Ensina-me a fazer a tua vontade, pois tu és o meu Deus; que o teu bondoso Espírito me conduza por terreno plano (Salmos 143:10).
O que é a vontade de Deus? Como conhecê-la? O que fazer para cumpri-la? Esse é um mistério que tem permeado a vida de pessoas ao longo de milênios. O jeito com que se trata esse assunto é o que gostaria de refletir aqui.
Não há dúvida de que, ao lermos as Escrituras, encontramos o princípio de que viver bem, com temor e dignamente significa dispor a vida para andar conforme a vontade do Senhor. Converter-se a Cristo, em parte, também é isto: permitir que nossa vontade saia cada vez mais de cena, a fim de dar lugar a uma vontade maior e soberana: a de Deus. O ponto para mim, porém, é: se temos consciência, quando buscamos a vontade de Deus, do que envolve esse “andar conforme”.
O salmo (143) de Davi, humano, honesto e orgânico, servirá como ponto de partida aqui.
Antes de tudo, trata-se de uma oração, de uma súplica. Normalmente, nós suplicamos com mais força quando sofremos. E é o que está acontecendo com Davi. Diante dos muitos conflitos que enfrenta, apela para a justiça e fidelidade divinas [v. 3]. Mostra-se muito angustiado e com o coração aflito, “em pânico” [v. 4].
Costumo dizer que a angústia não pode ser desprezada, pois é uma das avenidas que nos conduzem aos braços de amor de Deus. Mas nem sempre conseguimos lidar com ela. Sentimos como se a angústia fosse um peso, uma ferida aberta, uma faca cravada no peito da gente. E muitas vezes ela tem a ver com frustração, com medo, com sentimento de rejeição e abandono, e com as incertezas.
Então, apressados pra sair dessa logo, suplicamos pra que Deus se apresse a nos responder, a dar um rumo definitivo. Mas descobrimos que na vida não há rumos definitivos – nem a morte, biblicamente falando, é um rumo definitivo.
E o mais duro golpe aos apressados é ter que lidar com as indefinições, incertezas e dúvidas que fazem parte da vida de qualquer pessoa comum. Dessa forma, a “vontade de Deus” vai se tornando a fórmula religiosa para expiar tudo o que é indesejável, como também para alimentar o que se deseja. Daí brota as distorções, tais como:
Prega-se que precisamos estar no “centro da vontade de Deus”...
Que cada detalhe da vida não pode fugir do plano de Deus para nós...
Que a vontade de Deus é isso, e não pode ser aquilo; se desastres acontecem, foi “da vontade de Deus”; se o avião não saiu do aeroporto, era propósito de Deus, porque certamente ele cairia; se perdi um emprego, foi Deus quem quis, pois estava preparando um ainda melhor pra mim, e por aí vai... Vontade privatizada!
A moça ora para que Deus envie o homem segundo a Sua vontade para ela casar – no mundo todo existe só um. Estatisticamente, ela terá que orar muito, mas muito!
Jovens aderem a movimentos de santidade que afirmam que “esperar” (pelo amor, pelo casamento, etc.) é “a vontade de Deus” pra vida deles...
Será que a gente não para pra pensar no Deus monstrengo e esquizofrênico que vamos desenhando com todo esse besteirol teológico? Nos efeitos disso aos “pequeninos”?
Então, só pra contrariar, eu resolvi criar outro movimento: o “Eu escolhi ir à luta”. É um movimento de gente crente e temente, sim, mas que tem consciência que “não adianta olhar para o céu com muita fé e pouca luta” (Gabriel O Pensador). Que quer estimular uma liberdade responsável, o risco da decisão, a busca da vontade divina pelo discernimento.
Essa é, para mim, a chave do Salmo 143: quando, do desespero, Davi pede que o Senhor o ajude quando tiver que escolher o caminho a se andar [v. 8]; quando roga para que o “ensine a fazer sua vontade” [v. 10]. A vontade é de Deus, mas a escolha é nossa. E Deus só pode ensinar sua vontade a quem quer aprender, quem se lança na aventura de aprender, pois é vivendo [errando e acertando, sofrendo e mudando] que se aprende...
Por isso discernir é preciso! O salmista [119:27] também ora: “Faze-me discernir o propósito dos teus preceitos, então meditarei nas tuas maravilhas”. Na tradução A mensagem: “Ajuda-me a entender estas coisas de dentro pra fora”. A Palavra Divina!
Portanto, posso concluir que a vontade de Deus não se mostra instantaneamente; a vontade de Deus se experimenta e se pondera, pela renovação da mente [Rm 12.2]. Como eu entendo a vontade de Deus? Como um mistério revelado que só se entende e se experimenta na medida em que se caminha e em que se vai à luta.
O que eu quero dizer se traduz perfeitamente na música do Teatro Mágico, que diz:
Milagres acontecem quando a gente vai à luta!
Minha proposta aqui é muito simples: vamos à luta sem medo do que vamos encontrar, se derrota ou vitória, se sucesso ou fracasso. Pois Deus tem cuidado e cuidará de nós por onde formos; se nos desviarmos e, de coração, quisermos mudar a rota, Ele mesmo nos ajudará a colocar de novo nosso vagão nos trilhos de sua vontade. Que haja esperança!
Jonathan
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