No terceiro e último capítulo, Gondim faz uma pergunta de certo modo retórica, em virtude da argumentação apresentada anteriormente, tentando entender o porquê de “tamanha frustração” e inquietação dos evangelicais brasileiros em relação a seus irmãos do norte. Uma pergunta para qual ele, em seguida, ensaia uma resposta (tese do capítulo): “A Missão Integral simplesmente não conseguiu equacionar adequadamente a polarização da evangelização e da ação social” (p. 11).
De todos os capítulos, este me parece ser o mais focado e coerente com as interpretações (com as quais compartilho) dos fatos envolvendo o movimento de MI. O autor postula um “descompasso” entre as formas como os latino-americanos e os norte-americanos absorveram os impactos provocados por Lausanne, 1974. Enquanto os últimos insistiram em priorizar a proclamação verbal do Evangelho, os primeiros postularam o equilíbrio desta com a ação social. Como destaca o autor, “enquanto os evangelicais [referindo-se aos latino-americanos, acréscimo meu] insistiam na metáfora de duas asas necessárias para o pássaro voar, os anglo-saxões queriam ganhar ‘almas” (p. 112). Fica claro pela análise do autor, que a MI foi (e, apesar de tudo, continua sendo) um grande negócio mais “aqui” do que “acolá”, a partir de onde sua nave parece ter “decolado” pra valer.
O autor faz dois destaques críticos muito importantes e pouco trabalhados pelos analistas, a meu ver. O primeiro diz respeito ao que David Bosch chamou de “dicotomia básica” presente no Pacto de Lausanne entre os artigos 5 e 6. Enquanto no artigo 5 se afirma a inseparabilidade entre evangelização e ação social, no artigo 6 se afirma a “primazia” da evangelização dentro da tarefa missionária. Gondim faz uma interessante observação nesse tópico, de que na primeira tradução brasileira do Pacto de Lausanne, pela ABU Editora, em 1982, a palavra “primary” foi traduzida como “urgente” e não como “primária”, indicando primazia (p. 115).
Além dessa tentativa local de emenda, há outro fato, não mencionado pelo autor, que envolve a pessoa de John Stott, redator do Pacto. Ao se colocar na inglória tarefa de desatar tal imbróglio entre os artigos, John Stott, por um lado, defende que é “demoníaca” a tentativa de separar as duas coisas, para depois afirmar que, se fosse necessário optar, a evangelização seria primordial. Resta saber o porquê dessa tal necessidade. Isso mostra que, mesmo nos mais celebrados consensos, podem coexistir paradoxos e desequilíbrios.
O segundo destaque crítico se refere à análise, ainda pioneira devido à lacuna existente de reflexões a respeito, da relação entre a MI e a TL. O autor critica a MI por ter ficado “em cima do muro” ao tentar sustentar uma abordagem transformadora da realidade, associada, porém, com uma teologia conservadora. A razão, para ele, está no receio da MI de ficar marcada entre os evangélicos em geral como ecumênica e liberal, ou mesmo de ser identificada com as agendas da TL. O resultado é que “a Missão Integral oscila entre os pólos do proselitismo e do holismo” (p. 141), enquanto a discussão do que é prioritário ou não estaria bem resolvida na TL.
A falha nessa análise de Gondim, porém, está em (1) ocupar-se em desconstruir a MI, sem fazer o devido contrapeso crítico em relação à TL (tendemos mesmo a valorizar mais os “de fora”), e (2) em não apontar aproximações e distanciamentos entre MI e TL de forma mais rigorosa e clara, sem pender para lado algum. Afinal, ambas, como toda teologia, são insuficientes, possuem diferentes aportes, mas em algumas instâncias podem ser complementares.
(Continua...)
Jonathan
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