Parecem-me bastante pertinentes algumas expressões e palavras que retratam a vida e espiritualidade cristã nas dimensões de uma luta. A espiritualidade integral é o sinônimo de um modo de vida espiritual que se encarna na realidade, tendo a aceitação consciente de que Cristo é o Salvador, comprometendo-se com a sua cruz, e dependendo inteiramente da ação do Espírito (Mt 16).
Nesse sentido, Davi foi um dos homens de Deus mais humanos sobre quem já li e ouvi falar. A bíblia o retrata como um protótipo de uma gente tão paradoxal como a gente é: coerente e obtuso, às vezes muito crente, outras meio incrédulo, solidário e egoísta, amável e execrável, alegre e triste ao mesmo tempo. Seus salmos simbolizam muito daquilo que somos no cotidiano, posto que apresentam orações e suplicas que vêm romper com um modelo “espiritual” desencarnado e angelical que tem se criado nos últimos tempos, do crente sem mácula, sem problemas, sem crise, sem dúvidas e, se brincar, até sem pecados.
A oração de Davi, presente no Salmo 13, expressa sua mais legítima humanidade. “Até quando Senhor?” (v.1-3), interroga ele expressando sua aberta indignação diante da circunstância em que se encontrava. Do lamento brota a súplica: “Atenta para mim, responde-me, Senhor, Deus meu!” (v.3-4). Por fim, de queixoso e suplicante, Davi demonstra-se confiante e grato: “No tocante a mim, confio na tua Graça (...) Cantarei ao Senhor, porquanto me tem feito muito bem” (v.5-6). Davi foi uma amostra viva de que Deus se agrada daqueles que, de coração, falam a verdade e vivem com integridade, muito mais dos que fazem obras de caridade, mas sem misericórdia, ou que num lugar levantam as mãos, choram copiosamente e se esparramam no chão em suposto culto a Deus, mas que, fora dali, prosseguem aceitando suborno, difamando com a língua, oprimindo o próximo, lançando intriga contra o vizinho, cultivam orgulho e “amor” próprio e alimentam uma mente maquiavélica.
Sou muito mais adepto à indignação, ao questionamento e à dúvida que, por fim, resultem em louvor e confiança, que a uma postura externa piedosa, autoconfiante e aparentemente inabalável, porém decorrente de um coração rancoroso, cheio de julgamento e amargura. Que Deus nos livre da falácia da justiça própria, do mérito e da vanglória, e nos de corações verdadeiros e sinceros, preservando nossa humanidade e incitando-nos a viver uma espiritualidade de gente, e não de anjos (ou demônios!).
Jonathan
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