros e sóbrios (10:15), diante de disputas facciosas. Para meus propósitos aqui, relativos à busca de um saber edificante, ficam três aprendizados:</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<b>Primeiro:</b> <i>Aprender a temperar nosso conhecimento com amor.</i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Como fala a pessoas maduras, Paulo começa com um paradoxo: (a) todos temos algum conhecimento (v. 1); (b) mas quem acha que sabe, ainda não aprendeu como saber/pensar. É preciso desconfiar do que já sabemos e de como fazemos uso do que sabemos, porque o conhecimento infla (ensoberbece, nos faz orgulhosos), e se torna instrumento de destruição (ser mais que os outros). E isso é muito importante: uma pessoa pode até desempenhar uma função ou realizar uma performance melhor que outra pessoa, mas isso não faz dela uma pessoa melhor.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
A questão não é abandonar o conhecimento, mas temperar o saber com o amor. É perguntar se o conhecimento nos faz pessoas melhores (e não apenas mais sabidas). Além disso, reconhecer que a gente só sabe em parte (1Co 13:9) é um modo cristão autêntico de habitar harmoniosamente na casa do conhecimento e na casa do amor, até que os dois formem uma só casa.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<b>Segundo:</b> <i>Aprender que, mais que o saber, o que importa são as pessoas.</i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Paulo diz: eu sei, vocês sabem – o ídolo não é nada! Deus é tudo, há somente um Deus! Essa comida é igual a qualquer outra. Mas não é todo mundo que sabe disso. Portanto, saber não basta, não pode preencher tudo. “O conhecimento verdadeiro não é insensível”. Não é insensível ao outro, à pessoa, que está além do saber, o irmão e a irmã de caminhada, a quem prezamos.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Na década de 70, em O sofrimento que cura, Nouwen dizia lamentar ver sua igreja dividida em questões (gênero, homossexualidade). Então dizia que uma igreja dividida em questões, tende a se esquecer das pessoas. Hoje somos um país também dividido por questões (políticas, ideológicas, religiosas, sociais, etc.). Por causa dessas coisas nos tornamos inimigos de quem pensa e se posiciona de modo diferente, ao ponto de demonizar e excluir tal pessoa de nosso rol de relacionamentos. Muitos (ditos) não-cristãos fazem isso; e muitos (ditos) cristãos também.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Jesus, o fundador e cabeça da Igreja, porém, sempre acreditou que entre nós podia e devia ser diferente: que o primeiro é o que serve; que mulheres e homens têm igual importância; que os últimos serão os primeiros; que pequeninos, pecadores, publicanos e prostitutas nos precederiam no reino dos céus; que pessoas importam mais que coisas ou questões.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<b>Terceiro:</b> <i>Aprender que com grandes saberes vêm grandes responsabilidades </i>(essa eu parodiei, mas penso que vale muito aqui).</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
A começar pela responsabilidade de não colocar “em prática” tudo o que sabe; a abrir mão do “meu direito”, da “minha liberdade”. É obvio que, numa sociedade capitalista, liberal, narcisista e individualista isso soa como uma tremenda heresia!</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Mas Paulo era universalista. Ele era bobinho o bastante para acreditar que, às vezes, o particular precisa ser sacrificado em favor do todo – muito antes disso ser tão polêmico como é hoje. E mais: ele usou seu próprio exemplo como alguém que, “mesmo livre das exigências e expectativas de todos”, tornou-se “voluntário para com todos a fim de ganhar todo tipo de gente” (1Co 9.19). Ele não queria só falar, mas também encarnar a mensagem.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Então, já que o ídolo não é nada; já que comer ou deixar de comer não nos faz mais próximos de Deus, nem melhores que ninguém, é o seguinte: abram mão! Não sacrifiquem as pessoas mais fracas por causa do seu conhecimento e da sua liberdade, não! Porque se vocês macularem isso, se vocês ferirem essas pessoas, ao próprio Cristo estarão fazendo.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Então, podemos perguntar: como é a que a gente pode fazer isso, Paulo? É simples, ele disse, vocês têm que agir de modo semelhante a Jesus (Cf. Fp. 2.5-11). Em outras palavras, na contramão de um mundo inflado e tão cheio de si; na contramão de religiosos que só querem se encher do sobrenatural de Deus; na contramão de suas teologias, ideologias, e causas partidárias: ESVAZIEM-SE!</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
Num mundo dividido em facções, que a gente não se esqueça de Jesus; nem de que naquela cruz, todo direito e toda liberdade foram redimidos, mas também esvaziados. Que o saber, ainda mais o teológico, deve existir para ajuntar e edificar, e não para dividir. Se vier a dividir, como ocorreu com Jesus, que não seja pela nossa soberba, mas pelo incômodo gerado por nosso testemunho e nossa obediência a Jesus.</div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-91611237938896442902016-09-19T10:29:00.000-03:002016-09-19T10:29:32.821-03:00O risco de se perder e a graça de ser achado<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMIUBEkUPoxoJIXwfW1lpXrLipVd_s3EFULN5FFN7hJ01Z7XIgRLyF-c0mGS3_yVtDlNaHW65AiIF-it5SbddS76UQvJFZ3r2VwrnjozhOG2pyEFHzr118ZeL3pBJccz74tZn5Glxrbx56/s1600/Filho+pr%25C3%25B3digo+.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="225" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMIUBEkUPoxoJIXwfW1lpXrLipVd_s3EFULN5FFN7hJ01Z7XIgRLyF-c0mGS3_yVtDlNaHW65AiIF-it5SbddS76UQvJFZ3r2VwrnjozhOG2pyEFHzr118ZeL3pBJccz74tZn5Glxrbx56/s400/Filho+pr%25C3%25B3digo+.jpg" width="400" /></a></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: right;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">“Ele estava bem longe, na estrada, quando o pai o
avistou...” (Lc 15.20)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Certa vez, um grupo de religiosos – ou de gente que se
considerava bastante justa – viu um de seus mestres acompanhado de uma turma
que eles consideravam ter uma “reputação duvidosa”. É que gente religiosa
costuma se preocupar mais com reputação que com integridade. Então, começaram a
fofocar entre eles sobre o absurdo daquela situação. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Ouvindo atento àquela conversa, mas sem responder às
acusações ou se preocupar com os rótulos que recebera só de aparência, aquele
homem, um perito em contar histórias, resolveu emendar umas duas ou três parábolas,
que falavam de “perdição” – assunto, aliás, que não saía da agenda daquele
grupo, afinal gente que se acha justa demais se preocupa tanto em arbitrar
sobre o fato de uma pessoa ser perdida, que se esquece de espalhar a boa-nova
de ser achado – mas também, voltando às histórias, falavam de reencontro,
perdão e celebração. Uma me chama a atenção em especial, que gostaria de
retratar aqui.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><b>A história recontada</b><a href="file:///C:/Users/Jonathan/Documents/Jonathan/SERM%C3%95ES%20&%20ESTUDOS/Serm%C3%B5es/O%20risco%20de%20se%20perder%20e%20a%20gra%C3%A7a%20de%20ser%20achado.doc#_ftn1" name="_ftnref1" title=""><span class="MsoFootnoteReference"><span class="MsoFootnoteReference">[*]</span></span></a></span></div>
<div>
<div id="ftn1">
</div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">É a história de um pai que tinha dois filhos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><b>O mais velho</b> era um daqueles
tipos dedicados, trabalhador responsável, fazia tudo direitinho e gostava de
ver tudo nos conformes. Perfeccionista que era, quase nunca faltava na escola e
era o primeiro de sua turma. Cedo mostrou interesse em ajudar o pai a tocar os
negócios da fazenda, mas fez questão de trabalhar duro para mostrar serviço e
comprometimento. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><b>O mais novo</b> era o oposto de
seu irmão, o típico “ovelha negra” da família. Irreverente, extrovertido,
criativo – se focava mais em pessoas que em tarefas – encantado pela música,
tinha um “fraco” evidente por mulheres, nunca fez questão de ser o melhor nos
estudos, mas sempre dava um jeito de tirar a nota necessária para “passar
raspando”. Ao contrário de seu irmão, nunca demonstrou grande interesse pelos
negócios da família. Seu irmão e empregados mais chegados o viam como um <i>bon vivant</i> (alguém que vive a vida para
valer), “cabeça de vento”; por vezes era possível ver o mais velho indignado
quando pegava o caçula saindo mais cedo do batente só para contemplar o cair da
tarde da varanda ao som de boa música, poesia, vinho e diversão com os amigos
até altas horas. Embora reprovasse veementemente o comportamento desregrado do
irmão, em seu íntimo, silenciosamente, nutria certa inveja da vida que ele
levava...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">O pai procurava entender e lidar com o jeitão e as
aptidões de ambos, cuidando meio que à distância, tentando possibilitar a
vocação de seus filhos, sem frustrar-lhes a liberdade, mas obviamente preocupado
com o futuro dos dois, especialmente com o do caçula, que era quem menos dava
margem para a intervenção do pai. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Certo dia ele lhe deu um susto. Primeiro, quando fez um
inusitado pedido: queria antecipadamente a parte que lhe cabia na herança que
um dia receberia. O pai, tentando ser generoso e justo ao mesmo tempo, embora
desolado e aflito, o atendeu. Dividiu a herança em partes iguais entre os dois
filhos. Dias depois vieram o susto e a desolação maiores: repentinamente o filho
mais novo surgiu com a ideia de deixar a casa do pai. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">O que efetivamente aconteceu e ele partiu para um país
distante. Enquanto em casa, vivia com a sensação de que estava desperdiçando a
vida, de que havia muito pra ver; quando partiu, foi com um único desejo em
mente: aproveitar a vida! <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">E ele aproveitou “até às tampas”, ao exagero, à fadiga
total do corpo e de alma: consumiu, aproveitou, curtiu a vida “adoidado”, experimentou
os extremos, e, sem se dar conta, torrou toda a grana que tinha. O seu muito
virou bem pouco diante da imensidão de possibilidades e das escolhas que fez. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Logo veio uma fome que atingiu toda a região onde ele
se encontrava. E ele não havia se preparado para aquilo. Sem dinheiro, sem
teto, sem abastecimento e sem emprego, ele teve que trabalhar pesado – coisa
que até então não conhecia, pois nunca tinha feito na casa do pai – tomando
conta de porcos. De repente se viu tão esfomeado que já estava até desejando
saborear a iguaria comida pelos porcos. Mas nem aquilo podia ter. finalmente
ele chagou no fundo do poço.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Foi quando se deu conta do absurdo daquela situação.
Então se lembrou do pai. Resolveu voltar, pedir perdão ao pai, assumir sua
transgressão e esperar pela misericórdia de, pelo menos, poder ser achado como
mais um entre nos empregados da fazenda do pai, uma vez que um dia ele
sacrificou e maculou o lugar sagrado que graciosamente tinha ao lado do pai. É,
meus irmãos, o amor é como um solo sagrado: não pisamos no de muitas pessoas,
nem são tantas pessoas que pisam no nosso; mas quando esse solo é corrompido, a
dor que fica é humanamente irreparável. E o filho pródigo sabia disso,
compreendia que nada do que ele fizesse poderia reparar o mal causado no
passado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Alguns dias depois, estava o pai sentado na fazenda de
sua casa, exatamente pensando em seu filho, sangrando a dor da distância,
corroído pela saudade, aturdido por imaginar que o filho estava perdido, ou
quem sabe morto. Fechou os olhos por um momento o cochilou. Acordou com uma
revoada de pássaros e a ventania e, na estrada, para além do portão da fazenda,
ainda distante, avistou o maltrapilho filho caminhando, ou melhor, cambaleando,
de volta para casa. O coração do velho disparou. Ele não quis esperar, já tinha
esperado demais, e saiu correndo ao encontro do filho e, chegando, o abraçou e
o beijou. O filho, sem entender muito bem o calor daquela recepção, tentou
começar o discurso de retratação que havia preparado. O pai cobrindo-o de
beijos e ele, por sua vez, tentando das explicações! Mas o amor do pai não
pedia explicações, pedia o abraço reconciliador, cedia o perdão gratuito, e
transbordava a graça que festeja o retorno, a volta do perdido que foi achado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Sem ouvir o que o filho dizia, ainda coberto de euforia,
o pai gritou aos seus empregados e ordenou: – “Venham, tragam roupas e o
vistam. Coloquem o anel da família no seu dedo e calçado em seus pés. Apanhem o
melhor e mais gordo carneiro e o assem. Nós teremos festa! É tempo de celebrar!
Meu filho está aqui – dado como morto, agora vive! Dado como perdido, agora foi
encontrado!”. E foi a maior festança, como nenhuma festa antes vista. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">O pai é assim, se regozija em cada reencontro, e faz
de cada reencontro um evento singular, nunca visto, jamais repetido. O amor
personifica, gentifica!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Mas não nos esqueçamos que havia outro filho, que
havia ficado em casa. Ele voltava do campo naquele dia, cansado do trabalho. Se
aproximando da casa, percebeu um movimento incomum na parte dos fundos, música,
gente falando e rindo alto. Logo foi informado que o pai oferecia uma festa em
comemoração ao retorno de seu irmão pródigo, a quem dava por totalmente
perdido. Quando se deu conta, já estava revoltado e, é claro, recusou
participar da festa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">O pai, atento a tudo, sentindo a ausência do outro
filho, foi atrás dele e tentou conversar. Mas seu primogênito não o ouvia. Só
conseguia sentir mais raiva, até que disse: – “Olha pai, por quantos anos eu
permaneci aqui te servindo, nunca te dando uma dor de cabeça sequer, e você jamais
ofereceu uma festa dessas para mim e meus amigos?!”. O pai ficou em silêncio
por alguns segundos, demonstrando tristeza com aquelas palavras. Mas logo, com
misericórdia e paciência, típicas de pai, ele olhou para o filho e disse: <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">– “Filhinho, você não entende! Você está comigo esse
tempo todo e tudo o que é meu é seu também. Mas esse é um momento único,
maravilhoso, e temos que festejar! Porque seu irmão estava morto, mas reviveu!
Estava perdido, mas foi achado!”. Duvido que ambos tenham voltado para a festa
naquele dia... Pois o mesmo pai que festeja é o pai que também sangra quando vê
um filho/a perdido por alguma razão...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<b><span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Imagens e
percepções finais...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Essa história é uma das mais impactantes e que melhor
resumem o espírito do Evangelho, e o espírito de Jesus Cristo: é a história do
amor do Pai nos encontrando onde quer que seja em qual seja a condição em que nos
achemos. E nos abraça com um amor que não se pode medir, substituir ou
comparar!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">E a grande moral da história não está em saber quem
são, apontar ou identificar os perdidos da história. A questão é saber quem não
é, ou quem nunca foi perdido? Os dois filhos da parábola estavam perdidos; a
diferença é que um estava perdido fora de casa, e o outro dentro. Porque não é
preciso sair de casa para viver perdido; basta se desconectar das pessoas que
amamos e de Deus.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Então, antes de tudo, percebe-se que esta é uma
história para ninguém em específico e para todo mundo em geral; pois, em alguma
dimensão da vida, <i>todo mundo é pródigo</i>
(parafraseando Gerson Borges). E é aos pródigos, aos maltrapilhos, aos pobres
de espírito, aos pequeninos que o Senhor, paradoxalmente, escolheu convidar
para o banquete do reino. Em outras palavras, o que Jesus estava fazendo
enquanto andava com aquelas pessoas não é em nada incoerente com o que ele
anunciou a vida toda. <i><o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="background: white;">Essa história, contudo, mostra que é possível permanecer
perdido, mesmo sem nunca se deixar perder, sem nunca ter partido, como é o caso
do filho mais velho.</span><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="background: white;">Esse é um dos paradoxos da parábola: quando dizemos que já
fomos achados, que nada mais resta para ser redimido, aí é que perdidos estamos
e de modo permanente, invisível. Quando, porém, reconhecemos que perdidos
estamos, mesmo que por pouco, significa que há esperança de ser encontrado ou
reencontrado...</span><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<span style="background: white;"><span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Sendo honesto, então, preciso admitir isso: sou um eterno
reincidente! Não há um dia sequer de minha vida em que, por muito ou por pouco,
eu não caia. Essa é uma verdade inconveniente sobre mim: eu vivo caindo! Nem
todos sabem; poucos gostam de admitir, mas Deus o sabe...<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<span style="background: white;"><span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">A inconveniência dessa verdade está não somente no fato de
que ela me expõe como pessoa, mas também de que ela mostra que o cair não
precisa ser inimigo do estar de pé, de levantar, de poder se reerguer. Na
verdade, como diz o ditado, “para cair, basta estar de pé”. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: justify;">
<span style="background: white;"><span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Ou, melhor ainda, como disse Paulo, “<i>quem pensa</i> estar de pé, cuide para que não caia”. Cuide, e não
negue; cuide, e não reprima; cuide, o que significa, lide com a possibilidade
sempre iminente da queda... <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Por isso, é importantíssima no filho mais jovem a
atitude de reconhecimento, também crucial a todos nós, em que se admite: “Estou
perdido”! Sem isso, não há encontro possível. <i>Quem nunca se sentiu perdido na vida não pode reconhecer a alegria e a
satisfação de ser encontrado... </i>É preciso honestidade para se identificar
com o filho mais novo, como fez Henri Nouwen quando declarou: “Sou o filho
pródigo toda vez que busco amor incondicional onde não pode ser encontrado”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">O que mais tem me chamado a atenção, ao reler esta
parábola ultimamente, é que não somente os dois filhos são as figuras
vulneráveis e perdidas da história. O pai também é. Não da maneira dos filhos,
é claro; o pai é “perdido de amor”. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">É essa imagem de Deus que a parábola me revela: a
imagem de um Deus de amor, que também se encontra “perdido” em busca de seus
filhos perdidos e não descansa até que, finalmente, os encontre. Um Deus que
nos ama com um amor incondicional, incansável, imponderável, às vezes tolo,
insano e nada justo aos nossos olhos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Aposto que todos nós aqui já tivemos o sentimento de
irmão mais velho, dizendo: – “Eu estou esse tempo todo aqui, ralando, me
esforçando para não pisar na bola, e nunca recebi nada ‘extra’ por isso,
enquanto esse meu irmão ferra com tudo, enfia o pé na jaca feio, e ainda é
recebido com festa! Simplesmente não é justo!”. Agora eu pergunto: quem disse
que o amor é justo? Se o amor fosse justo, como imaginamos que deva ser, o que
seria de nós? Como qualquer um de nós poderia receber e dar amor?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">É para esse tipo de loucura que Deus está nos
chamando, para amar conforme um tipo de amor que o mundo desconhece, que é
motivo de espanto, escândalo, e até mesmo frustração. É um amor que não força,
não se apossa, agarra ou empurra; é um amor que liberta da <i>obrigação do amor</i>, para a <i>possibilidade
do amor</i>...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Helvetica Neue", Arial, Helvetica, sans-serif;">No fim das contas, se nossa consciência nos acusa, se
nosso coração nos condena, como o do pródigo, lembremos: Deus, o Pai de amor, é
maior que nosso coração, e sabe o que é melhor para seus filhos/as. Pode
reprovar com veemência quando maculamos o solo sagrado que há entre nós e Ele;
mas, enquanto houver arrependimento, haverá perdão, e o convite para uma nova
festa, e um novo reencontro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin: 6pt 0cm; text-align: right;">
<b><span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;">Jonathan</span></b></div>
<hr align="left" size="1" width="33%" />
<div id="ftn1">
<div class="MsoFootnoteText" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica Neue, Arial, Helvetica, sans-serif;"><a href="file:///C:/Users/Jonathan/Documents/Jonathan/SERM%C3%95ES%20&%20ESTUDOS/Serm%C3%B5es/O%20risco%20de%20se%20perder%20e%20a%20gra%C3%A7a%20de%20ser%20achado.doc#_ftnref1" name="_ftn1" title=""><span class="MsoFootnoteReference"><span class="MsoFootnoteReference"><span style="font-size: 10pt;">[*]</span></span></span></a> A história aqui reimaginada e recontada é uma narrativa baseada no texto de Lucas 15.11-32, conforme as traduções <i>Nova Versão Internacional</i> e <i>The Message</i>, de Eugene Peterson.</span></div>
</div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-60010258529571953632016-09-16T13:17:00.001-03:002016-09-16T13:17:31.035-03:00Morte e vida, gêmeas siamesas<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgXoFZAN4GK9owJ45ez_OUGuzc1cJ4epi8galS4nEOBSBOK6QJRhUNP016upi0Aqklg0jsehl9tVhOBxKRHyyuc31Kulds3PM9b_dT3-o4jySk0T99ckJkdK0h75qcogFGbEUE9Ys59rJ49/s1600/life-cycle-picture.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="225" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgXoFZAN4GK9owJ45ez_OUGuzc1cJ4epi8galS4nEOBSBOK6QJRhUNP016upi0Aqklg0jsehl9tVhOBxKRHyyuc31Kulds3PM9b_dT3-o4jySk0T99ckJkdK0h75qcogFGbEUE9Ys59rJ49/s400/life-cycle-picture.jpg" width="400" /></a></div>
<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;"><br />É necessário muito tempo para a gente aprender a viver. Porque somos lentos, frágeis e teimosos demais.</span><br />
<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;">Ou simplesmente porque, repetindo o jargão, viver não é fácil – especialmente para gente tão complicada quanto eu.</span><br style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;" /><span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;">Mas nem sempre temos esse tempo todo para aprender. </span><br style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;" /><span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;">Pois é necessário apenas um instante para que a vida seja ceifada, e com ela, os anseios de um hoje não vivido e de um amanhã melhor. </span><span class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #1d2129; display: inline; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;"><br />É, o amanhã não existe mesmo. Tecnicamente, talvez, mas na prática nunca se sabe. Por isso eu nunca aposto no amanhã; aposto no hoje.<br />Pois, mesmo com o desejo de ter vivido mais, e mesmo sendo cedo demais para alguns, é possível partir com a certeza de que a vida que vivemos valeu à pena.<br />E, assim, a saudade pela partida, para quem fica, se torna menos carregada e a dor pode andar de mãos dadas com a gratidão – ao menos eu acho...<br />Você pode querer sublimar, fazer de conta, buscar consolos fáceis ou ilusões úteis que te façam esquecer da realidade e te projetar para outra, menos “real”, menos cruel...<br />Mas a realidade é uma só: a morte é um fato inescapável, e ela não tem preferidos.<br />Cedo ou tarde, ela virá. E “tudo o que era sólido se desmancha no ar” (Marx), ou melhor, na terra ou debaixo dela.<br />Só que Bauman nos disse que hoje, já, agora, o sólido tem virado líquido. Bem, mas não apenas de hoje...<br />Há milhares de anos, Eclesiastes já tinha dito que tudo é fumaça, que nada faz sentido. E eu acrescento: nada permanece!<br />Nada mesmo?<br />A única certeza que tenho é a do instante, e preciso fazer dele o melhor possível enquanto tenho oportunidades. Mas só o agora oferece oportunidades.<br />Posso morrer sem ter mudado muitas coisas na minha vida e no mundo a meu redor; mas quero morrer bem ciente de que tentei ao máximo. De que fiz o que pude. De que que arrisquei. De que me tornei disponível aos outros.<br />E, mais importante, de que amei. Do começo ao fim – permitam-me contradição – só o amor permanece.<br /></span><br />
<div style="text-align: right;">
<span class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #1d2129; display: inline; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.32px;"><b>Jonathan</b></span></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-50275278309271086292016-08-09T20:03:00.002-03:002016-08-09T20:03:54.020-03:00Gente grande<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg5ne2c5L8iVMPeF-nYlJK_cZa91jWhK_GgqtttxzVSd0ADFPkjdFRpuXdkarQtIpdSVxWjI02Xqkfnx0ubkGmVlLNCPIBm5TLme5SEfFpO43F1Je5eJfWspw9KXplSwRTGyOYhuYR8VPQk/s1600/OnlyHuman2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg5ne2c5L8iVMPeF-nYlJK_cZa91jWhK_GgqtttxzVSd0ADFPkjdFRpuXdkarQtIpdSVxWjI02Xqkfnx0ubkGmVlLNCPIBm5TLme5SEfFpO43F1Je5eJfWspw9KXplSwRTGyOYhuYR8VPQk/s400/OnlyHuman2.jpg" width="400" /></a></div>
<br />
Boas notícias muitas vezes podem vir acompanhadas por más notícias; muitas vezes no mesmo dia ou até simultaneamente.<br />
Diante disso, gente mimada tende a espernear e "ficar de mal" com a vida e com outras pessoas - e, convenhamos, alguns e algumas de nós ficamos "de mal" mesmo por pequenos infortúnios.<br />
O problema é que, não sendo mais crianças, isso fica bem estranho, para não dizer ridículo.<br />
Gente grande, porém, sabe que a vida é cheia dessas contradições e paradoxos; na verdade, gente assim já espera por isso, e tem coragem o bastante para lidar tanto com os benefícios quanto com os malefícios de existir e de "estar vivo".<br />
E mais: gente grande sabe que, muitas vezes, ser grande significa saber "ser pequeno", passar por humilhações, enfrentar lutas, perder, frustar-se, cair, mas levantar e começar tudo de novo.<br />
Ser gente (grande) é não temer começar de novo, quantas vezes for preciso; pois às vezes é tão mais confortável seguir do mesmo jeito, não é mesmo?<br />
Porque em todo caminhar adiante há uma incerteza; em toda incerteza, uma oportunidade; e na oportunidade, o risco de acertar é proporcional ao de errar; em cada "mancada", no entanto, há uma chance de crescimento; e todo crescimento traz no bojo uma pitada de desconforto.<br />
Ah, mas às vezes é tão mais simples seguir do mesmo jeito... ser infante pra sempre, quem dera... pudera!<br />
Crescer dá trabalho, crescer traz responsabilidades irremediáveis. Mas também traz o benefício da sabedoria, o privilégio de poder viver e ver a vida com outros olhos, e quem sabe dar os ombros para que outros possam subir também.<br />
O mundo precisa mais de gente grande, do tipo que não tem vergonha de ser apenas e tão somente "humana"...<br />
<br />
<div style="text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-74675832941108117652016-06-21T17:43:00.002-03:002016-06-21T17:43:31.157-03:00Ser menos<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjZbD3LlUIzJhlCGp8D-qTUJFlNHI-zq_-xv0w1q5cQSn5MITGN5xeP0LMd5Hg1aoJWYVD4P0WwZlopQwZLyUhOfFA6EBzQY8568M7aExCKyaYiBA2NC6dxOLn4Q2FhYSsbjsK8m9BT7-Rb/s1600/van-gogh-shoes-mid.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="321" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjZbD3LlUIzJhlCGp8D-qTUJFlNHI-zq_-xv0w1q5cQSn5MITGN5xeP0LMd5Hg1aoJWYVD4P0WwZlopQwZLyUhOfFA6EBzQY8568M7aExCKyaYiBA2NC6dxOLn4Q2FhYSsbjsK8m9BT7-Rb/s400/van-gogh-shoes-mid.jpg" width="400" /></a></div>
<br />
Das grandes artes da vida que ainda quero aprender, uma tem ocupado especial lugar ultimamente: a arte de "ser menos".<br />
As grandes aspirações e o desejo de "ser mais" a mim têm parecido tanto mais superficiais, quanto inúteis. Tudo é fumaça, diz o pregador!<br />
Quanto mais controle sobre a vida quero, menos vida tenho.<br />
Quanto mais saber e poder almejo, menos humanidade e amor dou e obtenho.<br />
O saber pretensioso estultifica. Faz do inteligente o pior dos tolos.<br />
Não sei bem a razão, mas acho que nunca quis ser tanto gente comum quanto hoje.<br />
Talvez porque nosso mundo esteja tão rodeado e preocupado com questões, e bem pouco preocupado com pessoas, com gente.<br />
Hoje vale mais ganhar um debate, provar uma tese, do que fazer um amigo.<br />
Cansei de tentar vencer; meu negócio agora é tentar amar.<br />
Pois somente o amor "gentifica", constrói e liberta.<br />
O problema é que o desejo de amar deve ser proporcional à disposição para perder.<br />
Somente quem ama sabe mesmo o que é sofrer.<br />
Somente quem conhece a dor do choro, é também capaz de consolar quem chora.<br />
Somente quem passa pela tristeza profunda, reconhece o que é alegria.<br />
Quando decidi “ser menos”, aprendi o quanto a grande maioria de minhas ambições foram e são vazias.<br />
Com elas, gostaria de sepultar também sonhos de sucesso, desejos doentios de aprovação, e o anseio fútil por alguns minutos de fama, a serem derretidos no vórtice do próximo instante.<br />
Tentarei não mais alimentar a necessidade quase antropofágica dos outros de consumir meus talentos, pois essa é só mais uma maneira disfarçada de enterrá-los, ou de jogá-los fora.<br />
Estou interessado em provar minhas escolhas, e a descobrir e perseguir quantas delas me conduzem à integridade, sem ter de falsear a realidade de quem sou.<br />
Finalmente, quero aprender andar com Deus sem desaprender a andar com os outros.<br />
Não há nada mais inútil que gritar “hosana nas alturas” sem estender as mãos a quem precisa aqui, nesse chão da história.<br />
Quero a espiritualidade trans-imanente de Jesus de Nazaré, que me ensinou chamar a Deus de “paizinho” e ao estranho de “meu irmão”.<br />
Quem sabe eu já esteja pedindo muito; quem sabe eu já tenha escrito demais.<br />
Quem sabe o desejo de ser menos não passe do velho anseio de querer ser mais.<br />
Quem sabe? Eu não sei.<br />
Mas de uma coisa sei: não é possível ser menos sem a maior de todas as transgressões, a transgressão de si.<br />
<br />
<div style="text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
<div style="text-align: right;">
Londrina, inverno de 2016</div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-47994523448778983612016-05-24T14:21:00.001-03:002016-05-24T14:23:25.610-03:00A apologética cristã e sua obsessão com a verdade: notas do submundo pós-moderno<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhBAUjzvp7t15E8KJfRmN51O7Qxp4WVxMVEE3lyYVarzytfwtVr0bvahDCmLPS-nbWbs0-AljQvJ9tFXSh0BVDdzkmbpNWAfyQXJPorGWfXO6zyV8sKAjiZQOVUykAfcO6NICE9X9lf1sK5/s1600/Paladino.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="315" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhBAUjzvp7t15E8KJfRmN51O7Qxp4WVxMVEE3lyYVarzytfwtVr0bvahDCmLPS-nbWbs0-AljQvJ9tFXSh0BVDdzkmbpNWAfyQXJPorGWfXO6zyV8sKAjiZQOVUykAfcO6NICE9X9lf1sK5/s400/Paladino.jpg" width="400" /></a></div>
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Que a apologética está de novo em alta já não é nenhuma novidade. A questão que me ocupa aqui é: <i>em que ela se sustenta e o que propõe</i>? Com essa pergunta, fica claro que meu interesse nesse ensaio não é nem polemizar com algumas de suas notórias expressões contemporâneas, no Brasil e fora dele, mas entender algumas das bases nas quais se ampara sua metodologia. Para me ajudar a responder essa pergunta, elegi o norte-americano Carl F. H. Henry, teólogo e editor fundador da Christianity Today, e um dos grandes arautos, no século XX, da perspectiva de uma “apologética sólida” (isto é, de uma argumentação lógica e dedutiva em defesa dos conteúdos da fé). Algumas de suas perspectivas sobre a veracidade da fé cristã foram endereçadas em seu livro <i>Toward a recovery of Christian belief</i> (1990), que reúne ensaios de palestras oferecidas por Henry na Escócia em 1989. </div>
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Em um dos ensaios em que mais enfatiza um dos temas mais caros aos apologetas, a questão <i>da verdade</i>, sua afirmação central é a de que a consistência racional é um “teste para a verdade”, e um meio para que a teologia não se transforme em mero fideísmo. Como quase toda apologética, por sua natureza defensiva, possui seus adversários, os escolhidos de Henry neste ensaio são os empiristas, os neokantianos e os existencialistas. Os dois primeiros pelo apelo à objetividade, e o último pelo apelo à subjetividade na busca pelo conhecimento. </div>
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No campo teológico, ele rejeita tanto a visão liberal, de negociar os absolutos da fé bíblica a fim de adequar seu discurso às expectativas do ser humano moderno, quanto a de Kierkegaard e de certos neo-ortodoxos, como Karl Barth (pelo menos em parte de sua obra), por defenderem, segundo ele, que a verdade na religião reside mais no campo da fé (como salto) do que depende de raciocínios ou evidencias lógicas e testes racionais. Para Henry, tais visões não podem ser confundidas com a ortodoxia evangelical, para a qual, em sua visão, “é inaceitável a afirmação irracionalista de que o absurdo intelectual é o que torna dignas as crenças religiosas ou que a obediência espiritual depende de um ‘salto de fé’ indiferente a considerações racionais” (Henry, 1990, p. 39). </div>
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Sua premissa básica, assim, é a da legitimidade de uma teologia dedutiva – fundada em argumentação racional, sistemática e lógica sobre a fé – e a invalidade da alternativa evidencialista, isto é, a que necessita da evidência empírica como prova para argumentos racionais (Henry, 1990, p. 40). Um tanto acertadamente, Henry afirma que mesmo sistemas científicos consagrados, como a teoria da evolução de Darwin ou a teoria da relatividade de Einstein, em certo nível, necessitam de fé, ou seja, da aposta de que as coisas são como efetivamente se argumenta que sejam. “Em suma”, diz ele, “sem a fé, nem a ciência, nem a filosofia, nem a teologia podem fazer progressos” (Henry, 1990, p. 44). </div>
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A teologia dedutiva, embora se ancore na verdade da fé, defende que o teste para esta verdade é sua consistência lógica, a partir da inteligível auto-revelação de Deus; acredita na força do argumento, na defesa proposicional da fé e verificável por meio da Bíblia como meio eficaz de se falar “autoritativamente” sobre Deus. Em tese, não vejo Henry caindo na armadilha infantil de crer na correspondência da verdade com os discursos (teológicos) sobre ela. Ainda assim, ele insiste na ênfase unilateral de que o Espírito usa a verdade, atestada pelas Escrituras e testada pela consistência lógica do discurso, como um instrumento de persuasão e testemunho (Henry, 1990, p. 59). </div>
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A questão crucial aqui, para mim, está em indagar se esse tipo de apelo autoritativo e persuasivo no testemunho seria algo urgente e, discutivelmente, a melhor maneira de se tratar da verdade contemporaneamente e se a principal questão de nossa parte com a verdade hoje é a de sua “defesa”. Se a verdade é, para fins práticos, uma pessoa (Jesus), como e qual é a função e o lugar para o falar dela autoritativa, persuasiva e propositivamente? Minha insistência nessa discussão se dá precisamente por entender que ainda há uma forte corrente no meio evangélico de insistência nessa proposta, que não imputo como sendo errada, talvez só um tanto antiquada para meu gosto – e o de tantas pessoas que, como eu, não conseguem ver sua fé ajustada a apelos absolutistas.</div>
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Crê-se, em certos círculos apologéticos, conforme disse Henry (1990, p. 71), que “a expressividade proposicional é, obviamente, uma pré-condição para a avaliação de qualquer sistema. Um sistema que não pode ser expresso propositivamente envolve uma ambição à verdade não compartilhável e que de nenhuma forma pode ser testado”. Ser proposicional não é um problema em si. Nesse momento, ao reabrir essa discussão, estou lançando mão de argumentos, de perspectivas e, espero eu, de razoáveis proposições. Ou seja, não sou adepto do irracionalismo ou do “vale tudo”. </div>
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O que me parece um tanto ultrapassada é a pretensão à verdade (a com “V” maiúsculo) a partir das proposições; é todo o peso que se dá a elas, como se um pequeno sinal de incoerência em minha fala (o que sempre é uma possibilidade), menos até do que em minha vida, fosse prova da invalidade de meu discurso, pois este não corresponderia à verdade (resta saber: qual corresponde?). Em suma, é a pretensão a ser a única “voz da verdade” em um mundo plural. É claro que em uma discussão nos avaliamos mutuamente com base na assertividade e coerência de nossas proposições, o que não significa que: (a) elas sejam infalíveis; nem que (b) a sua consistência lógica invalida, automaticamente, o discurso supostamente menos consistente de outrem, bem como elimina sua possível aceitação como “verdade particular” em certo contexto. </div>
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Ou seja, o que me parece estar em foco aqui é um debate como disputa, não como diálogo, quando tratamos nossas convicções nesses termos. Isso fica mais claro ainda quando Henry diz que, “se as afirmações revelacionais cristãs são verdadeiras, nenhum outro sistema poderá ser mais compreensivamente consistente” (Henry, 1990, p. 82, grifo meu). A aposta está, portanto, não tanto na verdade em si, que se basta, mas na superioridade, em termos de consistência e coerência lógica, do “sistema cristão” em relação aos demais em sua acessibilidade à verdade. </div>
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Para Henry, em suma, embora não se possa provar (como queriam os empiristas) que o que se afirma no sistema cristão corresponde à verdade reivindicada, sua relevância filosófica depende da afirmação de que a verdade cristã tem validade universal, com alguma garantia para isso sendo apresentada (ver: Henry, 1990, p. 88). </div>
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Uma resposta coerente a estas afirmações de Henry pode ser encontrada na seguinte afirmação de George Lindbeck (1984, p. 69, grifo meu):</div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
Assim como a gramática por si mesma não pode afirmar nada que seja verdadeiro ou falso a respeito do mundo em que a linguagem é usada, mas apenas sobre a própria linguagem, também a teologia e a doutrina, na medida em que são <i>atividades de segunda ordem</i>, nada podem afirmar de verdadeiro ou falso sobre Deus e sua relação com as criaturas, mas apenas falar a respeito de tais afirmações. </blockquote>
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A visão de Lindbeck parece coincidir com a ideia de que a teologia não produz teorias de correspondência com a verdade, uma vez que ela seria uma espécie de “fala sobre a fala” (<i>aboutness</i>, na linguagem de Rorty), isto é, não o próprio espelho da linguagem divina, mas uma fala acerca tanto da fala de Deus (isto é, das Escrituras, que contêm sua Palavra) quanto das demais falas sobre Deus.<br />
<br />
Então, penso que uma coisa é a afirmação (racional, propositiva e coerente) de suas convicções em diálogo, escuta e respeito com as demais; outra, bem diferente, é a afirmação da sua em detrimento e exclusão das demais convicções (como que dizendo: se a minha convicção nasce e é expressão da verdade, a do outro não pode ser, afinal, a verdade “é uma só”: ou é verdade, ou é mentira, não tem “meio termo”). Ademais, diria que se alguma evidência (ou prova) pode ser reivindicada pelos que se consideram discípulos da verdade (Cristo), esta seria, nos termos de André Comte-Sponville (2008, p. 58), uma “evidência muda”, isto é, que se basta em si mesma, no ser mesmo, na vivência mesma, sem necessitar, forçosamente de defesa, argumentação, prova ou discurso para que “seja a verdade”.</div>
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O que preocupa aos cristãos em geral é uma coisa chamada “critério de decisão”. Qual é o critério que devemos adotar para decidir sobre questões de cunho moral, por exemplo? Richard Rorty tem muito a ensinar aos pensadores cristãos nesse sentido. O problema, para ele, não é a busca por critérios em si, mas a busca deles no mundo (ou em Deus) na expectativa de que ele “fale”, ou melhor, dite o que é ou tem de ser. Essa tentação de buscar critérios no mundo é devida a tendência de pensar no mundo, ou no próprio ser humano, como possuidor de uma “natureza intrínseca”, uma “essência”. Como não alcançamos essa essência (apenas pretendemos), o resultado é a “tentação de privilegiar uma dentre as muitas linguagens com que habitualmente descrevemos o mundo ou nós mesmos”, e a consequente criação de “vocabulários-como-totalidades” (Rorty, 2007, p. 31), ou, diria eu, de <i>vocabulários-deuses</i>. </div>
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Evitar essa tentação é minha proposta nessa breve discussão. Para isso é necessário um sacrifício: não o sacrifício da verdade, mas o sacrifício pela verdade – se é que ainda nos importamos com ela, e não apenas estamos interessados no poder ou status que a pretensão de possuí-la, ou que sua posse efetiva como efeito do “abuso espiritual” ou religioso, nos confere. O sacrifício<i><b> da verdade</b></i> acontece sempre que alguém alega tê-la encontrado, em seu estado absoluto, e a codificado em uma linguagem; já o sacrifício <i><b>pela verdade</b></i> é um sacrifício de si mesmo e da visão de que minha linguagem e teologia correspondem ao modo como as coisas (Deus, sua Palavra) realmente são. O sacrifício pela verdade é uma imitação do sacrifício de Jesus – o caminho, a verdade e a vida –, que como Ser-Verdade se sacrificou por amor, ao contrário de muitos dos que dizem seus seguidores, que continuam, em nome de uma versão tremendamente distorcida dele, sacrificando o amor ao próximo em nome da apologia da verdade: que mata, trucida e exclui. </div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
<i>Em contrapartida, afirmar que só sabemos em parte é um modo cristão autêntico de viver na casa do conhecimento sem abandonar a casa do amor. </i></blockquote>
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O saber, assim como a sombra, é uma espécie de bloqueio. Já nasce limitado. A luz, porém, continua brilhando lá fora... Não temos, portanto, o papel de fazê-la brilhar mais (pois seu brilho é suficiente, e porque é ela que ilumina nossas trevas, não o contrário); nem de tentar brilhar mais que ela (num surto narcísico); mas de, num “manquejar vitorioso” (Manning, 2005, pp. 179-194), caminhar nela. E, assim, poder orar como o salmista: “Lâmpada para os meus pés é tua palavra, e luz para o meu caminho” (Sl 119:105).</div>
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<b>Jonathan</b></div>
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<b>Referências bibliográficas</b></div>
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COMTE-SPONVILLE, André. <i>Valor e verdade</i>. São Paulo: Martins Fontes, 2008. </div>
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HENRY, Carl F. H. <i>Toward a recovery of Christian belief</i>. Wheaton, Illinois, EUA: Crossway Books, 1990.</div>
<div style="text-align: justify;">
LINDBECK, George A. <i>The nature of doctrine</i>. Religion and theology in a postliberal age. Philadelphia, Pennsylvania: Westminster Press, 1984. </div>
<div style="text-align: justify;">
MANNING, Brennan. <i>O evangelho maltrapilho. </i>São Paulo: Mundo Cristão, 2005.</div>
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RORTY, Richard. <i>Contingência, ironia e solidariedade</i>. São Paulo: Martins Fontes, 2007. </div>
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Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-90825962914145432142016-05-16T10:44:00.001-03:002016-05-16T13:40:44.076-03:00Transcender a aparência, rencontrar a ipseidade<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMwyzYLY1QJsBRsgPEF7V7uCtJLGj0TE8lZ5ilrl_wneDjM8DHee3hfLo5mg3dcWK1Ha5paC9iHYlLsZsHqSLAVCFTQsva_dLJS07h3PbeSiN3kqRss3gyZaqwG9InI9MMDZQtko80VQ_H/s1600/Who+Am+I+2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="286" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMwyzYLY1QJsBRsgPEF7V7uCtJLGj0TE8lZ5ilrl_wneDjM8DHee3hfLo5mg3dcWK1Ha5paC9iHYlLsZsHqSLAVCFTQsva_dLJS07h3PbeSiN3kqRss3gyZaqwG9InI9MMDZQtko80VQ_H/s400/Who+Am+I+2.jpg" width="400" /></a></div>
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Que empreendimento nefasto, infeliz e destrutivo esse de lutar pela aprovação alheia!<br />
<br />
Aos poucos, vamos nos esquecendo de quem somos, de nossa origem, de nossa personalidade, que vai sendo formada à imagem e semelhança do que os outros projetam, e que nós abraçamos visando agradar os outros.<br />
<br />
Será que existe algo mais volúvel e fugaz que a opinião e aprovação (ou não) alheia sobre nós?<br />
<br />
Um dia, você está no céu; no outro, é mandado ao inferno.<br />
<br />
Os mesmos que uma vez disseram que você é “o cara" ou “a mina”, pouco tempo depois, por não aprovarem algo que você disse ou fez, te condenam ao ostracismo.<br />
<br />
E se vivermos apenas em função disso, onde vai parar nossa ipseidade (aquilo que faz com que sejamos o que somos)?<br />
<br />
Que ela seja formada também por aquilo que emprestamos dos outros, disso não tenho dúvida. Mas não são os outros – sobretudo os que só enxergam a aparência – que têm de determinar quem somos, principalmente porque são raras as pessoas que nos aceitam do jeito que somos, não apenas a "aparência".<br />
<br />
No fundo, nossa luta é para que nos tornemos aquilo que somos.<br />
<br />
E por mais que minha ipseidade revele também minha dependência de outras pessoas, penso que ela também me reveste da capacidade de escolher a medida ou a extensão desse poder, para minha própria sanidade.<br />
<br />
Portanto, preciso da conscientização diária de que meu ser é originado na Vida; sou, portanto, Filho da graça de um Deus que me chama "amado". Quem vive apenas para agradar os outros é porque se esqueceu de sua ipseidade original, de sua identidade de Filho.<br />
<br />
A esperança é a de que um dia seremos achados como somos. E toda aparência se desvanecerá.<br />
<br />
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<b>Jonathan </b></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-69180051361561370142016-03-22T14:35:00.000-03:002016-03-22T15:23:46.290-03:00Do amor ao inimigo<span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ2ZNffsBDkckgfO_xt-SdQUbTzBhm6bZZKST7A7O3pP-iZCy97Yzrk07OtZC1k9rX6n77Z6tWrURkmpH2KB73SXaGsCFQZ2JtXyqC43_cS8_xctgR4h2cd6eqpWIf7579b_Tvyqh1Bl0_/s1600/Love+Enemy.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ2ZNffsBDkckgfO_xt-SdQUbTzBhm6bZZKST7A7O3pP-iZCy97Yzrk07OtZC1k9rX6n77Z6tWrURkmpH2KB73SXaGsCFQZ2JtXyqC43_cS8_xctgR4h2cd6eqpWIf7579b_Tvyqh1Bl0_/s400/Love+Enemy.jpg" width="400" /></a></div>
<blockquote class="tr_bq">
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Vocês ouviram o que foi dito: ‘Ame o seu próximo e odeie o seu inimigo’. Mas eu lhes digo: Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de seu Pai que está nos céus. Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos. Se vocês amarem aqueles que os amam, que recompensa receberão? Até os publicanos fazem isso! E se vocês saudarem apenas os seus irmãos, o que estarão fazendo de mais? Até os pagãos fazem isso! Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de vocês (Mt 5.43-48, NVI).</div>
</blockquote>
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De todas as palavras da Bíblia, o "dar a outra face" e "amai vossos inimigos" me parecem ser as que vão mais contra a natureza humana e tudo quanto eu prefiro e tendo a fazer. Por isso, talvez, sejam temas ausentes da pregação cristã, uma vez que é tão difícil viver. </div>
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<br /></div>
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Então, é um tema que a gente trata com certo desdém, como se fosse uma história que Jesus contou um dia, mas que não necessariamente tem que ter a ver com nossa vida (Jesus só podia estar de brincadeira se ele achava que a gente seria capaz de colocar isso em prática). É "utopia", diriam alguns. Mas para que serve a utopia? Não para negar a realidade, mas para iluminá-la; não para nos distanciar do chão, mas para nos fazer andar melhor nele.</div>
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<br />
Aqui está o meu problema com aqueles que vivem dizendo que Jesus era simples e de que o evangelho é simples. Pode, às vezes, partir de um ponto muito simples; e pode até ser simples de entender. Mas será simples de viver? Se fosse simples de viver, não seria nem necessário gastar tempo refletindo sobre isso. Mas não. Abraçamos o evangelho não apenas com o (suposto) entendimento do evangelho, mas, sobretudo, com a vivência do evangelho. E faz parte do processo de amadurecimento na vida (cristã) ter de conviver e lutar com as poucas ou muitas inadequações existentes entre o modo como entendemos e o modo como vivemos.</div>
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<br /></div>
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Afinal, o que Jesus está nos convidando a fazer nesse texto, quando fala de uma forma mais ampla e complexa de amor, que é o amor aos nossos inimigos e perseguidores?<br />
<br />
<b>I. Um convite à inversão de nossos padrões culturais (v. 43-44)</b></div>
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<b><br /></b>Observe que ele começa com um "vocês ouviram o que foi dito". A antiga lei, com a qual eles estavam acostumados, partia de um princípio de retribuição: se pegou, pague; se apanhou, bata; se recebeu amor, dê amor; se foi odiado, odeie; se venceu, receba o prêmio; se perdeu, lide com a derrota; etc. </div>
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<br /></div>
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É a maneira como nossa cultura - e a nossa justiça, distributiva e retributiva por natureza - tende a nos impulsionar a agir. Como? Dando inúmeros exemplos diários, da escola à universidade, do trabalho ao trânsito, do bar à igreja, de que é assim que as coisas funcionam "aqui em baixo". E, quando menos se percebe, já estamos normalizando esse modo de ser e nos adequando a ele, afinal, para sobreviver na selva é preciso, às vezes, agir como selvagem. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
O convite de Jesus é para que desafiemos isso, invertendo os padrões. Aceitar o convívio harmonioso com quem te persegue não basta, é preciso amar o inimigo e orar por ele. </div>
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<br /></div>
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Nos tornamos, assim, bobalhões que aceitam tudo e abaixam a cabeça para a injustiça? Não. Jesus foi um bobalhão? Acho que não. Ele lutou, mas com armas diferentes das de seus algozes. Sua justiça era a do reino; e a justiça do reino caminha de mãos dadas com o amor. Não pune, mas perdoa; não bane, mas restaura. Essa é a diferença entre a justiça retributiva e a justiça restauradora, como demonstrou Desmond Tutu em seu livro <i>Por que Deus não é cristão e outros ensaios: </i>enquanto o propósito da primeira e punir o perpetrador, o da segunda não é punitivo, mas restaurador, curador. Segundo ele, "a justiça restauradora acredita que um crime causa uma brecha, perturba o equilíbrio social, o qual, por sua vez, deve ser recuperado, assim como a brecha precisa ser fechada, em um processo em que o ofensor e a vítima possam se reconciliar e retornar à paz" (p. 62).</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
Assim, o amor ao inimigo não é um convite à subserviência, é um convite à revolução! Mas essa revolução precisa começar primeiro dentro da gente., o que nos remete a um segundo convite implícito no texto.</div>
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<br />
<b> II. Um convite para que abracemos nossa filiação (v. 45) </b></div>
<div style="text-align: justify;">
<b><br /></b>Começa dentro de nós, como eu disse, na medida em que avaliamos quem somos diante de Deus. Nós somos "filhos". E o que nos torna filhos? O fato de que somos nascidos do Pai, e agimos conforme ele age. E como age o Pai? Aqui tocamos num ponto importante. Para responder a essa pergunta, é útil que nos voltemos para dentro de nós mesmos, e nos perguntemos: <i>Como nós temos agido ou como tendemos a agir?</i> </div>
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<br /></div>
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Brennan Manning, no seu livro <i>A sabedoria da ternura</i>, disse que certa vez fez a si mesmo a pergunta: "Será que eu gasto os meus dias amando?". Depois de um exame de alma, a resposta foi "sim". O problema foi quando ele descobriu que dividia a comunidade humana em certas categorias. Então, ele disse: "Há algumas poucas pessoas que amo, certo número de pessoas de quem gosto e uma multidão em quem raramente penso, a quem me dirijo de maneira proativa ou por quem não manifesto qualquer interesse" (p. 85). </div>
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<br />
Essa talvez seja uma conclusão a que a maioria de nós, incluso a mim, chegaria caso se fizesse a mesma pergunta. Nós fazemos acepção entre pessoa e pessoa. Achamos isso natural. Amamos a quem é mais natural e fácil de amar. E no mais baixo escalão dessa acepção, colocamos nossos inimigos e pessoas que nos perseguem. Como amá-las? E mais do que isso: por que eu deveria amar essa pessoa? O que ela fez para merecer? Pelo contrário, muitas vezes as pessoas nos dão mais motivos para ódio e repulsa que para o amor - o que coloca em cheque a dependência do amor em relação ao mérito e ao dever.</div>
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<br /></div>
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Cito dois casos que aconteceram numa história recente, para nos ajudar a refletir. O primeiro ocorreu em 2012, com um menino do Rio de Janeiro, Wesley, de 2 anos, que morreu após uma parada cardíaca, com escoriações e fraturas no corpo e cabeça. O pai e a madrasta foram acusados de cometer o crime. Fico pensando se fosse com meu filho, uma violência bruta e covarde dessas: o que eu faria? Se você fosse a mãe desse menino, o que seria capaz de fazer com quem praticou essas atrocidades? O segundo aconteceu no mesmo ano em um cinema, em Colorado, nos EUA, quando um atirador de 24 anos fuzilou a plateia, deixando 12 mortos, e mais de 70 feridos, sendo 11 em estado grave. Se você fosse uma pessoa próxima de alguma das vítimas, perdoaria o seu algoz? Seria capaz de amá-lo sendo quem ele é, tendo feito o que fez? </div>
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<br /></div>
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É natural que desejemos que se faça justiça e que as leis sejam aplicadas a cada um dos culpados. Mas, e depois? Não há nenhuma possibilidade de perdão e restauração ao condenado? Difícil, certamente difícil pensar nessa pessoa andando livre pelas ruas outra vez, enquanto aqueles que amamos se foram. Mas quem sou eu para exigir seu banimento para sempre? O ódio e a ausência de perdão não são também formas de se manter também preso com eles, formas de autopunição? E o que Deus faz? Bem, Jesus diz que Ele ama, dá o seu melhor a despeito de quem seja, bom ou mal - como lemos: <i>ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos</i>.</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Sei que não é fácil. Mas, ser filhos e filhas de Deus é fazer o que Ele faz, mesmo que nunca no mesmo nível. Como lemos em João: "Aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus" (1Jo 4.7). Para isso, é preciso perceber o convite oculto de Deus nesse texto, como demonstro a seguir, e que pode ser um tanto aterrador.</div>
<div style="text-align: justify;">
<b><br />III. Um convite para um amor que transcende as categorias de bem e mal... e que cobre uma multidão de pecados.</b> </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
Deus nos convida a amar nossos inimigos por que Ele ama os seus inimigos: nós. Deus demonstrou seu amor por nós sendo nós ainda pecadores ou inimigos de Deus (Rm 5.8). E a pergunta crucial é: algum dia deixamos de ser pecadores? </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Não fosse pela graça, nunca deixaríamos de ser inimigos de Deus e, se não for pela graça, que todos os dias nos alcança, jamais deixaremos de ser. Na verdade, de muitas maneiras continuamos a ser algozes de Deus. Então, o amor de Deus transcende as categorias de bem e mal porque Ele não distingue quem vai amar. Se estamos e permanecemos no seu amor, essas distinções precisam cada vez menos fazer parte de nós.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Quero citar os versos 46 e 47 de nosso texto base na tradução <i>A Mensagem</i>, de Eugene Peterson:</div>
<div style="text-align: justify;">
<blockquote class="tr_bq">
“Se tudo o que vocês fazem é amar os que são amáveis, esperam um bônus? Qualquer um pode fazer isso. Se vocês simplesmente dizem 'olá' a quem os cumprimenta, esperam receber uma medalha? Qualquer pecador básico pode fazer isso”.</blockquote>
</div>
<div style="text-align: justify;">
É como se Deus estivesse nos dizendo: mostrem ao mundo um tipo de amor que ele não conhece, o amor com o qual eu os amo todos os dias, o amor que revoluciona e provoca uma inversão de todos os valores. É disso que estou falando...</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
A difícil questão, porém, permanece sendo: mas COMO posso amar meus inimigos? Talvez um bom começo seja a partir de certos reconhecimentos...</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
(1) Primeiro, reconhecendo a inaptidão natural que todo temos para amar nossos opositores.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
(2) Segundo, reconhecendo o amor de Deus por nós mesmo em nossa condição de seus potenciais, quando não reais, inimigos.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
(3) Terceiro, reconhecendo a revolução de graça que esse amor opera em nós, quando assumimos nossa condição de filhos de Deus e agentes de seu reino de vida no mundo.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Amar ao inimigo é uma daquelas coisas com as quais temos de caminhar a vida toda e, à luz de cada situação e de um exame sincero de consciência e de alma, colocar na mesa nossas imperfeições, inadequações e fraquezas, esperando pela misteriosa força que Deus supre. Não se trata de disciplina apenas, do cumprimento de um mandamento apenas. Só pela graça podemos agir com graça.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Termino com uma oração conhecida, a "Oração de São Francisco". Precisamos pendurá-la diariamente nas paredes dos nossos corações, especialmente nesse tempo de polarizações em que temos vivido:</div>
<br />
<div style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<i>Senhor, faze de mim um instrumento de tua paz<br />Onde houver injustiça, que eu leve o perdão<br />Onde houver ódio, amor<br />Onde houver dúvida, fé,<br />Onde houver desespero, esperança,<br />Onde houver trevas, luz,<br />Onde houver tristeza, alegria.<br />Ó mestre Divino, faze com que eu não busque mais<br />Ser consolado do que consolar<br />Ser compreendido do que compreender<br />Ser amado do que amar<br />Pois é dando que recebemos<br />É perdoando que somos perdoados,<br /> e é morrendo que se vive para a vida eterna… Amém!</i></div>
<div style="text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
<div align="right" style="line-height: normal; margin: 6pt 0cm; text-align: right;">
<br /></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-76012319573293551182016-02-12T15:49:00.000-02:002016-02-12T15:49:14.068-02:00Quem é esse ser que logo sou?<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgiTN17uN3J0woyGvZKcSZaMjOd-EHm_mwYcMR9DoW_Z4fka7kaNnQzgBb-N6D52KWNl3k1_EZFvKIriU3ENH_7Vo1YG9QCZLOM942gwjpv78QMCA7e0VyBEUPZ3Woq-Vj1iJVGxINJ6snn/s1600/Who+am+I.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="281" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgiTN17uN3J0woyGvZKcSZaMjOd-EHm_mwYcMR9DoW_Z4fka7kaNnQzgBb-N6D52KWNl3k1_EZFvKIriU3ENH_7Vo1YG9QCZLOM942gwjpv78QMCA7e0VyBEUPZ3Woq-Vj1iJVGxINJ6snn/s400/Who+am+I.jpg" width="400" /></a></div>
<div align="justify">
<br /></div>
<div align="justify">
Eis algumas perguntinhas despretensiosas que esse texto – “Como sabotamos a
nossa vida sem perceber” (ver <a href="http://www.revistapazes.com/sabotagem/">aqui</a>) - me induziu a fazer a
mim mesmo (e para além do que ele diz):</div>
<div align="justify">
<br /></div>
<div align="justify">
- O que ou quem define minha vida? </div>
<div align="justify">
- O que sobra de mim,
para além da imagem (pública) que construo diariamente? <br />- O que sobraria
dessa imagem pública caso mais pessoas, além de mim mesmo, soubessem um pouco
mais sobre quem realmente sou? <br />- E quem realmente sou? Quem sabe quem é
"realmente"?<br />- Quem são as pessoas que de fato gostam de mim, pelo que sou?
<br />- O quanto de integridade estou disposto a abrir mão para que mais pessoas
"gostem" de mim? <br />- De quantas curtidas eu preciso para me tornar
"alguém"?<br />- Qual é a história mais importante: a que eu escrevo, a que os
outros escrevem sobre mim, ou a que eu e os outros inventamos sobre um "eu" que
na verdade inexiste, exceto como emulação ou fantasmagoria?<br />- Vivo eu,
sobre-vivo, sub-vivo ou, como diria Paulo, é o Cristo que em mim vive? Afinal de
contas, o que significa "viver"?<br />- E se não vivo "realmente", o que tem me
privado de viver?</div>
<div align="justify">
<br /></div>
<div align="justify">
Não tenho respostas a dar a maioria dessas perguntas, e não
estou preocupado com isso. Tento, como diz Rilke em suas <em>Cartas a um jovem
poeta</em>, “ter amor pelas próprias perguntas, como quartos fechados e e como
livros escritos em uma língua estrangeira”, procurando não investigar “as
respostas que não lhe podem ser dadas, porque não poderia vivê-las”. <em>Vivo
agora as perguntas</em>! (p. 43)</div>
<div align="justify">
<br /></div>
<div align="justify">
Não faço isso por preguiça, mas por zelo e amor pela vida, tão
rica e complexa para ser encerrada em conceitos. Porque a vida, companheiros/as
de rede, é como um enigma fascinante (se não posso definir, o negócio é
comparar). Tão fascinante (e única) que não posso continuar vivendo sem parar
para refletir no modo; tão enigmática que não é possível desvendá-la por
inteiro; e tão breve que não vale a pena se paralisar pela possibilidade de
perdê-la. Afinal, como disse o Mestre dos mestres e Senhor dos senhores, quem
perde a vida, a acha. Quão libertadora não pode ser a ideia de ganhar aprendendo
a perder aqui e ali? Eis um paradoxo da vida: a vitória nem sempre é parceira do
ganho; e perder-se pode ser a melhor maneira de se achar.</div>
<br />
<div align="right">
<strong>Jonathan</strong></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-24669551726414504662016-01-24T06:00:00.000-02:002016-01-25T14:25:50.228-02:00Fé, teologia e a arte de perder chãos<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhFX0ljssMUjF9j_4CC9Huy5o_EhcLSxCTlmoGaAw0yKaVUhIfyr-taiQLSqTaP0by8cCKH2O-HIFKWpTUgE1sVCCIxnBPy9iz0d9CnKPJrBjTmFnIY1SLoOa1H3YSi51ntFAX6wzbkYZDi/s1600/falling.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhFX0ljssMUjF9j_4CC9Huy5o_EhcLSxCTlmoGaAw0yKaVUhIfyr-taiQLSqTaP0by8cCKH2O-HIFKWpTUgE1sVCCIxnBPy9iz0d9CnKPJrBjTmFnIY1SLoOa1H3YSi51ntFAX6wzbkYZDi/s400/falling.jpg" width="400" /></a></div>
<br />
<div style="text-align: justify;">
A vida intelectual, como a pensa João Batista Libanio (2006, p. 81), “só se desenvolverá se se mantiver uma atitude de abertura ao diferente, ao novo, ao questionamento”. De acordo com ele, como filhos/as de uma época e uma cultura específicas (na qual se insere a religião) todos/as fazemos parte de uma tradição (ou mais que uma). Por exemplo, o que concebemos como “fé” (falando de seus conteúdos) é fruto de uma vivência dentro de uma tradição, em que a experiências individuais alimentam e são alimentadas por experiências coletivas. Entretanto, como reitera Libanio, “viver só da tradição”, tratando-a de modo rígido ou definitivo, “termina em um processo repetitivo”. Aqui entra o que ele chama de atitude de abertura enquanto “capacidade de assumir uma autocrítica da própria tradição de dentro dela” (Ibid., p. 81). </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
Essa atitude se opõe, na visão de Libanio, tanto a uma concepção puramente ortodoxa, que trabalha com a perspectiva excludente de <i>sim ou não</i>, <i>ou, ou</i>; quanto também uma concepção relativista, que desqualifica a tradição assumindo uma postura em que <i>anything goes</i>, ou qualquer coisa vale, e que pode facilmente ser trocada por outra coisa no próximo momento. Ao invés, ele propõe uma concepção dialética, que “busca a síntese entre a tradição e a novidade da experiência, chegando a novas formas de verdade. Retém a positividade da tradição, nega-lhe a negatividade e assume do presente sua força crítica positiva. Vão assim construindo novas e mais ricas sínteses de verdades” (Ibid., p. 82). </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Nesse sentido, uma tradição nunca deve se impor como absoluta, e toda vez que o faz recai no risco da idolatria. Isso, porém, aconteceu e ainda acontece na história das religiões, e do cristianismo em particular. Basta recordar o período da Reforma Protestante, por exemplo, que teve como uma das razões principais de sua ocorrência a elevação da igreja, sua ordem, seus dogmas, à condição de absoluta, inquestionável, acima da própria Palavra de Deus. Somente através dela se podia conhecer o verdadeiro Deus e a legítima mensagem das Escrituras. Contra isso se impôs o que Paul Tillich (2006, 1992) chamou de <i>princípio protestante</i>. Segundo ele, “o princípio protestante é a reafirmação do princípio profético em seu ataque contra uma igreja que se considerava absoluta e que, por isso, se encontrava demoniacamente deformada” (Tillich, 2005, p. 234), ou, parafraseando o que ele disse em outro lugar (Tillich, 1992, pp. 209-221), trata-se do protesto divino e humano contra toda tentativa de absolutizar o que é apenas relativo e temporal. <br />
<br />
Quando a igreja quer igualar a si mesma, ou o que ela diz/faz, a Deus, torna-se um ídolo ou um demônio, deixa de ser igreja – lugar de pecadores salvos pela graça de Jesus Cristo e, por isso, conscientes de que seus saberes e experiências são sempre “em parte” – e passa a ser uma Babilônia ou uma sucursal do inferno.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
Contra essa tentação, meu propósito aqui é de fazer uma síntese sobre o que significa permanecer crendo, escolhendo a fé, diante das eventuais desconstruções pelas quais passamos em meio a um universo de descrença e ceticismo, ou mesmo de dúvidas e incertezas que nos cercam, tanto no plano intelectual (teológico e filosófico) quanto no plano existencial. Para tanto, gostaria de propor, como exercício de reflexão, o que aqui estou chamando de “arte de perder chãos”, cuja premissa é a de uma desconstrução sadia e intencional de todos os solos provisórios sobre os quais assentamos nossas crenças. Pode ser representado pela rudimentar figura que abaixo se encontra:</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgfQcXQN7glngtmidG-pHDftwxowZDc-_RqCxMOvkxblYq5inPnaUAH-MFfUqEB65JWfx0nJibA52YGPctcotobHVhs9boKSjr5c7Npmyg_JtTXeBRbJCRMYn-eT49SVjxqnVRPecPSn5xi/s1600/Ch%25C3%25A3os+-+Unidade+12.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="300" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgfQcXQN7glngtmidG-pHDftwxowZDc-_RqCxMOvkxblYq5inPnaUAH-MFfUqEB65JWfx0nJibA52YGPctcotobHVhs9boKSjr5c7Npmyg_JtTXeBRbJCRMYn-eT49SVjxqnVRPecPSn5xi/s400/Ch%25C3%25A3os+-+Unidade+12.jpg" width="400" /></a></div>
<br />
Tentarei explicar o que quero dizer com essa imagem através do seguinte:<br />
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
1. Na parte inferior da figura estão o chão da fé e o chão da história que, embora distintos, não se encontram em planos diferentes. Fé é fé no incondicional. Trata-se de chão invisível e indizível, em primeiro plano, por isso é chão enquanto sustentação incondicional do que denominamos fé. Essa fé, porém, não nos desistoriciza nem nos desumaniza, mas nos comissiona, segundo a premissa de encarnação vigente no evangelho, a entrar na história como antecipadores da eternidade através de gestos que Paulo chamou de “permanentes”: a fé, o amor e a esperança.</div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
2. A caminhada humana, porém, nos impõe a busca por sentido e, assim, a criação de sentidos possíveis para aquilo que acreditamos e sobre o porquê de acreditarmos nessas coisas. Esses são o que poderíamos chamar de “chãos finos e frágeis”, porque provisórios. </div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
3. Esses, por sua vez, são constituídos por manifestações temporais e impermanentes na esfera da cultura – ética, estética e religião. A cultura humana, inventada e invencionista, incita a cada ser humano a dar formas – símbolos, mitos, representações do “real”, e, par os de fé, da própria fé, da religião e de Deus, expressas pelos conteúdos, dogmas, crenças, tradição. </div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
4. Esses chãos, como já disse, são frágeis e provisórios – e essa é a sua propriedade. O ato de tentar equipará-los à própria realidade ou ao incondicional é parte do antropomorfismo, de modo que a crítica de Feuerbach à religião torna-se válida nesse caso: a realidade (ou o incondicional) é fruto da consciência que o homem tem (ou imagina ter) de si mesmo. A consciência que o ser humano tem da realidade, porém, não é capaz, por mais que pretenda, dar conta ou espelhar a própria realidade. Clément Rosset, em seu livro <i>O real e seu duplo</i> (2008), desenvolve a tese de que, com relação ao real, nossa tendência é a de suprimi-lo numa “atitude de cegueira voluntária”, que nos faz ignorar o real, o singular, e dirigir nosso olhar para outro lugar (seu duplo), onde o real não está. De modo que, aquilo que anunciamos como sendo “real”, é na verdade o “outro”, visto que o real, em si, nos escapa. A realidade não se dá a conhecer plenamente, não é inteligível em sua essência. Na mesma medida em que é ininteligível, também é cruel (ou seja, dura). Daí a cegueira voluntária consiste no efeito psicológico ilusivo produzido pelo efeito do espelho: no encontro com o outro da realidade (seu duplo, sua representação), penso estar em contato com ela mesma (Rosset, 2008, p. 91). O mesmo pode funcionar para o relacionamento da pessoa de fé com o incondicional: a ilusão, nesse caso, consiste na pretensão de falar por Deus, ou de que a imagem verdadeira de Deus está expressa na ideia ou na representação. É aqui que a ilusão pode se converter, ao mesmo tempo, em manipulação e em idolatria.</div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
5. Nietzsche e seu perspectivismo trouxe para gente a ideia de que tanto a realidade, quanto o que chamamos de “verdade”, são criações da linguagem. A linguagem coloca diante de nós um mundo de possibilidades e também de impossibilidades. A palavra pronunciada coloca uma parcela do mundo em movimento, mas nunca é a expressão exata desse mesmo mundo. Isso é o que Jacques Ellul (1984, p. 21) chama de “bendita incerteza do discurso; é o que lhe confere toda a riqueza”. O discurso, completa ele, é sempre ambíguo, jamais transparente. Posso me esforçar para que o outro compreenda exatamente o que estou dizendo, contudo, “não sei, exatamente, o que o outro está entendendo daquilo que digo” (Ibid.). Mas é no meio desses buracos, insucessos e mal-entendidos da linguagem que, segundo Ellul, reside uma nova expansão da vida, em que se recomeça incessantemente, e se deve trabalhar na interpretação do discurso e do texto num movimento sempre em construção e, por isso, sempre susceptível de múltiplas definições. Como expressa Ellul:</div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<blockquote class="tr_bq">
A confusão da linguagem impede a posse do ser, seu cativeiro. Eis-me diante de um instrumento de infinita riqueza, inesperada, de uma polifonia desencadeada pela menor frase. A ambiguidade do discurso, e mesmo sua ambivalência, mesmo a oposição entre o momento em que é enunciado e o momento em que é recebido, produzem as mais intensas atividades sem as quais seríamos formigas, abelhas, tornar-nos-íamos ressequidos, esvaziados de nosso drama e da nossa tragédia. Nascem aí o símbolo, a metáfora, a analogia. (Ibid., p. 21). </blockquote>
</div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
6. As possibilidades impossíveis da linguagem deveriam, assim, nos conduzir a uma tarefa mais honesta, humilde, dependente daquilo que somos e temos – e, por isso, impeditiva do atrofiamento dogmático –, e da graça de Deus e, por tudo isso, alegre e celebrativa. Eis o extraordinário, diria Ellul: é uma benção para o ser humano viver assim, cativo da linguagem, distante da completude e, ao mesmo tempo, em busca dela, pois do contrário, acrescentaria eu, não seriamos seres humanos e sim deuses, ou semideuses. Assim, a linguagem não é o espelho da realidade do sagrado; fala mais do ser humano do que do ser divino, nesses termos. Minha linguagem é prostituída; volta e meia incorpora novos amantes e novos parceiros/as, sem mesmo se dar conta. E não há nada que passe por seu filtro sem ser afetado e que, portanto, possa ser expresso em estado puro: nem as coisas do mundo, muito menos as coisas do céu. As ideias, os conceitos, os símbolos são, assim, formas de redução da realidade e não o seu reflexo. Quanto mais ciente disso me faço, menos pretensiosos serão meus atos de fala ou mesmo minha teologia. A teologia, mais que qualquer outra modalidade de saber, deveria estar ciente do estado de distanciamento involuntário a partir do qual ela surge; pretende falar de Deus, mas todo significado que dá para esta palavra não passa de uma mirada através de uma brecha ou um pequeno buraco na parede que dá uma visão (apequenada) para fora. Admitir isso não é uma forma de relativizar a verdade, mas de preservá-la. Isso é redenção e não desgraça, sobretudo quando se pode assumir jubilosamente a provisoriedade desses “chãos” da linguagem e permitir que eles se desmanchem e se refaçam num movimento dinâmico. Esses chãos estão para a queda assim como o peixe está para a água. O objetivo, porém, é perder o chão sem cair no abismo, e essa é uma arte bastante arriscada que somente os corajosos e aventureiros se dispõem a aprender e se permitem desenvolver. Deixar o chão ruir pode ser, ao invés da “ilusão voluntária” de quem os iguala à realidade, um mergulho consciente e voluntário. Ora, não foi assim com a encarnação do Cristo? Não foi um mergulho (ou enfraquecimento) voluntário na humanidade e na história? </div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
7. <b>Em conclusão</b>, é possível pensar que esse mergulho voluntário tem tanto uma dose de imanência quanto de transcendência (pensando naqueles dois chãos primários da figura), em que recebemos tanto um banho de realidade quanto da fé no incondicional e, a partir daí, fazemos uma revisão de paradigmas, de pressupostos, de nossos chãos. Aqui reside um aspecto muito importante: um chão cai para que outro seja construído – portanto, não se trata de desconstrução pura e simples que redunda num vazio. E isso se dá num movimento dinâmico – como as águas do rio que correm para o mar e de lá voltam a correr (Ec 1.7). Nesse sentido, pode-se pensar que nunca voltamos os mesmos de cada novo mergulho, de cada nova imersão e experiência. A esperança – falando propriamente contra o dogmatismo e a intolerância – é que voltemos mais maduros, melhores, mais tolerantes e generosos. É um movimento descendente, de humilhação, inspirado no evangelho do Cristo que se esvaziou por amor. Oxalá a teologia possa descobrir na arte de perder chãos um antídoto contra o absolutismo, a idolatria e uma ortodoxia morta.</div>
<div style="margin: 6pt 0cm; text-align: right;">
<b>Jonathan</b></div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<b>Referências bibliográficas</b></div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<br />
ELLUL, Jacques. <i>A palavra humilhada</i>. São Paulo: Paulinas, 1984. <br />
LIBANIO, João Batista. <i>Introdução à vida intelectual</i>. 3ª ed. São Paulo: Loyola, 2006. <br />
ROSSET, Clément. <i>O real e seu duplo</i>. Ensaio sobre a ilusão. 2ª Ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2008.<br />
TILLICH, Paul. <i>Teologia Sistemática</i>. 5ª ed. Revista. São Leopoldo, RS: Sinodal, 2005. <br />
_________. <i>A era protestante.</i> São Bernardo do Campo, SP: Ciências da Religião, 1992.</div>
<div style="margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 6.0pt; text-align: justify;">
<br /></div>
Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-67799078913225561142016-01-21T15:36:00.001-02:002016-01-21T15:36:10.401-02:00Paradoxos da fé<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiz4w8WdQd8NxvLmH5FiQuZHj0dNG3NgahqM9abZeUVaZcvRypfHjR3wQy-iIxe1NPESENRTkgXd7AeTh0wXpFpoB1v2rsfze12dbc-PAU0-SkVnCyTU5xJwXxPaBx1CBJ-M1tdoSclbvHk/s1600/new-old-life+2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="351" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiz4w8WdQd8NxvLmH5FiQuZHj0dNG3NgahqM9abZeUVaZcvRypfHjR3wQy-iIxe1NPESENRTkgXd7AeTh0wXpFpoB1v2rsfze12dbc-PAU0-SkVnCyTU5xJwXxPaBx1CBJ-M1tdoSclbvHk/s400/new-old-life+2.jpg" width="400" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Na famosa definição de Hebreus, a fé é “a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos” (Hb 11.1). Tomada fora do contexto e de modo descomplicado, essa definição pode enganar um pouco no aspecto dessa “certeza” e dessa “convicção” sobre a qual fala o texto. Que tipo de certeza é essa? Em que se baseia tal convicção? A tese de Hebreus 11, no verso 1, perde muito de seus sentidos possíveis se desatrelada de todo o texto. Minha intenção não é fazer uma exposição do texto, e sim apontar alguns paradoxs da fé importantes nele. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />O primeiro é o<i> paradoxo da fé entre a certeza e a incerteza. </i>Do que a fé é pode ser certa? Daquilo que, do ponto de vista humano, aparenta ser o mais incerto. A fé, por exemplo, é certa da existência de Deus, não porque Deus tenha se mostrado de maneira clara por meio de evidências ou provas, e sim porque, na linguagem de Tillich, esta pessoa foi tomada pelo incondicional e o eterno. Como diz Kierkegaard (2012, p. 77): “A fé é antecedida por um movimento de infinito; é apenas então que ela surge, <i>nec inopinate</i>, em razão do absurdo”. Tillich (1957, p. 65), de modo semelhante, também afirma que “todo ato de crer pressupõe participação naquilo para que está dirigido. Sem uma experiência anterior do incondicional não pode haver fé no incondicional”. </div>
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<br />O cientista tem provas de uma realidade na medida em que essa realidade se dá a investigar, e então ele tem uma certeza objetiva. O médico pode chegar a ter certeza sobre as origens de uma doença X, porque os exames que ele fez provaram que ela veio da ação de uma bactéria Y. Na fé não é assim. A fé não é apenas certeza do mais incerto, como certeza que se sustenta sob condições incertas. Hebreus diz que quando Deus chamou Abraão, por exemplo, este se dirigiu “a um lugar que mais tarde receberia como herança, embora não soubesse para onde estava indo” (11.8). Abraão partiu na certeza da promessa, no entanto, sem saber. Creu para essa existência, mas não obteve o que esperava nessa existência. Creu porque foi movido pelo incondicional, e porque teve a coragem da fé e o risco de suportar suas eventuais dúvidas e incertezas. E, como diz Tillich (1957, p. 15), “é suportando corajosamente a incerteza que a fé demonstra o mais fortemente o seu caráter dinâmico”. </div>
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<br />O segundo é o <i>paradoxo da fé entre o visível e o invisível. </i>Já disse anteriormente que o fundamento da fé (o incondicional) se encontra além da concreticidade dos fatos, portanto, além do que os olhos podem ver, de modo que a testemunha ocular, digamos, de um milagre, não necessariamente se torna um discípulo. Como disse Ariovaldo Ramos (2015) recentemente, “milagre não gera fé, gera festa”. Hebreus diz que a fé é “prova das coisas que não vemos”. Então “fé”, nesse sentido mais estrito, significa confiança naquilo que não se pode ver, ao que não se tem acesso imediato. </div>
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<br />Tomemos o exemplo de Moisés (11.23-29). O texto diz que, ao abandonar as riquezas e pompas do palácio no Egito, Moisés “permaneceu firme como quem vê o que é invisível” (v. 27). Ora, a própria ideia de “ver o invisível” já é um paradoxo. Logo, os olhos que “viram” não são estes humanos, mas os da fé, que se cria a partir da visão do inexistente porque “vê além”. Aqui facilmente alguém pode se recordar do que Jesus disse a Tomé, segundo o evangelho de João. Depois que este o viu e tocou em sua mão e em seu lado, declarou “Senhor meu e Deus meu”. Vendo aquilo, Jesus replicou: “Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não viram e creram” (Jo 20.26-29). “Assim, a fé crê no que não vê” (Kierkegaard, 2008, p. 118)</div>
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<br />O terceiro é o <i>paradoxo da fé entre a promessa e a realização. </i>Chegamos a culminância dos outros dois paradoxos: o discípulo, que tem a confiança certa nas condições mais incertas, que crê naquilo que não vê, mas espera ansiosamente, deve também, como os “heróis da fé” de Hebreus, acreditar e viver segundo orienta a promessa, sabendo, porém, que pode não chegar a experimentá-la em vida. Quando pensamos na figura do herói no sentido hollywoodiano, a imagem que mais comumente surge é de poder, luta, com eventuais contratempos, mas sabendo que, no fim, o triunfo é certo, pois o herói sempre vence. Sem muita consciência projetamos essa imagem na vida, e não diferente na vida de fé. Nutrimos a certeza de que aquele que plantou o bem, lutou para alcança-lo, trabalhou duramente para sua conquista, ao final, será recompensado. Entretanto, a realidade é mais complexa que isso. Eclesiastes tentou nos alertar a esse respeito ao concluir que a vida é miserável, fugaz, cheia de sofrimento e sem sentido; que a sabedoria pode trazer vida, mas nem por isso o sábio está garantido em comparação com o tolo, às vezes a vida vira do avesso, e vemos o sábio sofrendo muito enquanto o tolo, apesar de suas tolices, só se dá bem. Ele também diz que sol nasce para todos e o fim é o mesmo para todos, pobres ou ricos, sábios ou tolos, justos ou injustos. E que, durante a vida, “cedo ou tarde, a má sorte atinge a todos. Ninguém pode prever a desgraça. Como peixes capturados numa rede cruel ou pássaros numa gaiola, os homens e as mulheres são capturados pelo mal acidental e repentino” (Ec 9.11-12, A Mensagem). </div>
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<br />Podemos discordar, ficar bravos e profundamente incomodados com Eclesiastes, e com certa dose de razão, afinal, geralmente não somos preparados para lidar com as más notícias – nem pela família, tampouco pela sociedade ou pela religião –, apenas com as boas, como se o otimismo e o pensamento positivo nos garantissem vitória e vida longa. Contudo, de nada adianta espernear, fechar os olhos ou negar a realidade. Quem pensa que a vida de fé pode blindá-lo contra o sofrimento, facilmente envereda pela rua do engano e da ilusão. Primeiro, porque não há nenhuma garantia cósmica de que ter fé é ter proteção e segurança; segundo, porque não há nenhuma garantia bíblica, no sentido global, que sugira isso. Muito pelo contrário. Andar nos caminhos da fé, por sua própria natureza e pela natureza da vida, implica em enfrentar dificuldades várias, como foi o caso dos anti-heróis de Hebreus. Experimentaram, sim, a proteção divina em algumas circunstâncias e até viram algumas promessas sendo cumpridas, mas também “enfrentaram abusos, açoites e, sim, algemas e prisões”; alguns “foram apedrejados, serrados ao meio, assassinados a sangue frio”. Vaguearam pela terra, sem teto, força ou amigos, “vivendo como podiam nas periferias cruéis do mundo”, que, como diz o autor, não era digno deles! (11.32-38, A Mensagem).</div>
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<br />E o autor de Hebreus finaliza claramente expressando o paradoxo em questão: “Entretanto, nenhum desses exemplos de fé puseram a mão na recompensa prometida. Deus tem um plano melhor para nós: que nossa fé se junte à deles, para formar um todo completo, como se a vida de fé que eles tiveram não fosse completa sem a nossa” (11.39-40, A Mensagem). Caminhar na fé, segundo Hebreus, implica em lançar-se nos paradoxos sem seguro de vida ou de triunfo. Aliás, Kierkegaard foi taxativo e um tanto duro a esse respeito, seguindo a lógica ilógica de Hebreus, quando disse que:</div>
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<blockquote class="tr_bq">
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Em verdade, se ocorresse à fé alguma vez a ideia de avançar assim, triunfalmente <i>en masse</i>, então ela não precisaria autorizar alguém a cantar refrões satíricos, porque de nada adiantaria proibi-lo a todos. Mesmo que os homens emudecessem, ouviríamos sobre esta louca procissão uma risada estridente como aqueles sons zombeteiros que a natureza faz ouvir no Ceilão; pois a fé que triunfa é a mais ridícula de todas as coisas. Se a geração contemporânea de crentes não teve tempo de triunfar, nenhuma outra o conseguirá; pois a tarefa é a mesma, e a fé é sempre militante; mas enquanto ainda houver luta haverá a possibilidade de derrota, e por isso, no que concerne à fé, jamais se triunfa antes do tempo, ou seja, jamais se triunfa no tempo [...]. (Kierkegaard, 2008, p. 152-153). </div>
</blockquote>
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Que vantagem há na fé? Que proveito ela, porventura, traz? Afora as promessas falsas provenientes de uma falsa piedade – porque apartada da vida real –, a resposta honesta pode ser: nenhuma! E quem disse que a fé tem a ver, primordialmente, com vantagem e com proveito? Se algum proveito há na fé – claro que estou falando aqui da fé cristã – esse não está primeiramente voltado para a pessoa em si, mas para o próximo da fé, tanto no presente, quanto no futuro, pois a fé que vive no paradoxo se concretiza de várias formas já, só que plantando sementes para a eternidade. O final do capítulo 11 de Hebreus é sugestivo de que a fé do discípulo não é fé em si ou para si, mas é fé para a posteridade, é a fé que cresce e amadurece nos outros. É, nesse sentido, uma dádiva, um bem comunitário, um tipo de fé que se forja na junção do si mesmo e do/com o outro. Ali germina, ali cresce, e dali se expande para a eternidade.</div>
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<b>Jonathan</b></div>
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<b>Referências bibliográficas</b></div>
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KIERKEGAARD, Sören. <i>Temor e tremor</i>. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012. </div>
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_______. <i>Migalhas filosóficas</i>: ou um bocadinho de filosofia de João Clímacus. 2ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.</div>
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PETERSON, Eugene. <i>A Mensagem</i>. Bíblia em linguagem contemporânea. São Paulo: Editora Vida, 2011. </div>
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RAMOS, Ariovaldo. <i>Convergir</i>. Palestra proferida na Soul Igreja Batista, Rio de Janeiro, 15/09/2015. Ver: <https: goo.gl="" jjgtjn="">. Acesso em 16 set. 2015.</https:></div>
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TILLICH, Paul. <i>Dinâmica da fé</i>. 4ª ed. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1957.</div>
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Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-25602429360473874122015-11-23T19:13:00.000-02:002015-11-24T11:14:01.294-02:00Carta a Rubem Alves<p align="center"><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-DIQmi95WPa0/VlOB3wer8FI/AAAAAAAAGBU/d3AJ8ktDtmg/s1600-h/Rubem%252520Alves%2525202%25255B4%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; margin: 5px 0px 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="Rubem Alves 2" border="0" alt="Rubem Alves 2" src="http://lh3.googleusercontent.com/-UhhZyiK1vRg/VlOB4x5Hz2I/AAAAAAAAGBc/5tU1r9tdq6g/Rubem%252520Alves%2525202_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="538" height="289"></a></p> <p align="center">"As certezas andam sempre de mãos dadas com as fogueiras...” [Rubem Alves].</p> <p align="justify">Ah, querido Rubem, se você ainda estivesse entre nós, certamente notaria como essa sua assertiva, escrita há algumas décadas, continua sendo tão atual, infelizmente. Lembrando nosso amigo Voltaire, parece que continuamos nos dilacerando "por causa de alguns parágrafos", sendo piores que os tigres, que dilaceram senão para comer. Mas, sabe: o problema, talvez e muito ‘talvezmente’, não seja nutrir determinadas certezas, se me permite uma leve variação de ponto de vista, pois existem convicções (ideológicas, de fé e vida) que, para nós, são tão caras que arriscamos tomá-las como "certezas". Então, não sei, caro mestre, se "todas" as espécies de certezas conduzem a fogueiras - talvez a maioria delas, sim. É que teimosa e relutantemente ainda acredito na profundidade de certos valores (não consigo transvalorá-los todos, como pretendeu nosso outro bom amigo, Nietzsche), como o amor, por exemplo. Mas será que o amor pode ser chamado de certeza, ou mesmo de "valor"? Acho que aqui poderíamos concordar que o amor, se certeza for, é a mais incerta que existe, pois não oferece controle nem garantia de nada. Pela fé, por exemplo, sinto-me convicto sobre o amor de Deus pelo mundo; mas não há, nem nunca houve, garantias de que o mundo abraçará ou compreenderá o amor de Deus, às vezes sinto o contrário: que o mundo, ou seja, nós-mundo nos tornamos antítese desse amor, especialmente quando fazemos coisas horríveis, como sacrificar pessoas, "pelo amor de Deus", ou por amor à sua "verdade". Ironia das ironias: o Senhor amou o mundo, mas o mundo escolheu pregá-lo numa cruz! E ainda prosseguimos numa crucificação sem fim... <p align="justify">É, caro Rubem, as coisas aqui andam muito estranhas, especialmente nesse lugar mais deslocalizado possível chamado Facebook, onde algumas linhas ou imagens podem gerar uma tempestuosa indisposição entre pessoas, às vezes entre amigos, ou até mesmo entre irmãos. Seria por efeito das “certezas”, sobre as quais você falou, ou pela teimosia orgulhosa em não admitir nossas fraquezas, pontos falhos ou cegos? E como poderíamos falar de certezas senão por determinados pontos de vista? E como separá-las das fogueiras, se não mais toleramos os pontos de vista uns dos outros? Que faremos, pois: abolimos as certezas? E como fazer isso sem, de novo, aniquilar as pessoas? O relativismo, no fim das contas, parece mesmo ser um absolutismo invertido. Talvez se nos esvaziássemos, pelo menos, da pretensão de enxergar sempre melhor e mais acuradamente que os outros, da pretensão de preencher todos os espaços vazios, da pretensão ao conhecimento absoluto, a coisa já melhoraria muito, e as “certezas” já não seriam mais tanto um problema. <p align="justify">Quero então tentar uma nota diferente. As certezas que nutro, pela relatividade de meus pontos de vista, do lugar a partir do qual vejo e falo, são e serão decididamente incertas. E não existirão mais para achatar pontos de vista de outrem, pois, se não são capazes de conversar civilizada e respeitosamente, mesmo que em tom declaradamente dissonante, é melhor que permaneçam caladas. Desisto de tentar vencer sempre, pois um mundo onde todos querem a vitória (de seu partido, ideologia, visão doutrinária, religião ou nação), só pode ser um mundo em guerra e, por conseguinte, fadado à destruição. Quero viver uma vida em que as perdas sejam jubilosamente acolhidas como oportunidades, e as vitórias eventuais sejam celebradas humilde e humanamente com poesia e canto, e não com marchas triunfais. Que eu aprenda a abdicar de uma das mais tentadoras para mim: a marcha triunfal do pensamento. Pois ela é tanto triunfal, quanto inquisitória; tanto triunfal, quanto excludente. <p align="justify">Nunca me esquecerei de algo que você disse sobre os teólogos no prefácio ao seu livro “Por uma teologia da libertação”. Você disse que alguns deles se parecem com o galo: “Acham que se não cantarem direito, o sol não nasce: como se Deus fosse afetado por suas palavras. E até estabelecem inquisições para perseguir galos de canto diferente, e condenam outros a fechar o bico, sob pena de excomunhões”. Isso, porque “todos estão de acordo em que existe uma partitura original, revelada, autoritativa, e que a tarefa da teologia é tocar sem desafinar... Qualquer que seja a aposição, todos afirmam que existe um único jeito de tocar a música”. Você sabia o que estava dizendo, Rubem, pois enfrentou essa fúria galinácea na pele, não foi? E, como dizia Voltaire, por seus próprios “irmãos”! Não deve ser nem um pouco fácil ser apunhalado por gente da própria família, que pela frente diz “meu amado”, e pelas costas te condena como liberal, herege ou coisa que o valha, e não me admira que tenhas evitado para si o rótulo de “teólogo” depois disso (eu até acho que teria feito o mesmo). Por essa razão, me junto, sem querer me comparar, a você em prosseguir tentando “inventar outros cantos, sabendo que o sol não vai se zangar e vai nascer sempre, no mesmo lugar”. Gostei também da expressão que você usou para traduzir isso: “Graça”. Permita-me então encerrar transformando suas palavras em uma oração, dirigida agora especialmente a nossos camaradas teólogos/as: <p align="justify"><i>Que produzamos novos cantos teológicos, com coragem e responsabilidade, com inventividade e fidelidade, mas sem medo de desafinar, conscientes de que “a bondade de Deus continua a mesma, sempre, independente de nossas afinações ou desafinações. Ele [o sol] nem nasce melhor quando estamos afinados, e nem nasce pior quando estamos desafinados... Temos, portanto, a liberdade de fazer o que quiser... Eu não suportaria pensar que meu pensamento é tão poderoso que, caso eu pense errado, Deus vai ficar torto”. </i> <p align="right"><b>Jonathan</b></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-72330352421674756812015-10-28T16:01:00.001-02:002015-10-28T16:01:59.902-02:00O pós-moderno, a igreja e a verdade absoluta<p align="justify"><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-nYBX2GcbP-s/VjENkq0x1jI/AAAAAAAAGA0/EDYKhBsiK3s/s1600-h/postmodern%252520age%25255B3%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-bottom: 0px; border-left: 0px; margin: 7px auto 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: block; float: none; border-top: 0px; border-right: 0px; padding-top: 0px" title="postmodern age" border="0" alt="postmodern age" src="http://lh3.googleusercontent.com/-A-1Bx9sFFK4/VjENlXqt2HI/AAAAAAAAGA8/6d7Aa9MKk1s/postmodern%252520age_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="506" height="339"></a> <p align="justify">Um dos temas prediletos dos tribunais teológicos nos últimos tempos se chama “pós-modernidade”. Para muitos ela inspira ou representa quase sempre algo ruim, um tremendo desafio ao testemunho cristão, a besta do Apocalipse. No livro <b><i>A Igreja do outro lado</i></b> (Palavra, 2008), Brian D. McLaren critica algumas das críticas cristãs, para ele, distorcidas à pós-modernidade – que são papagaiadas exatamente por quem provavelmente nunca leu um livro sequer de um pós-moderno (que não proponha vale-tudismos), ou leu “alguma coisa” e pensa que, por ela, leu o todo, mais ou menos como quem acha que sabe tudo sobre a Teologia da Libertação tendo lido apenas “o livrinho introdutório dos irmãos Boff”, como vi um teólogo dizer recentemente. Entre as críticas mais requentadas, sobre a qual gostaria de falar nesse texto, está a de que “cristianismo e pós-modernidade são incompatíveis porque os pós-modernos não creem na verdade absoluta”. A resposta de McLaren, com a qual concordo inteiramente, é a seguinte: <blockquote> <p align="justify">Bem, é claro que há uma verdade absoluta lá fora. Não duvido disso. Apenas duvido de sua habilidade, ou na minha própria, de apreender essa verdade e de compreendê-la, lembrá-la, codificá-la numa determinada linguagem e comunicá-la a outros e fazê-la compreendida de uma maneira absolutamente exata. (...) aquilo que as pessoas pós-modernas tendem a rejeitar não é a verdade absoluta, mas o conhecimento absoluto (p. 234). </p></blockquote> <p align="justify">Ora, isso é quase um truísmo (uma obviedade), poderia dizer alguém, pois quem seria obtuso o bastante para ainda crer e dizer que pode codificar a verdade ou compreendê-la de maneira “absolutamente exata”? Também não entendo que haja um grande número de pessoas que faça isso assim, tão explicitamente. Mas no campo das ciências humanas e no da religião, por exemplo, ainda temos muitos/as "Dom Quixotes" da verdade que resistem em admitir os limites do saber e, mais ainda, da expressão desse saber. Então, prosseguem, usando aqui outra expressão de McLaren, “batendo o tambor da verdade absoluta” por aí, por mais ridículo e desesperado que isso pareça, quem sabe esperando que a chuva caia do céu e esses pós-modernos irresponsáveis finalmente se convençam de que não podemos jogar todos os valores (sobretudo os morais) na lata do lixo. Mas quem disse que o pós-moderno se caracteriza pela completa destruição de todos os valores? <p align="justify">Talvez estejamos lidando aqui com mais um preconceito. Lembrando a famosa definição de François Lyotard, o pós-moderno se caracteriza (num plano geral) pela “desconfiança em relação às meta-narrativas”, isto é, as grandes narrativas, aquelas que se colocam em letras maiúsculas, que pretendem oferecer explicações últimas ou definitivas para uma determinada realidade nos termos de uma determinada forma de pensamento ou linguagem. A teologia, por exemplo, torna-se uma meta-narrativa quando – num ímpeto semelhante ao dos “amigos de Jó” – abandona sua vocação metafórica, e passa a querer explicar e abarcar aquilo que não pode ser contido em vasos, odres ou caixas. Que podemos falar sobre o “radicalmente outro”? Ora, só uma teologia que, por natureza, também só pode ser “radicalmente outra” em relação a Deus, é capaz de dizer algo dentro de suas limitadas possibilidades, reconhecendo que só se pode conhecer em parte, como o próprio Paulo o fez (cf. 1Co 13.12). <p align="justify">E isso não tem nada a ver com “acabar com o absoluto”, porque essa é uma impossibilidade. O absoluto é o que está alheio a tudo: é o Totalmente Outro, o Eterno, o Incondicional. Não há razão para se precaver tanto contra a relativização em questão, pois ela não tem em vista o absoluto em si, uma vez que esse não é passível de ser relativizado, tampouco de ser supra-absolutizado – ficar repetido, em alto e bom som, a Deus que Ele é absoluto (ou todo-poderoso) é tão inútil quanto tentar explicar a um peixe que este sabe nadar. Somente o relativo pode (e deve) ser relativizado, sobretudo quando nutre pretensões ao status de absoluto, ou de ilusões de equivalência. No fim das contas, a supra-absolutização do absoluto ou a tentativa de guarda-lo “a sete chaves” é apenas mais um dos efeitos do desejo por poder que ocupa o interior da religião (e da teologia) há bastante tempo. <p align="justify">Nomear ou conceituar um aspecto do Reino de Deus, por exemplo, e então dizer “isso É o Reino”, é o mesmo que pretensamente conferir (a tal conceito) a mesma natureza (absoluta) do reino. Por isso, a “teologia” de Jesus era metafórica, pois, ao se referir ao reino nas parábolas de Mateus, capítulo 13, por exemplo, ele nunca disse o que o reino <u>é</u>, e sim com o que se <u>assemelha</u>: “O reino de Deus é semelhante a ...” <i>um homem </i>que semeou a boa semente no campo (v. 24); <i>um grão de mostarda</i>, que um homem tomou e plantou em seu campo (v. 31); <i>um fermento</i> que uma mulher tomou e escondeu em três medidas de farinha (v. 33); <i>um tesouro</i> escondido no campo (v. 44); <i>um que negocia</i> e procura boas pérolas (v. 45); <i>uma rede</i>, que lançada no mar colhe peixes de toda espécie (v. 47). <p align="justify">Diante das acusações de que gente pós-moderna não se importa com a verdade, McLaren então parte da ideia – talvez um pouco romântica, e quem sabe se referindo a uma parcela dos pós-modernos (são tantos, então penso que sim) – de que “as pessoas pós-modernas se importam tanto com a verdade que não querem fingir que uma opinião subjetiva ou ‘vista de um ponto’ seja mais do que ela realmente é. E se importam tanto com a verdade que questionam a habilidade da linguagem de comunicá-la suficientemente” (p. 235). <p align="justify">Mas isso ainda pode nos colocar diante de um impasse ético, do tipo: bem, se a verdade não nos é acessível, como distingui-la da mentira? Como justificar, do ponto de vista hermenêutico, o sincero escândalo que nos provocam tantos políticos e outras pessoas que mentem? Ou seja, ao se dizer adeus à verdade (como conhecimento absoluto sobre algo), como reconhecer e denunciar a mentira nociva ao bem individual ou comum? Coadunar-se-á com a descarada mentira? Ou, indo adiante, sem o parâmetro da verdade, como é possível se definir e diferenciar coisas tais como “mentira” e “bem comum”, como certo ou errado? Se a verdade absoluta é “mais um perigo que um valor”, como declarou Gianni Vattimo, que valores ainda podem ser nutridos sem que resultem no mesmo perigo ora rechaçado: o de absolutizar aquilo que é apenas particular? <p align="justify">A proposta que Vattimo oferece em seu livro <b><i>Adios a la Verdad</i></b> (Gedisa, 2010), parece ser uma solução aberta e provisória ao problema: se é passível que tal conflito não possa ser vencido pela pretensão de se chegar à verdade das coisas, uma vez que o produto sempre será diferente da verdade mesma, resulta que não mais se busque a verdade universal, mas a verdade comunitariamente válida ao grupo numa situação histórica dada. No “adeus à verdade” suspende-se a pretensão a uma validade universal de pressupostos, e se dá boas-vindas a “verdades particulares” com validade relativa e temporária. Assim, não se trata de um total abandono da tarefa de distinguir práticas ou discursos que sejam verdadeiros ou falsos, mas de reconhecer que “a diferença entre verdadeiro e falso é sempre uma diferença que surge de interpretações mais ou menos aceitáveis e compartilhadas”, como produto não do autoritarismo da visão de uns sobre outros, mas de <i>consensos solidariamente possíveis</i>. Não que o papel do diálogo seja, necessariamente, o de produzir consenso, nem que o do intelectual não possa ser o de persuadir seus pares de sua posição. A diferença, para Vattimo, está na palavra <i>interpretação</i>, de modo que: “A filosofia não é expressão da época, é uma interpretação que com certeza se esforça por ser persuasiva, mas que reconhece sua própria contingência, liberdade e riscos” (p. 61). <p align="justify">A filosofia (e/ou a teologia) que emerge, então, dessa abertura para a pluralidade de visões e interpretações diferentes, é carente de princípios últimos ou, por assim dizer, pós-fundacionalista. Mas, se ela é débil de fundamentos e de uma origem, como pode falar racionalmente e/ou não descambar para um irracionalismo puro e simples do tipo vale-tudo? Na perspectiva desse autor, ela o faz a partir de “eleições responsáveis” ou pontos de partida explícitos (não neutros, nem universalizantes), que surgem de necessidades plantadas não pelo olho de Deus subjacente a toda moral, mas pelo contexto e suas situações específicas. Vattimo parece propor, assim, a troca de uma ética universal (com imperativos categóricos) por uma ética situacional (com imperativos contextuais, forjados a partir de uma pertença comunitária e, assim, relativos a um lugar). A isto ele chama de <i>ética da finitude</i>: “aquela que tenta se manter fiel ao descobrimento da situação, sempre insuperavelmente finita, da própria procedência, sem esquecer-se das implicações pluralistas de tal descobrimento” (p. 110). <p align="justify">Isso se estende também ao que chamamos de “verdades” ou da “ética” do cristianismo. O cristão pode se manter fiel aos princípios nos quais acredita sem ter a pretensão de que eles sejam adotados irrestritamente por todas as pessoas, especialmente no âmbito público e civil. A ideia de que “precisamos implantar os valores cristãos na sociedade” tende a perder sua preeminência, não para que o relativismo – como parece ser o temor de tantos – tome seu lugar e se instaure o regime da desordem (uma espécie de anarquismo ético), e sim para que esses “consensos solidários”, sobre os quais Vattimo fala, sejam possíveis (ou pelo menos pensáveis por um grupo mais significativo de pessoas), levando em conta os direitos humanos básicos – que os cristãos deveriam ser os primeiros a abraçar, se é que são tão “éticos” quanto pensam e se é que sua ética transpassa o âmbito dos “princípios morais individuais” (do “eu” não faço isso ou aquilo) – e não o que “a igreja”, ou “um governo cristão”, ou uma “bancada evangélica” quer determinar como regra para todo mundo. <p align="justify">Se os cristãos não colocam como <i>uma voz</i> no coro de múltiplas vozes que se fazem ouvir na sociedade, talvez seja melhor que se calem; se não se podem contentar no papel de cooperadores (e não paladinos ou detentores) com o evangelho, talvez seja melhor não atrapalhar o processo; caso prossigam sendo teimosos em não se abrir para o diálogo (mais por medo que por convicção), provavelmente prosseguirão falando apenas de si para si mesmos numa congratulação universal dos que se colocam como os fiéis defensores da verdade. Os “demais cristãos”, marginais por natureza, que não pensam assim, devem ser exilados sob a pecha de “liberais”, “hereges” ou “apostatas”, quando não “anticristos”, porque tanto sua forma de pensar quanto de ser não estão de acordo com o que “a Bíblia diz”. “Compare com o que a Bíblia diz”, afirmam alguns desses fiéis (mais retos que a lei), “e verás que estás fora da verdade!”. Para esses, a equação é muito simples: “a Bíblia diz” é igual a “Deus diz”. Se eu repito, fielmente (ou seja, de modo literal), o que a escritura está dizendo, então a minha palavra corresponde à Palavra de Deus. Logo, se alguém contradiz a minha palavra, contradiz a Palavra de Deus e, portanto, é um herege. Isso é um exemplo tosco de como se pode perder de vista a lição de Jesus nas parábolas do Reino: só podemos comparar linguagem com linguagem e não linguagem com “o fato”, “a realidade”, “o ser”, “a essência”, “a verdade”, e assim por diante. <p align="justify">O que preocupa aos cristãos em geral é uma coisa chamada “critério de decisão”. Qual é o critério que devemos adotar para decidir sobre questões de cunho moral (já que entramos no assunto)? Richard Rorty, em <b><i>Contingência, ironia e solidariedade </i></b>(Martins Fontes, 2007), tem muito a ensinar aos cristãos nesse sentido. O problema, para ele, não é a busca por critérios em si, mas a busca deles no mundo (ou em Deus) na expectativa de que ele “fale”, ou melhor, dite o que é ou tem de ser. Essa tentação de buscar critérios no mundo é devida a tendência de pensar no mundo, ou no próprio ser humano, como possuidor de uma “natureza intrínseca”, uma “essência”. Como não alcançamos essa essência (apenas pretendemos), o resultado é a “tentação de privilegiar uma dentre as muitas linguagens com que habitualmente descrevemos o mundo ou nós mesmos”, e a consequente criação de “vocabulários-como-totalidades” (p. 31), ou, diria eu, de <i>vocabulários-deuses</i>. <p align="justify">Evitar essa tentação é minha proposta aqui, destinada particularmente aos próximos da fé, e é também a proposta de pós-modernos como Rorty e Vattimo. Para isso é necessário um sacrifício: não o sacrifício<i> da</i> verdade, mas o sacrifício <i>pela </i>verdade – se é que ainda nos importamos com ela, e não apenas estamos interessados no poder ou status que a pretensão de possuí-la, ou que sua posse efetiva como efeito do “abuso espiritual” ou religioso, nos confere. O sacrifício “da verdade” acontece sempre que alguém alega tê-la encontrado, em seu estado absoluto, e a codificado em uma linguagem; já o sacrifício “pela verdade” é um sacrifício de si mesmo e da visão de que minha linguagem e teologia correspondem ao modo como as coisas (Deus, sua Palavra) realmente são. O sacrifício pela verdade é uma imitação do sacrifício de Jesus – o caminho, a verdade e a vida –, que como Ser-Verdade se sacrificou por amor, ao contrário de muitos dos que dizem seus seguidores, que continuam, em nome de uma versão tremendamente distorcida dele, sacrificando o amor ao próximo em nome da apologia da verdade: que mata, trucida e exclui. <p align="justify">Por fim, como destaca Rorty, “dizer que devemos abandonar a ideia da verdade como algo que está aí, à espera de ser descoberto, não é dizer que descobrimos que não existe verdade alguma” (p. 33). Igualmente, dizer que não podemos mais aceitar critérios absolutos, porque supostamente atribuídos pela “natureza intrínseca” de algo, não é dizer que a partir de agora vivemos a partir de critério algum ou do “critério de me der na telha”. Apenas admitimos que são nossos critérios, que podem e devem ser colocados no mesmo patamar e em diálogo com outros critérios, em busca não de que um se estabeleça ou prevaleça sobre outro, mas de que encontremos aqueles “consensos solidários possíveis”, para construção de uma sociedade democrática e de direitos, na qual os marginalizados pelo sistema também tenham voz, e não de uma sociedade regida por parâmetros da minha religião. <p align="justify">“Mas eles precisam saber que Cristo é a Verdade!”, pode bradar alguém. Concordo, mas pergunto: como é que alguém “sabe” que Cristo é “a verdade”? Será por meio do convencimento proveniente de uma lógica teológica ou apologética qualquer? Será por ter sido testemunha ocular do poder de Deus? Vamos supor que um descrente X chegue a ser convencido, pelos crentes A e B, de que “Cristo é a Verdade”. Convenceram-no de que a verdade do cristianismo é plausível, e de que é absoluta, ou seja, de que está acima e, portanto, torna mentirosa qualquer outra forma de saber, religioso ou não, que reivindique ser verdade. Seria possível inferir pela situação descrita que: já que X foi convencido por A e B de que Cristo é a verdade, logo X é cristão? Mais do que isso: imaginemos que X tenha também presenciado um milagre, como a cura de um paralítico, que A e B obviamente atribuíram a Deus. Isso deve, necessariamente, levar-nos a crer que X agora se tornou uma pessoa de fé? Pode ser que sim, pode ser que não; mas não há garantias cósmicas, nem provas cabais de que seja (ou tenha de ser) assim. <p align="justify">Afinal de contas, a vida humana, seus encontros e desencontros com Deus e consigo mesma, tem uma dimensão de mistério, de inexplicável; Deus, por sua vez, tem seus próprios meios de se fazer conhecido, com ou sem nossa “santa ajuda”, e não é absolutizando nossos meios (nossa linguagem) que garantiremos que alguém venha a conhecer ou aceitar Deus. Estou convencido de que meu papel, ou melhor, meu modo de ser é ser testemunha, por palavras e ações (e, no contexto em que estou inserido, mais por ações que palavras) do Cristo que, pela graça, me fez e me faz ser quem sou, ou seja, do Deus que “É”, apesar de eu não ser, e que, parafraseando Tillich, me dá a “coragem de ser” apesar de não ser. O “convencimento” é papel de Deus; a salvação também. Nesse sentido, finalizo com as palavras de Michel Quoist em <b><i>Construir o homem e o mundo </i></b>(Duas Cidades, 1878): <blockquote> <p align="justify">Qualquer pessoa pode mudar de opinião, e algumas vezes bastante rapidamente. Mas, raramente acontece que alguém mude de opinião pelos argumentos de um outro que decidiu convencê-lo. Assim, se, por uma verdadeira preocupação de difundir a verdade você resolveu fazer alguém evoluir, não diga: vou demonstrar-lhe que está errado, mas, vou ajudá-lo a descobrir a verdade por si mesmo. Muitas vezes o outro estaria pronto para aceitar “a” verdade e não a “sua” verdade. Por que você monopoliza a verdade? Ela existe independentemente de você. Em noventa por cento dos casos, quando você a açambarca, você a turva. Se você quiser ser bem sucedido em suas discussões, esqueça-se e respeite o outro. Não seja o rico que dá uma esmola ao pobre, mas o amigo que corre em direção ao amigo para se unir a ele, e com ele descobrir a verdade. Trata-se de uma verdade religiosa? Então nunca se esqueça que o cristianismo não se demonstra por meio de raciocínios ou de ideias [sic.], pois antes de ser uma doutrina, o cristianismo é uma pessoa. A verdade é Cristo. E não se discute Cristo, acolhe-se Cristo. “Discutir religião” é, antes de tudo, dar testemunho e ajudar o outro a encontrar Cristo (p. 163). </p></blockquote> <p align="right"><b>Jonathan</b></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-89072064445177872212015-10-23T15:29:00.000-02:002015-10-23T15:30:49.799-02:00Verdade como 'evidência muda’: um devaneio<p><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-sr3uXrlrq9U/VipuxdqfgnI/AAAAAAAAGAc/Yk6jAVC3TAw/s1600-h/Seeking%252520thruths%25255B9%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-bottom: 0px; border-left: 0px; margin: 6px auto 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: block; float: none; border-top: 0px; border-right: 0px; padding-top: 0px" title="Seeking thruths" border="0" alt="Seeking thruths" src="http://lh3.googleusercontent.com/-E6gP7AhAzQM/Vipux5bSUAI/AAAAAAAAGAg/zs3z3yCwkos/Seeking%252520thruths_thumb%25255B7%25255D.jpg?imgmax=800" width="398" height="306"></a></p> <p align="justify">Assim como a questão da sexualidade, a questão da verdade ainda é “pedra de toque” da igreja cristã, e eu arrisco dizer: mais das igrejas protestantes que de quaisquer outras. Isso porque quando assumiram, após a Reforma Protestante, que o absoluto não pode ser relativizado e que, por isso, a Palavra de Deus está acima das palavras dos homens, fizeram um duplo movimento a meu ver: (a) entenderam que era preciso defender essa condição absoluta da Palavra de Deus a todo custo, e então recorreram à velha fórmula de determinar quais são os dogmas e doutrinas que melhor servem à conservação da “verdade da Palavra de Deus” – olvidando que a Bíblia é, também, palavra humana; e (b) esqueceram-se de que esses mesmos dogmas e doutrinas são linguagens e não o próprio absoluto; podem ser utilizadas por Deus como instrumento e benção, mas também podem ser anátemas (maldições), sobretudo quando se omitem do fato de que são vasos, meios, e não o próprio fim ou o coração da Verdade. <p align="justify">Esse é o problema do conservadorismo, parafraseando John Caputo: o conservadorismo não conserva, mas mata; pode ser apologético (inicialmente com boas intenções) ao querer defender Deus e seus “fundamentos” (aliás, daí vem a palavra Fundamentalismo), mas é tanto inútil, porque quer defender o indefensável (Deus não precisa de guarda-costas), quanto idólatra, porque transforma os instrumentos de sua defesa (sua teologia, seu discurso) em algo equivalente ao absoluto. Dessa forma, ele não defende Deus, mas mata. Nietzsche estava certo se pensarmos por esse ângulo: se Deus está morto, nós fomos os seus assassinos - e continuamos sendo! <p align="justify">A questão então passa ser: o que fazemos com isso, ou seja, o que fazemos com “a verdade”? Jogamos fora, desistimos, relativizamos? Antes de tudo, se a verdade é mesmo “A Verdade”, então não há sentido para qualquer intento de relativizá-la. Porque “A verdade”, segundo o evangelho, é Cristo – “Eu SOU a verdade”, disse ele em João. E Cristo é Deus, e não um ídolo ou um demônio; Cristo é o verbo (ou a verdade) encarnado, feito gente e, portanto, é também um “ser humano”, e não (pode ser reduzido a) um saber. Há claramente aqui uma diferença entre “ser” e “saber”. Só que não é uma diferenciação simples, é dinâmica e paradoxal. Jesus disse a Pilatos que aqueles que “são” da verdade, o ouvem e sabem do que ele está falando – e, nesse aspecto, “conhecem” a verdade. Aqueles que “são”, “sabem”. Entretanto, pode-se depreender disso também que aqueles que “pensam que sabem” – e pensam que podem expressar isso que sabem numa linguagem pretensamente absoluta – deixam de ser. Então, os que são, sabem; mas o que acham que sabem, não mais são. Há muita gente que é, mas não sabe; e a muita gente que pensa que "é", mas não é, tampouco sabe, só pensa que sabe. Há também muitas espécies de verdade; há muitas maneiras de tentar apreende-las e dominá-las. Mas Jesus, segundo ele mesmo reivindica em João, não é “uma espécie” de verdade, “Ele é a Verdade”: ele, e não nós; ele, e não quem fala em nome dele; ele, e não uma teologia qualquer a seu respeito. <p align="justify">Aqui está a diferença fundamental, que os cristãos custam a compreender: do ponto de vista da fé, a verdade existe e ela tem nome (ainda que o nome em si não a compreenda ao todo): é Jesus. Tudo o que temos, porém, são relances, aproximações, gestos graciosos e amorosos da própria verdade em nossa direção que asseguram, ao nosso ser todo, que estamos nela e dela somos. A verdade, nesse sentido estrito, “dá testemunho de si mesma”, como disse Michel Henry. Posso falar dela – afinal, “a linguagem ainda é seu meio de comunicação por excelência” (emprestando de novo palavras de Henry), desde que for, ou se for, necessário comunicar. Mas a questão é: o que alguém, de fato, comunica quando pretende anunciar a verdade: ela mesma ou uma versão possível, mas sempre diferente, parcial, dela? E essa verdade comunicada nas palavras, pode até convencer, mas de que forma ela liberta (como também diz João): pelo poder das palavras, ou pelo misterioso poder do Cristo, que está além delas? No fim das contas, a verdade só “é” para quem se vê capturado por ela, uma vez que a verdade, em si, não pode ser capturada por ninguém. Ser cristão significa viver no limear entre o anseio pela dádiva de ser cada vez mais possuído e capturado pela verdade na vida, e a boa-nova libertadora de não poder apreendê-la ou possuí-la no discurso, mas de vivê-la como “evidência muda” (André Comte-Sponville). Entretanto, que toda fala, todo discurso, toda comunicação, argumentação, raciocínio, narrativa ou teo-logização sejam benditos e bem-vindos, desde que se assumam jubilosamente como meios, e não como fins, como contingentes, e não absolutos. E não um contingente-orgulhoso, pretensioso, paladino, mas um contingente-modesto, despretensioso, assumidamente fraco. <p align="right"><b>Jonathan</b></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-29054419938162418622015-07-28T12:19:00.001-03:002015-07-28T15:27:33.357-03:00Sobre a Amizade<p align="justify"><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-4WRhrcB0Rko/VbedYm3zo_I/AAAAAAAAF-M/9Gwlxby8-yk/s1600-h/Friendship%2525202%25255B3%25255D.jpg"><img title="Friendship 2" style="border-left-width: 0px; border-right-width: 0px; border-bottom-width: 0px; float: none; margin: 10px auto; display: block; border-top-width: 0px" border="0" alt="Friendship 2" src="http://lh3.googleusercontent.com/-dnMSQnZCIBs/VbedZGNT5LI/AAAAAAAAF-U/57aig65Vvjo/Friendship%2525202_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="495" height="372"></a>Mil e tantos, é a marca dos amigos a que cheguei no Facebook recentemente. Não é uma marca a se gabar, e nem poderia; conheço pessoas que têm mais de quatro mil na sua rede; fora as figuras públicas, que podem chegar a milhares. E a “amizade” ali, muitas vezes (mas não sempre), se torna uma forma de escambo, de troca, quase uma versão daquela música do MC Leozinho, “se ela dança eu danço”; no caso, ali seria: “se ela curte, eu curto”. Por isso, muitos de meus “amigos” do Facebook veem e vão ao sabor do vento, ou melhor, do quão atrativo pareço a eles, e eles a mim; aliás, o Facebook é um excelente espaço para distinguir amigos de conhecidos, de admiradores, de aduladores, e de consumidores – sim, pois esses mil e tantos “amigos” que hoje tenho são os mesmos que consomem as coisas que compartilho, para o bem e para o mal. Então, quando o que só importa é o numero (de amigos, de curtidas, de compartilhamentos), significa que pouca coisa importa. Tenho amigos no Facebook, sim, mas as reais amizades acontecem fora dali. <p align="justify">Sempre fui muito reservado com amizades. Isso porque amizade, para mim, é como um <i>solo sagrado</i>: não piso no de muitas pessoas, nem são muitas as pessoas que pisam no meu. Compartilho esse espaço apenas com quem sei que provavelmente não vai profanar facilmente o solo – ainda que, é preciso estar ciente, como todo relacionamento humano, a amizade é passível de rachadura ou até mesmo de rompimento. Por isso, não é nada sábio achar que tudo está sempre garantido nas relações. A gente pode se surpreender conosco mesmos e com os outros. <p align="justify">Quero falar de amizade aqui a partir do diálogo: passeando pelo cotidiano, pela filosofia e pela Bíblia, para responder três questõezinhas básicas: O que é a amizade? O que significa ser amigo/a de alguém? E o que Deus tem a ver com isso? <p align="justify">A palavra “amor” aparece no grego sob três formas ou manifestações mais conhecidas: <i>Eros </i>(expressão que os gregos inventaram para designar o amor-paixão, e em seu sentido mais profundo, significa “cair fulminado de amor”); <i>Ágape</i> (palavra que os cristãos inventaram para designar o amor de Deus, o amor sem limites, também traduzida como “caridade”, ou “o amor liberado do ego”). O amor sobre o qual estamos refletindo não é nem tão complicado quanto <i>Eros</i>, nem tão raro quanto <i>Ágape</i>. Designa-se por outra palavra inventada pelos gregos, chamada <i>Philia</i> (amizade) e <i>philos</i> (amigo). André Comte-Sponville diz que <i>Philia </i>tem um sentido mais amplo, que é a “alegria de amar”. <p align="justify">A <i>Philia</i>, ou “a alegria de amar”, portanto, seria um estado de regozijo ou alegria, que não é tanto pelo que o outro <i>faz</i>, e sim pelo que ele/a <i>é</i>. Ou seja, é o regozijo, a satisfação pela simples existência do outro, do/a amigo/a. “Que bom que essa pessoa existe!”. A coisa legal da amizade é que ela tem exatamente essa leveza e esse frescor; nada pode ser forçado. Por isso, C. S. Lewis disse que era o menos complicado ou mais simples dos amores. Mas as escrituras nos ajudam a aprofundar o sentido desse “regozijo” da amizade. Quero destacar apenas o verso que provavelmente mais conhecemos: “O <i><u>amigo ama</u></i> em todos os momentos; é um <i><u>irmão</u></i> na adversidade” (Pv 17.17, NVI). <p align="justify">O melhor sentido para a palavra amigo (no original <i>reah</i>) é companheiro, aquele/a que faz companhia ou anda junto. O texto diz que ele “ama” (acompanha) em “todos os momentos” (tempos, circunstâncias). E o autor acrescenta na segunda frase que: na “adversidade” (<i>tsarah:</i> sofrimento, tempos difíceis), esse companheiro se torna irmão (<i>ach</i>: [tão próximo quanto] alguém que tem o mesmo pai e/ou mãe). No capitulo 18, v. 24, essa última ideia de algum modo se complementa quando ele diz que: “Quem tem muitos amigos pode chegar à ruína, mas existe amigo mais apegado que um irmão”. Na tradução “A Mensagem”, fica ainda mais claro: “Amigos vêm e vão, mas o verdadeiro amigo é mais próximo que um irmão”. O texto, portanto, nos ajuda a separar “amigos” (como os do Facebook) de “verdadeiros amigos”. Ele diz: o verdadeiro amigo é <i>mais próximo que um irmão</i>. O amigo-irmão, para Salomão, é aquela pessoa que faz um esforço para estar por perto e que a gente quer ter por perto, mesmo ou especialmente quando as coisas não vão muito bem. Às vezes o contrário acontece: o sofrimento afasta amigos, ao invés de aproximá-los. Mas, se afasta, ainda assim poderíamos chamá-los de <i>amigos</i>? Ainda assim seria uma manifestação do<i> amor</i>? <p align="justify">Recentemente eu li uma história, contada por Ique Carvalho em um de seus muitos textos sobre amor, que ilustra bem isso. Ali ele narra assim: <blockquote> <p align="justify"><font size="2"><em>(...) Em junho de 2013, poucos dias antes do dia dos namorados, minha namorada terminou comigo. Eu fiquei sem entender. Voltei pra casa e durante todo o caminho me perguntava: “Por quê?”. A única coisa que vinha na minha cabeça era a voz dela dizendo: “Eu amo você”. Eu passei um mês sofrendo procurando respostas para o que estava acontecendo. Um dia, entrei no quarto do meu pai chorando e perguntei: “Pai, ela dizia que me amava. Então, por que ela terminou comigo?”. Ele respondeu: “Meu filho, quando alguém entra na sua vida e depois de algum tempo vai embora, pode ser qualquer coisa menos amor”. Eu disse: “Não dá para entender. Um dia, existe amor e no outro tudo acabou”. Ele respondeu: “Você nunca vai superar seus traumas se continuar procurando no amor uma lógica. Construa uma nova história”. Eu perguntei: “E de onde vem essa força pra começar algo novo?”. Ele respondeu: “Não se preocupe com isso. Todo começo vem de um final”. Uma semana depois, meu pai foi diagnosticado com uma doença rara e degenerativa que iria matá-lo em alguns dias. Minha mãe não o abandonou. Ela ficou. Meu pai saia toda sexta para comer pizza com dois irmãos. Quando ele parou de andar, meus tios começaram a trazer a pizza aqui em casa. Eles diziam: “Sem o seu pai, não tem graça”. E ficavam a noite inteira dando gargalhadas. Hoje, meu pai não consegue mais comer. Mesmo assim, toda sexta meus tios passam aqui em casa. Meu pai estudou em Ouro Preto-MG. Na formatura ele combinou com três amigos de se encontrarem de cinco em cinco anos. Este ano, meu pai não pôde ir porque ele não anda mais. Os amigos dele saíram do interior de Minas e vieram até aqui em casa. Todo formando tem uma foto pregada na parede na república que estudou. Os amigos do meu pai trouxeram a foto dos quatro. Pregaram a foto de cada um na parede do quarto e disseram: “Agora, a nossa república é a sua casa”. E combinaram que daqui cinco anos estariam de volta. Meu pai chorou. Meus pais completaram 47 anos de casados dia 2 de junho. Eles sempre dançaram nesse dia. Meu pai não consegue mais se levantar. Minha mãe entrou no quarto e colocou a música que eles dançavam. Ela disse: “Meu filho, traz a cadeira de rodas”. Eu perguntei: “O que você vai fazer?”. Ela respondeu: “Vou fazer o que seu pai faria por mim”. Eu busquei a cadeira de rodas. Minha mãe colocou meu pai na cadeira. Ela ajoelhou ao lado dele e disse: “Vamos dançar?”. Abraçou meu pai e fez a cadeira girar. Ela ficou ajoelhada a música toda. Meu pai chorava e ria ao mesmo tempo. Eles ficaram ali dançando e se divertindo. Eu voltei pro meu quarto chorando (...). </em>[Ver texto completo </font><a href="http://www.thebrocode.com.br/artigo-305-amor-completo/"><font size="2">AQUI</font></a><font size="2">].</font></p></blockquote> <p align="justify">Na amizade é assim: nem tudo tem a mesma “graça” se aquela pessoa não estiver por perto. E é importante que a gente diga e faça coisas para que nossos amigos saibam disso, por mais “estranhas” que sejam, enquanto é tempo. E quem sabe quanta oportunidade ainda terá? Dia desses tive um rompante e escrevi mensagens individuais para alguns caros amigos falando sobre como esta pessoa é importante em minha vida e quão grande é minha <em>philia </em>por ela. Uma amiga, sem entender muito bem a razão da declaração repentina, perguntou: “Você está passando bem?”. Outro, aproveitando para fazer graça, indagou: “Você já tomou o seu Gardenal hoje?”. Por mais hilárias que sejam, essas reações são sintomáticas de nossa falta de jeito nessas situações. Alguns de nós lidam melhor com atitudes que com palavras, elogios, ou afirmações de afeto; mas, às vezes, as palavras também são importantes, pois inseminam vida, reforçam nossas identidades. <p align="justify">Para resumir e finalizar, a história de Ique Carvalho me ajuda a unir os sentidos grego e hebraico, filosófico e bíblico, de amizade: Amizade ou<i> Philia</i>, como diz Comte-Sponville, é um regozijar-se mútuo por nossa mútua existência. “Obrigado porque você existe!”, diz o amigo; “bem vindo à minha existência” replica a amiga. Mas, onde existe amizade, há também o convite à partilha não somente dos momentos bons, lúdicos ou de prazer da vida; é um convite a partilhar também a dor, o luto, as incertezas e inseguranças que nos assaltam vez por outra. Em outras palavras, a gente precisa do amigo pra rir com a gente, feito bobo, de besteiras e coisas das quais achamos graça (rir “da gente” também faz parte); mas a gente também precisa do amigo ou da amiga que segure nossa mão e nos abrace quando o momento for de choro. <p align="justify">Tudo isso só é possível, sobretudo, porque a amizade, como todos os amores, é derivada do amor de Deus. Regozijar-se e lamentar pela existência do/a amigo/a, é se regozijar e lamentar em Deus, que o/a fez. Somos capazes de amor e amamos, como disse João, porque “Ele nos amou primeiro”. Isso me lembra da frase que li no livro<em> O Amor</em>, de André Comte-Sponville (Martins Fontes, 2013), que não é um cristão, mas certamente disse isso seguindo o espírito joanino: <blockquote> <p>“<i>A graça de ser amado precede a graça de amar, e a torna possível</i>”.</p></blockquote> <p align="justify">Oxalá o amor de Deus, e nossa amizade com Ele, continue possibilitando que sejamos amigos e tenhamos amigos em nossas vidas. <p align="right"><strong>Jonathan</strong> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-16106353053626553582015-06-09T15:19:00.001-03:002015-06-09T15:19:03.135-03:00Os assasinos do Deus tolo da cruz<p align="justify"><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-hSlolP9qaqg/VXcuEbLwv8I/AAAAAAAAFrQ/_7EOC99ZG2U/s1600-h/Homofobia%252520cruz%25255B3%25255D.jpg"><img title="Homofobia cruz" style="border-top: 0px; border-right: 0px; border-bottom: 0px; float: none; margin: 10px auto; border-left: 0px; display: block" border="0" alt="Homofobia cruz" src="http://lh3.googleusercontent.com/-WVSy6vJkyEM/VXcuFeKULNI/AAAAAAAAFrY/t2xpi7jSwc0/Homofobia%252520cruz_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="475" height="318"></a>Hoje acordei perplexo, e não é pela transexual crucificada (na Parada Gay 2015, em São Paulo), mas pelo esquecimento de que a cruz não é um símbolo sagrado, mas de escárnio, dor e abandono; não é objeto de veneração, mas mensagem a ser encarnada. A cruz, na visão cristã, "está vazia", mas não pode ser esvaziada de seu significado em nome de uma visão triunfalista e sectária da fé. Cristo continua sendo o Cristo da cruz, e se vê representado em todos/as os/as crucificados/as pela hostilidade e opressão humanas ainda hoje, o que certamente inclui os GLBT. </p> <p align="justify">Para o Cristo não existem estas classificações e rótulos éticos, étnicos, tribais e etimológicos que tanto nos dividem; para ele, existem tão somente pessoas. Não se trata de saber com quem elas dormem, mas quem elas são e o anseio que mora em seus corações. Enquanto nós as enxergamos através de rótulos e aparência, Ele está interessado no ser; enquanto buscamos punição, ele oferece perdão; enquanto as mandamos para a cruz - e perversamente reclamamos quando uma delas resolve, de fato e simbolicamente, "ir para a cruz" -, Ele oferece graça, amor, redenção. Enquanto alguns de seus notórios e pretensamente fiéis representantes vão coar camelos nas redes sociais e na mídia em geral gritando "Escândalo, seja anátema!", ao lado dos oprimidos e das minorias, ainda posso ouvi-lo gritando da cruz: "Pai, perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem". </p> <p align="justify">O paradoxo e o escândalo da cruz, contudo, é que tanto para os "santos perversos" da religião, quanto para os transviados da vida, existe a possibilidade da ressurreição - mas temo que apenas os transviados estejam abertos para ela. Precisamos parar de falar do amor de Deus, para aprender com ele e pô-lo em prática; pois, enquanto o "nosso amor" rechaça tolices e é cheio de ponderações, não sendo propriamente amor, mas indulgência condicional, 'o amor de Deus é tolo', como declarou Brennan Manning: tolo e imponderado. </p> <p align="justify">É, amigos/as desta blogosfera, talvez não haja oração mais urgente que essa, ao menos para mim: "Senhor, eu também quero ser tolo; faz de mim repositório de suas tolices divinas".</p> <p align="right"><strong>Jonathan</strong></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-39104340349986007262015-05-25T11:30:00.001-03:002015-05-25T11:30:36.439-03:00Tempus Fugit: Tudo é fumaça!<p align="justify"><a href="http://lh3.googleusercontent.com/-lD1hMoX3Tgc/VWMyCWcR5sI/AAAAAAAAFj0/Ys3zvIUGDOk/s1600-h/Smoke%25255B3%25255D.jpg"><img title="Smoke" style="border-top: 0px; border-right: 0px; border-bottom: 0px; float: none; margin: 10px auto; border-left: 0px; display: block" border="0" alt="Smoke" src="http://lh3.googleusercontent.com/-4FAWErqtrEc/VWMyCyAU63I/AAAAAAAAFj8/swE_QP9Uf_A/Smoke_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="495" height="331"></a>Hoje... O “hoje” foge, escapa na esteira do imediato. Esse hoje me remete a tantas coisas que foram e ainda são, que deveriam ser, mas não são, que persistem enquanto deveriam estar mortas a essa altura. Alguns exemplos óbvios: hoje não estamos interessados mais em debate, mas em mandar recado; não desejamos mais nos aprofundar nos pensamentos, mas em consumi-los quase que antropofagicamente; não mais apreciamos criticamente o olhar do outro, mas o reduzimos a um "gostei" ou "não gostei"; não produzimos textos, mas opiniões do tipo "love it" ou "hate it" - e o "lover" de hoje pode muito bem se transformar no "hater" de daqui a pouco, afinal, não é tanto uma questão de conteúdo, mas de semântica, não tanto de caráter, mas de aparência. Chegamos ao ponto de jogar fora o carinho e respeito pela pessoa em função de sua forma de pensar. <p align="justify">Não falamos francamente, mandamos uns "torpedos"; emulamos amizades com milhares pelas redes, enquanto nas teias de nosso inominável “ser interior” permanecemos profundamente sozinhos; hesitamos em deixar as claras as regras do jogo nas relações pessoais e institucionais, preferimos comentar nos bastidores (falar “por trás” mesmo) como fulano "é errado", como "está fora do prumo", como está longe da "nossa visão". É, minha gente, se pensarmos bem, mas bem mesmo, nos acharemos no mesmo poço escuro e fundo que o sábio de Eclesiastes se viu há milhares de anos e, com ele, honestamente e tragicamente poderemos concluir: "vaidade de vaidades, tudo é vaidade e correr atrás do vento". O ato mais heroico e mais humano que alguém pode fazer por si mesmo hoje é lutar para manter sua integridade enquanto os “demônios do hoje” lutam, nos muitos balcões da vida, para vender a sua alma – com ou sem a sua anuência. Tempus fugit... viver (e deixar viver) é preciso! <p align="right"><b>Jonathan</b></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-51994787216820692612015-05-09T19:23:00.001-03:002018-04-17T15:41:54.767-03:00Homossexualidade: saindo de meu armário teológico<div align="justify">
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<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgCqGJePPWfTLA7ENztMMmJhW0-4dJtSnZ1e4Coe6QK185B4ogsp9aIyYch3PvHatso1HynMI4RxEjWxKKwQt-Ysb9WaJqJiou07xElS0Do99oUbLbUeDpq0iVEuWT5CfRJbuhTzXyG3BAH/s1600/beloved.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="267" data-original-width="320" height="333" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgCqGJePPWfTLA7ENztMMmJhW0-4dJtSnZ1e4Coe6QK185B4ogsp9aIyYch3PvHatso1HynMI4RxEjWxKKwQt-Ysb9WaJqJiou07xElS0Do99oUbLbUeDpq0iVEuWT5CfRJbuhTzXyG3BAH/s400/beloved.jpg" width="400" /></a></div>
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Homossexuais. Que seres tão incompreendidos, não é mesmo? E por isso, mal julgados, maltratados, malvistos... Infelizmente, a cada dia comprovo que nossa sociedade, de modo geral, o que inclui os cristãos, não está preparada para lidar com essas pessoas e, portanto, não as trata como pessoas, mas como doentes, depravadas, indignas. E a homossexualidade não é uma doença (por isso o termo “homossexualismo" deve ser evitado), mas uma condição: não almejada nem desejada por ninguém que realmente seja um homossexual, assim penso, afinal, primordialmente, não se trata de uma escolha. E muitos sofrem por serem assim, exatamente pela rejeição e o julgamento que têm e terão de lidar hoje e para o resto de suas vidas. Sim, porque, se consentimos que não é "doença", logo é absurdo buscar uma "cura".<br />
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Henri Nouwen, meu grande herói na literatura, era padre e era homossexual, viveu assim e morreu assim – mesmo tendo optado por não se realizar sexualmente, por força de sua vocação sacerdotal – e efetivamente, nada do que penso e sinto sobre ele mudaria se o contrário fosse verdade. Mas ele sofreu as consequências dessa escolha, e como sofreu. Quem não sofreria? Você não sofreria, supondo que seja hétero, se alguém chegasse hoje e dissesse que o universo e a história toda estavam errados? Que a ordem da criação (ou da evolução) da sexualidade humana é uma mentira, e que a verdadeira ordem natural (divinamente aprovada inclusive), é a homossexual? Então você teria de suprimir seu desejo por homens (ou mulheres), e eu, de suprimir o meu por mulheres. Parece absurdo, mas é uma forma bem tosca, mas enérgica, de se imaginar no lugar dessas pessoas. Que coisa mais destrutiva de fé, de corpo e de alma esse negócio chamado de "cura gay"! Quantas pessoas não se alijaram da fé por conta dessa falsa crença – não falsa crença no poder de Deus em si, mas em que são doentes e que só Cristo pode curar. Mas e quando não “cura”, como em muitos casos que conheço de pessoas que oraram por longo tempo, buscaram ajuda, participaram de campanhas, foram a psicólogos, fizeram tratamento médico e até tomaram remédios? E quando supostamente a pessoa se cura, e passa a ter relações heterossexuais ou então se tornar celibatária, mas o desejo homossexual permanece lá, vivo e <i>caliente</i>? Se a homossexualidade é uma condição, como os muitos estudos existentes e uma observação atenta da realidade me fazem acreditar, então não faz sentido nenhum falar em "cura gay".<br />
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Então, você pode estar pensando: "O que nos resta, como cristãos", caso queiramos sair de nossos armários teológicos e doutrinários previamente estabelecidos sobre o assunto? Em primeiro lugar, e o passo mais óbvio, é o de que precisamos amar, sem perguntar nem quem, nem onde, nem por que, nem quando, nem de que jeito. É isso que Jesus me ensina a fazer, como alguém que amava sem condição e abraçava sem perguntar nada. Deixe as perguntas e as tentativas de respostas para depois. Em segundo lugar (pensando aqui que você vive em um ambiente conservador, onde não se discute, apenas se determina qual é a “visão correta”), quando esse momento chegar, procure um pequeno grupo de orientação e reflexão (se ele não existir, crie) onde o assunto possa ser discutido com liberdade de mente e coração, com abertura, sem julgamentos, utilizando as mais diferentes ferramentas de leitura existentes, o que inclui uma leitura e exegese séria dos textos bíblicos que tratam do assunto. Para mim, é relativamente claro que estes textos (como em Levítico, Romanos, 1Coríntios, etc.) literalmente proíbem práticas homossexuais em tais e/ou quais circunstâncias historicamente dadas dentro de contextos culturais específicos. No entanto, me parece temerário defender que estes mesmos textos deem base para: (1) tratar a pessoa homossexual hoje como doente ou depravada – até porque, via de regra, nestas passagens são homens e mulheres heterossexuais deitando-se com outros (e outras) pessoas heterossexuais e, na maioria das vezes, em práticas de culto orgiástico, que, na tradição veterotestamentária, feriam o princípio do culto ao único Deus, Javé ou, como no caso de Sodoma e Gomorra, desobedeciam à lei de hospitalidade a estrangeiros; (2) nem falar em "cura gay", como já enfatizei; ou (3) condenar a condição natural de ser homossexual – mesmo porque provavelmente na antiguidade existiam muitos homossexuais (tanto quanto hoje), mas pouco se sabia sobre a homossexualidade enquanto condição, até porque o conceito de homossexualidade sequer existia. Por que será que Jesus não dirige uma palavra sequer sobre essas pessoas nos evangelhos? E por que Paulo se preocupou, mais que Jesus, com essas práticas orgiásticas de homens com homens, mulheres com mulheres? São perguntas que precisamos fazer, dentre outras, ao abordar o tema biblicamente – e aqui não me estenderei mais a respeito, pois não é o propósito desse breve desabafo. Ademais, precisamos lançar mão do que têm asseverado os psicólogos e cientistas que têm se dedicado a estudar o assunto, uma vez que há tantas pesquisas a respeito, e tão poucas conclusões definitivas sobre isso. Realmente, este assunto ainda dará muito pano para a manga; basta que estejamos interessados em saber mais, saindo de nosso pequeno armário preconceituoso, despótico, autoritário e superficial de julgamento, sobretudo no campo da religião e, mais ainda, do cristianismo.<br />
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Minha posição atualmente é a seguinte: quanto à questão teológica, posso dizer que, até agora, não vejo razões na bíblia que claramente me dão base para justificar e embasar a prática homossexual em si – e sinceramente, não é preciso, pelo menos não para mim. A questão não é essa. Não existe a homossexualidade, ou a prática homossexual, fora da pessoa. Então a questão é: biblicamente falando, posso deixar de amar um/a homossexual ou qualquer pessoa que seja? E não um amor cheio de imposições e “senãos”, como muitos oferecem, dizendo coisas do tipo: "ah, amo você, mas não o seu 'pecado" (dá pra separar?); "você é bem-vinda em nossa igreja, pode frequentar, mas não pode batizar e nem se tornar membro" (que oferta irrecusável, não? Jesus deve se orgulhar muito dessa). Não, queridos/as irmãos e irmãs. Amar é abraçar; é dizer "você é bem-vindo/a aqui", é dizer "você é um/a filho/a amado/a do Pai, e por isso é minha irmã, meu irmão”; você, que ama ao Senhor, é parte desse corpo e, portanto, seus dons e talentos são bem-vindos aqui. Como costuma dizer um amigo, “quem chama a Deus de Pai não pode escolher irmãos”. Afinal, o que é mais importante, acolher a pessoa em serviço e amor sincero, ou arbitrar sobre com quem ela dorme ou deixa de dormir? E quem é que pode garantir que os "santificados" heterossexuais da igreja dormem com pessoas a quem amam, por quem prezam, e das quais cuidam, como dizem que fazem? O que torna essa pessoa "autorizada pra entrar aqui", e a outra, homossexual, que tem um/a parceiro/a a quem ama, preza e cuida e é fiel, inapta para o reino de Deus? Aliás, quem é o/a “apto/a” para isso? O reino de Jesus, tal como o evangelho me mostra, existe exatamente para pessoas não aptas, desajustadas, pecadoras; ou, parafraseando Brennan Manning, para a “turma da auréola torta”, e não para a turminha angelical da “auréola apertada” (os fariseus e saduceus que o digam). Sério mesmo que vamos continuar achando que estas pessoas são pecaminosas e ignominiosas, condenáveis por assim dizer, enquanto o presbítero, casado e hetero, ministra a ceia na igreja, mas não deixa de olhar para a calcinha da irmã aparecendo na saia curta, e depois se masturba ou transa com a sua mulher pensando nela? E não venha me dizer que isso não acontece!<br />
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Eu, porém, não ouso dizer nada mais além de: "tem misericórdia de mim, Senhor, porque sou falho, não merecedor e não apto". Sendo pecador, ainda que não viva no nem para o, mas eventualmente caia em, pecado, como posso julgar ou condenar meus irmãos e irmãs humanos/as? A mim mesmo me condeno se o fizer, como disse Jesus no Sermão do Monte. Sei que provavelmente muito do que tenho dito aqui você preferia não ouvir assim, não concorda, queria mais “embasamento” ou talvez não pediu para que dissesse. Honestamente, não me importa, isto é um desabafo. E hoje falo assim, não porque acredite que a igreja ou a sociedade estão preparadas para isso, nem abertas para o diálogo e a escuta – na verdade, penso que elas nunca estarão de fato, ou isso está deveras longe de acontecer. Posiciono-me assim, por convicção de fé e humanidade, e pela certeza de que há muita gente sofrendo e até morrendo por essa causa, pelo preconceito, a rejeição, a discriminação e a violência bárbara, física ou verbal, material ou simbólica.<br />
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No fundo, é nessas pessoas que penso, e não nos crentes fundamentalistas; são essas pessoas que importam, e não seus detratores e abusadores. E estas pessoas não podem esperar mais para serem ouvidas, amadas, abraçadas; não podem mais ter seus direitos humanos negados; não podem mais orar e esperar pela mudança de visão e coração dos cristãos, dos políticos, da sociedade, enquanto nada muda. Estas pessoas clamam pelo direito de ser gente e de ser quem são. E como cristão, minha missão não é outra senão a de lutar para que sejam, para que possam, para que alcancem esse direito – independente das querelas teológicas improdutivas que gravitam ao meu redor sobre o assunto, às quais não dou mais a mínima. A questão homossexual só deixará de ser uma questão e deixará de ser urgente, quando o amor, a justiça, a igualdade, os direitos e a liberdade se fizerem realidade concreta em nossas vidas. Enquanto isso não acontecer, decidi que não posso e que não vou mais me calar a respeito: decido sair do armário de minhas “médias ponderadas evangélicas”, de minhas posições razoavelmente confortáveis, a fim de clamar pelo direito de gente oprimida, gente pela qual Jesus entregou sua vida.</div>
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<b>Jonathan</b></div>
<br />Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3140203643759271880.post-17542371325042307252015-03-23T12:02:00.000-03:002015-03-23T12:05:57.784-03:00Por uma fé que pode fraquejar<p align="justify"><a href="http://lh6.ggpht.com/-bciZjWatfyg/VRArU3HyI4I/AAAAAAAAFGU/s10vILlL_Mk/s1600-h/Week%252520heart%25255B6%25255D.jpg"><img title="Week heart" style="border-top: 0px; border-right: 0px; border-bottom: 0px; float: none; margin: 15px auto 0px; border-left: 0px; display: block" border="0" alt="Week heart" src="http://lh5.ggpht.com/-r3TPomoE_8M/VRArVtO6dOI/AAAAAAAAFGc/gTZD2_vJng0/Week%252520heart_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="492" height="329"></a> <blockquote> <p align="justify"><font size="2" face="Lucida Bright"><em>Quando o meu coração estava amargurado e no íntimo eu sentia inveja, agi como insensato e ignorante; minha atitude para contigo era a de um animal irracional. Contudo, sempre estou contigo; tomas a minha mão direita e me susténs. Tu me diriges com o teu conselho, e depois me receberás com honras. A quem tenho nos céus senão a ti? E na terra, nada mais desejo além de estar junto a ti. <u>O meu corpo e o meu coração poderão fraquejar</u>, mas Deus é a força do meu coração e a minha herança para sempre (Sl 73.21-26).</em></font></p></blockquote> <p align="justify">Uma das coisas que mais me preocupa quando o assunto é “fé” é o pouco espaço que nossas definições e percepções mais ou menos comuns deixam para o lado incerto e fraco da fé. Sobretudo porqu<a name="_GoBack"></a>e, ainda que o conceito de fé tenha um aspecto doutrinário ou quase definitivo – e se não respeitar aquilo, não será considerado fé – o fato fundamental é que a fé não existe fora da pessoa. E como pessoas, adotamos, criamos, defendemos e obedecemos convicções, mas também somos abalados em relação a elas, o que denota uma dupla condição de fragilidade: (a) primeiro a condição da vida humana; (b) a condição de nossas certezas, que muitas vezes se abalam na medida em que invariavelmente nosso mundo se abala. A questão no caso é se saberemos ou não a lidar com a ambiguidade óbvia que nos contitui como humanos e, como tal, também atinge nossa própria fé? <p align="justify">Os salmos são cheios dessas ambiguidades, como este que lemos acima. O salmista demonstra ser alguém que andava com Deus, buscando e apreciando seus conselhos; mas no meio dessa trajetória comete alguns deslizes próprios de quem, mesmo sendo de fé, é gente, é humano; e o que aproximava este homem de Deus não era apenas o fato de que ele foi um “escolhido” de Deus, mas de que também, a despeito de suas dúvidas, inquietações, medos e outros sentimentos demasiadamente humanos, ele prosseguia escolhendo Deus. E escolher Deus implica em admitir sua dependência, é ser honesto com Ele, é saber que Ele “é” e continua “sendo”, a despeito de nós não sermos, e que ele <i>permanece</i>, apesar de nossos desvios e fraquezas. <p align="justify">É disso que trata este texto. Nele, o autor admite ter sido tomado pela inveja e amargura em seu coração em relação aos arrogantes e ímpios, mas prósperos; pessoas passam por cima das outras e só pensam em si mesmas, mas, a despeito disso, parecem ser bem-sucedidas em tudo: não adoecem, estão sempre fortes, oprimem os outros, agem como quem pode se apossar da terra, como se esta fosse só delas; além disso, ainda zombam de Deus, não se preocupam com nada e só vão aumentando sua riqueza. O salmista então é tomado pela insensatez e conclui que toda a sua busca por se manter reto e puro, em agir corretamente e temer a Deus, provava-se inútil, pois o fez penar ainda mais enquanto esses pérfidos aí gozam de todas as benesses que ele, pelo bem realizado, deveria estar gozando. E quem não se sentiria injustiçado? Quem não se veria tentado e duvidar do caminho da retidão, isto é, dos caminhos de Deus? Quem numa situação dessas não passaria pelo vale da insensatez e da amargura como passou o salmista por um momento, que não sabemos quanto tempo durou? É isto que chamo de “mundo abalado”; perdemos nosso chão, e vemos como nossas convicções podem ser solapadas e se perder nestas horas. <p align="justify">Mas o salmista não era insensato ao todo; simplesmente porque, diante de Deus, ele admitiu fraquejar, reconheceu seus minutos de bobeira e insensatez; mas mesmo neles, percebeu que não saiu do lado de Deus. Para onde poderia correr? Qual seria, afinal, o sentido de tudo isso? Ele decidiu que melhor é continuar andando com Deus. O sentido de sua fé era maior que a própria fé, pelos modos pelos quais ela se constrói, pelos invólucros frágeis nos quais ela, muitas vezes, se sustenta. Permanecer na fé, contra todos os questionamentos que eventualmente fazemos aos seus conteúdos, como diz Tillich, é um ato de coragem, e mostra que a fé é bem maior que os invólucros que inventamos para contê-la; em suma, é ser possuído por “aquilo que nos toca incondicionalmente”. Envolve a pessoa inteira. Não somente a razão, tampouco só as emoções. Não apenas convive com a dúvida existencial, mas se alimenta dela. Sua única certeza é a do incondicional. Seu principal mote é o impulso de viver, a despeito da própria morte e da incerteza. <p align="justify">No fim das contas, o coração humano é ou pode ser enganoso, como defendeu Jeremias; traiçoeiro em seus direcionamentos, compulsivo em seus desejos. Por ele passam torrentes de pensamento, impulso e volição que podem nos afastar tanto do centro de quem somos, como de nossa própria fé. Por isso, como diz o salmista, ele pode, sim, fraquejar. Mas eu acrescento: é bom que ele fraqueje, pois, fraquejando, melhor reconhece suas lacunas, vulnerabilidades, defeitos; mais bem sabe de sua insuficiência. E quando sabemos disso, fica talvez mais fácil entender que somos apenas gente, parte de um todo, e que a força do nosso coração vem não dele mesmo, mas de quem o fez e faz pulsar: Deus, o único que possui a chave dos corações humanos e que, mesmo em meio a toda corrupção que lhes é própria, escolhe deliberadamente por amá-los. <p align="right"><b>Jonathan</b></p> Jonathan Menezeshttp://www.blogger.com/profile/10312343569722214097noreply@blogger.com1