segunda-feira, 15 de março de 2010

Aprendendo a lidar com as incertezas (III)

Priscila, obrigado uma vez mais pelos comentários e pelas dicas, tentarei me lembrar delas todas as vezes que for me aventurar em narrativas.

Sobre seus comentários, meu objetivo está mesmo em ficar mais no campo da epistemologia (ciência do conhecimento) do que nas ciências exatas, que me parece ter sido o foco de seus comentários. Minhas críticas partem mais de meu próprio campo, que é o das ciências humanas, onde fazer ciência não é e nem pode ser "a busca por respostas exatas", visto que o humano tem muito pouco de exato. Todavia, concordo com você: não podemos abandonar certos alicerces e até mesmo "certezas", verdades, etc. Não sou defensor do relativismo e nem do absolutismo. Para mim, os extremos são sempre perigosos, pois me dão a sensação de que, cada vez que a eles me rendo, mais longe ainda em encontro do alvo. Parto apenas da admissão das incertezas presentes mesmo em nossas mais caras (e cuidadosamente investigadas) certezas, e de que isso é um fato inelutável ao ser humano.

Não penso que fazer ciência, mesmo as chamadas humanas, seja um “vale tudo” do tipo "o que estiver certo pra mim, estará certo, ainda que esteja errado". Porque assim deixa de ser ciência – que visa, obviamente, acertos, ainda que nem sempre “acerte”. O "erro" como você bem interpretou, é a lacuna. E disso não creio que poderemos fugir; ainda que a verdade seja meu foco, creio que nossa relação com ela é por aproximação, nunca por correspondência, e aqui obviamente não me refiro às “exatas” ou obviamente observáveis. Afinal, ninguém precisa dizer que está chovendo lá fora, quando eu olho pela janela e posso ver que está chovendo.

Contudo, grande parte da realidade a qual nos referimos – e aqui penso em termos mais da filosofia da ciência – não é transparente aos nossos olhos. Como diria Clément Rosset, a realidade resiste ao conhecimento, que por sua vez, até pode se remeter à realidade, mas inevitavelmente criando o duplo da realidade (que pode ser o duplo de si mesmo) e não a realidade em si. E como complementa Edgar Morin: "As idéias e teorias não refletem, mas traduzem a realidade, que podem traduzir de maneira errônea. Nossa realidade não é outra senão nossa idéia de realidade". E se, para alguns, isso pode parecer tragédia (ou mesmo relativismo), para mim é redenção, a idéia de que tenho de aprender a conviver com os mistérios da realidade que minha mente não pode desvendar por completo...

E se fôssemos pensar nas ciências que menos podem “errar”, como é o caso das ciências médicas, por exemplo, ainda assim ficamos sabendo de casos nevrálgicos e quebra-cabeças dificílimos de resolver, mesmo ao mais talentoso cientista, o que requer, muitas vezes, uma boa dose de conhecimento intuitivo – para entender o que estou dizendo, basta assistir a um episódio da serie “House” – isto é, um conhecimento que nem sempre pode dar a razão exata de seus procedimentos.

Afora, estão também os muitos erros médicos cometidos, seja por imprudência, descaso, falta de recursos ou mesmo por falta de explicações exatas, certeiras, para problemas da vida humana. Igualmente (falo, obviamente, como leigo-observador e não especialista), podem-se considerar as possibilidades de encontrar diferentes formas de tratamento para um mesmo problema (fruto de pontos de vista matizados), em que haverão aqueles que tratarão algumas dessas formas como mais ou menos eficazes que outras, enquanto outros poderão ver certas possibilidades como tão eficazes quanto outras, num princípio que leva em consideração a complexidade da vida humana e o valor da investigação particular de cada caso, que é um caso, sem considerar o todo.

Bem, pelo jeito sofro do mesmo “mal” que você, um mal necessário, quem sabe, que é o de falar tanto, ao querer explicar, e acabar falando mais para si mesmo – como forma de esclarecer seu pensamento. Enfim, o debate continua aberto, caso você ache necessário prosseguir. Afinal, somos todos aprendizes nas trilhas labirínticas do conhecimento...

Jonathan

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