quarta-feira, 4 de abril de 2012

Diálogo sobre a frase de John Piper (I)


Jon,

Em geral, concordo com você. Piper é um típico representante da teologia WASP, mas acho que você atirou à queima-roupa, sem considerar o todo. De fato, a herança pietista deformada transformou a oração individual em panaceia para todos os males da alma – ela quase se tornou na própria Graça. Esse reducionismo deixa de fora a contemplação da natureza, a leitura orante das Escrituras e mais uma série de coisas boas que a tradição cristã nos legou nesses séculos. Sem falar que pode desembocar num peticionismo egoísta, em vez de comunhão contínua com Abba.

Acho que uma coisa implícita na frase de Piper, e que você não contemplou, é o aspecto intercessório da oração. É claro que isso não tem relação com quantidade de tempo, mas gerenciamento de tempo, em prol de outras pessoas, e angústia por causa do sofrimento alheio. Nesse sentido, concordo com ele. A distração pode me levar a ignorar a realidade do outro e, neste caso, a motivação para não orar não é diferente da motivação que você denunciou. Ambas desembocam no orgulho e na satisfação do eu. Essa é uma daquelas coisas que, segundo Kierkegaard, “quem diz que tem, não tem e quem acha que não tem, tem”.

A menos que estejamos dispostos a encarar as Escrituras como mera expressão da experiência religiosa do povo de Deus, sem nenhum rigor instrutivo para a espiritualidade, não podemos confundir a oração com a vivência do Evangelho – por mais nobre e mais necessário que isso seja – pois fazer isso seria simplificar o mistério da oração em detrimento dela mesma e da espiritualidade.

De minha parte, não aprecio Piper, não oro uma hora por dia, sempre me considero em débito para com a Graça divina e procuro viver o Evangelho, mais do que falar dele. Contudo, não consigo deixar de falar com Deus acerca do sofrimento e das lutas das pessoas ao meu redor.

Abraços.

Vanderlei Frari

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