segunda-feira, 31 de março de 2008

Uma breve conversa sobre sexo (Parte I)

Sexo antes do casamento é pecado? Masturbação é pecado? Se “tocar”, um ao outro, antes do casamento é pecado? Estas são perguntas corriqueiras entre jovens cristãos e que, de modo geral, na igreja são tratadas de forma pouco profunda, evasiva e, na maioria das vezes, sob ponto de vista legalista-fundamentalista. Dúvidas surgem, as respostas são vagas e farisaicas, e a tendência é que o jovem caminhe em um ou outro extremo: ou de forma dissoluta e libertina, ou em um puritanismo “castrante” e recluso.

Certa vez, em uma destas conversas sem convenção – estas que a gente tem só pelo prazer de estar com o outro – um camarada fez perguntas semelhantes a mim, e minha resposta, com toda franqueza e liberdade que tenho no Senhor, e com base na Lei do Amor, foi que tanto pode ser pecado como não, dependendo de quem faz (do ponto de vista da consciência e compreensão da Graça de Deus), com quem faz, em que circunstâncias e com que motivação faz. Aqui me refiro ao Amor, com “A” maiúsculo mesmo, sem o qual o sexo ou qualquer outra coisa que diz respeito a uma relação perde o sentido, tornando-se um mero acessório de um projeto falido e sem futuro profícuo, pelo menos aos olhos de Deus. Quando falo de amor, falo pensando que todos os atos que o incluem demandam em responsabilidade.

Lembra daquele conselho que o tio do Homem-Aranha disse pra ele no primeiro filme: "Um grande poder exige uma grande responsabilidade". Eu aplico isso ao amor. O amor é mais do que sentimento, prazer ou curtição momentânea, e o sexo também. Quando você decide fazer sexo, ou melhor, "amor", com outra pessoa, deve ter em mente que você está assumindo uma responsabilidade para com ela, até porque, como diz Paulo, em Efésios 5:31, "vocês se tornarão os dois uma só carne". Caio Fábio diz que ali, no ato sexual, é que se engendra o casamento, ou seja, algo que vai marcar vocês dois para o resto da vida, enquanto uma só carne. O lance da cerimônia na igreja, da noiva de branco (que representa a pureza), da benção do pastor, das famílias, da igreja, todos representando a benção e o consentimento de Deus, seguido da noite de núpcias (a "primeira vez" dos noivos), tornou-se algo tão canonizado que se a ordem dos acontecimentos, por um motivo ou por outro, muda, o escândalo e a desaprovação são gerais, com raras exceções. Por essas e por tantas outras coisas que é, para tantos, difícil falar sobre sexo na igreja, ou qualquer outro lugar, que dirá tomar alguma posição.

Quando não há educação e o ensino de um evangelho que não oprime ou aprisiona, mas que, pelo contrário, liberta, você cria pessoas cativas: a um pensamento doutrinário fraco, à vigilância do pastor, do líder de jovens, dos outros membros da igreja, etc. Em conseqüência, esta pessoa (a “vítima”), quando estiver sozinha e tiver que lidar com situações como esta que estamos tratando, de sexo, masturbação, etc., ela não vai conseguir segurar a barra, pois tudo o que ouvira, até então, foram respostas negativas e evasivas, e quando o corpo e a mente dizem "sim" e a "coisa" acontece, ela se enche de complexo de culpa e, dependendo do que vai ouvir de quem souber o que aconteceu, ela adoece, e acaba entrando num círculo vicioso muitas vezes sem volta.

Jonathan

sexta-feira, 28 de março de 2008

O olhar da Graça

Hoje é meu aniversário: 27 anos intensos de Graça. Mais do que nunca, quero cultivar esse olhar: pra vida com gratuidade e gratidão; para as pessoas com amor, compaixão e ternura, assim como Jesus. Essa meditação escrevi há uns anos atrás. Ainda reverbera em meu coração de modo especial. Espero que também o faça no de vocês.

Alguém um dia inventou, e tantos outros seguiram reproduzindo, o dito que afirma ser os olhos o “espelho da alma”. Isto é, segundo tal dizer, os olhos refletem a “pessoa” que há por dentro de nós, e o olhar é a exterioridade do que acontece internamente. Acredita-se que com um simples olhar, é possível expressar sensações e percepções em relação ao mundo que está a nossa volta; expor o “estado” mais profundo de nossas almas, e, mais incisivamente, exibir a realidade “oculta” de nosso ser. Assim, a visão manifesta-se como o grau conseguinte do olhar. Ela pode ser tanto a “graça” como a “des-graça” do olhar (do indivíduo que vê), posto que ela é o canal manipulador das “imagens-mensagens” que procedem “de fora”, bem como das “percepções-respostas” que vêm “de dentro”.

A maneira como direcionamos nossos olhares para as pessoas e as “coisas”, determinam as formas com as quais nos relacionamos com as mesmas. Entretanto, Paulo diz que tudo o que “hoje” vemos, é visto em parte. Nossa visão é “caolha”, unilateral, tendenciosa. Deus é quem realmente “vê”; e nós, quase enxergamos. Tudo o que ele vê com nitidez, para nós não passa de imagem distorcida. Por quê? Ora porque Deus é singular e primoroso. E para nós, permita-me ser redundante, ainda não veio a plenitude do que é perfeito. “Porque, agora, vemos como em espelho, obscuramente; então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei como também sou conhecido” (1Co. 13:12).

Jesus Cristo foi o homem de toda graça, pois podia olhar muito além das meras aparências de cada pessoa que cruzasse seu caminho, e vê-la como ela realmente era vista, isto é, como ser criado, em amor, à imagem e semelhança de Deus. É como uma viagem para dentro do outro, buscando extrair e valorizar o que nele há de melhor. Jesus conseguia fazer isto com maestria, como que destituído dos vícios e patologias que assolam o coração humano, expressando uma sintonia com a misericórdia, com o amor e a graça do Pai, que encharcava sua alma, estendendo-se pelos seus átrios, moldando seus atos e caráter segundo o coração do Pai.

E a nós, o que nos resta? De tudo, o que permanece, posto que nossos olhares refletem feições e juízos incompletos acerca do que foi criado, e que nada podemos designar além do que, pelo criador, assim creio, já fora designado desde a eternidade? Resta-nos o desafio de sermos “imitadores de Cristo”, cooperando com ele na realização do Reino, moldando nosso olhar apaixonado e, ao mesmo tempo, injusto, bem-intencionado e parcial, ao seu olhar da terna Graça Divina. Permanecem, como diz Paulo, a fé, a esperança e o amor. A “Fé” expressando nosso alicerce, a “Esperança” nosso alvo, e o “Amor” nosso lema relacional de vida; todos apontando para a consumação da história, em Cristo Jesus.

Jonathan

quarta-feira, 26 de março de 2008

Religião, votos e sacrifícios

Não pode haver abominação maior, escárnio mais tenebroso aos olhos de Deus que a devoção e sacrifícios externos a Ele de um lado, aliados a um vazio e uma escuridão interna decorrentes de um coração maligno e idólatra. Religião, "Bandeira do inferno" (como denominou Glenio Paranaguá); emissária de Satanás enviada para incutir na mente dos crentes um falso senso de pureza e autojustificação, levando-os ao patamar do orgulho e beirando a intolerância. Afinal, uma reparação exterior é sempre mais simples e atraente que a árdua missão de "reformar" o interior.

O povo de Israel, no tempo do profeta Jeremias, havia deixado de dar ouvidos à voz do Senhor e de andar conforme suas ordenanças, outrora estipuladas na aliança firmada com seus pais, aliança que se encontrava visivelmente violada. Duas acusações vieram à tona aqui: dureza de coração e idolatria (reverência a outros deuses). Jeremias, assim, exorta de maneira bem específica: "Que direito tem na minha casa a minha amada, ela que cometeu desonras? Acaso, ó amada, votos e carnes sacrificadas poderão afastar de ti o mal?" (Jr. 11:15). Prestemos atenção em duas palavras que se destacam neste texto: direito e sacrifício. Pela antiga aliança, a nação de Israel passaria a ser "povo de Deus" por "direito" contraído, pelo que foi eleita por Deus a fim de ser povo santo, não obstante ser o "menor" dentre todos os demais povos, fato aparentemente esquecido.

Dessarte, seus sacrifícios perante Deus eram puros, agradáveis e redentores por si só, assim se cria. Veja só, quanto mérito e quanta nobreza em jogo! Deus parecia estar fatigado diante de tanta balbuciação e tolice. Afinal, holocaustos passaram a ter maior importância e a ser tão suficientes quanto compaixão e misericórdia. Jesus, porém, veio e enfraqueceu tanto o direito como o sacrifício, no sentido aqui exposto. A cruz de Cristo elimina qualquer mérito ou participação humana em alcançar sua própria redenção. Religião, votos e sacrifícios deram lugar à fé, à graça e ao amor, amor Divino, eterno e suficiente. Nas palavras de William James, nosso "pequeno ego convulsivo" foi anulado, e, segundo diz ainda uma canção de João Alexandre, "Deus não habita mais em templos feitos por mãos de homens", e "não será jamais enclausurado na escuridão de quem ainda tem um coração de pedra".

Jonathan

segunda-feira, 24 de março de 2008

Uma breve história da religião

Sintomático, simplista talvez, mas capta a essência da coisa: o que deveria ser amor, paz, liberdade e libertação, do outro e para o outro, degenerou-se em fundamentalismo e violência. E tudo isso por e para uma suposta entidade a quem chamam "Deus". Mas quão distante esse tipo de mentalidade está de captar algo tão simples e tão complexo:

"Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. (...) Se alguém disser: Amo a Deus, e odiar a seu irmão, é mentiroso, pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê" (1João 4.7, 20).

Jonathan

A religião dos 'puros' e 'sem mácula'

A religião se torna um instrumento vão nas mãos daqueles que facilmente se conformam aos ditames de sua cultura (como o que tem acontecido com uma parcela de cristãos, submersa na atual “cultura da bobalização”, que diz: “acumule!”, enquanto a Palavra nos ensina a repartir). E o resultado é que os tais deixam de amparar ao necessitado, de exercer misericórdia e justiça ao oprimido, de acolher ao órfão, à viúva e o estrangeiro.

Não é a manutenção de uma exterioridade piedosa que sustenta a religião, nem tampouco o juízo aceptivo; primeiro porque, de todas as coisas, Deus deseja que guardemos incontaminado o nosso coração; segundo, pois Deus não nos constituiu juízes uns sobre os outros, mas nos convocou para uma vida marcada por liberdade e misericórdia, tendo em vista que “a misericórdia triunfa sobre o juízo”, conforme Tiago, e a liberdade prevalece frente ao refreamento mortífero daqueles que no exterior dizem: “creio!”, tanto quanto inescrupulosamente os demônios também crêem e tremem!

Deus, todavia, se agrada do homem e da mulher que de coração fala a verdade, pois Ele perscruta os corações, especialmente aqueles já blindados pela hipocrisia e por uma imagem “imaculada” e “pura”, forjada após anos e mais anos dentro de um sistema religioso abusivo e opressor. Até quando ficaremos excessivamente presos aos obstáculos irrelevantes que historicamente construímos enquanto a vida passa, o mundo fica cada vez mais vil e cruel, e, por conseguinte, o mandato de Jesus: “Ide, e fazei discípulos por todas as nações”, ainda se faz imprescindível? Quantas vezes mais coaremos até a mais imperceptível das partículas do mosquito, enquanto o camelo “desce redondo” por nossas gargantas amortecidas?
Às vezes penso que a parcela a qual mencionei, a dos religiosos “puros” e “sem mácula”, pode ser comparada aquele inquilino chato de um condomínio qualquer, que vive dando “dores de cabeça” ao síndico, que por sua vez não agüenta mais tanta reclamação de supostos “direitos”, tantos defeitos apontados, tantos pedidos de melhoria no prédio, recebendo, porém, como respaldo, apenas a inadimplência deste condômino na quitação de suas “dívidas”. No caso da igreja, oro para que o Síndico, quer dizer Deus, tenha misericórdia (mais?) frente a tanta mediocridade, do contrário, salvo fatalismo, talvez a igreja (nós) é que tenha de amargar o “despejo” e “fazer as malas” mais cedo. E o cedo já será tarde...
Jonathan

sábado, 22 de março de 2008

Viva! O Nosso Redentor Vive!

HOJE, ACORDEI COM MUITA VONTADE DE VIVER
DE VIVER MESMO A VIDA QUE DEUS ME DEU
PREENCHIDA POR AQUELA QUE, EM CRISTO, ELE ME LEGOU:
ALEGRE, COM TONS COLORIDOS, SUAVES E VIVOS,
QUE FAZEM FORTE CONTRASTE ENTRE AS ANTIGAS “CORES”,
“NUBLADAS E TRISTES”, QUE, SEM SUCESSO, PERSISTEM
EM QUERER MANCHAR O QUE O PINTOR, GÊNIO CRIATIVO,
PINTOU COM PERFEIÇÃO

HOJE, ACORDEI COM A ALEGRE CERTEZA DE QUE,
MAIS DO QUE NUNCA, ESTOU VIVO PRA CRISTO,
PORQUE HOJE, MAIS DO QUE ANTES HOUVERA CRIDO,
“EU SEI QUE O MEU REDENTOR VIVE!”.
VIVE EM MIM, EM NÓS, E VIVE PARA QUE NELE VIVAMOS,
SENDO NÓS, NELE, UM SINAL TRANSFORMADOR DO LUTO,
EM EXULTAÇÃO PELA SALVAÇÃO ETERNA.

PERSISTIMOS VIVENDO, EM MEIO À “ORDEM” DESORDENADA DESTE MUNDO, ALIMENTADOS PELA EXPECTATIVA DA VINDA REAL, A REAL ESPERANÇA DE QUE A PLENITUDE DESTA VIDA, NÃO É AQUI, NEM AGORA, MAS GLORIOSAMENTE HÁ DE VIR.
AH, E COMO AGUARDAMOS ESTE DIA, GRANDE DIA, MARANATA! QUANDO TODOS, A UMA SÓ VOZ, DE UMA VEZ POR TODAS, PODEREMOS DIZER: “BENDITO SEJA AQUELE QUE VEM EM NOME DO SENHOR!”
Amém!

Jonathan

quinta-feira, 20 de março de 2008

Redescobrindo a alegria

Digo isto não por causa da pobreza, porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação” (Filipenses 4.11).
 
Ao, mais uma vez, falar sobre alegria, quero aqui continuar fazendo um exercício de honestidade. Perguntas honestas requerem respostas honestas, diria Francis Schaeffer. Mas em que isso implica? Implica em não esconder, mas ajudar a escancarar o que a vida real já torna evidente. Aliás, quanto mais experiência se acumula no caminhar, mais dever-se-ia ser assaltado de honestidade e realismo – bem, tudo é uma questão de perspectiva. Há quem diga que escolher ficar alheio à dureza da realidade sempre faz muito mais bem à “saúde” que enfrentá-la. Eu discordo. Por mais que me traga “infelicidade”, prefiro a realidade.

Como vai dizer C. S. Lewis: “O que me agrada na experiência é a sinceridade que nela percebo. Você pode tomar quantos desvios quiser; mas basta manter os olhos bem abertos, que logo verá a placa de alerta. Talvez você se tenha enganado, mas a experiência não tenta enganar ninguém. O universo se mostra fiel sempre que você o testa com justiça” (Surpreendido pela alegria, p. 182). O problema é que nem sempre estamos de olhos abertos, seja por insensibilidade, opção ou por pura preguiça de abrir os olhos. A pior enganação é aquela em que a gente finge que está sendo enganado enquanto um universo de coisas acontece em nosso entorno.

Talvez pudesse aqui falar de alegria começando pelo que ela não é – falo de uma alegria mais profunda: a alegria cristica (de Cristo). Fujo propositalmente do termo “cristã”.

1. Alegria não é empolgação. Empolgação é um subproduto da alegria. Acontece quando nosso desejo e atenção estão focados em alguma coisa (tipo, paquerar uma garota e perceber que há correspondência). Mas, de um jeito ou de outro, a empolgação vai embora; e, se alegria fosse empolgação, o que restaria?

2. Alegria não é prazer emocional ou estético. Embora, é claro, os inclua. O aguilhão do prazer é a satisfação. Enquanto há satisfação, o prazer está garantido. Mas se não há satisfação, não há prazer. E se alegria só se resume a prazer, com que rapidez não se perderia?

3. Alegria não é otimismo ingênuo. O otimista é aquele que age pautado na crença de que o amanhã sempre será melhor que o hoje. Mas, e se não for melhor? Bem, se não for, e a alegria for apenas otimismo, então, ela não escoaria outra vez pelo ralo?

4. Alegria não é ausência de tristeza. Tomo emprestada de Henri Nouwen essa expressão. Ora, se tristeza óbvia da condição humana é apenas produto de tristeza e só produz mais tristeza, então estamos fadados a ser um bando de melancólicos desconsolados. Prefiro pensar, porque assim permite meu olhar para a realidade e para as Escrituras, que alegrias e tristezas se misturam nessa dança da vida, de modo que só há sentido para uma na presença da outra. Só experimentamos a profundidade do que é a alegria de Cristo, quando nos deparamos com a tristeza, bem como só sabemos que a tristeza é tristeza porque um dia tivemos um relance, pelo menos, do que seja a alegria. Logo, elas deixam de ser pólos que se repelem e assumem o lugar de irmãs de jornada.

A alegria é um aprendizado. Essa é a deixa de Paulo. “Aprendi a viver contente”, ele diz. E em toda e qualquer situação, inclusive de tristeza mais profunda. Os caminhos do aprendizado são sempre mais difíceis. Ensinam-nos que na vida transitamos por diferentes situações, de tristeza e alegria, pranto e riso, fracasso e vitória, perda e ganho, e nem sempre de forma sucessiva, mas também simultânea.

E a alegria de Cristo, cf. Paulo, não é um produto de fórmulas instantâneas – tal como: “pense positivo, e tudo dará certo”. Pelo contrário, ela nasce da compreensão de que tudo podemos suportar amparados na força que Deus supre – “tudo posso naquele que me fortalece”. É possível que até não estejamos lá muito contentes com a circunstância vivenciada, que pode ser a de um desejo não realizado, uma perda, frustração, fracasso, depressão, etc. Contudo, podemos esperar e nos alegrar em Deus, que nos acompanha e nos ajuda a passar pelo processo, de todas essas situações e muitas outras quem sabe, sem perder a alegria Nele, uma alegria mais profunda e enraizada, que transcende o mero sorriso; isto, pois é fruto da esperança que brota do coração, que até pode se encharcar com um riso, mas se aformoseia mesmo e é semeado com as lágrimas.

 Como diz o autor de Eclesiastes: "Melhor é a mágoa do que o riso, porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração" (Ec 7.3).

Jonathan

quarta-feira, 19 de março de 2008

Não quero ser feliz

Desisto, não quero mais ser feliz. Procurei a felicidade como um caçador de borboletas. Armado de redes e binóculos, percorri florestas e cavernas buscando prender minha libélula, mas acabei frustrado: ela sempre voava para mais longe de mim. Desisto, não quero mais ser feliz. Agora, vou contentar-me em perseguir a justiça. Tocarei minha vida advogando o direito dos meninos de jogarem pedras em mangueiras e de nadarem em lagoas. Conformado com minha sorte, protegerei as meninas que brincam de pular corda; elas nunca deveriam precisar ganhar dinheiro para alimentar a família.

Desisto, não quero mais ser feliz. Vou escancarar as portas do meu coração para a dor de mães que choram por seus filhos drogados; não evitarei os esquálidos que morrem de Aids; não virarei meu rosto para velhinhos que pedem esmolas nos sinais de trânsito. Não desejo continuar cavando os fossos que me isolam em meu castelo de desejos. Desisto, não quero mais ser feliz. Não perseguirei a amizade de gente famosa que, por tanto tempo, acreditei capaz de me fazer sentir importante. Resignado, procurarei novos amigos. Aceitarei andar ao lado dos simples, e de conviver com os humildes. Quero aprender a conversar despretensiosamente.

Desisto, não quero mais ser feliz. Abrirei mão de meus grandes projetos. Lutei para conquistar objetivos irrealizáveis. Imaginei que minhas metas se tornariam fontes de alegrias infinitas. Resignado, desejo viver cada vão momento como sagrado. Transformarei meu almoço numa liturgia; celebrarei meus encontros solenemente; e cantarei minhas músicas prediletas como hinos de agradecimento à vida. Desisto, não quero mais ser feliz. Cansei de defender minha honra, reputação e posicionamentos – todos, políticos, espirituais e filosóficos. Abdico de estar certo. De agora em diante, confessarei abertamente minhas incertezas. Não rolarei na cama, insone com a opinião de pessoas que desconheço; não retrucarei, quando me sentir atingido. Estou disposto a aprender o significado daquela declaração divina: “quem quiser ganhar sua vida a perderá e quem perder sua vida a ganhará”.

Desisto, não quero mais ser feliz. Não tentarei segurar o amor de quem amo. Deixarei que cada um acerte seu caminho; arriscarei viver com gratuidade. Preciso acreditar que ninguém me deve coisa alguma. Vou aventurar-me fazer o bem, e não cobrar nada em troca. Já que desisti de ser feliz, resta-me seguir por esses caminhos incertos. Prometo avisar se algum dia a felicidade pousar em meu ombro.

Ricardo Gondim

terça-feira, 18 de março de 2008

Alegria: coisa pra poucos!

Volta e meia ouvimos na igreja que a alegria deve ser a marca distintiva do crente. Mas muitas vezes isso se torna algo do tipo “kit-viagem para o país das maravilhas com Alice e o coelhinho”, ou quem sabe não seria uma espécie de “selo de qualidade cristã”: se você tem, tudo bem, mas se não tem, algo deve estar errado com sua fé. Quantas e quantas vezes cheguei até a me culpar por ser induzido a pensar desse modo nada realístico com que a igreja trata de alegria e felicidade hoje, nada diferindo inclusive da alegria ópio que o mundo pós-moderno tem proposto, do sorriso estampado no rosto, pensamento positivo, muito dinheiro no bolso e “saúde pra dar e vender”.

O culto evangélico, de modo geral, tem refletido fielmente essa realidade. Temos cultos para todos os gostos e tamanhos, afinal a demanda do mercado de “bens simbólicos” (que inclui os crentes) exige que as denominações se adequem à lógica do “quem dá mais leva” para não perder os seus para a “concorrência”. O individualismo de nossos cânticos tem desviado nossos olhares da realidade e da missão, transferindo-nos do mundo terrestre para o mundo celeste. Falam de uma alegria “energética”, como uma total ausência de angústias, dores e sofrimentos, e uma constante presença de paz interior e felicidade. Se não for assim, não pode ser a alegria de Cristo, como diz uma célebre frase que por aí tem sido disseminada: “Não estou em crise, estou em Cristo”. Para essa gente, somente todas as coisasa boas são as que cooperam para o bem dos que amam a Deus.

Não preciso contra-argumentar muito pra dizer que isso, apesar de muito comum, é uma tola subversão do Caminho de Jesus e de toda a bíblia. A oração do profeta Habacuque apresenta o que para mim é a idéia de Deus sobre a alegria: “Porque ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; ainda que decepcione o produto da oliveira, e os campos não produzam mantimento; ainda que as ovelhas da malhada sejam arrebatadas, e nos currais não haja gado; Todavia eu me alegrarei no SENHOR; exultarei no Deus da minha salvação” (Hc. 3:17-18). Observe que Habacuque não está aqui dando origem a nenhuma filosofia de confissão positiva, nem está dizendo seguramente coisa alguma a respeito do futuro, algo do tipo: “eu determino que a figueira vai florescer” ou “tenho certeza que Deus não vai deixar faltar”, e só por isso me alegro no Deus que me salvou. Não. Ele está dizendo que mesmo que as coisas piorem ainda mais, mesmo assim ele poderá se alegrar no seu Senhor.

Sem dúvida Habacuque seria um profeta impopular em nossos dias. Porque, em outras palavras, ele vem dizer que a alegria do Senhor não veio abolir a consternação, a dor ou as agonias da vida. Deus não nos ensina que para sermos felizes temos que suprimir a realidade, mas sim encará-la de frente, com coragem, confiança e a força que Ele supre. Os momentos de paz e alegria devem transcender as circunstancias, mostrando a soberania e a graça de Deus. E quem poderá acusar os filhos de Deus? Afinal, não é Deus quem os justifica? (Rm.8:33). Dir-se-á então que se eu passo por crises eu não tenho Cristo? Pura enganação, leitores, puro engodo espiritualista! Eu tenho crise sim, e são exatamente essas crises que me aproximam mais de Cristo, o Senhor Total da minha existência e razão primeira da minha alegria. A Ele seja a Glória!

Jonathan

segunda-feira, 17 de março de 2008

Alegres tristezas de ser feliz

Quero, essa semana, trazer algumas perspectivas sobre felicidade e alegria, tristeza e dor, no mundo atual...

Felicidade: atributo de quem é feliz ou “bem-aventurado”. Qual maneira uma expressão tão simples de vida pode ser tão complexa, quando em conjugação com o que constantemente a ela acrescentamos? Tantos benefícios, tantas vitórias, ganhos, riquezas, posses, cargos de alto escalão, poder, dinheiro, sucesso... Para quê? O que há de felicidade nisso? O atual “estado” das coisas nada nos pode trazer senão uma “felicidade-engano”, ou o engano de que se é feliz. Quem são os verdadeiros felizardos desta vida? Segundo Jesus, no Sermão do Monte, felizes são: os humildes de espírito, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os limpos de coração, os pacificadores, os perseguidos por causa da justiça. Estes são felizes, porque sua felicidade depende de um só fator para existir: Deus.

Ora, o que mais poderiam ter os mansos e os humildes de espírito, a não ser a mansidão que vem do Espírito de Deus e a certeza da pertença ao seu reino? Que mais teriam os que choram e os pacificadores, além do consolo que vem do Pai e a prerrogativa de serem chamados seus filhos? O que poderiam almejar os misericordiosos e os que têm fome e sede de justiça, além da certeza de que, em Deus, serão fartos e alcançarão misericórdia sempiterna? Sua “felicidade” brota da certeza de que a verdadeira recompensa vem única e exclusivamente de Deus. E não há nada que possa contemplar ou substituir isso.

Ser feliz, na ótica do Reino de Deus, significa viver num paradoxo entre “tristezas alegres e alegrias lacrimejantes”. As pessoas que conhecem a alegria do Senhor, não rejeitam o sofrimento ou as tristezas, apenas escolhem não viver continuamente neles. Paulo disse: “aprendi a viver contente em toda e qualquer situação” (Fp. 4:11). Outrossim, em nosso mundo, costumeiramente dividimos as coisas: sofrimento é entendido como “ausência de alegria”, e alegria quer dizer “ausência de sofrimento”. Henri J. Nouwen afirma que tais distinções, em Deus, são inexistentes. A alegria Divina não elimina o Divino pesar. “Jesus, o filho de Deus, é o homem das dores, mas também é o homem da total alegria”.

Jonathan

sábado, 15 de março de 2008

A última palavra sobre oração

“Quando ele abriu o sétimo selo, houve silêncio nos céus cerca de meia hora. (...) E da mão do anjo subiu diante de Deus a fumaça do incenso com as orações dos santos”.
(Apocalipse 8.1-5)


Vivemos em um mundo barulhento. Gritam conosco, somos incitados, convocados. Todo mundo tem uma mensagem urgente para nós. O barulho nos cerca: telefone, rádio, televisão, aparelho de som. As mensagens são amplificadas a um nível ensurdecedor. O mundo é uma multidão, onde todos falam ao mesmo tempo e ninguém se dispõe, nem é capaz, de ouvir. Mas Deus ouve. Ele não se limita a falar; também escuta. Isso é maravilha ainda maior do que Ele falar. Raramente alguém ouve com atenção toda a mensagem. Poucas vezes vemos alguém entender o que gaguejamos, decifrar nossa fala desajeitada, elucidar, ajeitar e ouvir nossa sintaxe confusa – atenção a cada sílaba, compreensão de cada nuança.
Alguém leva nossa mente e nossos sentimentos a sério. Quando isso acontece percebemos a importância imensa do que falamos e sentimos. Adquirimos dignidade. Só saberemos se pensarmos e falarmos bem, se encontrarmos alguém que nos ouça. (...) A fala verdadeira se torna possível quando alguém ouve de verdade. As palavras de nada valem se não houver quem as ouça. Silêncio no céu por cerca de meia hora: Deus está ouvindo. Tudo que falamos, cada gemido, murmúrio, tentativa de oração: Ele ouve tudo. Todo o céu se aquieta. As vozes elevadas dos anjos, as mensagens penetrantes das trombetas, os cânticos retumbantes do trono, tudo fica quieto enquanto Deus ouve. As orações dos fiéis devem ser ouvidas: os aleluias espontâneos, os améns solenes, os “Por que me desamparastes?” desesperados, os “Afasta de mim este cálice” agonizantes, os “Pai nosso que estás nos céus” confiantes, os “Tu, Senhor e Deus nosso, és digno de receber a glória, a honra e o poder, porque criaste todas as coisas, e por tua vontade elas existem e foram criadas” cheios de alegria.
Ouvem-se agora, de forma pessoal, cuidadosa e precisa, todos os salmos, ditos e cantados por todos os séculos, em vozes altas, suaves, iradas ou serenas. Deus silencia anciãos e anjos. Nenhuma de nossas palavras se perderá em um turbilhão de fofocas nem se afogará na catarata formada pelos barulhos deste mundo. “A característica distintiva da oração dos primeiros cristãos é a certeza de ser ouvido”. Percebemos que temos dignidade. Mudanças dramáticas ocorrem nesse período de silêncio. O mundo se coloca na perspectiva correta. Percebemos a realidade do ponto favorável da obra de salvação de Deus, e não mais no meio do pântano da desordem desesperadora. Adquirimos esperança.

Eugene Peterson
Extraído do livro Trovão Inverso: Apocalipse e oração imaginativa (Habacuc, 2004).


Minha oração

Querido Senhor, minhas orações muitas vezes são resultado de uma batalha travada em meu interior: contra meus sentimentos confusos, contra os ruídos exteriores que se reproduzem dentro de mim, contra a voz de meu adversário murmurando que minhas palavras terminam no vazio, e contra minha própria indisposição em abrir minha vida, desde os recônditos mais obscuros de minha alma, até às feridas mais expostas e visíveis. Mas tu, Senhor, recebe tudo isto com os ouvidos atentos, com o carinho, cuidado e compreensão de um Pai ou uma mãe que recebe seus filhos depois de uma noitada daquelas na rua. Obrigado Senhor, minha gratidão é grande por saber que tenho alguém que realmente me conhece, ama e cuida. Restaura minha confiança e ti ó Deus, e a alegria da salvação todos os dias. Desse teu filho pródigo, a quem muito tens amado. Amém!

Jonathan

quinta-feira, 13 de março de 2008

O que fazer quando me sinto distante? (II)

Tornai-vos praticantes da palavra e não somente ouvintes...” (Tg 1.22).

Ao mesmo tempo em que a graça de Deus vem nos acolher em nossas fraquezas e superabundar frente à multidão de nossos pecados, ela também pressupõe compromisso de vida com o Deus da Palavra, que nos justifica, mas igualmente nos corrige, como uma faca de dois gumes. Muitas vezes, contemplamos e vemos nossos corações encharcados de uma angustia que nos tira o sono, que pode minar a incompreensível paz do Espírito, mas que também nos faz acordar para o fato de que, se chegamos nesse ponto, é porque nos afastamos da comunhão com Deus em algum momento ou circunstância de nossas vidas, seja pela apatia (o “mal do século” da Igreja), indiferença ou outro pecado.
Essa angústia na alma e uma incômoda sensação de desajuste, e até uma certa culpabilidade, podem ser sintomas do, ainda que breve e circunstancial, distanciamento. As inúmeras distrações e “cuidados” da vida parecem ter outra vez sufocado nossa paixão por Jesus Cristo. E o que fazer quando isso acontece? Seria simplista demais se dissesse que basta orar e ler mais a Bíblia que tudo se resolve. Por outro lado, seria um crime negligenciar a importância e o poder de transformação que há nestes dois itens básicos de uma vida cristã saudável e produtiva. Necessitamos, outra vez, do equilíbrio para enfocar a espiritualidade e a vida de uma maneira integral, como Deus vê.
Quão custoso se torna o caminho de saída desse labirinto espiritual e existencial em que entramos quando percebemos que nos afastamos de um relacionamento vivo com o Senhor – e veja que eu digo “nos afastamos”, e não que Deus esteja longe ou não mais presente. Nesses instantes em que a voz do Espírito, que antes tanto “incomodava”, se torna cada vez mais indistinguível de outras vozes, como ecos a quilômetros de distância, vemo-nos mais próximos da enganação de nos mantermos apenas como ouvintes passivos da Palavra. Todavia, a Palavra viva nos impele à ação – “tornai-vos praticantes” – o que significa considerar de novo o que temos feito, a quantas temos andado, e retornar ao caminho de escuta e vivência, pela graça, das palavras de Deus.
O Senhor nos corrige apenas porque nos ama – “Eu disciplino a quem amo”, Ele diz. Pode nos envergar, mas nunca nos quebra; nos provar, mas nunca desamparar. Tudo isso me leva a concluir que podemos, sim, nos distanciar por um pouco, de uma relação viva com o Senhor, mas nunca o bastante para que jamais o encontremos outra vez ou para que nos deixe de amar. Nada poderá nos separar do amor de Deus! Que doce mistério! A Deus seja a glória!

Jonathan

quarta-feira, 12 de março de 2008

O que fazer quando me sinto distante? (I)

Eu disse na minha pressa: estou excluído da tua presença” (Sl 31.22).


Tenho a sensação de que quanto mais milhas acumulamos na caminhada da fé, maior se torna a pretensão de que estamos muito próximos ou íntimos de Deus, de querer parecer melhores que outras pessoas “pagãs. Ora, alguém pode questionar: Sendo nosso alvo Jesus Cristo, o progresso, o crescimento e uma maior intimidade com ele não são conseqüência? Tenho a convicção que sim. Todavia, sob o signo desse suposto progresso espiritual, corremos o risco de fazer com que a linha de chegada pareça mais próxima do que realmente está. Em outras palavras, um mínimo sinal de progresso pode se tornar pretexto à estagnação, ao conformismo, de achar que já somos e sabemos o suficiente na vida cristã, de que o mal não mais nos atinge e de que “estamos a dois passos do paraíso”.

O resultado são crentes que passam anos a fio na igreja, de domingo a domingo, uma atividade religiosa após a outra, sem passar pela verdadeira transformação do Evangelho e sem viver em novidade de vida. Um pouco de honestidade e realismo, porém, nos ajudaria a pôr os pés no chão e atentar para o fato de que ainda somos humanos e a vida é um pouco mais complicada porque somos seres contraditórios, sujeitos a errar, e muito. A minha percepção é que quanto mais meu senso de justiça e bondade próprias me levam a pensar que estou muito perto da vontade de Deus, mais, na realidade, continuo me afastando dela. Na Bíblia existem diferentes paralelos que comprovam isso. Um exemplo está na parábola do fariseu e do publicano (Lc 18.9-14). Jesus utiliza-se desses dois personagens para dizer que a justiça vem de Deus; assim, “todo o que se exalta será humilhado; mas o que se humilha será exaltado”.

Então, o que fazer quando em cada um de nós se aguça, como no salmista, esse sentimento de exclusão, abandono e distância da presença do Senhor? Começo a perceber que a súplica desesperada acompanha constatações sinceras de pecadores, cuja consciência da presença de Deus permanece viva, apesar de todo o seu pecado. “Não obstante, ouviste a minha voz quando clamei por teu socorro”. Esse é o contraponto do salmista ao seu estado de ânimo inicial. O amor e a graça de Deus não permitem a exclusão total de um pecador consciente da presença santa deste Deus, nosso consolo e esperança na angústia. Deus seja louvado, hoje e sempre, por sua misericórdia.

Jonathan

terça-feira, 11 de março de 2008

Rumo a uma vida sem julgamentos

Uma das questões espirituais mais difíceis é a de viver sem preconceitos. Algumas vezes não temos nem consciência do quão profundamente enraizados são nossos preconceitos. Podemos até pensar que nos relacionamos de igual pra igual com pessoas que são diferentes de nós em cor, religião, orientação sexual, ou estilo de vida; mas, em circunstâncias concretas, nossos pensamentos espontâneos, palavras sem censura, e reações de bate-pronto frequentemente revelam que nossos preconceitos continuam lá.

Estranhos, pessoas diferentes de nós são colocadas em desconforto, suspeita e hostilidade. Elas nos fazem perder nosso senso de segurança apenas sendo “outras”. Apenas quando reivindicarmos inteiramente o fato de que Deus nos ama de uma forma incondicional e passarmos a olhar para “esses outros” como igualmente amados, poderemos começar a descobrir que a grande variedade de ser humano é uma expressão da imensa riqueza do coração de Deus. Então a necessidade de pré-julgar as pessoas poderá desaparecer gradualmente...
Livres de julgamento, livres para a misericórdia...

Gastamos uma grande parte de nosso tempo e energia fazendo nossas cabeças sobre outras pessoas. Nenhum dia passa sem que uma pessoa faça ou diga alguma coisa que evoque em nós a necessidade de emitir alguma opinião sobre ele ou ela. Nós ouvimos, vemos e conhecemos muitas coisas. O sentimento de que temos de classificá-los em nossas mentes e emitir julgamentos pode ser um tanto quanto opressivo.

Os pais do deserto disseram que julgar outras pessoas é um fardo pesado... Uma vez que deixamos de lado nossa necessidade de julgar o próximo, experimentaremos uma imensa e profunda liberdade. Uma vez livres do julgamento, estaremos também livres para a misericórdia. Lembremos das palavras de Jesus: “Não julgueis e não sereis julgados” (Mateus 7.1).

Henri Nouwen
From Daily Meditation
By Henri Nouwen Society (http://www.henrinouwen.org/)
Tradução: Jonathan Menezes

segunda-feira, 10 de março de 2008

Ideal cristão: exclusividade ou inclusividade?

Defendo não só a exclusividade de Cristo como Senhor (o que não significa defender necessariamente todas as formas de cristianismo ou igreja), mas também que o movimento que ele fundou é para minorias, e não para multidões. As minorias serão o fiel remanescente, que compreende e busca viver a mensagem em sua integralidade, não se deixando guiar por qualquer "vento de doutrina" ou pela corrente mais atraente do momento ou que esteja de acordo com a moda. O Evangelho é universal e é para todos. Mas, por enquanto, apenas algumas minorias na história compreenderam que ser universal não significa ser arbitrário, violento ou autoritário.

Exclusivismo, sim, mas um exclusivismo inclusivo. Como pode ser isso? Aqueles que não estão conosco estarão, necessariamente, contra a gente? Não, apenas estarão na sua - essa é uma máxima da pós-modernidade, embora os fundamentalismos religiosos estão aí pra mostrar que a intolerância ainda está presente nos círculos religiosos. Agimos com exclusivismo não somente na afirmação da doutrina, do dogma ou de uma confessionalidade; mas quando optamos pelas escolhas radicais de Deus: o amor, a justiça, a alegria, a paz, ao humano, sempre ao humano. Essa é a maior confissão de todas. Exclusos estarão naturalmente aqueles que optarem pelo contrário. A comunidade de Jesus é perseguida pelo mundo por seu exclusivismo de viver intensamente o amor a Jesus Cristo e, como corolário, ao mundo pelo qual Ele morreu. É perseguida também pelas atrocidades cometidas por cristãos. Mas isso é uma outra história. Essa é uma perseguição mais do que óbvia. A graça comum faz com que outras pessoas optem pelo bem e pela justiça e se indignem contra a violação dos direitos mais básicos do ser, a vida, a liberdade, a justiça, etc.

A opção dos "outros" pelo "ideal do eu" deve nascer de uma sincera convicção de que tal ideal só é "ideal" enquanto remete, para além do "eu", para a vida abundante a qual Jesus prometeu, Nele. E nisso, não tem nada de proselitismo, mas é a vocação da igreja. Isso se, e somente se, ela entender que evangelizar não significa empunhar uma bandeira ou uma "espada" em busca da "conquista" do outro para seu ideal, mas do encontro e diálogo com o outro, em amor e respeito, ambos em busca desse ideal. "É um mendigo ensinando a outro onde encontrar pão", diria Orlando Costas. Também não posso, antes de tudo, submeter um ideal ao outro se minha vida não é a expressão cabal desse ideal. Do contrário, cai-se no descrédito. Um ideal sempre passa pelo crivo do eu. Mas nunca deve se submeter totalmente a ele, pois assim fazendo passaria longe de um ideal de Deus. Como saber se esse meu ideal é um ideal de Deus, e não uma simples elucubração da mente humana? A Palavra. Não conheço outra forma, outro norte. Que Ele nos ilumine nela e através dela.
Jonathan

sábado, 8 de março de 2008

Sexo, Alpha Dog e a Cidade Secular

Há uma estreita relação entre sexo e secularização. Entende-se “secularização” como o processo de emancipação do homem e do mundo do controle religioso ou semi-religioso que os jugulava. Os seres humanos da cidade secular aos poucos foram não se permitindo mais serem regidos por leis ou mitos sagrados, mas governam a si próprios, criando para si outros “mitos”, como o da autonomia, da liberdade, do consumo e do prazer. E o sexo torna-se um parceiro mais que natural nessa busca, como meio de auto-realização, poder, satisfação, auto-engano. De modo que o ser outra vez encontra-se sendo dirigido por uma espécie mais perniciosa de governo, a autocracia ou “governo do eu” – sendo este seduzido pela ditadura do gosto e do estético.
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Como afirma Harvey Cox em sua obra The Secular City, “a erosão dos valores tradicionais e o desaparecimento das modalidades aceitas de comportamento deixam os homens contemporâneos livres, mas um tanto sem direção”. A realidade retratada no filme Alpha Dog (2007) pode ser vista como um protótipo da vida a que se entrega boa parte dos jovens na cidade secular atualmente. Festas, tráfico e consumo de drogas, violência, sexo fácil, ‘livre’ e desimpedido, marcas típicas desse grande simulacro chamado universo urbano jovem.
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Essa é uma geração já posterior à geração que rompeu com os tabus da sociedade tradicional e religiosa. Entre eles estão os tabus sexuais. Segundo Cox, “nenhum aspecto da vida se agita com tantos demônios não exorcizados como o sexo”. E, numa sociedade onde o sexo tem sido explorado como nunca por todos os meios, em especial os de comunicação, “a subcultura jovem vem a ser o proletariado psicológico. É quem paga o pato de nossa hipocrisia”. Frente a tais realidades, tenho perguntas que não querem calar: até quando viveremos nessa dissimulação “evangélica” de que nada disso afeta ou diz respeito a “nossos” jovens? Até quando reproduziremos os mesmos discursos, tabus e ditos “absolutos”, que nada têm de biblicamente válidos, divinos ou saudáveis?
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Quando enxergo e penso nessa gritante realidade do jovem na cidade secular, e me deparo, em contrapartida, com a ausência de propostas inteligentes, honestas e, sobretudo, relevantes sobre o tema da sexualidade por parte dos cristãos, aliada a uma ligeira obsessão e certo medo de falar abertamente a respeito, francamente falando, batem um desânimo e uma vontade de deixar de lado toda essa ‘besteira’. Então, me lembro que Jesus não quis fundar uma nova religião, nem instituiu muitas das “leis” e costumes que devotamente se seguem até hoje, e isso me dá esperança – nem tudo está perdido. Faço minhas as palavras de Harvey Cox, uma novo-antiga e grata descoberta pra mim nesses dias:
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Talvez um dia superemos nossa ridícula obsessão com o sexo, da qual nossa idéia fixa sobre castidade e virgindade é apenas outra face da moeda. Até chegarmos lá, deveríamos, contudo, nos alegrar pelo fato de que em Jesus Cristo somos libertados do mito e da lei”.
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Jonathan

quarta-feira, 5 de março de 2008

Santidade e Sexualidade

Reconhece-se que as comunidades cristãs brasileiras não são exatamente um primor de sanidade mental. Que o digam os clínicos e as clínicas. Estamos bem distantes do ideal da Igreja como comunidade terapêutica, tão preconizado por teólogos do nosso século. São problemas diversos, em geral resultantes de uma educação familiar e eclesial censora e deformadora, quando a desinformação ou a informação inadequada (e vivência idem) resultam em manifestações patológicas de variadas formas. Patologias que realimentam e são realimentadas por aqueles grupos sociais, se reproduzem nas novas gerações ou nos novos convertidos, desservindo a causa do Evangelho e atestando negativamente "o novo homem em Cristo".

Reconhece-se que as comunidades cristãs brasileiras não são exatamente um primor de sanidade mental. Que o digam os clínicos e as clínicas. Estamos bem distantes do ideal da Igreja como comunidade terapêutica, tão preconizado por teólogos do nosso século. São problemas diversos, em geral resultantes de uma educação familiar e eclesial censora e deformadora, quando a desinformação ou a informação inadequada (e vivência idem) resultam em manifestações patológicas de variadas formas. Patologias que realimentam e são realimentadas por aqueles grupos sociais, se reproduzem nas novas gerações ou nos novos convertidos, desservindo a causa do Evangelho e atestando negativamente "o novo homem em Cristo".

Apesar da importância dessa dimensão do ser humano, costumes, preconceitos e instituições jogam um imenso papel em sua negação ou minimização, tanto ao nível teórico como na prática cotidiana. Como construir pessoas sem a liberdade e o seu preço? Como ser Igreja sem o medo da liberdade? Como ser sadio sem integrar a sexualidade? Cristo salva e o Espírito santifica? Sim. A Igreja deve ensinar todo o conselho de Deus? Sim. A Igreja deve padronizar, detalhar e uniformizar a vida dos cristãos? Não. Deus nos fez para a felicidade ou para a infelicidade? A Igreja apóia a busca da felicidade ou concorre para a infelicidade?

Não há compromisso com o Evangelho sem compromisso com a sanidade. Só o "adversário" se alegra com a insanidade. Não há sanidade excluindo-se a sexualidade. Poderão os cristãos construir comunidades terapêuticas, comunidades de amor, comunidades da construção do ser, de aceitação, apoio e promoção, enquanto a Palavra e o Espírito fazem a sua obra? Comunidades centradas n’Aquele que chama a si todos os cansados e oprimidos para encontrar descanso, pois seu jugo é suave e seu fardo é leve? Estarão os cristãos prontos para reconhecer que depois da salvação, como defende um psicanalista, "O cerne da felicidade da vida é a felicidade sexual"?

Robinson Cavalcanti
Trechos de: "Libertação e Sexualidade" (Temática publicações, 1990).
*Ilustração: Jasiel Botelho

Robinson Cavalcanti e os evangélicos

Eis, mais uma contribuição de Robinson Cavalcanti sobre o tema da sexualidade. Trata-se de um trecho do livro "Libertação e Sexualidade" (São Paulo, Temática Publicações, 1990). Apesar de ter sido escrito há um pouco mais de duas décadas, ainda é, em minha opinião, um dos únicos (senão o único) livros publicados em português que trata a questão de maneira aberta, ousada, bem fundamentada e, o que é melhor, sumariamente humana. Num artigo publicado em sua coluna na Ultimato em 2003, ele comentou sobre a reação ao livro e o tratamento do tema entre os protestantes:

"Nessa área, o protestantismo brasileiro, no geral, fez uma opção por uma pretensa “reta doutrina” (dogmatismo), que é um conjunto ideológico estático, em que entram claros princípios bíblicos misturados com visões culturais e de classe, fortemente influenciada pelo “cinturão da Bíblia” (“Bible belt”) norte-americano" (Ultimato, Edição 285, Novembro-Dezembro 2003).

Há uma patente resistência ao nome de Robinson em alguns círculos, não só pelas posturas que adotou no passado e as trincheiras que assumiu na coisas que escreveu, mas também pelas polêmicas envolvendo sua pessoa no presente, especialmente em sua relação com a Igreja Anglicana e as posturas que tem assumido frente a questão do homossexualismo. Há quem ache que seus posicionamentos atuais são uma negação do que ele havia escrito no passado. Ele mesmo, penso, jamais admitiria tal incoerência - o que particularmente não concordo, visto que o ser humano, queira ou não, é um paradoxo - e um exemplo disso está no artigo que escreveu em resposta ao professor, também anglicano, Eduardo B. Calvani, sob o título: Coerência evangélica na terra do frevo. Sua frase inicial: “Ao contrário de certas lideranças da República, não esqueçam o que escrevi”. O título do artigo escrito por Calvani, por sua vez, é : Deus e o Diabo na terra do frevo - o maniqueísmo retórico de Dom Robinson Cavalcanti.

Apesar de tudo, ainda penso que o pensamento de Robinson ainda é um das poucas iniciativas que fazem jus a uma teologia da sexualidade bíblica e saudável, frente a um protestantismo de "reta doutrina", estéril e irrelevante. Faço minhas as palavras desse autor abaixo colocadas:
"Essa “reta doutrina” é um tabu, de escassas implicações pastorais para a vida e os dramas de milhões de pessoas. O resultado é uma alienação entre o dogma, por um lado, e uma “clandestinidade erótica” dos cristãos, por outro, com previsíveis danos espirituais, éticos e emocionais. O neofundamentalismo e o liberalismo têm sido (até aqui) mais fortes. Paciência. Um dia a igreja evangélica brasileira terá a coragem e a sinceridade de enfrentar essa temática de forma desarmada e não-emocional".

Jonathan

terça-feira, 4 de março de 2008

Sexualidade: o prazer que liberta

A sexualidade continua a ser o último tabu do cristianismo. Nada do que é humano nos deveria ser estranho (Terêncio). Os cristãos continuam a estranhar a natureza, ou, na visão de Rubem Alves, não querem ouvir “as vozes do corpo”. Nunca a civilização teve ao seu dispor tanta informação sobre o tema, mas não se avança porque não se lança mão desse material ou porque a apreensão se dá apenas no plano cognitivo e não existencial. A questão parece ser menos de conhecimento e mais de atitude. No Brasil, os evangélicos conservadores se dividem em dois grupos: a) os que nunca tocam no assunto e vivem a realidade empírica e a repressão; e b) os que patrocinam a divulgação de um só ponto de vista – o moralismo pequeno-burguês de inspiração norte-americana – e censuram qualquer outra opinião.

A imaturidade e a insegurança não dão lugar ao pluralismo. O temor dos instintos e sentimentos conduz a normatização do erótico, a um legalismo irracional, anticientífico e patogênico. Evangélicos mais lúcidos se calam e se acomodam para melhor sobreviver. Outros reproduzem o discurso tradicional para garantir a carreira e a aceitação diante de um rígido e impiedoso controle social. Todos fiscalizam todos e se enquadram mutuamente. O processo é alimentado teologicamente pelas centrais do poder religioso conservador do Primeiro Mundo. Entre os protestantes liberais o quadro não é mais animador. Também teríamos dois grupos: a) o majoritário, constituído pelos que são “liberais” em tudo e “puritanos” quanto à sexualidade. Em quase nada se diferenciam de seus irmãos fundamentalistas. Liberais na cátedra e reacionários na vida; e b) o minoritário, formado pelos eternos vanguardistas, miméticos das vanguardas do Primeiro Mundo e que optam pela via mais fácil do relativismo.

Com relação à Teologia da Libertação, o reducionismo econômico e político impediram a reflexão e a práxis abrangente que incluísse a libertação do erótico, muito menos a percepção de Reich, em que o erótico libertador é o próprio veículo da libertação sadia, econômica, política e cultural. Nem Marcuse foi levado a sério. Honrosas exceções protestantes: Jaci Maraschin defende uma teologia do corpo; e Rubem Alves denuncia a semelhança reacionária entre o ascetismo religioso e o ascetismo político, que impedem um discurso sobre o prazer.

Robinson Cavalcanti

Se quiser ler o artigo na íntegra, acesse: http://ejesus.com.br/conteudo/4257/

segunda-feira, 3 de março de 2008

Religião e Sexualidade

Talvez um dos assuntos mais espinhosos que qualquer um possa tomar a peito em nossa sociedade e, quiçá em nossas igrejas, é o da sexualidade. Mesmo em tempos em que, na prática, as pessoas têm "avançado" consideravelmente nessa matéria, seja por via propagandista (novelas, filmes, internet, etc.), seja pelo simples fato de que poucas coisas têm tido a capacidade de refrear os ímpetos de nossos jovens hoje no campo da sexualidade - e aqui incluo a própria religião e suas "leizinhas" de reprimenda e escravização do eu - ainda nos encontramos retroagindo, especialmente quando se tenta utilizar a mente e inteligência que Deus nos deu para pensar e propor alternativas que não apenas sejam bíblica e teológicamente viáveis, como também relevantes a atuais, levando em consideração nosso contexto, e não apesar dele (como se ainda vivêssemos de e no passado).

Na últimas férias, enquanto lia "O Conceito de Angústia", de Sören Kierkegaard, escrito em 1844, deparei-me com uma simples e brilhante denúncia:

"Todo o problema da importância da sexualidade nos mais diversos domínios tem sido, até o presente, insuficientemente tratado e, sobretudo, raras vezes no tom justo. Produzir gracejos a este respeito não passa de uma arte bem miserável; fazer de censor, é demasiado fácil; extrair daqui sermões, passando por cima da dificuldade, não é menos doentio; mas falar sobre o problema de maneira verdadeiramente humana, eis o que constitui toda uma arte".

Nós, homens e mulheres, negros ou brancos, pobres ou ricos, religiosos ou não (embora esteja interessado em me reportar, nesse caso, principalmente aos evangélicos) precisamos urgentemente aprender essa arte da qual fala Kierkegaard. No momento, ainda estamos a quilômetros de distância disso... Mas quem sabe (e oxalá) o amanhã, apesar de todos nós, possa ser um novo dia (Chico Buarque). Luto e espero por esse novo dia, em que a liberdade de Deus possa de fato encontrar guarida em nosso ser, ainda imerso em extremismos de toda espécie.

Nos próximos posts, quero trazer algumas contribuições de autores que admiro sobre o tema da sexualidade. Continuem acompanhando, e vamos debater a respeito.

Jonathan